Taís é uma simpática jovem que venceu a timidez fazendo cursos no Projeto Arrastão. Moradora do bairro do Campo Limpo, Taís conta em seu depoimento passagens de sua infância no bairro do Itaim Paulista, na capital. Fala sobre a separação dos pais e as dificuldades que a família depois desse período. Lembra o concurso que participou no Sesc Itaquera, onde seu grupo da escola foi premiado. Recorda do curso de gastronomia que fez no Projeto Arrastão e da escolha do curso de graduação. Por fim fala dos empregos que teve, com destaque para a área de telemarketing e sobre o Projeto Criança Esperança.
Meu nome completo é Taís Cristina Bispo de Lima, eu nasci no dia 1º de setembro de 1993, em São Paulo. O nome do meu pai completo é Antomar de Lima, o nome da minha mãe é Edilene Aparecida Bispo, os dois nasceram em São Paulo. Minha mãe nasceu no dia 23 de setembro de 1973, e meu pai nasceu no dia 16 de maio. O meu pai tem uma empresa e, assim, o que você precisar ele vende, vende tudo um pouco. E ele é técnico de raio X também. A minha mãe é cabeleireira, ela faz alongamento. Meu pai é superengraçado, ele se dá bem com todo mundo, ele sabe falar, sabe se portar com qualquer tipo de pessoa, ele é muito extrovertido. A minha mãe também conversa. Porque ela é cabeleireira, então ela tem que saber lidar com as clientes, tem que saber escutar, mas ela é um pouco mais brava porque é mãe. Mulher é um pouco mais brava. Mas também é um amor de pessoa. O nome da minha irmã é Carolina Bispo de Lima e do meu irmão é João Vitor Bispo de Lima. O João tem 13 anos e a Carol tem 18. O bairro de infância era bem tranquilo, era uma rua sem saída, tinha bastante criança, então eu costumava viver o dia inteiro na rua brincando. E minha casa era uma das casas maiores do bairro, porque era um bairro bem simples. Não que a gente fosse melhor de vida, mas a gente era um pouquinho melhor do que as outras crianças. Então a nossa casa era maior, a gente tinha bicicleta, tinha ursinho, tinha boneca, e a gente dividia com as crianças da rua e era bem gostoso, porque era gostoso poder compartilhar com uma pessoa que não tinha brinquedo e tudo mais. Era no Itaim Paulista. Era Encosta Norte, o nome do bairro.
Eu sempre fui pra escola, creche. Não sei, pré. O prezinho, eu tinha uma melhor amiga, a Luciana, e a nossa sala foi selecionada pra participar de um concurso, uma coisa que eu lembro, no Sesc Itaquera, e nós ganhamos a peça. A gente encenou um teatro lá e nós ganhamos. Foi uma peça sobre a escravidão. Tinha um centro comunitário perto da escola e nós ensaiamos lá. O professor de capoeira ensinou a gente a fazer algumas coisas. E nós apresentamos no Sesc Itaquera e nós ganhamos o concurso, e nós tivemos um dia inteiro lá pra usar a piscina, usar tudo que tinha lá. Depois, na primeira série eu tive que ir pra casa dos meus avós, porque meus pais estavam construindo a minha casa, e a gente ficou um ano morando com o meu avô e minha avó por parte de pai. Quando acabou, nós voltamos pra nossa casa. Quando eu fiz 11 anos, meus pais se separaram, então eu mudei muito de escola. Meus pais se separaram e minha mãe teve que manter eu, minha irmã e meu irmão sozinha, porque meu pai infelizmente não ajudou muito. Eles venderam a casa que nós morávamos, nós fomos morar na Penha, eu tive que cuidar dos meus irmãos. Eu dou graças a Deus pela saúde da minha mãe, que todo esse tempo, dez anos, ela nunca ficou doente e sempre batalhou pela gente. E a única coisa que me entristece é a distância do meu pai. Minha mãe nunca pediu pra ele: “Olha, dá um dinheiro. Eu quero dinheiro”. Não, ela falou: “Lima, vai lá, sai com as crianças, leva na pracinha, só conversa com eles”. E não, ele não fazia isso. E agora ele fica triste porque a gente não vai a casa dele, mas é que assim, não teve esse convívio, então a gente não sente vontade de ir. Ele fala: “Vai lá, visita a sua avó”. Mas, sabe, aniversário, Natal, não liga. Nunca ligou pra falar “parabéns”.
Eu fiquei muito chateada com a separação. Eu me revoltei, eu não me arrumava, não queria saber de ninguém. Eu era muito mal humorada e não fazia nada, só ia pra escola. Não queria saber de nada. Depois que eu mudei pra zona sul, eu melhorei. Eu conheci novas pessoas, novos amigos, mas antes eu não saía. Na Penha, assim, eu tinha minhas primas, que elas são netas da irmã da minha avó, da minha tia-avó, então eu fui melhorando. A Sílvia, a Elisa, tem o André, o Vi, o Gui, então eles eram um pouco mais velhos do que eu, então eles saíam, às vezes eles ficavam brincando, conversando na rua. Eu acho que fui esquecendo, melhorando, deixando a vida levar a gente. E depois disso que virou costume, eu não saio até hoje. Comecei a participar mais da igreja, comecei a fazer amigos, depois fui pra ONG, depois pra faculdade.
A gente mudou bastante de escola. Nós mudamos de casa, de escola, várias vezes. Na Penha, nós moramos em três casas, depois nós fomos... Depois minha mãe não aguentou mais o aluguel, conversou com a minha avó, perguntou se a gente não podia construir a casa no quintal dela, minha avó autorizou. Nós fomos pra lá e estamos lá até hoje. Mas nós fomos pra lá em 2009, ou 2008. Nós mudamos pra cá, meus irmãos entraram numa ONG, numa organização, que é o Meninos do Morumbi, e eu não pude entrar, porque eu não tinha idade. Eu era mais velha, eu tinha acho que 16, ou 15, alguma coisa assim. E a moça falou assim: “Não, não pode, você é muito velha”. E só meus irmãos puderam entrar. Nossa, eu fiquei muito triste. Eu: “Ai, mãe, mas eu queria entrar, não sei o quê”. E minha tia: “Ah, vai para o Arrastão”. Eu falei: “Arrastão?”. Ela falou assim: “É. Lá tem um monte de coisa, tem um monte de cursos, você vai aprender, vai ter oportunidade de emprego”. Eu falei assim: “Ah, está bom”. Eu fui. Inclusive, a minha tia falou pra eu ir lá porque ela trabalha lá. Mas ela estava de licença, porque ela tinha quebrado a perna, daí eu tive que ir lá sozinha, ir lá tentar. Eu entrei no curso, fiz curso de Marketing Pessoal, depois eu fiz curso esse de Gastronomia. Eu fiz muitos cursos profissionalizantes, me ajudou bastante como se portar numa entrevista, empreendedorismo. Nunca tinha ido a teatro, conheci a Globo, conheci os restaurantes da Globo. Nossa, eu conheci muita coisa, conheci muitos lugares que eu nem imaginava ir, nem sabia que existia, mas nunca pensei em ir. Então o Arrastão foi uma porta muito grande, que acho que, sei lá, Deus. Foi muito bom eu ter conhecido, porque através do Arrastão eu conheci outras pessoas, comecei a entender que eu tinha que estudar. Porque, meu, eu sabia que tinha que estudar, mas eu não tinha... Sabe? “Ah, tem que estudar. Pra quê, eu não sei.” Então assim, todo mundo: “Ah, você está estudando? Você vai fazer qual faculdade?” “Nossa, faculdade?”. E eu fui me inteirando das coisas, fui conhecendo novas pessoas. Achei que foi uma das melhores coisas que aconteceu, foi ter participado do Arrastão.
