Identificação. A família, de ascendência portuguesa, que comercializava verduras e frutas. A infância e o trabalho como entregador de jornal. A escola e o comércio de Campinas nessa época. Abertura de seu próprio comércio e as viagens que realizava em busca de mercadorias. Condições das estradas brasileiras e a solidariedade entre os caminhoneiros. O processo de fabricação e comercialização de xaxins. A loja da família. Relacionamento com clientes e distribuição de alimentos na cidade. Casamento. Evolução do comércio. Período em que possuiu fazendas de gado. A família e a trajetória de vida profissional.
IDENTIFICAÇÃO
Sou Edvaldo Martins Felipe, nascido em 19 de abril de 1943, em Campinas.
FAMÍLIA
Meus pais são Oswaldo Felipe e Júlia Carolina Martins Felipe. A origem de meu pai é portuguesa, o meu avô era José Felipe, de Lisboa e a minha avó era Beatriz dos Anjos Afonso, também de Lisboa. Eles vieram para cá de navio, se radicaram aqui e também eram comerciantes. Eu era o xodó da minha avó Graças a Deus Eles tinham um comércio de atacado de verduras e frutas; ele tinha firma em São Paulo, Campinas e Poços de Caldas. Isso era numa época bem difícil, o meio de transporte era bem precário e ele distribuía. A minha avó morreu trabalhando. Levantou de manhã, estava trabalhando, foi na hora do almoço conversar com o meu pai, teve uma morte fulminante. Meu avô morreu com 98 anos Meu pai começou a trabalhar com meu avô e ficava em São Paulo. Meu avô tomava conta daqui e de Poços de Caldas. A minha mãe, mineirinha de Guaxupé, adorava dar conselho pra todo mundo Ela era costureira de alto padrão - na época existia isso – e ela tinha muita uma freguesia boa. Ela era muito detalhista, fazia um vestido, via os defeitos, arrumava, gostava, fazia as coisas bem caprichadas. Comprava tecido aqui em Campinas Tinha uma boa loja, vendia por metro, ia com a freguesa pra loja, escolhia o pano e fazia tudo. Tudo, ela fazia tudo Na época que o meu pai ficou em São Paulo - não ficou muito tempo não, ficou coisa de cinco, seis anos - e eles vieram pra cá e a minha mãe começou a costurar. Então eles já ficaram aqui. Meu pai ia pra São Paulo mais de trem. Tinha a Anhanguera; só a Anhanguera... Tinha uma estrada velha de São Paulo, mas já tinha a Anhanguera recém inaugurada. Foi aumentando o trânsito, fizeram a Bandeirantes e melhorou muito. Tenho duas irmãs. Sou o do meio, tenho uma irmã mais velha e uma mais nova. A minha irmã é casada com um advogado e a minha irmã mais nova é casada com um engenheiro mecânico. Ele era diretor da Elida Gibbs, divisão da Unilever, e aposentou. Depois entrou na Johnson & Johnson, foi também diretor, e agora está aposentado. O meu filho Edvaldo Luiz Felipe trabalha na IBM [International Business Machines]. Morou no Canadá pra aprender inglês porque aqui no Brasil aprender inglês não aprende, só paga mensalidade e não aprende nada. Ele foi para o Canadá, ficou um ano lá, voltou, já tinha se formado em Comércio Exterior, entrou na IBM e está lá. Está contente, está bem lá. Eu tenho mais quatro filhas. Eu tenho a Renata, que é a mais velha, a Fernanda, que é essa que mora em Curitiba, tem a Carla que é nutricionista e mora em São Paulo e tem a Paula que das mulheres é a caçula. Meus filhos são todos formados.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Eu comecei a trabalhar com oito anos de idade por orgulho próprio. O meu pai era comerciante e tinha um poder aquisitivo razoável pra época. Eu me sentia envergonhado de pedir dinheiro pra ele pra cortar cabelo, pra comprar um sapato. O que eu fazia? Um dia eu saí com oito anos de idade. Em Campinas, na Barão de Jaguará, tinha um jornal que chamava “A Defesa”. Eu fui lá e arranjei um serviço mais por causa do tamanho, porque eu sempre fui uma pessoa alta. Cheguei lá e falei: “Vocês estão precisando de empregado?” “Nós estamos precisando. Você tem bicicleta?” “Tenho” “ Precisa de um menino pra fazer entrega de jornal” “Então, eu vou entregar jornal” Eu levantava às três horas da manhã. Naquele tempo, Campinas não tinha perigo. Eu morava aqui perto da Frei Antônio de Pádua, perto do campo do Mogiana, hoje é o Cerecamp [Estádio do Campinas Futebol Clube]. Eu descia às três horas da manhã, pegava o jornal e fazia entrega no Cambuí inteirinho. Acabava onze horas, ia para casa, tomava um banho e ia pra a escola, que era na Orozimbo Maia, aqui na Andrade Neves. Eu estava no primário, saía às cinco horas, ia para casa, dormia e começava novamente no outro dia. Comecei assim. Minha mãe falava para mim: “Não, nós te ajudamos, compra...” Eu falava: “Não, eu quero ter o meu dinheiro” Eu tinha orgulho de ter a minha bicicleta, cortar o meu cabelo, comprar o meu sapato, a minha roupa.
INFÂNCIA
Dava tempo de jogar futebol, empinar as pipas, nadar com os amigos, andar de bicicleta nas horas vagas, passear. Aos domingos, depois de entregar o jornal, eu ia de bicicleta até Americana, na Praia Azul nadar Ia e voltava de bicicleta. Dava uns 30 quilômetros. Por causa da idade, eu tinha fôlego. Eu, graças a Deus, tive uma infância muito boa. Jogava muito em amador de Campinas, disputei campeonato na Liga Campineira de Futebol. Não sei nem se ainda tem isso. E nós fazíamos muitos amigos. Amigos da escola... E outra, na vida - um pensamento meu - nós temos as pessoas conhecidas, só que amigos são poucos; você tem que saber quem são realmente seus amigos. Eu tive realmente muitos amigos bons. Infelizmente, a maioria já se foi. Eu tenho, graças a Deus, o privilégio de ter uma boa saúde e até agora não tomo remédio para nada Também nunca fumei, nunca pus um cigarro na boca O meu pai morreu de câncer do pulmão com 62 anos, sofreu seis meses em casa, eu ia todos os dias visitar, levar o que ele precisava, saía de lá chorando.
FORMAÇÃO
Naquela época era primário, admissão para o ginásio e ginásio. Hoje já é oitava série, sei lá, mudou tudo. Eu parei de estudar porque eu achei que eu tinha que trabalhar. Eu achava assim. Eu era um excelente aluno de matemática, geografia, história; eu tinha facilidade. Eu achava assim: o estudo, pra qualquer pessoa, você vai à sala de aula, aprende, chega em casa, você tem que dar uma recapitulada, você gravar aquilo pra quando tiver uma prova; é lógico, você ouviu isso hoje, uma vez, recapitulou, acho que dá pra você assimilar muita coisa e em uma prova você tem muita facilidade de tirar uma nota boa. Eu acho que ainda hoje tem que ser assim. O que eu fazia? Eu ia à aula, chegava em casa, recapitulava, tinha prova, sempre fazia, tirava nota boa, só que chegou uma época que eu decidi ser comerciante e parei. E gosto de ser comerciante.
COMÉRCIO DE CAMPINAS
Em termos de movimento era bem melhor do que é hoje, porque a cidade cresceu, pulverizou muito e o comércio hoje é difícil; não é pra qualquer um. Hoje a pessoa pra ter um comércio, se não tiver um planejamento bom não sobrevive dois anos Era mais o comércio pequeno, mas tinha um movimento bom, você podia vender fiado pras pessoas, marcava no caderno, a pessoa vinha, pagava, era outra mentalidade. Hoje você vê que um cheque não vale mais nada. Muitos valores, hoje... É uma coisa muito insegura.
JUVENTUDE
Eu adorava baile. Eu tive as minhas fases. Eu ia a baile, a minha mãe gostava, eu ia junto com ela; minhas irmãs gostavam, eu ia junto e meu pai também ia. Depois eu comecei a jogar futebol. Eu não fui profissional porque não quis. Joguei em muito time de futebol, gostava de jogar bola, tive as fases boas. Aqui em Campinas tinha o Camões, eu ia muito a Valinhos, no Rigeza. Era diferente, você chegava ao baile, era mais valsa que dançava, bolero, alguma vez tocava algum tango, e tinha aquele respeito, ia mais pra bater papo, dançar. Terminava o baile, todo mundo se cumprimentava e ia embora. Dançar é como andar de bicicleta, você nunca mais esquece Todo mundo se vestia a caráter. Pra comprar roupa tinha a Ezequiel, tinha a Renner... A Ezequiel tem até hoje na Campos Sales Escolhia a beca, gostoso, muito bom.
VIAGENS
A minha família viajava bastante. Usava Kombi direto. Uma pelo custo beneficio porque era espaçosa e levava 10, 12 pessoas. Era bom.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
A loja do meu pai antes era Banca da Semente. Depois, quando meu pai me chamou e falou que eu iria tocar, eu mudei; coloquei Agro Comercial Felipe que está até hoje. O meu pai ficava na loja e eu achava que eu tinha que crescer, construir. Comprei um terreno e construí um barracão na Fernão Pompeu de Camargo onde montei um atacado. Eu já tinha casado. Eu construí o atacado e comecei trabalhar. O meu forte eram aqueles vasos de xaxim Eu ia a Santa Catarina, foi uma brincadeira, eu viajava muito para o sul com o caminhão, porque uma época também eu fiquei uns cinco anos como caminhoneiro, eu adorava viajar. Eu sempre fui de viajar. Até hoje, eu estou na loja, eu fico 12 horas na loja, mas para mim é um martírio. Eu sou o cara cigano, eu gosto de viajar, eu estando na estrada eu posso ficar sem dormir, comer mal, pra mim está bom, e outra, no Brasil eu só não conheço Manaus, o resto eu conheço tudo. E eu estou aqui, estou em Brasília, estou em Belém, pra mim eu estou em casa, eu nunca me alterei, porque tem muita gente que quando sai de casa se altera, quando está longe de casa sente angústia, sente isso, sente aquilo. Eu nunca senti, graças a Deus, eu adoro viajar. Eu comprei um caminhão parcelado, financiado, e falei: “Bom, agora eu vou ser caminhoneiro” Mas é duro. Eu nasci em 43, eu tinha 19 anos. Naquele tempo, as estradas eram horríveis, os caminhões péssimos, você saía na estrada e era uma aventura, o caminhão quebrava, você ficava sem comer, dormia na estrada e era difícil. Eu viajava mais para o Sul. Transportava fruta de mercado a mercado. Chamava Rápido de Fruta. Você tem horário, você não pode dormir; eu tomava rebite - que eles falam - pra ficar acordado. É um remédio dexamil, dexedrine, um monte de remédio pra você ficar acordado. Só que é terrível, você fica acordado... Eu viajava tanto que chega uma hora que você pára o caminhão na estrada, desliga, puxa o freio, olha pra frente e o caminhão está andando; você olha de lado, está parado, é terrível Você sai de órbita Tinha vezes que eu ia até a divisa do Uruguai e voltava. Quando eu chegava em casa, ficava dois, três dias dormindo; só levantava pra ir no mictório e voltava. Ficava sem comer, só dormindo de tanta canseira e stress que tinha. Não podia parar Tomate, pimentão, berinjela, legume, fruta, puxava o que tinha, ganhava dinheiro, mas não era fácil não. Caminhoneiro, não deixa o outro na mão. Na minha época, eu cheguei a ficar com um caminhão pendurado pra tombar, os caras vinham, engatavam cabo de aço, tiravam. Um ajudava o outro, sempre foi assim. Códigos tem; na estrada tem Se tem radar, se a estrada está com problema, se tem carro tombado. Quando você ultrapassa alguém que te dá um toque na buzina pra agradecer. É como hoje você vê na estrada: o cara dá farol pra você, pode ver que tem radar.