Eu fiz um ano e meio de Administração, porque minha mãe queria e também porque eu não sabia... Eu sabia o que eu queria, mas não tinha condições. E se passaram três anos e eu tinha que fazer a faculdade, que eu estava desesperada. E minha mãe: “Taís, você tem que fazer a faculdade, faz Administração, já vai à faculdade. Eu pago”. Eu falei: “Não. Não quero fazer”. Eu pensei, falei: “Ah, já fiz Gastronomia, não quero ser chef”. Falei: “Ah, vou fazer Nutrição, que é mais ou menos relacionado”. Então eu falei: “Ah, tá bom”. Eu comecei o curso, odiei. Não gostei. Já queria parar, minha mãe: “Ah, você começa e não termina”. E agora eu estou gostando muito, eu estou fazendo o curso de Massoterapia também. Eu estou no segundo semestre.
A minha tia trabalha há muitos anos lá, no Arrastão, então ela já foi bibliotecária, professora, assim, várias funções. Então cada vez que eu vou lá, ela está fazendo uma coisa. Mas no que precisar, ela ajuda lá. Ela trabalha acho que há 13 ou 15. O curso que eu mais gostei foi o de Marketing Pessoal, porque eu sou tímida, mas eu era muito, muito tímida. Porque antes eu não conseguia conversar com as pessoas. Então ele me abriu, fez com que eu conseguisse expressar o que estava pensando. Não parece que eu sou tímida porque agora eu falo pra caramba, mas eu sou. E assim, a professora era uma aluna do Arrastão, a Daiane, e dentro do Arrastão ela fez uma prova pra entrar na Unilever e ela conseguiu entrar. E, nossa, eu fiquei super feliz quando ela me contou. Eu falei: “Nossa, mas você era aluna daqui?”. Ela: “Eu era”. E ela: “Não, estuda”. Ela me emprestou os livros dela: “Não, estuda isso, estuda aquilo. Olha, vai cair no vestibular”. E ela fazia vários exercícios de entrevista, como eu já tinha dito, então eu acho que isso foi muito importante pra mim, porque sempre que eu vou fazer uma entrevista, uma coisa assim, eu passo. Eu fiquei muito feliz, porque isso foi graças ao Arrastão e graças a Daí também. Eu acho que foi uma das professoras que mais me marcou. Assim, na Gastronomia, o que mais me marcou foi o Val, porque eu não esperava nada, na verdade. Eu entrei porque eu falei: “Ah, Gastronomia é legal, eu vou comer”. Só isso. Mas, assim, foi diferente, ele ensinou, ele explicou como surgiu a gastronomia, a diferença da gastronomia nos países e tal. Ensinou técnicas, como media, como chamava os instrumentos, como lia uma receita, como fazia uma receita. É uma coisa básica, mas, sei lá, eu nunca me interessei. E eu achei que foi super legal, porque ele foi no bê-á-bá.
Nessa época, eu só estudava. Eu estava fazendo o primeiro e o segundo ano. E também eu ganhava 60 reais por mês se eu não faltasse. E, nossa, ajudava bastante, eu até saía com o dinheiro. E depois de lá eles até indicava para as empresas, tal, mas eu comecei a trabalhar com o meu pai, depois trabalhei com a minha mãe. Depois trabalhei num restaurante também, que eu tive que sair. Não, me mandaram embora do restaurante, porque não estavam rodando os clientes e mandaram algumas pessoas embora, as que estavam em experiência. Como eu tava na experiência, me mandaram embora. Mas esse último emprego que eu saí foi porque eu estava com dificuldade em anatomia, e eu falei: “Mãe, e agora? Eu acho que eu vou reprovar”. Ela: “Não, então sai do emprego e fica estudando”. Eu saí, mas agora já estou procurando outro. Eu era auxiliar administrativo. Eu postava as coisas na internet, tirava foto dos produtos, postava na internet, atendia telefone, fazia ficha fiscal. Depois disso eu fiquei desempregada de novo, porque eu falei: “Ah, mãe, eu quero sair, eu quero um trabalho que ninguém me conheça, eu quero conhecer coisa nova, não sei o quê”. Eu saí. Meu primo falou que tinha uma pessoa precisando de hostess num restaurante, ele levou minha foto, ela falou assim: “Ah, pode trazê-la”. Eu fui, passei, fiquei morrendo de medo, falei: “Nossa, o que é isso?”. Eu comecei a trabalhar como hostess, mas ficou muito cansativo, porque eu tinha começado a faculdade, eu acordava cinco horas, chegava a minha casa uma hora, muito tarde. E eu procurei, procurei, falei: “E agora?”. Falei: “Ah, mãe, já sei, vou trabalhar de telemarketing”. Ela: “Você está louca, telemarketing, não sei o quê”. Eu falei: “Ah, vou trabalhar de telemarketing. “Mãe, pelo amor de Deus, eu preciso sair”. Ela falou: “Está bom, Taís, então você vai só pra faculdade. Você não vai sair, não vai fazer nada, só vai pra faculdade”. Eu falei: “Ah, está bom”. Eu saí. Faz um mês e pouco ou menos de um mês que eu saí.
O Arrastão, ele foi uma porta abençoada pra mim. Foi uma porta que abriu minha mente, meu horizonte. Mostrou-me que não é porque eu nasci num lugar pobre que eu tenho que ser pobre para o resto da vida. Eu não conheço o Criança Esperança, eu assisto na TV, sei que foi o que ajudou o curso de Gastronomia no Arrastão pela Unesco, tinha até um símbolo lá na parede da cozinha. E eu sei que ajuda muitas crianças, muitas ONGs, instituições. Eu acho isso. Eu sei que eles arrecadam dinheiro pra ajudar as pessoas que participam dessas instituições. Mas assim, afundo mesmo, eu não sei. Tanto de dinheiro que eles arrecadam, eu acho até que é pouco pelo tanto de instituições que eles ajudam. A cozinha onde eu fazia meu curso era excelente, tinha tudo do bom e do melhor, não faltava nada. E eles realmente ajudaram, não só a mim, tantas outras pessoas. Meus amigos, eu vejo no Face, alguns não estão trabalhando especificamente na área de gastronomia, mas estão trabalhando e eu acho que isso foi muito importante, porque são pessoas que não tinham estrutura pra estarem onde estão. Assim, acho que se não fosse o Criança Esperança, se não fosse o Arrastão, acho que a gente, sei lá, ia ficar na mesma, não ia sair do lugar. Então eu acho muito importante essa coisa deles ajudarem, de ajudarem as instituições, porque realmente existem pessoas que não têm condições, não sabem porque tem que estudar, porque nós temos que crescer, porque nós temos que ajudar o próximo pra que a nossa sociedade cresça, pra que todo mundo fique bem.
Histórias de Esperança - 29 anos do Projeto Criança Esperança (HECE)
Vencendo a timidez
História de Thais Cristina Bispo de Lima
Autor: Museu da Pessoa
Publicado em 18/10/2014 por Rosali Henriques
Museu da Pessoa – Conte sua história
Histórias de Esperança – 29 anos do Projeto Criança Esperança
Depoimento de Taís Cristina Bispo de Lima
Entrevistada por Tereza Ruiz
São Paulo 24/09/2014
Realização Museu da Pessoa
Entrevista HECE_HV_18
Transcrito por Liliane Custódio
P/1 – Primeiro, Taís, fala pra gente seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Bom, meu nome completo é Taís Cristina Bispo de Lima, eu nasci no dia 1º de setembro de 1993, em São Paulo.
P/1 – Agora o nome completo do seu pai e da sua mãe, e data e local de nascimento deles se você lembrar.
R – O nome do meu pai completo é Antomar de Lima, o nome da minha mãe é Edilene Aparecida Bispo, os dois nasceram em São Paulo. Minha mãe nasceu no dia 23 de setembro de 1973, e meu pai nasceu no dia 16 de maio.
P/1 – O que seus pais fazem profissionalmente, Taís?
R – Bom, o meu pai tem uma empresa e, assim, o que você precisar ele vende, vende tudo um pouco. E ele também faz raio X. Ele técnico de raio X também. A minha mãe é cabeleireira, ela faz alongamento.
P/1 – Você falou que seu pai vende um pouco de tudo, mas tem alguma coisa específica, um tipo de produto específico?
R – Assim, computador, máquina fotográfica, mais coisa de tecnologia assim.
P/1 – Eletrônico?
R – Isso. Isso mesmo, eletrônico.
P/1 – Conta um pouco pra gente como ele são de personalidade, de jeito assim, seu pai e sua mãe?
R – Meu pai é superengraçado, ele se dá bem com todo mundo, ele sabe falar, sabe se portar com qualquer tipo de pessoa, ele é muito extrovertido. A minha mãe é mais... Deixe-me ver... A minha mãe não é séria, ela também conversa. Porque ela é cabeleireira, então ela tem que saber lidar com as clientes, tem que saber escutar, mas ela é um pouco mais brava porque é mãe. Mulher é um pouco mais brava. Mas também é um amor de pessoa.
P/1 – Você tem irmãos, né?
R – Tenho.
P/1 – Fala pra gente o nome dos seus irmãos.
R – O nome da minha irmã é Carolina Bispo de Lima e do meu irmão é João Vitor Bispo de Lima.
P/1 – E eles são mais novos que você?
R – Mais novos. O João tem 13 anos e a Carol tem 18.
P/1 – Conta um pouco agora como era a casa em que você passou a infância. Descreve um pouco pra gente mesmo, a casa o bairro.
R – Bom, o bairro era bem tranquilo, era uma rua sem saída, tinha bastante criança, então eu costumava viver o dia inteiro na rua brincando. E minha casa era uma das casas maiores do bairro, porque era um bairro bem simples, então a gente... Não que a gente fosse melhor de vida, mas a gente era um pouquinho melhor do que as outras crianças. Então a nossa casa era maior, aí a gente tinha bicicleta, tinha ursinho, tinha boneca, e a gente dividia com as crianças da rua e era bem gostoso, porque era gostoso poder compartilhar com uma pessoa que não tinha brinquedo e tudo mais.
P/1 – Qual era o bairro?
R – Era Itaim Paulista. Era Encosta Norte, o nome do bairro.
P/1 – E você falou um pouquinho dos brinquedos que vocês tinham.
R – Isso.
P/1 – Eu queria que você falasse um pouco quais eram as brincadeiras da sua infância, do que você brincava, com quem você brincava.
R – A gente brincava de rouba bandeira, a gente brincava de vôlei, às vezes fazia campeonato com as pessoas da outra rua. Eu era a menor, mas eu sempre era café com leite quando tinha vôlei, mas eu fingia que estava brincando. Quer dizer, eles fingiam que eu estava brincando. Deixe-me ver... Rouba bandeira, pega-pega, esconde- esconde, vôlei, pular corda, pulava elástico. Nossa, muita coisa! A maioria das brincadeiras que no final do tempo as crianças sempre brincavam. Porque agora é mais vídeo game, né? Mas assim, tudo. O que tinha, a gente brincava, de qualquer coisa.
P/1 – E brinquedo, vocês tinham? O que vocês tinham de brinquedo?
R – Ah, nós tínhamos bicicleta, tinha boneca, tinha corda, bola, tinha a Barbie, a casinha... Não a casinha, mas os móveis da Barbie, roupinha. Acho que era só. Acho que era só isso.
P/1 – Você tinha uma brincadeira ou um brinquedo favorito?
R – Eu gostava de andar de bicicleta, muito. Eu amava andar de bicicleta, passava o dia inteiro andando.
P/1 – E dessa fase assim de brincadeiras, tem alguma história que você lembre que tenha ficado marcada pra você?
R – Ah, um dia nós fomos brincar de esconde-esconde, não na minha casa, na casa da minha avó. E a minha irmã sempre dormiu muito, e aí nós estávamos brincando, minha prima estava lá contando e nós fomos nos esconder. E tudo bem, minha prima me achou, achou minha outra prima, e aí a Carol sumiu. A minha avó ficou desesperada, todo mundo ficou desesperado: “Gente, cadê a Carol? Cadê a Carol? Carol!”. E ela não falava, não aparecia. E a gente: “Carol, a gente parou de brincar. Carol”. A minha avó ficou desesperada. Aí passou, minha prima foi ao quarto e ela só viu que tinha uma coisa embaixo da cama. Embaixo da cama da minha avó tinha um colchão, quando a gente dormia lá, a gente tirava o colchão. E a minha irmã estava dormindo embaixo do colchão. A gente passou a tarde inteira procurando-a. Mas foi assim, desesperador.
P/1 – Ela dormiu durante a brincadeira?
R – Dormiu. Ela dorme naturalmente (risos).
P/1 – Deixe-me voltar um pouquinho. Você sabe qual a origem da sua família, Taís? Os seus antepassados assim? Por parte de mãe, por parte de pai, avós, bisavós?
R – A minha bisavó, eu lembro que minha mãe fala, minha avó falava que ela... Não sei se era italiana ou se era portuguesa, eu sei que pegaram a minha tataravó e aí nasceu minha bisa. E ele não assumiu, lógico, porque naquela época era comum. E era um monte de negão e a minha bisavó. E depois nasceu minha avó, aí teve mais os irmãos delas, e depois ela... Eles moravam em São Carlos, na Fazenda Tamoio, minha avó sempre fala isso. Depois a minha avó veio pra cá pra São Paulo e através de uma amiga dela conheceu o meu avô, eles se casaram tiveram os meus tios, depois viemos nós. E por parte de mãe, eu sei que a minha outra avó, o pai dela era fazendeiro, ele era amigo do meu avô, então ele prometeu a minha avó pra ele. Minha avó não queria de jeito nenhum. Mudou a idade dela no cartório, que naquela época podia, aí que mudou, casou obrigada e veio pra São Paulo. Aí teve meu pai, meus irmãos. Não sei, acho que ela aprendeu a gostar dele. Não sei, difícil, mas... E meus pais se conheceram, acho que em festa, baile, essas coisas, e aí viemos nós: e eu meus irmãos.
P/1 – Você chegou a conviver com seus avós?
R – Então, com a minha avó e meu avô por parte de pai, sim. E com meu avô por parte de mãe, eu não o conheci, ele morreu dois anos antes de eu nascer. Mas a minha avó, eu convivi com ela, inclusive moro no quintal da casa dela (risos).
P/1 – Você convive com ela então.
R – Sim.
P/1 – Conta um pouquinho pra gente quais são as lembranças que você tem da escola, as primeiras lembranças da escola, quando você entrou na escola.
R – Da escola?
P/1 – Quantos anos você tinha quando você começou a frequentar a escola?
R – Ah, eu sempre fui pra escola, creche. Não sei, pré. O prezinho, eu tinha uma melhor amiga, a Luciana, e a nossa sala foi selecionada pra participar de um concurso, uma coisa que eu lembro, no Sesc Itaquera, e nós ganhamos a peça. A gente encenou um teatro lá e nós ganhamos. Aí a gente ganhou um dia lá no Sesc, não sei o quê.
P/1 – Qual foi? Conta um pouquinho melhor pra gente. Qual foi essa peça que vocês apresentaram?