COMÉRCIO DE XAXIM
Um dia o meu pai falou assim: “Oh, Felipão, trás pra mim vaso de xaxim” E na Serra do Espigão, lá na região de Santa Cecília, tinha uma fábrica na beira da estrada. Eu parei lá, vi, trouxe o que dava pra trazer. Fui trazendo uma vez, dez vezes. Um dia, o dono... Quem ficava lá era a esposa dele e ela falou: “Olha, o meu marido quer falar com você. Vamos conversar” Eu parei lá e ele falou: “Você não quer levar uma carga lá pra Campinas e você vende lá no atacado?” Eu tinha que ter um lugar pra colocar. Eu aluguei um depósito no Jardim do Trevo e comecei a trazer carga. Deu certo, uma carga, duas cargas daí vinham três cargas por semana. Eu arrumei um vendedor e comecei a vender pelo Brasil inteiro Ele me chamou pra ser sócio, fizemos uma fábrica e foi a maior fábrica de vaso de xaxim do Brasil Nós tínhamos 20 tornos; o torno é o vaso, tronco. O xaxim tem uma curiosidade: hoje no Estado de São Paulo é proibido vender xaxim, é crime ambiental, não pode vender. O Alckmin [Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho] sancionou a lei, mas veja, o xaxim é tirado de Santa Catarina, da região serrana. No mundo só existe xaxim em uma faixa do Brasil, que é Paraná e Santa Catarina. Também existe no México, em outro lugar não existe xaxim. Ele é derivada de uma planta que chama Samambaiauçu, um tronco de xaxim, num diâmetro mais ou menos de 60 centímetros demora de 100 a 120 anos para formar. O xaxim, na região é um lixo, um mato que não tem valor nenhum, por quê? Porque as firmas de reflorestamento entram com os tratores de esteira, trator pesado, aquilo vai acabando com todo o xaxim; entram pra replantar o pilo para fazer madeira: a maioria da madeira que nós consumimos é o pilo de reflorestamento. Então, o xaxim, como ele demora muito para formar, é uma planta excelente para plantar samambaia, uma avenca, uma orquídea, o que acontecia? Nós entrávamos antes do reflorestamento e tirávamos todo o xaxim que conseguíamos; industrializava e trazia os vasos pra cá. Ele é um tronco, são cortados os rolos, coloca num torno, adaptado, num torno de madeira, só que ele é adaptado pra segurar com a faca feita de mola de caminhão; ele vira e você vai moldando. É fácil de fazer, você faz um atrás do outro, rapidinho faz. Cada tronco dá um diâmetro. Nós começamos a industrializar e deu certo. Eu cheguei a ter oito caminhões entregando isso, mas caminhão grande, aqueles baús grandes. O que aconteceu? Foi diminuindo o xaxim porque a Klabin vinha pra nós e falava assim: ”Essa área aqui vocês entram, abre a estrada...” Ele dava o mapa, “... e vocês tiram o que pode tirar até tal mês Depois vai entrar a nossa turma e vocês não podem mais entrar” Ia com o trator de esteira, abria a estrada, nós tínhamos caminhão traçado... Traçado é caminhão que, por exemplo, três eixos, três eixos que têm tração, porque a maioria dos caminhões a frente não é tração, só vira. Então, entrava e ia tirando, tirava dia e noite, tinha uma equipe que ficava acampada no mato, lá é terrível, chega a dar seis graus abaixo de zero; e tinha equipe que dormia no mato, ficava mês e mês lá, só trabalhando com isso, ele puxava na estrada com o trator, nós íamos no caminhão, puxando dia e noite e nós industrializando. Eu ganhei dinheiro, deu pra equilibrar a vida, aí foi ficando ruim. Quando foi em 94, o meu sócio comprou uma fazenda em Sorriso, no Mato Grosso, na Cuiabá-Santarém, o negócio já começou a ficar meio ruim, porque ele tocava lá, eu tocava aqui, estava em harmonia, ele quis ir para o Mato Grosso, o negócio balançou. E outra, quando você vai terminar um negócio, você tem que abortar na hora, não adianta ficar protelando, eu cheguei a falar: “Vamos fechar, acabar com isso aqui e pronto” Acabamos, ele é meu amigo até hoje, vou lá no Mato Grosso na casa dele, acabamos o negócio e eu parei com o xaxim, eu só fiquei com a loja, mas também foi por causa da idade também, você vai ficando cansado, eu estou com 64 anos, trabalho 12 horas por dia. Sábado é cruel, você trabalha de arrasto Eu não tenho vergonha de falar, com a saúde que eu tenho, você chega no sábado tão cansado que você não vê a hora de descansar. Graças a Deus, deu pra cuidar dos filhos, deu pra tocar a vida.
AGRO COMERCIAL FELIPE
O meu pai ficou doente e eu já estava mais perto dele. Tinha o atacado e eu fiquei com a loja. Fiz inventário, as minhas irmãs ficaram com as outras, fizemos as partilhas, tudo direitinho e pronto. Hoje, eu vendo sementes, adubo, inseticida. Porque a verdura nós paramos. Foi mudando aos poucos. O problema da verdura é que é uma venda... Você quer fazer um canteirinho de rúcula na sua casa, você vai comprar quanto de rúcula? Um punhadinho, você não vai comprar um kilo É uma venda técnica. Não adianta eu chegar pra você e falar: “Não, leva 100 gramas, um kilo” Você não vai levar, você não vai precisar, você vai levar um pouquinho porque um pouquinho dá um canteiro. Uma colherzinha de semente de alface, você colhe 500 pés de alface, rende muito E tem o adubo que você tem que usar certo, e mais doméstico, tem chácara, sítio, usa pouco, não é a lavoura grande. Então, eu fui mudando. E outra, verdura se você não vender hoje, amanhã pode jogar fora, a maioria estraga, você pega um pé de alface, colhe, se você não botar num lugar adequado daí a duas horas não serve para mais nada O problema hoje, acho que é do Brasil inteiro, a vida mudou muito; mudou pra você, mudou pra mim, mudou pra todo mundo. Nós ganhamos, ganhamos, agora eu te pergunto, sobra alguma coisa pra você? Está todo mundo no mesmo barco Hoje no Brasil, é lógico, chegou a tecnologia, melhorou muita coisa, só que naquela época você trabalhava e via o resultado. Você trabalhava um ano e você falava: “Bom, no fim do ano o que eu comprei? Uma casa, um terreno” Hoje você trabalha dez anos e você não compra um terreno, por que? Porque hoje tudo é caro, conta de água, conta de luz, telefone... Você vai ao supermercado, você não compra nada e a conta é lá em cima, quer dizer, ficou difícil. Hoje pra se viver é muito caro, você ganha, ganha, tudo bem, só que não sobra nada Hoje os impostos são terríveis, a carga tributária é muito alta. Vamos analisar no geral, no comércio, você ganha 500 reais, vai te sobrar 10, 15 reais, porque o resto come tudo em despesa. É cruel, é muito difícil
FORMAS DE PAGAMENTO
Cheguei no tempo do caderno, da caderneta, e o pessoal pagava, honrava. Hoje é um perigo, o que eu pego de nota falsa As que mais aparecem são de 100, de 50, e de 10 reais. As de 20 não. É todo dia Você tem que ter a maquininha, você pegou essa nota, põe na maquininha, é certeza que é falsa Quando você chega para o cliente e fala: “Vem cá, onde você pegou essa nota?” O cliente assusta; às vezes, ele sabe e, às vezes, ele não sabe. Por que você conhece uma nota falsa? Você não conhece. Vai num banco, saca, vem uma no meio, chega uma pessoa pra você e fala: “Não, essa nota é falsa, onde você arrumou?” Um dia, um cliente chegou na loja, comprou a mercadoria e me deu uma nota de 100. Eu pus na máquina, era falsa. Quando eu perguntei pra ele: “Onde você arrumou essa nota aqui?” Ele catou a nota da minha mão e saiu correndo da loja Agora o que eu vou pensar? Eu não sei se foi ele que sabia da nota falsa ou se ele ficou com medo de ser preso, alguma coisa. Hoje uma coisa boa para o comerciante é o cartão de crédito. O cartão, o dinheiro de plástico. É muito bom. Eu tenho, funciona, só que nós percebemos que a pessoa que está com o cartão no bolso não pensa muito pra gastar não. Eu acho que a mentalidade é essa: “Meu cartão vai cair dia primeiro, hoje é dia oito, se eu gastar trinta e gastar cinqüenta, é a mesma coisa” Não é, porque dia primeiro ele vai ter que pagar lá; aí é problema da financeira, não é mais conosco. Então é o dinheiro do futuro Por causa da garantia. O cheque hoje não tem mais garantia; o cheque hoje não quer dizer nada. Tem cheque que você consulta agora, você deposita o cheque amanhã e não tem problema. Hoje a taxa de administração do cartão, por comerciante, gira em torno de - dependendo do giro - de 2 a 3,5%. Eu acho errado, eu acho que não devia cobrar nada ou cobrar alguma coisa menor. Existe o débito e o crédito. Funciona assim: o seu cartão é dia cinco, o crédito, o que você comprar ao longo do mês vai cair dia cinco Cartão de débito é no outro dia, é como compensar um cheque. Eu passei hoje, fiz um fechamento, amanhã já está na minha conta, não tem encrenca nenhuma, não tem esse negócio de esquecer de depositar. Dá garantia, mas tem um custo, 3,5%, eu pago Passou lá, 3,5% é da financeira.
SUPERMERCADOS
O comércio era diferente. Depois que entrou o supermercado mudou, foi uma revolução no comércio e hoje o supermercado é um segmento mais amplo, mais completo. Se você tem cash pra montar um comércio forte, você vai montar, que se dane o concorrente, isso é a lei da oferta e da procura, lei do comércio. Muitas firmas que existiam antes do supermercado hoje não tem o porquê existir, porque hoje você vai para o supermercado e ele faz concorrência com muita coisa. Muito segmento. Você vai ao supermercado, você compra uma televisão, uma geladeira, a linha branca, que eles falam, você tem um leque muito grande. O supermercado quando entrou já mudou tudo, já começou a mudar Pra qualquer um de nós. Eu vou para o supermercado, ele vai, você vai e tal. O supermercado não faz nada bonitinho pra ninguém, não. Eu fiz um curso de administração de empresa intensivo, nessa linha de venda, o supermercado trabalha com um leque grande e eles põem 20 produtos chamarizes, que é arroz, feijão. Ele compra um saco de arroz por um real, ele vende por noventa centavos, pra chamar você pra ir lá, ver que ele está vendendo arroz barato. Só que você vai comprar lata de outra coisa e você vai pagar mais caro do que qualquer outro lugar. Aí é problema do comprador. Ele que vai ter que garimpar pra ver se é barato ou não O supermercado tem essa armadilha e a maioria das pessoas não vê isso; eles chegam, vão catando, vão pondo no carrinho, chega lá, paga, passa o cartão, pronto. Quando sai, você comprou aqui um item, você pagou no supermercado três e vinte, você sai na cidade está dois e noventa, você fala: “Paguei mais” Milagre ninguém faz
COMÉRCIO DE CAMPINAS
Naquela época era empório, armazém. Nós comprávamos mais essas coisas nos bairros e Campinas era pequena. Quem morava no Cambuí, morava longe do centro. Hoje o Cambuí é centro. Eu fui criado aqui perto do Mogiana, no Guanabara, da linha férrea que agora está desativada, na Barão de Itapura. Dali pra cima era tudo terra; o Castelo, lá pra cima, tudo terra, buraco na rua. Quando asfaltou foi aquela alegria: ”Nossa Agora nós estamos morando na cidade” Ali onde eu morava, no Mogiana, da Barão de Itapura pra cá era o comércio; dali pra cima não tinha quase nada. Cada bairro tinha um tipo de comércio. Padaria era mais no centro da cidade.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Eu tive uma padaria durante um ano e oito meses. Foi o pior negócio da minha vida Porque a despesa da padaria era mais do que o lucro. Naquela época, o pão era tabelado e vendia muito fiado Eu tinha 250 cadernetas. Herdei 250 cadernetas de fiado. Quando tinha a caderneta, o cliente ia lá e falava assim: “Me dá meio quilo de presunto, meio quilo de queijo.” Tudo na caderneta. “Cinco litros de leite.” E o pão todo o dia. Chegava na hora de receber, eu recolhia as cadernetas dia 31, tinha que pagar até dia 10, metade pagava, metade não pagava. Você ia cobrar: “Não tenho dinheiro” “Calma, espera aí, você comeu, você gastou, você tem que ter consciência.” Não tinha cartão de crédito. Hoje acabou, não deu certo, vendi, perdi. Tive fazenda em Goiás durante 14 anos. Era uma fazenda de cria e recria. Cria e recria o que é? Você tem as vacas, cada 30 vacas, um touro. O bezerro que nasce, você vende os machos e fica com as fêmeas. As vacas, pra cada oito crias, você vende para o descarte, para o açougueiro. Também não gostei, péssimo negócio, as contas não batem Durou 14 anos. De sofrimento, passando raiva E na hora de vender o gado, você vende o gado fiado, não recebe, se você pega o cheque também não vale nada, é um negócio horrível No comércio, todo dia se está com dinheiro, vai pagando as contas, vem, entra dinheiro, você paga. Na fazenda, na hora que você vai vender o gado, não cobre a despesa. Nasce bezerro, você fala: “É lucro” É lucro nada porque quando ele nasceu, já comeu o lucro. É cruel. Eu sempre fui uma pessoa organizada, nunca tive protesto, meu nome é limpo na praça, minha firma é boa, e na fazenda eu vi que o negócio não era bom porque as contas não batiam. Eu acho que fazenda hoje no Brasil é um negócio que não sei pra quem é bom A minha que era de cria e recria, o meu lucro era vender bezerro macho e vaca descartada. Depois de a vaca ter oito crias você pode vender; o bezerro você vende pra quem vai por o macho pra engordar e a fêmea para reproduzir também. As fêmeas, a maioria ficava com ela para o plantel. O touro, a cada dois anos você tem que trocar. Você tem um touro aqui, ele está cobrindo a vaca, se você não trocar daqui a dois anos, ele começa a cobrir as filhas dele, míngua o gado. Na região, sempre o seu gado é melhor do que dos outros. Eu via lá e falava: “Fulano, eu tenho cinco touros pra vender, quantos você quer?” “Tanto” O dele era mais caro, o meu era mais caro, eu pensei bem e falei: “Se você precisa trocar touro e eu preciso trocar, porque nós não trocamos sem mexer dinheiro?” Eu ia lá e falava: “Eu tenho cinco touros pra trocar, você tem cinco aí pra trocar comigo?” “Tenho” “Vamos trocar.” “Não, o meu é mais bonito que o seu...” “Espera aí, o touro também tem a idade fértil dele, você olha nele, você sabe a idade mais ou menos. Vamos fazer o seguinte, você pega o padrão dos cinco touros seus, eu pego o padrão do meu e analisa, deu certo, vamos trocar, não fala em dinheiro.” Os caras achavam que era absurdo fazer isso. Eu pus na cabeça e a primeira vez trocou, um foi falando pro outro, trocando, trocaram o touro, pronto Resolvia o problema porque você ficar com o touro só pra dizer que ele é bonito e ele te dando prejuízo, não adianta. Eu sei que fiquei 14 anos, ganhei na compra pra venda com as benfeitorias que eu fiz. Eu fiz 98 quilômetros de cerca, fiz casa, curral bom e arrumei, melhorei a fazenda, paguei “x”, vendi por “y”, deu lucro na compra e na venda, só que o resultado econômico financeiro péssimo, horrível. Na minha região, quando eu comprei, chegava um vizinho meu: “Quantas cabeças de gado você tem?” Você fala: “Tenho cinco mil” Depois de 14 anos: “Quantas cabeças de gado você tem?” “Tenho 200” “Mas cadê o resto?” “Cadê o carro novo que você tinha?” Está velho, quebrado, tudo danado, você não sabe falar nem pra onde foi o dinheiro. O meu sonho, quando eu tinha lá pelos 20 anos, era ser piloto de avião, só que eu fui atrás e era um curso muito caro, era semelhante a um curso de medicina hoje, ou talvez mais caro. Eu vi que não tinha cash pra isso e descartei, não adianta. Mas sou feliz em ser comerciante. Tenho uma família boa, maravilhosa, agradeço a Deus, não tem ninguém doente, ninguém em cadeira de rodas, ninguém com problema de nada Meus netos, meus filhos, graças a Deus
DESAFIOS
O pessoal fala muito de inflação. Para o comerciante, uma inflação média é boa. Agora, a inflação alta é terrível, é ruim pra todo mundo. Só que agora dizem que não tem inflação, só que não tem conversa... Por que eu pergunto pra você, você acha que as coisas não sobem? Quando a inflação dá 2%, que eles falam que dá, a mercadoria subiu 20, então tem inflação, é inflação camuflada. Outra coisa no Brasil que é errada é o bi-tributo. Nós temos tantos bi-tributos que você não acredita, porque você tem o seu carro e você é obrigada a pagar o IPVA [Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores] do carro e você paga pedágio. O pedágio é caro, é terrível. Você pega um caminhão na Anhanguera ou na Bandeirantes, em São Paulo, e vai até a divisa de Minas que é Uberaba. Um caminhão que arrasta 25 toneladas gasta de pedágio - vamos fazer uma suposição - 200 reais; daí mais 150 de combustível. Eu pergunto, está errada a conta ou não está? Por quê? Você pega o seu carro daqui de São Paulo, você gasta 10 e 60 de pedágio e oito de gasolina, tem coisa errada ou não tem? Como o pedágio é mais caro que o combustível que você está gastando? Você já pagou o pedágio, o pedágio é um bi-tributo Isso tudo influencia no preço dos produtos.
PRODUTOS
A semente, 90% vem dos Estados Unidos, região da Califórnia. Outros 10% vem da Europa, de países como Itália, França, Dinamarca. Eu compro de um importador. Antigamente, o Brasil produzia sementes só que ficava mais caro do que comprar lá fora. Sabe por quê? Porque tudo no Brasil custa mais caro, é super faturado. Flor também. Flor o forte é a Europa, vende razoável. A flor é uma planta bonita, mas pra você cuidar dela não é fácil. Só quem gosta mesmo e tem tempo. O adubo compro aqui. É misturado, é o NPK. Também é a matéria-prima, é tudo importada. Os maiores importadores são São Paulo e Rio de Janeiro. Eles importam em tambores grandes e depois embalam latinhas de 100 gramas; vem com rótulo, tudo direitinho. A venda de semente é hoje igual a venda de farmácia, toda a semana tem que estar repondo, não adianta estar comprando um monte. É uma venda técnica, não adianta eu comprar dez quilos. E tem vencimento também; venceu, eu tenho que jogar fora. Tem um prazo de validade. A legislação anterior era de três anos. Hoje é dois anos. Eu faço o pedido e a transportadora trás. Ás vezes uso o fax, depende da pressa. Se for esperar o vendedor, às vezes você fica uns seis meses sem comprar Internet não uso. Sou do tempo antigo, nem computador tenho na loja; só em casa.
CASAMENTO
Eu sou casado pela segunda vez. Eu casei muito novo, da primeira vez. Eu tive primeiro a Renata, depois de quatro anos veio a Fernanda, essa que mora em Curitiba. Não deu certo o casamento, achei melhor separar. Separei, dei uma casa para ela, fiz tudo que tinha que fazer e fiquei quieto. Depois eu conheci a minha segunda esposa, a Maria Cacilda, no mercado. Ela trabalhava em uma loja perto da do meu pai. Eu nem parava muito lá, foi a época que eu viajava e um dia, conversando, meu pai falou: “Estou precisando arrumar uma funcionária” Ela entrou para trabalhar, eu ia viajar, eu estava sozinho e falei: “Separa umas contas pra mim” Deixava dinheiro pra ela pagar e eu ia viajar. Depois começamos... Eu tive três filhos com ela. Duas meninas, a Carla, a Paula e o Edinho, o caçula é homem. Tenho cinco filhos, quatro mulheres e um homem. Nós nos damos bem, a minha primeira esposa é viva, não temos nada de problema. Vivemos bem, vivemos todos em harmonia, não tem problema nenhum.
FUNCIONÁRIOS
Tenho um só Eu Estou naquela fase, 64 anos, esperando São Pedro dar a marretada (risos)
PROPAGANDA
Eu fazia propaganda numa época, mas o meu segmento, acho que não precisa. Eu não quero aumentar, não quero crescer, quero ficar do jeito que está até eu ir embora. Acho que é besteira, a propaganda porque é cara, fica inviável.
SUCESSO
A loja era do meu avô, depois ficou pro meu pai e depois para mim. Eu acho que está lá no Mercado desde 1925, por aí. No mesmo lugar. O sucesso do comércio é o bom atendimento, amizade. Você vai comprar lá e eu tenho que transmitir pra você uma amizade, uma coisa boa; eu tenho que conversar com você, dialogar, saber o que você quer, se você está com problema na tua casa, com pulgão na tua planta ou isso ou aquilo. Eu tenho que passar pra você uma confiança e um bom atendimento. Isso que ganha hoje. Hoje tem um problema grave e geral no comércio: têm produtos de vários preços e várias qualidades; você tem que saber vender aquilo que o cliente está precisando e o cliente tem que ter uma consciência também. Muitas vezes, preço baixo não é qualidade. Às vezes, também, preço alto não é qualidade. Tudo existe no mercado e quem tem que ver sou eu. O vendedor tem três produtos: barato, médio e caro. Qual é o melhor? O barato, então eu vou vender pra você o barato porque é o melhor; às vezes, o médio e o caro não são bons, o produto não é de qualidade boa. Eu vou te passar a confiança daquilo que você vai comprar de mim hoje e que vai dar resultado. Amanhã você vai lembrar de mim. Se você tem um restaurante, sabe quem tem que ser bom no seu restaurante? O seu garçom e o seu cozinheiro. Se você vai a um restaurante e é mal atendido pelo garçom, você vai voltar lá? Se você vai a um restaurante e a comida não é boa, você vai voltar? Não é o dono. O dono tem que saber quem ele põe lá pra trabalhar. No meu comércio, o bom é o vendedor que eu ponho lá, ele tem que ser um bom vendedor, senão eu vou perder cliente.
PROMOÇÕES
No meu ramo, infelizmente, não dá para fazer promoção porque os fornecedores também não fazem. Quem tem outro segmento, chega pra você e fala: “Se você comprar dez caixas de lâmpadas eu te dou 20% de desconto, você compra duas, três” Você pode fazer uma promoção, mas o meu segmento, se você comprar uma e comprar 100 é o mesmo preço, então não tem por que
COMÉRCIO DE CAMPINAS
É um comércio forte, tem um potencial muito grande. Mas como campineiro, nascido e criado aqui, como comerciante, o comércio campineiro é meio abusivo quanto a preço. Você compra uma mercadoria em Campinas, você paga dez reais e essa mesma mercadoria, em São Paulo, no preço final, preço final de venda, você paga sete, sete e cinqüenta. Por que essa diferença se o fornecedor seu, que mora em São Paulo, é o mesmo meu? Eu acho que Campinas é uma cidade cara pra se viver Eu tenho um exemplo, a minha filha mora em Curitiba há 15, 16 anos. Em Curitiba, o preço das coisas lá, a vida é muito mais barata do que em Campinas. O centro produtor, a turma sempre fala que é o Estado São Paulo e por que em Curitiba que é no Paraná, está a 500 quilômetros daqui, o custo de vida é mais barato? Tem alguma coisa...