R – Foi uma peça sobre a escravidão. Aí tinha um centro comunitário perto da escola e nós ensaiamos lá. O professor de capoeira ensinou a gente a fazer algumas coisas. E aí nós apresentamos no Sesc Itaquera e nós ganhamos o concurso, e nós tivemos um dia inteiro lá pra usar a piscina, usar tudo que tinha lá. Depois, na primeira série eu tive que ir pra casa dos meus avós, porque meus pais estavam construindo a minha casa, e a gente ficou um ano morando com o meu avô e minha avó por parte de pai. Quando acabou, nós voltamos pra nossa casa. Depois disso...
P/1 – Como você ia e voltava pra escola?
R – Então, o meu avô... O meu avô, ou meu tio, ou minha avó buscava a gente da escola, e aos finais de semana a gente ia pra nossa casa mesmo. Era só de semana que a gente ficava lá, porque minha mãe falava que era muito pó, não sei, e a gente teve que ficar lá.
P/1 – E quando você estava na casa dos seus pais de volta, você ia e volta... A escola era próxima, era distante? Como você ia e voltava?
R – Na nossa casa, era na esquina a escola. A gente só descia a rua, era na esquina. Pertinho.
P/1 – E você fez todo o ensino básico nessa mesma escola?
R – Não. Quando eu fiz 11 anos, meus pais se separaram, então eu mudei muito de escola. Eu saí da quarta, eu estava indo pra quinta série. Acho que era isso. A gente mudou bastante de escola. Nós mudamos de casa, de escola, várias vezes. Na Penha, nós moramos em três casas, depois nós fomos... Minha mãe pagava aluguel tudo sozinha, meu pai se distanciou da gente, não sei por que. Depois minha mãe não aguentou mais o aluguel, conversou com a minha avó, perguntou se a gente não podia construir a casa no quintal dela, minha avó autorizou. Aí nós fomos pra lá e estamos lá até hoje. Mas nós fomos pra lá em 2009, ou 2008. Acho que foi isso.
P/1 – Nessa fase de infância, você lembra o que você queria ser quando crescesse?
R – Aeromoça. Mas depois do acidente da TAM, eu desisti (risos). Nunca mais quis saber de avião.
P/1 – Por que você queria ser aeromoça, você lembra?
R – Nossa, eu achava muito lindo, elegante. Elas sabiam falar várias línguas, e a roupa delas, nossa, eu achava... Falava: “Ah, eu quero ser aeromoça”. Só por isso.
P/1 – Você já viajou de avião alguma vez?
R – Nunca viajei. Eu sempre quis, mas estou esperando um dia (risos). Depois disso, que nós mudamos pra cá, meus irmãos entraram numa ONG, numa organização, que é o Meninos do Morumbi, e eu não pude entrar, porque eu não tinha idade. Eu era mais velha, eu tinha acho que 16, ou 15, alguma coisa assim. E a moça falou assim: “Não, não pode, você é muito velha”. E só meus irmãos puderam entrar. Nossa, eu fiquei muito triste. Eu: “Ai, mãe, mas eu queria entrar, não sei o quê”. E minha tia: “Ah, vai para o Arrastão”. Eu falei: “Arrastão?”. Ela falou assim: “É. Lá tem um monte de coisa, tem um monte de cursos, você vai aprender, vai ter oportunidade de emprego”. Eu falei assim: “Ah, está bom”. Aí eu fui. Inclusive, a minha tia falou pra eu ir lá porque ela trabalha lá. Mas ela tava de licença, porque ela tinha quebrado a perna, daí eu tive que ir lá sozinha, ir lá tentar. Eu entrei no curso, fiz curso de Marketing Pessoal, depois eu fiz curso esse de Gastronomia. Eu fiz muitos cursos profissionalizantes, me ajudou bastante como se portar numa entrevista, empreendedorismo. Nunca tinha ido a teatro, conheci a Globo, conheci os restaurantes da Globo. Nossa, eu conheci muita coisa, conheci muitos lugares que eu nem imaginava ir, nem sabia que existia, mas nunca pensei em ir. Então o Arrastão foi uma porta muito grande, que acho que, sei lá, Deus. Que foi muito bom eu ter conhecido, porque através do Arrastão eu conheci outras pessoas, comecei a entender que eu tinha que estudar. Porque, meu, eu sabia que tinha que estudar, mas eu não tinha... Sabe? “Ah, tem que estudar. Pra quê, eu não sei.” Então assim, todo mundo: “Ah, você está estudando? Você vai fazer qual faculdade?” “Nossa, faculdade?”. E eu fui me inteirando das coisas, fui conhecendo novas pessoas. Achei que foi uma das melhores coisas que aconteceu, foi ter participado do Arrastão. Foi muito legal.
P/1 – Você falou que conheceu várias coisas que você não conhecia. Tem algum passeio, alguma coisa que você tenha conhecido que tenha te marcado mais? Uma experiência que você lembre, que você tenha gostado em especial?
R – Eu acho que o melhor pra mim foi ter ido a Globo, que nós conhecemos os restaurantes, conhecemos... Não sei como é o nome do restaurante. Eu sei que é um restaurante que tem lá em cima no prédio, e aí um senhor, que trabalha lá há muitos anos, falou pra gente como funcionava tudo, e falou que nós tínhamos que estudar, que não importa, a gente tem que batalhar, a gente tem que... Se é o nosso objetivo, então vai atrás, então luta. Foi mais ou menos isso que ele falou, porque faz tanto tempo. Então eu falei: “Meu, então não importa o que eu quero ser, o que eu for, eu vou ser a melhor”. E a partir daí, eu quis... Tinha o projeto também de fotografia, participei também. Aí eu quis fazer Rádio e TV de qualquer maneira. Eu: “Mãe, preciso fazer Rádio e TV, não sei o quê, não sei o quê” “Ai, Taís, é muito caro, não sei o quê”. Eu tentei o Enem, só que eu não consegui uma escola legal, eu falei: “Ah, não vale a pena. Se não for pra fazer uma legal...”. Aí minha mãe: “Não, então faz Administração”. Eu falei: “Ai não, Administração eu não quero, mãe”. Ela me inscreveu, falou assim: “Não, se inscreva na ETEC e aí você a prova”. Eu falei: “Ah, todo mundo faz, ninguém passa”. Falei: “Ah, então vou fazer”. Eu fiz. Minha tia ligou: “Taís, parabéns!”. Eu: “Oi, parabéns do quê?” “Você passou na ETEC”. Eu: “Não acredito, que bosta!” Eu não queria ter passado de jeito nenhum. Eu peguei e falei: “Ah, obrigada”. Eu fiz um ano e meio de Administração, porque minha mãe queria e também porque eu não sabia... Eu sabia o que eu queria, mas não tinha condições. E aí se passaram três anos e eu tinha que fazer a faculdade, que eu estava desesperada. E minha mãe: “Taís, você tem que fazer a faculdade, faz Administração, já vai à faculdade. Eu pago”. Eu falei: “Não. Não quero fazer”. E meus tios, eles trabalham tudo na área da saúde, eles são educadores físicos. E quase todos os meus tios trabalham para o Hospital das Clínicas, Lecy Montoro, então eles queriam que eu entrasse de qualquer jeito. Eu pensei, falei: “Ah, já fiz Gastronomia, não quero ser chef”. Falei: “Ah, vou fazer Nutrição, que é mais ou menos relacionado”. Então eu falei: “Ah, tá bom”. Eu comecei o curso, odiei. Não gostei. Já queria parar, minha mãe: “Ah, você começa e não termina”. E agora eu estou gostando muito, eu estou fazendo o curso de Massoterapia também, que é gratuito da faculdade, então estou lidando com os pacientes, sabe, poder ajudar as pessoas. A pessoa: “Nossa, olha...”. E tinha um senhor que o braço dele era assim, aí o braço dele foi soltando e ele estava conseguindo fazer isso. Quando ele fez isso, todo mundo chorou. Eu falei: “Gente, que legal. A gente ajudou”. Assim, é gratificante poder ajudar o próximo, então eu falei: “Ah, estou na profissão certo”.