LIÇÕES DO COMÉRCIO
A lição que eu tirei é que tenho cinco filhos, todos eles com diploma universitário. Eu tenho uma filha que é nutricionista, mora em São Paulo. O salário dela dá vergonha de falar Eu tenho uma filha que é formada em Turismo, ela ganha menos do que uma funcionária da minha loja que não tem faculdade, não tem nada No Brasil, nós estamos indo para o caminho errado. O meu genro é médico. Um médico, pra ele começar a ganhar dinheiro na vida... Porque é cruel você fazer 10, 12 anos de faculdade e quando você sai para o mercado de trabalho, você não é valorizado. O investimento, tudo que você vai investir tem que ter um retorno, e o retorno do universitário hoje é muito lento, muito ruim. O comércio, se for ver, analisar as categorias, o comércio é um bom negócio, é viável. Só que tem coisas primordiais no comércio, você tem que ter honestidade, sinceridade e caráter. Caráter você tem que por na cabeça que ninguém é bobo; você tem que cumprir quando você falar uma coisa. Se você deve, você paga. E o importante no comércio é pagar em dia, se vencer dia primeiro, paga dia primeiro, não deixar pra pagar dia dois, dia três. É o sucesso do comércio. Porque a notícia boa anda, a ruim voa. A vida é assim, anda direito na vida que você vai ter as coisas boas, você não fica achando que os outros são bobos, que você é sabido, que você não vai a lugar nenhum; é a minha opinião. Eu passei pros meus cinco filhos isso sempre na vida: “Filho, você está andando numa estrada, você está passando num laranjal, você não pare e pegue uma laranja porque não é sua. Você não põe a mão naquilo que não é seu” Meus cinco filhos foram criados assim e, graças a Deus, até hoje, nunca tive problema nenhum. Drogas? Eu fui criado no mundo, me ofereceram drogas, traficante ofereceu pra mim com caminhão, pra transportar cocaína no meio de carga. O cara falou: “Eu te pago tanto pra você levar?” “O que eu vou levar?” “É uma caixa assim e tal” “Se eu não souber o que tem dentro da caixa, não vai por no meu caminhão” E não punha por dinheiro nenhum. Eu sei que é errado e, então, por que vou fazer errado? Faz errado quem quer fazer, ninguém obriga ninguém a fazer nada errado.
MEMÓRIAS DO COMÉRCIO DE CAMPINAS
Eu acho que é uma coisa boa. Esse livro que vocês fazem, vocês tem que fazer chegar ao público leitor Eu não sei a que preço, mas tem que chegar. Só assim nós vamos conseguir o objetivo, porque não adianta nada você fazer um livro dessa grossura, lindo, maravilhoso, mas ninguém lê Não serviu pra nada porque ninguém leu o livro, ninguém sabe o que está ali dentro. O livro tem que chegar ao povo. Adorei a entrevista. Eu fiquei muito honrado e muito contente de ser lembrado.
Memórias do Comércio - Campinas (MCCAMP)
Vendendo produtos para agropecuária
História de Edvaldo Martins Felipe
Autor: Museu da Pessoa
Publicado em 06/08/2008 por Museu da Pessoa
P/1 – Bom seu Felipe eu queria começar a entrevista com o senhor dizendo seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Edvaldo Martins Felipe, nascido em 19 de abril de 1943 em Campinas.
P/1 – E o nome dos seus pais, Felipe?
R – Oswaldo Felipe e Julia Carolina Martins Felipe.
P/1 – a sua família tem origem portuguesa?
R – Portuguesa, por parte de pai.
P/1 – Seu pai que veio para cá?
R – Não, meus avôs.
P/1 – E o senhor lembra desses avós?
R - Lembro. O meu avô era José Felipe, de Lisboa e a minha avó era Beatriz dos Anjos Afonso, também de Lisboa. Aí eles vieram para cá de navio, se radicaram aqui e também eram comerciantes.
P/1 – E o senhor chegou a conhecer, a conviver com eles?
R – Eu era o xodó da minha avó!
P/1 – É mesmo!
R – Graças a Deus!
P/1 – Que tipo de comércio tinha os seus avôs?
R – Eles tinham comércio atacado de verduras e frutas, ele tinha firma em São Paulo, Campinas e Poços de Caldas, na época, e era uma época bem difícil, o meio de transporte era bem precário.
P/1 – Eles compravam essas verduras no interior e distribuíam, é isso?
R – É, distribuíam, tudo. É, a minha avó morreu trabalhando. Levantou de manhã, tava trabalhando, aí ela foi na hora do almoço conversar com o meu pai, teve uma morte assim fulminante.
P/1 – Então é uma família que já vem do comércio?
R – É, meu avô morreu com 98 anos!
P/1 – Eles também eram comerciantes lá em Portugal, o senhor se lembra disso?
R – Isso aí eu desconheço, aqui sempre foram comerciantes.
P/1 – E os seus pais? A atividade deles? Sempre do comércio?
R – Meu pai sempre, ele começou a trabalhar com meu avô e também ele ficava em São Paulo e meu avô tomava conta daqui e de Poços de Calda.
P/1 – E a sua mãe era costureira, né?
R – A minha mãe, a mineirinha de (guachupé?), muito legal, tudo, adorava dar conselho para todo mundo!
P/1 – E ela era costureira de alto padrão, não?
R – Era, na época existia isso, ela tinha muito a freguesia boa, mesma, ela era muito detalhista, ela fazia um vestido, ela via os defeitos, arrumava, gostava,fazia as coisas bem caprichadas.
P/1 – O senhor lembra onde ela comprava os tecidos, seu Felipe, se era aqui em Campinas mesmo?
R – Aqui em Campinas!
P/1 – Não precisava ir para São Paulo?
R – Não, não. Tinha aqui boa loja, deve ter aqui até hoje, naquela época vendia por metro, né, aí ela ia com a freguesa para a loja, escolhia o pano, tal e fazia tudo.
P/1 – Vestido de festa, casamento...?
R – Tudo, ela fazia tudo!
P/1 – E tudo aqui em Campinas, não precisava ir para São Paulo?
R – Não, tudo aqui.
P/1 – E o teu pai ficava em São Paulo?
R – É, na época que, o meu pai ficou em São Paulo, não ficou muito tempo não, ficopu coisa de cinco seis anos, aí eles vieram para cá e a minha mãe começou a costurar e tal então ele já ficaram aqui.
P/1 – essa época que o teu pai ia para São Paulo o senhor já era nascido, não?
R – Já era nascido!
P/1 – Como é que ele ia para lá? O senhor lembra se ele ia de trem?
R – É, aquela época era mais de trem e tinha mais a Anhanguera, só a Anhanguera, só.
P/1 – Que era uma estrada pequenininha!
R – Uma estrada velha de São Paulo, mas já tinha, a Anhanguera foi recém inaugurada, né, e aí foi aumentando o transito e ficou intransitável aí fizeram a Bandeirantes e melhorou muito.
P/1 – O senhor ia também para São Paulo?
R – Eu não lembro porque era muito pequeno.
P/1 – Não lembra, mas provavelmente devia ir com seus pais. E o senhor tem irmãos seu Felipe?
R – Tenho duas irmãs.
P/1 – Então é o único rapaz?
R – Sou o do meio, tenho uma irmã mais velha e uma mais nova.
P/1 – Então foi paparicado pelas irmãs quando era pequeno?
R – É, graças a Deus!
P/1 – E as suas irmãs também estão no comércio?
R – Não, a minha irmã é casada com um advogado e a minha irmã mais nova é casada com um engenheiro mecânico, aposentado hoje, ele era diretor da _________ _____, Divisão da Unilever, aí ele aposentou, aí ele entrou na Johnson, foi também diretor, agora está aposentado.
P/1 – Quer dizer que comércio mesmo só o senhor que continuou?
R – É!
P/1 – Da família? Quer dizer, seu avô, seu pai, agora o senhor e o teu filho?
R – Não, o meu filho trabalha na IBM, ele morou no Canadá para aprender inglês, porque aqui no Brasil aprender inglês não aprende, só paga mensalidade e não aprende nada, então ele foi para o Canadá, ficou um ano lá, voltou, já tinha se formado em comércio exterior, aí ele entrou na IBM e está lá, está contente, está bem lá...
P/1 – Como chama esse seu filho?
R – Edvaldo Luiz Felipe.
P/1 – E o senhor tem mais duas filhas?
R – Eu tenho mais quatro filhas!
P/1 - Quatro filhas, quatro moças! Que bacana!
R – Eh, eu tenho a Renata, que é a mais velha, a Fernanda, que é essa que mora em Curitiba, tem a Carla que é nutricionista e mora em São Paulo e tem a Paula que das mulheres é a caçula.
P/1 – e praticamente todos formados?
R – É, todos formados.
P/1 – Todos fizeram faculdade? A caçula também está fazendo?
R – Já fez.
P/1 – E o senhor conseguiu formar essa turma toda só trabalhando no comércio?
R – Graças a Deus!
P/1 – Que coisa muito boa! E como era Campinas, seu Felipe, quando o senhor era menino, por exemplo, do que o senhor se lembra?
R – Eu comecei a trabalhar com oito anos de idade, assim, veja bem, por orgulho próprio, o meu pai era comerciante e tinha poder aquisitivo razoável, para a época, então eu me sentia envergonhado de pedir dinheiro para ele para cortar cabelo, para comprar um sapato, aí o que eu fazia? Um dia eu sai com oito anos de idade, em Campinas, a Barão de Jaguara tinha um jornal que chamava A defesa, aí eu fui lá e arranjei um serviço, mais por causa do tamanho, porque eu sempre fui uma pessoa meio alta, então com oito anos eu cheguei lá e falei: “Vocês estão precisando de empregado?”, “Ah, nós estamos precisando... Você tem bicicleta?”, “Tenho!”, “ Então, vai precisar de menino para fazer entrega de jornal!”, “Ah, então eu vou entregar jornal!”. Eu levantava três horas da manhã, naquele tempo Campinas não tinha perigo, eu morava aqui perto ________________________, hoje é ______________ do Guanabara aqui, aí eu desci três horas da manhã, pegava o jornal na Defesa e fazia o ____________ inteirinho, acabava onze horas, assim, ia para casa, tomava um banho, aí eu ia para a escola, que era _____ Maia, aqui na Andrade Neves, eu estava no primário, né, aí eu saia às cinco horas, ia para casa, dormia, aí ia no outro dia...Comecei assim.
P/1 – Sua mãe não achava ruim?
R – Não, ela falava para mim: “Não, a gente te ajuda, compra...”, eu falava: “Não, eu quero ter o meu dinheiro!”, então eu tinha orgulho de ter a minha bicicleta, cortar o meu cabelo, comprar o meu sapato, a minha roupa, tudo.
P/1 – Que beleza, hein, quer dizer, em termos de infância o senhor não brincou, dava tempo?
R – Ah, dava tempo de jogar futebol, empinar as pipas, nadar com os amigos, andar de bicicleta nas horas vagas, passear, eu ia de bicicleta aos domingos, depois de entregar o jornal em Americana, na praia azul nadar! Ia e voltava de bicicleta, de Campinas dava 30 quilômetros, quer dizer, por causa da idade, a gente tinha fôlego. Eu graças a Deus tive uma infância muito boa.
P/1 – E jogar bola que o senhor mais gostava, isso?
R – É, jogava, eu joguei muito em amador de Campinas, disputei campeonato na Liga Campineira de futebol, não sei nem se ainda tem isso aí e a gente fazia muitos amigos.
P/1 – quer dizer, o senhor conseguia trabalhar, estudar porque o senhor também fez ginásio, o senhor fez exame de admissão, o senhor estava me falando, é isso?
R – É naquela época primário, admissão para o ginásio e ginásio. Hoje já é oitava série, sei lá, mudou tudo. Outra, eu parei de estudar porque eu achei que eu tinha que trabalhar.
P/1 – Mas o senhor nunca teve problema de escola, mesmo com essa sua atividade ____, você sempre foi bem na escola?
R – Não, não, porque a escola, eu achava assim, eu era um excelente aluno de matemática, geografia, história, então eu tinha facilidade nisso, então eu sempre achava assim, o estudo, para qualquer pessoa, acho que até hoje, você vai na sala de aula, você aprende, você chega em casa, você tem que dar uma recapitulada, você gravar aquilo para quando tiver uma prova você é lógico, você ouviu isso hoje, uma vez, recapitulou, acho que dá para você assimilar muita coisa, numa prova você tem muita facilidade de tirar uma nota boa. Então o que eu fazia? Eu ia na aula, chegava em casa, recapitulava, tal, tinha prova, sempre fazia, tirava nota boa, só que chega uma época, eu decidi que eu tinha que ser comerciante, e gosto de ser comerciante.
P/1 – Então, e o senhor estava falando que o senhor tinha muitos amigos, e esses amigos eram o que, vizinhos, amigos da escola?
R – Amigos da escola, e outra, a gente na vida, eu acho que eu, um pensamento meu, a gente tem as pessoas conhecidas, só que amigos são poucos, então você tem que saber quem são realmente seus amigos. Eu tive realmente muitos amigos bons.
P/1 – Que bom, tem amizades daquela época até hoje seu Felipe?
R – Infelizmente a maioria já se foram, então eu tenho, graças a Deus, o privilégio de ter uma boa saúde e até agora não tomo remédio para nada!
P/1 – Que bom!
R – também nunca fumei, nunca pus um cigarro na boca! O meu pai morreu de câncer do pulmão com 62 anos, sofreu seis meses em casa, eu ia todos os dias visitar ele, levar o que ele precisava, saia de lá chorando.
P/1 – E como era o comércio seu Felipe quando o senhor era criança, o senhor se lembra do comércio de Campinas, ou quando era criança ou quando era jovem,o que o senhor lembra?
R – Em termos de movimento era bem melhor do que é hoje, porque hoje a cidade cresceu, pulverizou muito e o comércio hoje é difícil, não é para qualquer um, hoje a pessoa, para ter um comércio, se não tiver um planejamento bom, não sobrevive dois anos!
P/1 – Mas tinha grandes lojas?
R – Não, era mais o comércio pequeno, mas tinha um movimento bom, você podia vender fiado para as pessoas, marcava no caderno, a pessoa vinha, pagava, era outra mentalidade, hoje você vê, um cheque não vale mais nada, muita coisa hoje, muitos valores hoje, é uma coisa muito insegura.
P/1 – O seu pai sempre teve a loja no mercado ou ele tinha, quando veio para Campinas, porque aí ele estava em são Paulo, porque aí ele veio para Campinas e já colocou a loja no mercado. Sempre com esse nome seu Felipe?
R – Não, antes era Banca da Semente,a í depois quando meu pai me chamou e falou: “Ó, você vai agora tocar!”, eu mudei, eu pus ____ Comercial Felipe que está até hoje.
P/1 – Que é o sobrenome da família?
R – É.
P/1 – Mas aí depois que o senhor teve essa passagem pela entrega de jornal o senhor continuou pelo comércio?
R – Continuei, aí veja bem. O meu pai ficava na loja e eu achava que eu tinha que crescer, construir, comprei um terreno e construí um barracão na _____ de Camargo e montei um atacado.
P/1 – Isso já na sua juventude?
R – É, aí eu já tinha casado, bom aí eu construí o atacado e comecei trabalhar no atacado.
P/1 – Esse atacado vendia o quê?
R – O forte meu era aqueles vaso de xaxim! Então eu ia em Santa Catarina, foi uma brincadeira, eu viajava muito para o sul com o caminhão, porque uma época também eu fiquei uns cinco anos de caminhoneiro, eu adorava viajar...
P/1 – Então, que queria que o senhor contasse também essa história, como é que o senhor resolveu ser caminhoneiro?
R – Eu sempre fui de viajar. Até hoje, eu estou na loja hoje, eu fico 12 horas na loja, mas para mim é um martírio, eu sou o cara cigano, eu gosto de viajar, eu estando na estrada eu posso ficar sem dormir, comer mal, para mim está bom, e outra, no Brasil eu só não conheço Manaus, o resto eu conheço tudo. E eu estou aqui, to em Brasília, to em Belém, para mim eu estou em casa, eu nunca me alterei, porque tem muita gente que quando sai de casa de altera, quando está longe de casa sente angústia, sente isso, eu nunca senti, graças a Deus, eu adoro viajar.
P/1 – Aí o senhor decidiu, o que o senhor fez, comprou um caminhão...
R – Eu comprei um caminhão parcelado, financiado, eu falei: “Bom, agora eu vou ser caminhoneiro!”, mas é duro, hein?
P/1 – Ah conta seu Felipe, que época foi isso, primeiro para a gente entender os anos 70.
R – Eh, eu nasci em 43 eu tinha 19 anos.
P/1 – Então é, quase anos 70. Final de 60, já anos 70. Então conta, como é essa vida de caminhoneiro seu Felipe?
R – Eh, naquele tempo as estradas eram horríveis, os caminhões péssimos, então você saia na estrada e era uma aventura, o caminhão quebrava, você ficava sem comer, dormia na estrada e tal, então era difícil. Então eu viajava mais para o Sul.
P/1 – E o que o senhor transportava?
R – Fruta. Mercado a mercado, era ____ de fruta que eles falam, você tem horário para fazer, você não pode dormir, eu tomava rebite que eles falam para ficar acordado.
P/1 – O que é rebite, é um?
R – É um remédio dex_______, dex_____, um monte de remédio para você ficar acordado, só que é terrível, você fica acordado, só que eu viajava tanto, e chega uma hora, você para o caminhão na estrada, desliga ele, puxa o freio, tal, você olha para frente o caminhão está andando, você olha de lado está parado, é terrível!
P/1 – Dá essa sensação de...
R – É, você sai fora de órbita! E tinha vez que eu fazia rápido, eu ia até a divisa do Uruguai e voltava, quando eu chegava em casa eu ficava de dois a três dias dormindo, só levantava para ir no mictório, sem comer, dormindo, de tanta canseira e stress que a gente tinha.
P/1 – Eh, porque fruta também não podia demorar, né?
R – Não podia parar!
P/1 – que tipo de fruta? Todo tipo de fruta?
R – Tomate, pimentão, berinjela, legume, fruta, tudo,então _________ o que tinha, né, ganhava dinheiro, mas não era fácil não.
P/1 – E tinha uma coisa mesmo, a gente sempre ouve dizer, entre os caminhoneiros há aquela questão da amizade mais forte, uma questão mais de não mandar, um ajuda o outro, isso existe mesmo seu Felipe?
R – Ajuda, caminhoneiro, eles não deixam o outro na mão não. Eu, na minha época não tinha, eu cheguei a ficar com um caminhão pendurado para tombar, os caras vinham, engatavam cabo de aço, tiravam, um ajudava o outro, sempre foi assim
P/1 – Tinha códigos entre os caminhoneiros?
R – Tem, na estrada tem!
P/1 – Conta para a gente seu Felipe, como são esses códigos?
R – Assim, tem radar, assim a estrada está com problema, tem carro tombado, tem coisa, o que eu lembro são esses dois.
P/1 – A buzina como era? Tem um toque, dois toques? Não é isso?
R – Não, quando você ultrapassa alguém que te dá ____ você dá um toque na buzina para agradecer, tem o sinal do farol, tem a seta de um lado e do outro, mas eu não lembro muito mais não porque...
P/1 – Isso existe inclusive até hoje!
R – Tem, até hoje. É que nem hoje, você vê na estrada o cara dá farol para você, pode ver que tem radar, então...
P/1 – Tem que ter os códigos, né? Mas aí o senhor estava dizendo, o senhor ia muito lá para o Sul, Santa Catarina...
R – Então, aí um dia o meu pai falou assim: “Oh Felipão, trás para mim vaso de xaxim!”, e na Serra do Espigão lá na região de Santa Cecília tinha uma fábrica na beira da estrada, aí eu parei lá, vi, e estava ____________, o que dava para trazer, fui trazendo, uma vez, duas vezes. Um dia o ____ lá, quem fiava lá era a esposa dele, aí ela falou: “Olha, o meu marido quer falar com você. Vamos conversar!”, aí eu parei lá, tal e ele falou: “Oh, você não quer levar uma carga lá para Campinas e você vende lá no atacado?”, aí eu tinha que ter um lugar para colocar, aí eu aluguei um deposito, aí no Jardim do Trevo e comecei a trazer carga, e deu certo, aí uma carga, duas cargas, aí vinha três cargas por semana, aí eu arrumei um vendedor e comecei a vender pelo Brasil inteiro! Aí ele me chamou para ser sócio dele lá, fizemos uma fábrica lá e foi a maior fábrica de vaso de xaxim do Brasil! Nós tínhamos 20 ____, ____ é o vaso, tronco, o xaxim tem uma curiosidade, hoje ele está, no estado de São Paulo é proibido fazer xaxim, é crime ambiental, não pode vender, o Alckmin sancionou a lei, mas veja bem, o xaxim é tirado de Santa Catarina na região serrana. No mundo só existe xaxim numa faixa do Brasil, que é Paraná, Santa Catarina e no México, em outro lugar não existe xaxim, ela é derivada de uma planta que chama Samambaiaçu, então um tronco de xaxim, num diâmetro mais ou menos de 60 centímetros demora de 100 a 120 anos para formar. Só que veja bem, o xaxim, na regiam lá, é um lixo, um mato que não tem valor nenhum, por quê? Porque as firmas de reflorestamento entram com os tratores de esteira, trator pesado, aquilo vai acabando com todo o xaxim para replantar o ____ para fazer o, madeira, a maioria da madeira que a gente consome é o ____, reflorestamento, então o xaxim , como ele demora muito para formar, é uma planta excelente para plantar samambaia, uma vença, uma orquídea, tudo, então o que acontecia, a gente entrava antes do reflorestamento e tirava todo o xaxim que conseguia, aí industrializava ele e trazia os vasos para cá.
P/1 – Por que ele é uma espécie de um tronco?
R – Ele é um tronco, aí é cortado os rolos, aí coloca num torno, adaptado, num torno de madeira, só que ele é adaptado para segurar com a faca feita de mola de caminhão, ele vira e você vai moldando ele, é fácil de fazer, você faz um atrás do outro, rapidinho faz.
P/1 – Em vários formatos se dá para fazer?
R – Cada tronco dá um diâmetro, né? Então a gente começou a industrializar e tal e deu certo. Eu cheguei a ter oito caminhões entregando isso aí, mas caminhão grande, aqueles baús grandes. Aí o que aconteceu? Foi diminuindo o xaxim porque a _______ vinha para a gente e falava assim: “Essa área aqui...”, eu cheguei a ter trator de esteira!”Essa área aqui vocês entram, abre a estrada...”, ele dava o mapa, “...e vocês tiram o que pode tirar até tal mês! Depois vai entrar a nossa turma e vocês não podem mais entrar!”, aí a gente ia com o trator de esteira, abria a estrada, nos tínhamos caminhão traçado, traçado é caminhão que, por exemplo, três eixos, três eixos que têm tração, porque a maioria dos caminhões a frente não é tração, só vira, né, então a gente entrava e ia tirando, tirava dia e noite, tinha uma equipe que ficava acampada no mato, lá é terrível, chega a dar seis graus a baixo de zero, e a gente tinha equipe que dormia no mato, ficava mês e mês lá, só trabalhando com isso, então ele puxava na estrada com o trator, a gente ia no caminhão, puxando dia e noite e a gente industrializando. Bom, aí...
P/1 – Começou a diminuir...
R – Eu ganhei dinheiro, deu para equilibrar a vida, tal, aí foi ficando ruim. Quando foi em 94, o meu sócio comprou uma fazenda em Sorriso, no Mato Grosso, na Cuiabá Santarém, aí o negócio já começou a ficar meio ruim, porque ele tocava lá, eu tocava aqui, tava em harmonia, aí lá ele quis ir para o Mato Grosso aí o negócio balançou. E outra, quando você vai terminar um negócio, você tem que abortar na hora, não adianta ficar protelando, cheguei a falar :“Vamos fechar, acabar com isso aqui e pronto!”. Acabamos, ele é meu amigo até hoje, vou lá no Mato Grosso na casa dele, acabamos o negócio e eu parei com o xaxim, aí eu só fiquei com a loja, mas também foi por causa da idade também, você vai ficando cansado, que nem hoje, eu estou com 64 anos, trabalho 12 horas por dia, olha, eu vou te falar, no sábado é cruel, você trabalha de arrasto!Eu não tenho vergonha de falar, com a saúde que eu tenho, você chega tão cansado que você não vê a hora de descansar, né, mas graças a Deus deu para cuidar dos filhos, deu para tocar a vida...