P/1 – Você está no curso de Nutrição ainda?
R – Estou. É que na verdade, assim, Massoterapia é da Fisio, aí eu me intrometi, perguntei se eu poderia fazer. E aí eu fui. Mas eu dou umas dicas, falo pra beber água, falo a alimentação. Nossa, é muito... Acho que eu estou na área certa. Acho que quando eu terminar, eu vou fazer Fisio. Eu quero ficar na saúde, ajudar todo mundo que eu puder fazer.
P/1 – Que ano você está da faculdade agora?
R – Estou no primeiro. Eu estou no segundo semestre.
P/1 – Deixe-me voltar um pouquinho assim lá atrás.
R – Tá. Eu já voei (risos).
P/1 – Eu queria saber assim, durante a escola, o período escolar, se teve algum professor ou alguma professora que tenha te marcado.
R – Que marcou? Sim. Tem a professora... Ai, meu Deus, como é o nome dela? Eu estava falando dela esses dias, que ela foi professora da minha irmã também. Meu Deus... É uma professora de Português. É a professora... Meu Deus... Nossa, esqueci.
P/1 – Não tem problema se não lembrar o nome. Mas conta um pouquinho dela. Por que ela te marcou assim?
R – Nossa, que absurdo que eu esqueci, Jesus Cristo. Então, porque assim, ela era um amor de pessoa, tratava todos os alunos super bem, sabe, acreditava em todos. E assim, ela tem um filho que tem Síndrome de Down e no ano que ela estava me dando aula a mãe dela faleceu, e aquela correria, e ela tendo que cuidar de tudo, e mesmo assim ela estava na escola e dava atenção pra todo mundo. Assim, eu não acreditava, porque eu no lugar dela ia falar: “Olha, vou pedir licença, não quero mais”. Não, mas ela continuou e, sabe, todos os alunos a amavam. No que você precisar, se você precisar ir à escola agora, ela te dá a maior atenção. Então eu acho que essa coisa do amor dela pelas pessoas, eu acho muito bonito. Assim, isso me marcou bastante. Não só ela, mas como a diretora da escola também. Ela falava: “Gente, mesmo que você for o lixeiro, você tem que ser o melhor. Você tem que se destacar. Se você for fazer alguma coisa, faça o melhor, não importa a sua profissão”. Então eu acho que isso é muito importante não só pra mim, mas pra todo mundo. Porque o que adianta você, sei lá, ganhar super bem igual um político, eu acho que não vai passar essa parte, você ser um deputado, você não sabe falar nem o seu nome, e ser um bosta, um porcaria. Então o que adianta você ser um deputado e não estar servindo para o próximo? Então acho que não vale de nada.
P/1 – E você comentou comigo lá fora que você é evangélica.
R – Isso.
P1 – Queria saber assim, como é a religião? Se você é religiosa desde pequenininha, como é a sua relação com a religião, se você frequenta a igreja, se faz parte de algum grupo.
R – Faço. Eu sou desde pequena, minha mãe sempre foi à igreja. Quando eu nasci, a minha mãe começou a ir pra igreja. Então eu sempre participei de grupo, já passei por várias igrejas, e agora eu sou regente, que é dos adolescentes. E eu dou aula na escola dominical e sou regente deles. Eu amo. Acho que é a melhor fase, que a gente dá risada. Eles são muito bobos, ri de tudo, zoa com todo mundo, mas acho que é muito gostoso, é a melhor fase, são muito carinhosos, são muito verdadeiros: sim, sim; não, não. Falam a verdade.
P/1 – Qual o seu trabalho como regente na escola dominical? Explica um pouco pra gente.
R – Então, a escola dominical tem um revista, algumas histórias, aí eu explico, faço perguntas, assuntos atuais, como, sei lá, pra que serve a Lei Eca, o que isso tem relacionado com a palavra de Deus. Deixe-me ver... Respeitar o próximo. Sei lá, o porquê não pode tal coisa, por que não pode outra. Vem tudo explicado na revista. Daí eu estudo, vejo, o que eu tiver dúvida eu posso perguntar, depois eu dou aula pra eles. Quando é pra reger, todo domingo à noite tem vários grupos: das crianças, das irmãs, dos adolescentes, aí um de cada vez vai cantar. E aí eu fico lá na frente regendo-os. Entendeu? É isso.
P/1 – Você canta também?
R – Ah, eu arrisco, canto com todo mundo. Não sei muito, não.
P/1 – Mas no coral? Você fez parte do coral já?
R – Faço. Eu faço parte da mocidade da igreja.
P/1 – E canta no coral então.
R – Isso mesmo.
P/1 – E você tem uma canção preferida? Alguma das canções que está no repertório de vocês, que vocês cantam, que você já tenha cantado?
R – Ah, tem... É que tem várias. Tem uma que eu gosto bastante, que é da Ana Paula Valadão, que é... Fala que “eu quero ser como um jardim fechado: regado e cuidado pelo seu espírito, que é o espírito de Deus. Que ele flua em mim como manancial. O meu interior como águas vivas. Restaura o meu ser para o Seu louvor”. Eu acho que é um louvor que fala pra Deus fluir na nossa vida, pra que a nossa vida sirva para o louvor dele, pra que nossas atitudes sirvam pra... Que agrade ao senhor. Entendeu? Eu acho que é isso.
P/1 – Durante toda a sua vida religiosa, que é desde pequenininha, teve algum momento que tenha sido especial pra você, Taís? Relacionada a sua fé, ou a ação na igreja mesmo?
R – Especial? Deixe-me ver.
P/1 – Um momento marcante? Pode ser em relação à escola dominical talvez.
R – Ah, teve uma vez que nós fizemos... Acho que foi... Deu muita vergonha (risos), porque eu sou meio tímida, mas nós fizemos mímica no farol. Quando o farol fechava, a gente fazia uma história assim, Jesus te ama, uma coisa assim. Mas eu não lembro direito. Eu tinha uns 11 anos, eu não lembro o que a gente fazia, eu sei que a gente pintou o rosto assim, fez meio que uma mímica quando fechava o farol. Mas foi muito legal. Foi uma coisa que, nossa, eu nunca pensei que eu ia fazer isso. Mas foi legal.
P/1 – E você falou que mais ou menos por essa idade, com 11 anos, foi o momento que seus pais se separaram.
R – Foi.
P/1 – Eu queria saber como foi isso pra você, que você era bem pequena ainda, criança, como você se sentiu, como sua família se reorganizou.