P/1 – E quando é que o senhor assume a loja do teu pai?Porque aí o senhor continuou com uma loja que não tinha a ver com a loja do teu pai, não é isso?
R – O meu pai já tinha, aí quando ele ficou doente, que ele pegou câncer no pulmão por causa do cigarro e tudo, eu já estava mais perto dele, mas tinha o atacado lá, mas ele veio a falecer, aí ...
P/1 – O senhor ficou com a loja...
R – Fiquei com a loja, fiz inventário, as minhas irmãs ficaram com as outras, fizemos as partilhas, tudo direitinho e pronto.
P/1 – Então porque ele primeiro trabalhava com o comércio também de verduras e frutas daí depois ele chegou a vender sementes, é isso?
R – Sementes, adubo, inseticida, que eu vendo hoje.
P/1 – Continua então?
R – É, porque a verdura nós paramos.Foi mudando aos poucos.
P/1- Por que foi mudando?
R – O problema da verdura é que é uma venda, apesar que essa venda minha hoje é técnica, você vai, vamos supor, você quer fazer um canteirinho de rúcula na sua casa, você vai comprar quanto de rúcula? Um punhadinho, você não vai comprar um kilo! Certo? Então é uma venda técnica. Não adianta eu chegar para você e falar: “Não, leva 100 grama, um kilo!”, você não vai levar, você não vai precisar, você vai levar um pouquinho porque um pouquinho dá um canteiro. Uma colherzinha de semente de alface, você colhe 500 pés de alface, rende muito! E tem o adubo que você tem que usar certo, e mais assim, doméstico, tem chácara, sítio, então usa pouco, não é a lavoura grande, então eu fui mudando, e outra, verdura se você não vender hoje, amanhã filha, pode jogar fora, amanhã estraga, você pega um pé de alface, colhe ele, se você não botar num lugar adequado daí duas horas não serve para mais nada!
P/1 – Mas essa época do comércio de semente sempre foi para, esse comércio menor para chácaras e para casas?
R – É, nunca foi...
P/1 – teve um período de expansão dessas chácaras aqui em volta de Campinas, seu Felipe, que o senhor lembre?
R – Não, teve, hoje, veja bem, o problema hoje, acho que é do Brasil inteiro, vamos supor, ávida hoje mudou muito, mudou para você, mudou para mim, mudou para todo mundo, a gente ganha, ganha, agora eu te pergunto, sobra alguma coisa para você?
P/1 – É verdade!
R – Está todo mundo no mesmo barco! Hoje no Brasil, é lógico, chegou a tecnologia, melhorou muita coisa, só que aquela época você trabalhava e via o resultado, você trabalhava um ano você falava assim: “Bom, no fim do ano o que eu comprei? Um casa, um terreno, ta!”, hoje você trabalha dez anos e você não compra um terreno, por que? Porque hoje tudo é caro, conta de água é caro, conta de luz, telefone, você vai no supermercado, hoje no supermercado você não compra nada e a conta é lá em cima, quer dizer, ficou difícil, hoje para se viver é muito caro, você ganha, ganha, tudo bem, só que não sobra nada!
P/1 – então, é como o senhor estava dizendo, o comercio antigamente era um aramo de atividade mais fácil.
R – Mais fácil, mais rentável, hoje os impostos são terríveis, a carga tributária é muito alta. Hoje vamos analisar assim, vamos analisar no geral, no comércio, você ganha 500 reais, vai te sobrar 10, 15 reais, porque o resto come tudo em despesa, é cruel, é muito difícil!
P/1 – É difícil, mas o senhor também estava dizendo da forma de pagamento, ou seja, o senhor chegou a vender também por caderneta, como que era isso?
R – Cheguei, no caderno, na caderneta, e o pessoal pagava, honrava. Hoje é um perigo, o que eu pego de nota falsa! As que mais aparecem de 100, de 50, e de 10 reais as de 20 não, olha é todo o dia, você tem que ter a maquininha lá, você pegou essa nota, põe na maquininha, é certeza que é falsa! Aí quando você chega para o cliente e fala: “Vem cá, onde você pegou essa nota?”, o cliente assusta, às vezes ele sabe, e às vezes ele não sabe, por que você conhece uma nota falsa? Você não conhece, você vai num banco aí, saca, vem uma no meio, você está certa, aí chega uma pessoa para você e fala: “Não essa nota é falsa, onde você arrumou?”. Um dia um cliente chegou na loja, comprou a mercadoria e me deu uma nota de 100, eu pus na máquina e falsa, quando eu perguntei para ele: “Onde você arrumou essa nota aqui?”, ele catou a nota da minha mão e saiu correndo da loja! Agora o que eu vou pensar? Eu não sei se foi ele que sabia da nota falsa ou se ele ficou com medo de ser preso, alguma coisa.
P/1 – E nessa época que o senhor estava falando, tinha a questão da caderneta, como era verdura, essas coisas, como era, as famílias, era consumo, você acha que as pessoas consumiam mais do que hoje esses tipos de produto? Elas chegavam lá para o senhor e anotavam, o que pediam, um pé de alface, um quilo de...
R – Eh, faziam as compras do que estavam precisando, né!
P/1 – E faziam por semana?
R – Eh, mas a gente não, os ______ é difícil da gente lembrar, né? Mas comprava, era aquele negócio, a pessoa não ia comprar mais do que precisa, né, isso é até hoje assim.
P/1 – Mas era mais ou menos uma compra por semana? Aí anotava e pagava no fim do mês?
R – Eh, no fim do mês.
P/1 – Donas de casa? Também não tinham muitos supermercados, né?
R – Não, o comércio era diferente. Depois que entrou supermercado mudou, foi uma revolução no comércio e hoje o supermercado é um segmento mais amplo, mais completo e é também, lógico, se você tem cash para montar um comércio forte, você vai montar, que se dane o concorrente, isso é a lei da oferta e da procura, lei do comércio, então muitas firmas que existiam antes do supermercado não tem o porquê existir, porque hoje você vai para o supermercado e ele faz concorrência com muita coisa.
P/1 – Porque ele tem tudo.
R – Muito segmento, né? Hoje você vê, você vai no supermercado você compra uma televisão, uma geladeira, a linha branca, que eles falam, você tem um leque muito grande...
P/1 – Compra tomate também, você pode comprar uma televisão e pode comprar um quilo de tomate ao mesmo tempo.
R – É. Hoje uma coisa boa para o comerciante é o cartão de crédito, o cartão, o dinheiro de plástico. É muito bom, eu tenho, funciona, tudo, só que a gente percebe que a pessoa que está com o cartão no bolso não pensa muito para gastar não,viu, porque eu acho o seguinte, a mentalidade é essa: “Ah, meu cartão vai cair dia primeiro, hoje é dia oito, se eu gastar trinta e gastar cinqüenta, é a mesma coisa!”, não é, porque dia primeiro ele vai ter que pagar lá, então aí é problema lá da financeira, não é mais com a gente.
P/1 – quer dizer então que o senhor passou por esse período, da caderneta para o cartão de crédito?
R – E o supermercado quando entrou, já mudou tudo, já começou a mudar! E agora o supermercado tem um, porém para qualquer um de nós. Eu vou parta o supermercado, ele vai, você vai e tal. O supermercado não faz nada bonitinho para ninguém, não. Eu fiz um curso de administração de empresa intensivo, mais nessa linha de venda, né, o supermercado trabalha com um leque grande e eles põe lá 20 produtos chamarisco, o que é, arroz, feijão, pá, pá, vamos supor, ele compra um saco de arroz por um real, ele vende por noventa centavos, para que, para chamar você para você ir lá ver que ele está vendendo arroz barato, só que você vai comprar lata de outra coisa e você vai pagar mais caro do que qualquer outro lugar, então ai é problema do comprador, ele que vai ter que garimpar para ver se é barato ou não! O supermercado tem essa armadilha e a maioria das pessoas não vêem isso, eles chegam, vão catando, vão pondo no carrinho, chega lá, paga, passa o cartão, sei lá, pronto, quer dizer, aí quando sai, quer dizer, você comprou aqui um item, você pagou no supermercado três e vinte, você sai na cidade está dois e noventa, você fala: “Pô, paguei mais!”, aí, milagre ninguém faz!
P/1 – Então de forma de pagamento o senhor acha que o cartão de crédito, o dinheiro de plástico veio resolver?
R – Eh, é o dinheiro do futuro! Por causa da garantia para a gente, porque o cheque hoje não tem mais garantia, o cheque hoje não quer dizer nada. Tem cheque que você consulta agora, você deposita o cheque amanhã e não tem problema.
P/1 – Mas os comerciantes não reclamam que tem taxa de administração, essa coisa toda? Mesmo assim compensa, seu Felipe?
R – Hoje a taxa de administração do cartão, por comerciante, gira em torno de, dependendo do giro, de dois a três e meio por cento! Eu acho errado, eu acho que não devia cobrar nada também, ou cobrar uma alguma coisa, né?
P/1 – Porque ele também não põe para o senhor na mesma hora,não é isso seu Felipe, leva um tempo, não é?
R – Existe o débito e o crédito. O débito que é 30 dias, se você comprar de mim 100 reais nessa linha, eu vou receber 30 dias depois.
P/1 – Mas na minha conta sai na mesma hora?
R – Não sei, acho que não!
P/1 –Tá!
R – Não, veja bem, funciona assim. O seu cartão é dia cinco o débito, o que você contar ao longo do mês vai cair dia cinco!
P/1 – Esse o crédito!
R – É.
P/1 – O débito é à vista, na hora. O senhor recebe à vista?
R – No outro dia, é que nem compensar um cheque. Eu passei hoje, fiz um fechamento, amanhã já está na minha conta, não tem encrenca nenhuma, não tem esse negócio de esquecer de depositar, isso ou aquilo.
P/1 – Quer dizer que pelo lado da garantia é mais interessante?
R – Só da garantia, mas tem um custo, né? Três e meio por cento eu pago! Passou lá, três e meio é da financeira.
P/1 – Na época que o senhor era jovem, o senhor estava contando, na época que o senhor casou, o senhor casou cedo seu Felipe?
R – Casei com 18 anos.
P/1 – 18 anos! Nossa senhora! Mas como era o comércio da cidade? O senhor gostava de fazer compras, a sua esposa? Eu sei que o senhor gosta de fazer viagens, ficar andando por ai, mas como que a sua esposa fazia compra? Como que ela chama, por falar nisso?
R – Maria Cacilda.
P/1 – Então, onde a dona Maria Cacilda fazia compras, o senhor lembra? Porque o senhor ia embora viajar e ela ia comprar as coisas da casa aonde?
R – É, naquela época era empório, armazém,né?
P/1 – Tinha muito aqui em Campinas, seu Felipe?
R – Tinha, tinha.
P/1 – Fazia compra por caderneta também?
R – É, a gente comprava mais essas coisas nos bairros, né, e outra, Campinas era pequena, não tinha muita, quem morava no Camburi morava longe do centro, hoje o Camburi é centro. Eu fui criado aqui perto do __________ no Guanabara, quando eu mudei lá, da linha férrea, que agora esta desativada, ________ dali para cima, tudo terra, ______ lá para cima, tudo terra, buraco na rua ______.
P/1 – Castelo na rua! Tinha castelo na rua?
R – Tinha, tinha um castelo bem antigo. Então a gente, quando asfaltou foi aquela alegria:”Nossa! Agora nós estamos morando na cidade!”.
P/1 – Mas o senhor estava falando, era mais comércio no bairro, o que o senhor diz, no bairro que as pessoas moravam?
R – É, ali onde eu morava em _______, da ______ para cá que era o comércio, dali para cima não tinha quase nada.