R – Então, na verdade, ninguém esperava isso, nem minha família, porque, nossa, a gente era a família perfeita. Meus pais se separaram e minha mãe teve que manter eu, minha irmã e meu irmão sozinha, porque meu pai infelizmente não ajudou muito. Eles venderam a casa que nós morávamos, nós fomos morar na Penha, eu tive que cuidar dos meus irmãos. Tinha uma senhora que cuidava de mim, a dona Isabel. Então foi muito estranho, porque eu não sabia, não sabia cozinhar, não sabia... Tive que virar mãe dos meus irmãos (choro). Foi muito duro pra mim, porque eu era criança e eu tive que amadurecer, porque minha mãe tinha que trabalhar e alguém tinha que cuidar dos meus irmãos (choro). Mas, assim, nunca faltou nada, a gente nunca passou fome. Assim, graças a Deus a gente não virou “piriguete”, não virou bandido. Nós até hoje estudamos. E, assim, eu dou graças a Deus pela saúde da minha mãe, que todo esse tempo, dez anos, ela nunca ficou doente e sempre batalhou pela gente (choro). E, assim, a única coisa que me entristece é a distância do meu pai (choro). Minha mãe nunca pediu pra ele: “Olha, dá um dinheiro. Eu quero dinheiro”. Não, ela falou: “Lima, vai lá, sai com as crianças, leva na pracinha, só conversa com eles” (choro). E não, ele não fazia isso. E agora ele fica triste porque a gente não vai a casa dele, mas é que assim, não teve esse convívio, então a gente não sente vontade de ir. Ele fala: “Vai lá, visita a sua avó”. Mas, sabe, aniversário, Natal, não liga. Nunca ligou pra falar “parabéns” (choro). E, assim, eu acho que foi covardia dele ter abandonado a gente (choro), mas Deus vê tudo, ele está vendo (choro). Eu não tenho ódio dele, não, nada, só desejo coisa boa, mas a única coisa que eu queria é que ele fosse um pai presente (choro). Que antes ele era muito, ele brincava com a gente, sabe? Saía, levava a gente no parquinho quando a gente era pequeno, sempre, todo final de semana. E é como se fosse assim, mudou da água para o vinho, irreconhecível. Eu não sei o que aconteceu.
P/1 – E essa senhora que você mencionou agora pra mim, Isabel. É Isabel, né?
R – É.
P/1 – Que também você tinha contado lá fora. Conta um pouquinho sobre ela, como ela se aproximou da sua família, como ela conheceu a sua mãe e como era a relação dela com você.
R – Então, na verdade a gente se mudou pra lá e a minha mãe precisava de alguém pra cuidar da gente, que a gente era pequena, eu e minha irmã. Nem tinha meu irmão ainda. Ia ser uma vizinha, a Magali, só que ela arrumou um emprego, aí ela falou assim: “Ah, vê se a dona Isabel não pode cuidar”. E falou com ela, aí a dona Isabel falou: “Não, eu cuido”. E tem a filha dela, a Janete, aí elas cuidaram da gente todo esse tempo, sempre. Às vezes meus pais chegavam bem tarde e elas ficavam com a gente sem nenhum problema, como se fosse nossa mãe branca, mãe-avó. E até hoje, assim, a gente visitá-la, nossa, dá um aperto, uma saudade (risos). Mas ela foi nossa mãe assim na infância.
P/1 – E depois quando foi entrando na fase de adolescência, Taís, um pouco depois, 12, 13, essa parte de adolescência assim, o que mudou na sua vida em termos de lazer? Você saía? Você fazia alguma coisa pra se divertir? Amigos?
R – Não. Eu não saía. Eu fiquei muito chateada. Eu me revoltei, eu não me arrumava, não queria saber de ninguém. Eu era muito mal humorada e não fazia nada, só ia pra escola. Não queria saber de nada. Depois que eu mudei pra zona sul, aí eu melhorei. Eu conheci novas pessoas, novos amigos, aí eu melhorei, mas antes eu não saía. Na Penha, assim, eu tinha minhas primas, que elas são netas da irmã da minha avó, da minha tia-avó, então eu fui melhorando. A Sílvia, a Elisa, aí tem o André, o Vi, o Gui, então eles eram um pouco mais velhos do que eu, então eles saíam, às vezes eles ficavam brincando, conversando na rua. Aí eu acho que fui esquecendo, melhorando, deixando a vida levar a gente. E aí eu fui melhorando, melhorando, graças a Deus. Graças a eles, a tia Lu, ela fazia a noite do pastel, noite da esfirra, noite de tudo, que a gente morava na mesma rua. Aí eu fui melhorando. E depois disso, nós mudamos pra uma casa, depois mudamos pra zona sul. Aí eu melhorei. Acho que virou costume, eu não saio até hoje (risos). Assim, tomo sorvete, vou ao shopping, essas coisas básicas. Eu melhorei, comecei a me arrumar, comecei, sabe, a ver que a vida não é isso. Não ia adiantar eu ficar assim. Comecei a participar mais da igreja, comecei a fazer amigos, depois fui pra ONG, depois pra faculdade.
P/1 – E ouvir música assim, você tinha o hábito nessa fase mais de adolescência? A ver filme?
R – Eu ouvia a Nova Brasil porque a minha mãe ouvia. Eu odiava a Nova Brasil. Aí eu aprendi a gostar, agora eu amo MPB. Amo MPB. Assim, eu ouço até hoje. Eu gosto muito. Gosto mesmo.
P/1 – Do que você gosta?
R – Olha, eu gosto de tudo. Gosto de, sei lá, Caetano Veloso, gosto de Maria Rita, Elis Regina. Olha, acho que tudo que é MPB eu gosto, viu? O que eu não gosto é de funk e de rock bate cabeça, porque o resto eu gosto. Gosto de Beyoncé. Nossa, amo a Beyoncé. Gosto de música evangélica, gosto bastante, Thalles Roberto.
P/1 – E a show, você ia, ou vai de vez em quando?
R – Então, os únicos shows que eu fui foi a show evangélico. Foi do Thalles Roberto, fui de um grupo dos Estados Unidos, Take 6. Deixe-me ver... Ao Kirk Franklin. Fui a alguns shows assim, mas mais evangélicos, nunca fui a outros. Gostaria de ir de MPB assim. E esses abertos assim eu tenho medo de tiro, essas coisas (risos).
P/1 – Você comentou comigo que você fez várias coisas no Arrastão, como você conheceu. Parece que você falou que a sua tia trabalhava lá, o que ela fazia no Arrastão?
R – Então, a minha tia trabalha há muitos anos lá, então ela já foi bibliotecária, professora, assim, várias funções. Então cada vez que eu vou lá, ela está fazendo uma coisa. Mas no que precisar, ela ajuda lá. Ela trabalha acho que há 13 ou 15 anos lá, muito tempo.
P/1 – Bastante tempo.
R – Isso.
P/1 – E você passou por vários cursos, eu queria perguntar assim, desses cursos que você, qual você mais gostou, qual mais te marcou e por quê?
R – Olha, o curso que eu mais gostei foi o de Marketing Pessoal, porque eu sou tímida, mas eu era muito, muito tímida. Porque antes eu não conseguia conversar com as pessoas. Então ele me abriu, fez com que eu conseguisse expressar o que estava pensando. Não parece que eu sou tímida porque agora eu falo pra caramba, mas eu sou. E assim, a professora era uma aluna do Arrastão, a Daiane, e dentro do Arrastão ela fez uma prova pra entrar na Unilever e ela conseguiu entrar. E, nossa, eu fiquei super feliz quando ela me contou. Eu falei: “Nossa, mas você era aluna daqui?”. Ela: “Eu era”. E ela: “Não, estuda”. Ela me emprestou os livros dela: “Não, estuda isso, estuda aquilo. Olha, vai cair no vestibular”. E ela fazia vários exercícios de entrevista, como eu já tinha dito, então eu acho que isso foi muito importante pra mim, porque sempre que eu vou fazer uma entrevista, uma coisa assim, eu passo. Eu fiquei muito feliz, porque isso foi graças ao Arrastão e graças a Daí também. Eu acho que foi uma das professoras que mais me marcou. Assim, na Gastronomia, o que mais me marcou foi o Val, porque eu não esperava... Sei lá, eu não esperava nada, na verdade. Eu entrei porque eu falei: “Ah, Gastronomia é legal, eu vou comer” (risos). Só isso. Mas, assim, foi diferente, ele ensinou, ele explicou como surgiu a gastronomia, a diferença da gastronomia nos países e tal. Ensinou técnicas, como media, como chamava os instrumentos, como lia uma receita, como fazia uma receita. É uma coisa básica, mas, sei lá, eu nunca me interessei. E eu achei que foi super legal, porque ele foi no bê-á-bá, entendeu? Ensinou passo a passo, ensinou de onde surgiu, pra quê servia. E tantas outras coisas: postura, limpeza, manter as unhas limpas, prender o cabelo, colocar toquinha, o porquê tinha que usar, essas coisas.
P/1 – Você já sabia cozinhar?
R – Não. Ah, sabia fazer ovo, miojo, esquentar leite (risos). Coisa básica.
P/1 – E você aprendeu um pouco mais depois do curso?
R – Eu aprendi. Eu tive mais noção. Eu comecei em casa fazer arroz, essas coisas. Porque até hoje eu não sou muito fã de cozinha. Eu estou fazendo Nutrição, mas eu quero trabalhar em hospital, na parte clínica. Mas foi bom, porque eu tive mais uma proximidade, porque eu não tinha noção nenhuma. E foi muito bom.
P/1 – E você tinha mencionado também de fotografia, foi no Arrastão?
R – Foi no Arrastão.
P/1 – Como foi? Conta um pouco.
R – Cada um ganhou uma câmera... Eu não sei qual era a instituição, mas cada um ganhou uma câmera... Não ganhou, era do Arrastão. E nós saímos, e ele falou assim: “Olha, tira foto de uma coisa que você acha legal. Uma coisa diferente. Assim, uma coisa comum, mas uma visão que ninguém está vendo, só você está vendo”. Então tiramos várias fotos. E depois eles mandaram as nossas fotos. E ele falou assim: “Olha, agora tem canetinha aí, vocês pintam uma coisa que seja a cara do Brasil”. Eu falei: “A cara do Brasil?”. Bom, aí vieram as fotos, eu peguei a foto de alguém, que eu não sei quem era, e tinha aqueles... Não sei onde era. Sabe a calçada preta e branca, vários quadradinhos assim? Aí eu pintei a bandeira do Brasil nos quadradinhos. E quando tinha as pessoas, eu não pintava as pessoas, só o chão mesmo. E escolheram a minha foto, publicaram lá na instituição. Nossa, eu fiquei superfeliz, me achando, né? (risos). Mas eu fiquei muito feliz. Eu achei muito legal isso. Eu falei: “Ah, eu quero fazer Rádio e TV, eu quero...”. Mas ainda não.
P/1 – E durante todo esse tempo, Taís, do ensino básico e do Arrastão, você trabalhou em algum momento além de estudar, ou você só estudava?
R – Não, eu só estudava. Eu estava fazendo o primeiro e o segundo ano. E também eu ganhava 60 reais por mês se eu não faltasse. E aí, nossa, ajudava bastante, eu até saía com o dinheiro. E depois de lá eles até indicava para as empresas, tal, mas eu comecei a trabalhar com o meu pai, depois trabalhei com a minha mãe. Depois trabalhei num restaurante também, que eu tive que sair. Não, me mandaram embora do restaurante, porque não estavam rodando os clientes e aí mandaram algumas pessoas embora, as que estavam em experiência. Como eu estava na experiência, me mandaram embora. Mas esse último emprego que eu saí foi porque eu estava com dificuldade em anatomia, e eu falei: “Mãe, e agora? Eu acho que eu vou reprovar”. Ela: “Não, então sai do emprego e fica estudando”. Eu saí, mas agora já estou procurando outro.
P/1 – O primeiro então foi com o seu pai, o seu primeiro emprego?
R – Foi.
P/1 – E o que você fazia com o seu pai?
R – Eu era auxiliar administrativo. Eu postava as coisas na internet, tirava foto dos produtos, postava na internet, atendia telefone, fazia ficha fiscal. Não. Ficha fiscal? Acho que é. Não.
P/1 – Nota fiscal?
R – Nota fiscal. É isso mesmo. Fazia nota fiscal. E eu fiquei quatro meses, porque eu não aguentei, porque o trabalho era na Penha e eu morava no Campo Limpo. E era muito, muito longe, aí eu não aguentei, falei: “Ai, pai, pelo amor de Deus, não aguento mais”. Aí eu saí. A minha mãe falou...
P/1 – Com que idade você estava nesse momento?
R – Ah, acho que eu estava com 18.
P/1 – Desculpa, e te interrompi, né?
R – Não tem problema.
P/1 – O que sua mãe falou?
R – Eu falei: “E agora, mãe?”. Ela: “Ah, não, fica sossegada, eu vou...”. Minha mãe decidiu abrir uma empresa, ela abriu uma loja que vendia alongamento, cabelo, aplique, acessórios, aí ela falou: “Não, aí você trabalha pra mim”. Eu falei: “Ah, está bom”. Nisso eu tinha saído do Arrastão, tinha acabado de sair. Eu estava muito triste, porque eu tinha saído da escola e do Arrastão, perdi todos os meus amigos, cada um escolhe um caminho diferente. Aí eu trabalhei pra minha mãe durante dois anos e meio nessa loja, estava fazendo ETEC, tanto que meu trabalho foi sobre a loja dela. Depois disso eu fiquei desempregada de novo, porque eu falei: “Ah, mãe, eu quero sair, eu quero um trabalho que ninguém me conheça, eu quero conhecer coisa nova, não sei o quê”. Aí eu saí. Meu primo falou que tinha uma pessoa precisando de hostess num restaurante, ele levou minha foto, ela falou assim: “Ah, pode trazê-la”. Eu fui, passei, fiquei morrendo de medo, falei: “Nossa, o que é isso?”. Eu comecei a trabalhar como hostess, mas ficou muito cansativo, porque eu tinha começado a faculdade, eu trabalhei... Eu acordava cinco horas, chegava a minha casa uma hora, muito tarde. Eu não conseguia dormir, não conseguia estudar, não conseguia fazer nada. E eu fiquei com medo de não passar, e no final eu falei: “Mãe, eu não aguento mais. Pelo amor de Deus, eu não aguento mais”. Ela: “Não, continua, você está ganhando bem, não sei o quê”. Eu falei: “Mãe, é sério. O que adianta ganhar bem e não ter saúde, não estudar, nada?”. Eu falei: “Quero sair”. No outro dia o gerente me chamou e falou que ia me mandar embora, eu e mais outras pessoas, porque não estava rodando e tal. Ai, graças a Deus. Aí eu saí (risos). Minha mãe falou: “E agora você vai procurar outro emprego, porque como você vai pagar a sua faculdade?”. E eu procurei, procurei, falei: “E agora?”. Falei: “Ah, mãe, já sei, vou trabalhar de telemarketing”. Ela: “Você está louca, telemarketing, não sei o quê”. Eu falei: “Ah, vou trabalhar de telemarketing. Ah, vocês ficam falando demais”. Aí eu fui. Menina, comecei a trabalhar, tudo bem, só que eu só oferecia o produto, se o cliente não queria, eu desligava. Tudo bem. Só que eu estava muito estressada, o dia inteiro falando, falando, ai meu Deus. Nossa, eu acordava, falava: “Ai meu Deus, tenho que trabalhar”. Eu ia pra faculdade, aí eu falei: “Eu não aguento mais”. Eu pedi as contas. E também porque eu ia mal na prova. Eu tinha que fazer cinco horas de laboratório e são três professores de Anatomia. E eu não tinha tempo pra fazer, eu trabalhava. Eu falei: “Mãe, pelo amor de Deus, eu preciso sair”. Ela falou: “Tá bom, Taís, então você vai só pra faculdade. Você não vai sair, não vai fazer nada, só vai pra faculdade”. Eu falei: “Ah, tá bom”. Aí eu saí. Faz um mês e pouco ou menos de um mês que eu saí. Aí eu estou aqui.
P/1 – E com o que você ganhou, Taís, nessa sua experiência profissional, mas passou já por vários lugares, com o que você recebia de salário, você comprou alguma coisa que você queria? Você lembra a primeira vez que você teve seu salário pra gastar o que você comprou? Ou se você juntou pra comprar alguma coisa que você desejava e não tinha?