P/1 – Quer dizer que cada bairro tinha um tipo de comércio?
R – É.
P/1 – Ah, ficava mais próximo das pessoas?
R – Ali era mais no centro da cidade. A padaria... Eu tive uma padaria, um ano e oito meses, foi o pior negocio da minha vida!
P/1 – Porque seu Felipe?
(TROCA A FAIXA)
P/1 – O senhor estava falando então que o senhor teve uma padaria? Um ano e oito meses?
R – Uma padaria! Um ano e oito meses!
P/1 – E porque foi o pior negócio?
R – Porque a despesa da padaria era mais do que o lucro, porque naquela época o pão era tabelado e muito fiado!
P/1 – vendia fiado na padaria?
R – Caderneta, tinha 250 cadernetas, eu herdei ela com 250 cadernetas de fiado e o brasileiro quando tinha caderneta ele gerava no fim de semana, ele ia lá e falava assim: “Me dá meio quilo de presunto, meio quilo de queijo.”, tudo na caderneta, “Cinco quilos de leite.”, e o pão todo o dia e tal. Aí chegava na hora de receber filha, rã, eu recolhia as cadernetas dia 31, tinha que pagar até dia 10, metade pagava metade não pagava, aí você ia cobrar: “Ah, não tenho dinheiro!”, “Calma, pêra aí, você comeu, você gastou, você tem que ter consciência do dinheiro...”, quer dizer, não tinha cartão de crédito, né, aí que entra o, hoje acabou, aí não deu certo, vendi, perdi.
P/1 – Que mais negócios o senhor teve?
R – Tive fazenda em Goiás.
P/1 – Era de gado?
R – 14 anos. Eu tinha uma fazenda em Goiás de cria e recria. Cria e recria o que é, você tem as vacas, cada 30 vacas um touro, e o bezerro que nasce, você vende os machos e fica com as fêmeas para, e as vacas para cada oito crias você vende ela para o descarte, para o açougueiro e tal. Também, 14 anos, não gostei, péssimo negócio, as contas não batem!
P/1 – Mas durou bastante!
R – Durou 14 anos. De sofrimento, passando raiva! E na hora de vender o gado, na hora que você vai vender o gado não cobre a despesa, nasce bezerro, você fala: “Oh, é lucro!”, é lucro nada, quando ele nasceu ele já comeu o lucro, é cruel, eu sei lá, eu sempre fui uma pessoa organizada, nunca tive protesto, meu nome é limpo na praça, minha firma é boa, tudo, e eu vejo que na fazenda eu vi que o negócio não era bom porque as contas não batem, e eu acho que fazenda hoje no Brasil é um negócio que não sei para quem que é bom!
P/1 – Tem um comércio mais restrito, né,seu Felipe? São sempre as mesmas pessoas que compram de uma fazenda, não?
R – É , a fazenda não, a minha que era de cria e recria, o que eu tinha, o lucro meu era vender bezerro macho e vaca descartada.Depois da vaca der oito crias você pode vender ela.
P/1 – Aí o senhor vendia para frigorífico? E o bezerro?
R – O bezerro você vende para quem vai, o macho para engordar, a fêmea para reproduzir também, mas as fêmeas a maioria ficava com ela para o plantel. O touro, a cada dois anos você tem que trocar, ou seja, você tem um touro aqui, ele está cobrindo a vaca, se você não trocar daqui há dois anos ele começa a cobrir as filhas dele, aí míngua o gado. Na região, porque veja bem, sempre o gado seu é melhor do que dos outros, então eu via lá e falava: “Oh fulano, eu tenho cinco touros lá para vender, quantos você quer?”, “Tanto!”, o dele era mais caro, o meu era mais caro, aí eu pensei bem e falei: “Não, se você precisa trocar touro e eu preciso trocar, porque nós não trocamos touro, não mexe dinheiro?”, aí eu ia lá e falava: “Eu tenho cinco touros para trocar, você tem cinco aí para trocar comigo?”, “Ah, tenho!”, “Vamos trocar”, “Ah, não, o meu é mais bonito que o seu...”, não espera aí, o touro também tem a idade fértil dele, é tantos anos, o touro, você olha nele, você sabe a idade mais ou menos dele, então vamos fazer o seguinte, você pega o padrão dos cinco touros seus, eu pego o padrão do meu e analisa, deu certo, vamos trocar, não fala em dinheiro, os caras achavam que era absurdo falar isso, aí eu pus na cabeça e foi a primeira vez, trocou, aí um foi falando para o outro, trocando, aí trocaram o touro, pronto!
P/1 – Que é a base do comércio, né, seu Felipe?
R – É lógico!
P/1 – O comércio começou com a troca!
R – É, então, aí resolvia o problema porque você ficar com o touro lá só para dizer que ele é bonito, mas ele está te dando prejuízo não adianta, né? Bom, eu sei que fiquei 14 anos, ganhei na compra para a venda, com as benfeitorias que eu fiz, eu fiz lá 98 quilômetros de cerca, fiz casa, curral bom e arrumei, melhorei a fazenda então paguei X, vendi por Y deu lucro na compra e na venda, só que o resultado econômico financeiro péssimo, horrível, e para você ter uma idéia, na região minha, quando eu comprei, chegava lá um vizinho meu, você é um vizinho meu: “Quantas cabeças de gado você tem?”, você fala; “Tenho cinco mil!”, depois de 14 anos: “Quantas cabeças de gado você tem?”, “Tenho 200!”, “Mas cadê o resto?”, “Cadê o carro novo que você tinha?”, está velho, quebrado, tudo danado, você não sabe falar nem para onde foi o dinheiro, quer dizer, é bom o negócio?
P/1 – Também teve muita crise econômica, né seu Felipe? Teve uma época, o senhor pegou essa época desses planos, desses tabelamentos, isso interfere no comércio!
R – Não, o que eu acho é o seguinte, o pessoal fala muito de inflação, a inflação para o comerciante é uma inflação não muito alta, mas uma inflação média é boa para o comerciante. Agora a inflação alta é terrível, é ruim para todo mundo só que agora que dizem que não tem inflação, só que não tem conversa, porque eu pergunto para você, você acha que as coisas não sobem? Quando a inflação dá dois por cento que eles falam que dá, a mercadoria subiu 20, então tem inflação, é inflação camuflada. Outra coisa no Brasil que é errada é o bitributo, nós temos tantos bitributos que você não acredita, porque você tem o seu carro e você é obrigada a pagar o IPVA do carro se você paga pedágio? O pedágio é caro, é terrível, eu vou te citar porque é caro, você pega um caminhão na Anhanguera ou na Bandeirantes em São Paulo e vai até a divisa de Minas que é Uberaba, um caminhão que arrasta 25 toneladas, ele gasta, de pedágio, vamos fazer uma suposição, 200 reais de pedágio, de combustível 150, então eu pergunto para você, está errada a conta ou não está? Por quê? Você pega o seu carro daqui de São Paulo, você gasta dez e sessenta de pedágio e oito de gasolina, tem coisa errada ou não tem? Como o pedágio é mais caro que o combustível que você está gastando? E outra, você já pagou o pedágio, o pedágio é um bitributo!
P/1 – Isso acaba interferindo no comércio, no preço dos produtos!
R – Mas lógico.
P/1 – Da onde vêm os produtos que o senhor vende?
R – Ah, eu vendo semente, adubo e inseticida.
P/1 – Então, eles vêm da onde, eles vêm da região mesmo, ou eles vem...
R – Não, a semente, 95 por cento, não, 90 por cento é dos Estados Unidos, região da Califórnia e os outros 10 por cento é da Europa, pulverizada assim, Itália, França, Dinamarca.
P/1 – E é o senhor que faz a importação?
R – Não eu compro de um importador.
P/1 – Porque que a semente vem de lá, é melhor que a nossa?
R – Porque antigamente o Brasil produzia sementes só que ficava mais caro que comprar lá fora, você sabe por quê? Porque tudo no Brasil custa mais caro, é super faturado.
P/1 – Então o senhor compra de um importador, vende essas sementes e aí é como o senhor falou é semente de tudo, de verdura e de flores também, não?
R – Flor também. Flor o forte é a Europa;
P/1 – Vende bem?
R – Razoável, a flor é uma planta bonita, mas para você cuidar dela não é fácil, só quem gosta mesmo e tem tempo.
P/1 – E o adubo o senhor compra aqui.
R – O adubo é, compro aqui, é misturado, é o ( NP__?) também é a matéria-prima, é tudo importada.
P/1 – E esse seu importador das sementes ele é aqui da região de Campinas?
R – O maior importador que tem é São Paulo e Rio de Janeiro.
P/1 – Aí o senhor compra em São Paulo. Como é que o senhor recebe, vem de caminhão?
R – Eles importam em _____ grande e depois eles embalam latinha de 100 gramas...
P/1 – Ah, já vem prontinho?
R – Eh, vem com rótulo, tudo direitinho. A gente compra... E outra, a venda de semente é hoje igual a venda de farmácia, toda a semana tem que estar repondo, não adianta estar comprando um monte, como eu te falei, é uma venda técnica, não adianta eu comprar dez quilos, e tem vencimento também, venceu eu tenho que jogar fora.
P/1 – A semente tem um prazo de validade? Mais ou menos quanto tempo?
R – Tem, tem um prazo de validade. A legislação anterior era três anos, hoje dois anos.
P/1 – Aí já vem tudo bonitinho na embalagem, mas aí para o senhor vem como? A empresa entrega? Como o senhor faz o pedido? Vem um vendedor na sua loja ou o senhor faz
R – A gente faz o pedido e a transportadora trás. Fax... Depende da pressa, se for esperar o vendedor às vezes você fica uns seis meses sem comprar!
P/1 – Tem na internet, seu Felipe? O senhor usa a internet no seu comércio para fazer um pedido?
R – Não uso, sou do tempo antigo, nem computador tenho na loja.
P/1 – Já tentou?
R – Em casa tenho.
P/1 – Porque também facilita,também deu uma facilitada. Seu Felipe, na sua família seu pai ou sua mãe queriam que o senhor fosse outra coisa que não comerciante ou eles sempre respeitaram as suas decisões?
R – Não, nunca me falaram nada, porque com oito anos eu falei: “Mãe, eu vou ter meu dinheiro”, aí sai para o mundo e...
P/1 – Eles nunca quiseram?
R – Nunca quiseram, nunca interferiram em nada.O sonho meu quando eu fiquei lá pelos 20 anos meus, era ser piloto de avião, só que eu fui atrás e era um curso muito caro, era semelhante a um curso de medicina hoje, ou talvez mais caro ainda, mas aí eu vi que não tinha cash para isso e descartei, não adianta, mas sou feliz hoje, ser comerciante. Tenho uma família boa, maravilhosa, tudo, agradeço a Deus, não tem ninguém doente, ninguém em cadeira de rodas, ninguém com problema de nada! Meus netos, meus filhos, graças a Deus!
P/1 – Graças a Deus! E na juventude seu Felipe? O senhor ia a baile?
R – Adorava baile.
P/1 – E mesmo, como eram os bailes?
R – Veja bem, eu tive as fases minhas. Eu ia em baile, a minha mãe gostava, eu ia junto com ela, minhas irmãs gostavam, eu ia junto, meu pai ia, ai depois eu comecei a jogar futebol, eu não fui profissional porque não quis, joguei em muito time de futebol, gostava de jogar bola tal, tive as fases boa tudo.
P/1 – Mas me conta dos bailes. Onde eram os bailes aqui em campinas?
R – Aqui em Campinas tinha o Camões , eu ia muito em Valinhos, no Rigeza.
P/1 – E era aqueles bailes bacanas daquela época, todos os rapazes bem arrumados?
R – Ah, era diferente de hoje, hein!
P/1 – Como que era?
R – Era diferente, tinha, você chegava no baile, tal, era mais que dançava valsa, bolero, alguma vez tocava algum tango, então a gente, e tinha aquele respeito, ia mais para bater papo, dançar, tal, terminava o baile todo mundo se cumprimentava e ia embora.
P/1 – O senhor gosta de dançar senhor Felipe?