R – Então, na verdade, olha, eu acho que fui muito boba. Eu gastei com coisa assim, comida, que eu amo comer, e comprei algumas roupas assim. Assim, uma coisa bem legal, eu não comprei nada. Nada. Ah, eu comprei uma blusa linda, muito cara, eu falei... Um vestido, meu Deus. Nossa, eu me arrependo até de lembrar. Mas valeu a pena, era pra trabalhar. Mas assim, pra mim mesmo, pra eu usufruir, que eu queria, não comprei nada assim legal.
P/1 – As roupas.
R – É (risos). As roupas. Acho que só. Eu guardei dinheiro, consegui pagar dois meses da minha faculdade seguidos assim, aí eu fiquei meio parada. Acho que isso foi legal, de eu ter guardado pra eu conseguir pagar a faculdade. Acho que só.
P/1 – Queria saber assim de você qual você acha que foi a importância do Arrastão pra você, pra sua vida.
R – Olha, o Arrastão, como eu disse, ele foi uma porta abençoada pra mim. Foi uma porta que abriu minha mente, meu horizonte. Mostrou-me que eu poderia ser uma pessoa além... Não é porque eu nasci num lugar pobre que eu tenho que ser pobre para o resto da vida. Não é porque a minha condição é essa, não é uma condição tão boa, não é um condição elevada, que eu tenho que ser assim para o resto da vida. Ele me mostrou que eu posso ser mais, eu posso ajudar o próximo, eu posso ir além do que eu sou, entendeu? Eu posso fazer amigos, posso ser feliz com o que eu tenho ali, entendeu? Brincar. Eu acho que o Arrastão me ajudou assim, grande parte do que eu sou, uma boa parte foi no Arrastão. Conversar, lidar com as pessoas. Não sei, eu acho que ali foi onde eu aprendi a começar a saber me expressar, saber a falar com as pessoas, saber falar o que eu quero, mostrar que eu também sei, eu também posso, não é só ele, todo mundo pode, todo mundo é igual. Então eu acho que o Arrastão é isso. Que o Arrastão, na verdade, o significado do Arrastão é um peixinho, e aí no mar tem uma correnteza... Não sei se é correnteza. Tem uma coisa que se chama arrastão. E o arrastão leva todos os peixes, grandes, pequenos. Então acho que é isso, o Arrastão é um empurrão pra todos os peixes, grandes, pequenos, todo mundo. E acho que o Arrastão é isso mesmo, um empurrão pra todo mundo.
P/1 – O que você sabe do Criança Esperança, Taís? Você conhece o Criança Esperança? O que você sabe do projeto?
R – Então, eu conheço. Eu não conheço, eu assisto na TV, sei que foi o que ajudou o curso de Gastronomia no Arrastão pela Unesco, tinha até um símbolo lá na parede da cozinha. E eu sei que ajuda muitas crianças, muitas ONGs, instituições. Eu acho isso. Eu sei que eles arrecadam dinheiro pra ajudar as pessoas que participam dessas instituições. Mas assim, afundo mesmo, eu não sei.
P/1 – E disso que você sabe, qual você acha que é a importância de um projeto como o Criança Esperança e de um trabalho como o Arrastão, que o Arrastão faz? Você falou um pouco da importância pra você, mas de uma maneira assim geral, qual você acha que é a importância desse projeto?
R – Olha, eu acho o Criança Esperança. Eu achava que era mentira, na verdade, quando eu era pequena. A minha avó: “Ah, isso é mentira, esses caras só querem dinheiro, não sei o quê”. Eu: “Ah, eles querem dinheiro”. Eu repetia, eu era pequena. Mas não, ao contrário, é muito importante, sabe? Tanto de dinheiro que eles arrecadam, eu acho até que é pouco pelo tanto de instituições que eles ajudam. A cozinha onde eu fazia meu curso era excelente, tinha tudo do bom e do melhor, não faltava nada. E eles realmente ajudaram, não só a mim, tantas outras pessoas. Meus amigos, eu vejo no Face, alguns até... Não estão trabalhando especificamente na área de gastronomia, mas estão trabalhando e eu acho que isso foi muito importante, porque são pessoas que não tinham estrutura pra estarem onde estão, entendeu? Não tinha... Assim, acho que se não fosse o Criança Esperança, se não fosse o Arrastão, acho que a gente, sei lá, ia ficar na mesma, não ia sair do lugar. Então eu acho muito importante essa coisa deles ajudarem, de ajudarem as instituições, porque realmente existem pessoas que não têm condições, não sabem porque tem que estudar, porque nós temos que crescer, porque nós temos que ajudar o próximo pra que a nossa sociedade cresça, pra que todo mundo fique bem. Então eu acho muito importante esse negócio de o Criança Esperança ajudar as instituições, as ONGs.
P/1 – Tá bom, Taís. Eu vou encaminhar agora para o final da nossa entrevista.
R – Tá.
P/1 – Tem duas questões finais. Antes de fazer essas perguntas pra você, eu queria saber se você quer dizer alguma coisa que eu não tenha te perguntado e você gostaria de deixar registrado.
R – Não. Acho que não. Acho que eu falei tudo. Acho que eu falei até demais (risos).
P/1 – Não faltou nada, você acha?
R – Eu acho que não.
P/1 – Ah, tem uma pergunta, lembrei, que eu quero te fazer. Na sua vida, até esse momento, você teve algum relacionamento, alguma pessoa importante mais nesse lado afetivo, um primeiro amor?
R – Ah... Ah, não, acho melhor eu não falar isso, não (risos). Porque na verdade... Olha, isso vocês não colocam, tá? (risos).
P/1 – Você não pode falar?
R – Não, é porque assim, na verdade era um menino lá do Arrastão e ele gostava muito de mim, só que eu não gostava dele, eu gostava dele como amigo. Eu falei assim: “Ah, eu vou namorá-lo, eu vou gostar dele”. Só que eu não gostei dele. E aí foi muito difícil. Eu falei: “Meu Deus do céu”. Eu falei: “Ah, a gente não pode namorar, você nem me pediu em namoro”. Aí ele ajoelhou: “Ah, você quer namorar comigo?”. Eu fiquei muito mal, não sabia como falar “não” pra ele. Eu dei só um beijo nele, eu fiquei com nojo, porque eu não gostava dele. E a gente terminou o curso, ele ficou triste comigo, a gente infelizmente foi da mesma sala até o final do ano, ai meu Deus. Mas assim, acho que ele nem gosta de mim, acho que ele me odeia. Sério (risos).
P/1 – E alguém que você tenha se apaixonado pela pessoa?
R – Ah, não, melhor a gente não por isso, não. Eu vou ficar morrendo de vergonha.
P/1 – Não tem problema. Se não quiser falar, não tem problema.
R – Tá.
P/1 – Então eu vou fazer as duas perguntas finais, a primeira é: quais são seus sonhos hoje?
R – Bom, hoje meu sonho é concluir a faculdade e ter uma casa, ter filhos, ver a minha mãe bem, dar uma casa, vê-la bem, chega de trabalhar. E ver meus irmãos bem também, concluir a faculdade, ter a casa deles, a vida deles. Acho que meu sonho é só estar estabilizada, entendeu? E ajudar seja quem for, que foi isso que eu aprendi.
P/1 – E como foi contar a sua história? Como foi dar o depoimento aqui pra gente hoje?
R – Nossa, foi legal. Eu achei que, sei lá, fiquei com medo, mas foi bem legal. Gostei.
P/1 – Tá bom. Então a gente encerra aqui. Obrigada, viu, Taís?
R – Imagina.
FINAL DA ENTREVISTA