R - Agora não, mas eu sei.
P/1 – Até tango dançava?
R – Dançar é que nem andar de bicicleta, você nunca mais esquece!
P/1 – E como é que ia arrumado no baile, ia todo de ...
R – A caráter.
P/1 – E onde comprava a roupa?
R – Tinha a Ezequiel, tinha a Renner, Ezequiel tem até hoje na Campos Sales!
P/1 – Ia lá, escolhia uma roupa bonita.
R – A beca, gostoso, muito bom.
P/1 – O senhor gosta de fazer compras senhor Felipe? Ou o senhor nem liga para...Compra pessoal!
R – Ah, difícil, quem compra é a minha filha, a minha esposa. Eu falo: “Compra uma calça lá para mim?”, ela compra, “Compra duas camisas!”, quer dizer, ela que...
P/1 – E um presente assim, o senhor não gosta de comprar um presente para alguém ou deixa isso também por conta da esposa?
R – Eh, mais para ela! Hoje mesmo eu tenho uma afilhada em santos que a minha esposa vai para lá cedo, eu tenho uma afilhada que faz aniversário lá e hoje ela vai no shopping comprar, tal para levar para Santos sábado.
P/1 – E seu Felipe, a sua família viajava aqui pela região à exceção do comercio que seus pais tinham, mas iam visitar outras cidades aqui da região. O senhor falou que iam no baile em Valinhos...?
R – Ah, a minha família viajava bastante de sair.
P/1 – De sair? E como que andava? De carro, de ônibus?
R – Era muito combi, né? Usava combi direto, uma pelo custo beneficio, era espaçosa, levava 10, 12, era bom.
P/1 – O senhor tem funcionários hoje na loja ou toca tudo sozinho?
R – Tenho um só! Ah, eu estou naquela fase, 64 anos esperando São Pedro dar a marretada!
P/1 – Imagina seu Felipe, tão jovem! Como o senhor conheceu a sua esposa? Como foi o casamento? Foi num baile, não?
R - Na verdade eu sou casado pela segunda vez. Eu conheci a primeira esposa, não lembro aonde foi, não foi no baile não...
P/1 – Na praça, de repente? Bom, então e aí?
R – Eu sei que eu casei a primeira vez muito novo!
P/1 – Foi bonito o casamento?
R – Foi na Igreja Santo Antônio, aí eu tive a primeira a Renata, depois de quatro anos veio a Fernanda, essa que mora em Curitiba. Aí não deu certo o casamento, achei melhor separar, separei, ______ uma casa para elas, fiz tudo que tinha que fazer e fiquei quieto. Depois eu conheci a minha segunda esposa no mercado mesmo, ela trabalhava numa loja perto da do meu pai que eu nem parava muito lá, foi a época que eu viajava, aí um dia conversando meu pai falou: “Estou precisando arrumar uma funcionária!”, aí pegamos ela para trabalhar, eu ia viajar, eu tava sozinho, eu falei: “Bom, separa umas contas para mim!” e deixava dinheiro para ela pagar e ia viajar, depois começamos...
P/1 – Quer dizer que ela também é do comércio?
R – Aí eu tive três filhos com ela?
P/1 – Com a dona Maria Cacilda?
R – Duas meninas, a Carla, a Paulo e o Edinho agora, o caçula é homem, tem cinco filhos, quatro mulher e um homem.
P/1 – Ela então é do comércio também?
R – É , a gente se dá bem, tudo, a minha primeira esposa é viva mas nunca, assim as minhas filhas da minha primeira esposa, nós não temos nada de problema nenhum, a gente vive bem, vive tudo em harmonia, não tem problema nenhum.
P/1 – O senhor faz propaganda da loja senhor Felipe ou nem precisa?
R – Uma épica eu fazia, mas eu o segmento meu eu acho que não precisa, e outra, no mercado aí eu não quero aumentar, não quero crescer, quero ficar do jeito que está, até eu ir embora e eu acho que é besteira propaganda. Uma que é caro e fica inviável, é muito caro.
P/1 – E essa loja do seu pai está no mercado desde quando, que hoje é sua, mas está no mercado desde quando, o senhor se lembra seu Felipe?
R – Lembro, quer ver...
P/1 – Porque ela é bem antiga, né?
R – Faz desde, porque era do meu avô, né?
P/1 – Sim, é verdade, era do seu avô.
R – Depois ficou para o meu pai, depois para mim.
P/1 – Porque o mercado é de 1908.
R – É, eu acho que está lá desde 1925, por aí.
P/1 – No mesmo lugarzinho?
R – No mesmo lugar.
P/1 – Como que é uma loja no mercado, porque a sua dá para a rua, né? Uma loja de rua é melhor, não é, do que a interna no mercado ou não faz diferença?
R – Não, eu acho que ali no mercado, não é só lá, em qualquer lugar, o comércio é o bom atendimento, amizade, você vai comprar lá de mim e eu tenho que transmitir para você uma amizade, uma coisa boa, eu tenho que conversar com você, dialogar, saber o que você quer, se você está com problema na tua casa, com pulgão na tua planta ou isso ou aquilo, eu tenho que passar para você uma confiança e um bom atendimento, isso que ganha hoje.
P/1 – esse é o segredo do comércio? A confiança e o bom atendimento?
R – Esse é o segredo. Porque você vai voltar e outra, hoje tem um problema grave e geral no comércio, têm produtos de vários preços e várias qualidades, você tem que saber vender aquilo que o cliente está precisando, mas veja bem, o cliente tem que ter uma consciência também que, às vezes, preço baixo, é lógico, não é qualidade, e tem às vezes que preço alto também não é qualidade, então existe no mercado, quem tem que ver sou eu, o vendedor, tem três produtos, barato, médio e caro, qual é o melhor? O barato, então eu vou vender para você o barato porque é o melhor, às vezes o médio e o caro não é bom, o produto não é de qualidade boa, então aí eu vou te passar a confiança daquilo que você vai comprar de mim hoje, vai dar resultado e amanhã você vai lembrar de mim, e tem outra, hoje no comércio, eu sempre falei, se você tem um restaurante, sabe quem tem que ser bom no seu restaurante? Sabe ou não? É o seu garçom e o seu cozinheiro. Se você vai num restaurante e você é mal atendido pelo garçom, você vai voltar lá? Se você vai num restaurante e a comida não é boa você vai voltar? Então não é o dono, o dono tem que saber quem ele põe lá para trabalhar, no meu comércio, o bem do meu comércio é o vendedor que eu ponho lá, ele tem que ser um bom vendedor se não eu vou perder cliente.
P/1 – O senhor faz promoção de produto também ou não precisa?
R – Não, no meu ramo não. No meu ramo, infelizmente não dá para fazer promoção porque os fornecedores também não fazem, veja bem, quem tem segmento, ele chega para você e fala: “Oh, se você comprar dez caixas de lâmpadas eu te dou 20 por cento de desconto a mais,então você compra duas, três!”, aí você pode fazer uma promoção, mas o meu segmento, se você comprar uma e comprar 100 é o mesmo preço, então não tem porque!
P/1 – Então o senhor falou que o segredo é a questão da confiança e do atendimento, o senhor acha que o comércio aqui de Campinas é um comércio forte, seu Felipe? É um bom comércio? Tem de tudo que as pessoas precisam?
R – É um comércio forte, tem um potencial muito grande, só que eu vou te falar uma coisa que a gente, eu como campineiro, nascido e criado aqui como comerciante, eu acho que o comércio campineiro é meio abusivo quanto à preço, para ter uma idéia, você compra uma mercadoria em Campinas, você paga dez reais, essa mesma mercadoria em São Paulo, no preço final, preço final de venda, você paga sete, sete e cinqüenta, então porque essa diferença se o fornecedor ser que mora em São Paulo é o mesmo meu? Então eu acho que Campinas é uma cidade cara para se viver!
P/1 – As pessoas saem daqui para comprar em São Paulo, seu Felipe?
R – Tem muita gente que sai, tem vantagem. Eu tenho um exemplo, a minha filha mora em Curitiba há 15, 16 anos, Curitiba, o preço das coisas lá, a vida as coisa, muito mais barato do que Campinas, para você ver, o centro produtor das coisas, a ____sempre falou que é o estado São Paulo e porque que Curitiba que é no Paraná, está há 500 quilômetros daqui, o custo de vida é mais barato do que aqui? Tem alguma coisa, né?
P/1 – Seu Felipe, a gente já está indo para terminar, que missões deu para tirar do comércio esse tempo todo, essas atividades todas? Lições que o senhor tirou para a sua vida?
R – Eh, veja bem , a lição que eu tirei é a seguinte, tenho cinco filhos, todos eles com diploma universitário, eu tenho uma filha que é Nutricionista, mora em São Paulo, você sabe quanto é o salário dela? Dá vergonha de falar! Eu tenho uma filha que é formada em Turismo, ela ganha menos do que uma funcionária da minha loja! Que não tem faculdade, não tem nada! Então no Brasil, nós estamos indo para o caminho errado. Um médico, o meu genro é médico, eu vou falar para você, o médico, para ele começar a ganhar dinheiro na vida, ganhar ele ganha, sobrar dinheiro, ganhar aquilo que você merece, veja bem, é cruel você fazer 10, 12 anos de faculdade e quando você sai para o mercado de trabalho, você não é valorizado, isso que é cruel, porque o investimento, tudo que você vai investir tem que ter um retorno, e o retorno do universitário hoje é muito lento, muito ruim, então eu acho que hoje o comércio, se for ver, analisar as categorias, o comércio é um bom negócio, é viável, só que tem umas coisas primordiais no comércio, você tem que ter honestidade, sinceridade e caráter, como? Caráter você tem que por na cabeça que ninguém é bobo, você tem que, quando você falar uma coisa, cumprir, você deve, você paga, e o importante no comércio é pagar em dia, se vencer dia primeiro paga dia primeiro, não deixa para pagar dia dois, dia três, é o sucesso do comércio. Porque a notícia boa anda, a ruim voa, não é assim, então eu acho que a vida é assim, anda direito você na vida que você vai ter as coisas boas, você não fica achando que os outros são bobos, que você é sabido, que você não vai a lugar nenhum, é a minha opinião pessoal. E eu passei para os meus cinco filhos isso sempre na vida: “Filho, você está andando numa estrada, você está passando num laranjal, você não pare e pegue uma laranja porque não é sua. Você não põe a mão naquilo que não é seu!”, meus cinco filhos foram criados assim e graças a Deus, até hoje, nunca tive problema nenhum. Droga? Eu fui criado no mundo, me ofereceram droga, traficante ofereceu para mim com caminhão, transportar cocaína e tal no meio de carga, o nego falou: Eu te pago tanto para você levar?”, “O que eu vou levar?” , “É uma caixa assim e tal!”, “Se eu não souber o que tem dentro da caixa não vai poder no meu caminhão!”, e não punha por dinheiro nenhum, eu sei que é errado, porque vou fazer errado, faz errado quem quer fazer, ninguém obriga ninguém a fazer nada errado.
P/1 – Está certo, e seu Felipe o que o senhor acha dessa idéia do Sesc de contar a história pelos comerciantes?
R – Ah, tudo que é bom é válido, eu acho que é uma coisa boa e agora eu acho uma coisa, esse livro que vocês fazem , vocês tem que fazer ele chegar ao público leitor! Eu não sei a que preço, mas tem que chegar, só assim nós vamos conseguir objetivo, porque não adianta nada você fazer um livro dessa grossura, lindo, maravilho, mas ninguém lê! Aí não serviu para nada porque ninguém leu o livro, ninguém sabe o que está ali dentro, então o livro tem que chegar no povo, no povão, naquele que gosta de ler, isso que tem que chegar.
P/1 – Certo, valeu a dica para o Sesc! O senhor gostou da entrevista?
R – Nossa, adorei, qualquer outra entrevista estou aberta.
P/1 – Então ta bom seu Felipe, a gente agradece muito a tua participação.
R – Eu também, fiquei muito honrado e muito contente de ser lembrado.
P/1 – Obrigado, seu Felipe.