Lediane ainda pequena, acompanhava a mãe na roça. Cedo sua avó profetizou que ela seria professora, dado o gosto pelos estudo. Apesar das dificuldades econômicas e geográficas formou-se em Pedagogia, e inseriu-se na rede de ensino. Encontrou uma escola com sinais de desgaste e lixo acumulado, até incluir-se num projeto com foco na coleta de lixo e meio ambiente. A mobilização foi além da escola, o que a levou pensar que a criança é como uma semente: o que aprende na escola ela vai passando e transformando a realidade.
P/1 - Poderia confirmar o nome, local e data de nascimento?
R – Lediane Seguetto Fiorini. Nasci em 13 de junho de 1979, na cidade de Putinga.
P/1 – Putinga finca onde?
R – Putinga é um município. Como é que vou dizer? Faz divisa com Fontoura Xavier, mas desce. Como vou explicar?...
P/1 – É perto?
R – É perto! Faz divisa com Fontoura Xavier. É mais para baixo. Pegando...descendo a estrada que passa aqui no Colégio, sabe? Vai ter um rio. A calha que tinha ali é onde faz a divisa. O próximo município é Putinga.
P/1 – Onde passou a infância?
R – Numa comunidade pequena que fica logo abaixo daqui, a Santa Catarina.
P/1 – Como era esta comunidade?
R – Era um lugar pequeno. Uma comunidade pequena. Escola pequena. Na época, era um professor que atendia a todos os alunos. A comunidade era bem pequena e também bem unida. Eu gostava de morar ali. Gostei muito da minha infância.
P/1 – Lediane, sabe a origem da tua família?
R – Sim. O meu pai é de origem italiana. A minha mãe é brasileira.
P/1 – O teu pai nasceu na Itália?
R – Não, não. Acredito que...não sei bem em relação ao pai dele. Não sei se o pai dele veio de lá. Sei que o meu pai é de origem italiana.
P/1 – E você sabe alguma coisa dos teus avós?
R – Quase não tive convivência. A minha nonna (avó) faleceu antes de eu nascer e daí o meu nonno (avô) continuou morando lá depois que nos mudamos. Daí, não tive muita convivência.
P/1 – Você tem irmãos?
R – Tenho.
P/1 – O que eles fazem?
R – A minha irmã é professora e trabalhamos na mesma escola. O meu irmão é pedreiro.
P/1 – Você passou a infância na comunidade Santa Catarina?
R – Uhum.
P/1 – O que lembra desta fase, nesta comunidade?
R – Lembro que a gente morava perto dos meus avós - os pais da minha mãe. Gostava muito deles! Desde cedo, eu ajudava o meu pai e a minha mãe na roça. Antigamente, as coisas eram mais difíceis. Como eu era a filha mais velha, tinha que ajudar. Nos finais de semana, a gente se reunia com os amigos para brincar. Na verdade, como a comunidade era pequena, éramos todos parentes.
P/1 – Como você ajudava os seus pais
R – Na época, a gente plantava até trigo, né?. Trigo, milho, feijão. Estas coisas. Eu ajudava, quando… na verdade, eu ajudava depois de um pouquinho mais grande. Como a minha mãe não tinha com quem me deixar, eu ia para a roça. Ficava na sombra com eles pra não ficar sozinha em casa.
P/1 – Na sua casa existiam aqueles costumes fortes da cultura italiana?
R – Quando reunia a família do meu pai, que tinha alguma festinha ou coisa do tipo, eles gostavam muito de cantar em italiano.
P/1 – Que cantoria faziam?
R – Eu lembro da La verdinela, mas não sei cantar.
P/1 – Você recorda de entender a letra?
R – Não entendia muito o que falavam. Daí, tinha os filhos que, depois de casados com as brasileiras, passaram a falar uma mistura de português com italiano. Falavam meio que misturado e eu não conseguia entender.
P/1 – Do que vocês brincavam aos finais de semana?
R – Pular corda, roda cantada.
P/1 – Roda cantada?
R – Aquela que tem uma musiquinha: Roda cotia, de noite, de dia. Sabe? Também tinha as brincadeiras do ovo choco e a de pular corda. Estas coisas.
P/1 – Tinha alguma coisa, assim, que imaginava ser?
R – Eu não tinha muita imaginação sobre o que gostaria de ser. Mas, a minha avó dizia, desde que eu era pequena, que eu seria professora. Devido as minhas mãos...eu tinha os dedos meio grandes [risos]. Ela sempre falava que eu seria professora e eu nem pensava nisto.
P/1 – Por que ela pensava assim? [risos]
R – Não sei. Eu acho que… assim, ela notou que entre todos os netos era eu quem levava os estudos mais a sério. Os outros pararam bem mais cedo e eu continuava. Eu continuei a estudar.
P/1 – E você gostava?
R – Eu gostava de estudar.
P/1 – Você lembra de ir à escola? Como foi?
R – Dalí... há um tempo...a gente se mudou pra uma comunidade mais perto: a Linha Silveira. Colégio maior. Eu vim estudar ali. Gostava muito de estudar ali. Vinha uma professora e eu continuei estudando. Quando terminei o primeiro grau, tinha que estudar em Fontoura (município vizinho). daí, eu lembro que na época a gente não tinha transporte. Eu parei numa casa de família pra continuar os estudos. Aí, quando normatizou tudo, eu voltei pra casa e continuei estudando. Sempre gostei de estudar. Os meus pais sempre me incentivaram muito.
P/1 – Como foi? Vieram pra Fontoura?
R – Não. Este lugar, onde eu morava, não é Fontoura Xavier. A gente só se mudou pra uma comunidade mais perto da cidade, que é a Linha Silveira e e que também é próxima da comunidade São Roque, que é onde a gente tá (local da entrevista).
P/1 – A escola ficava longe?
R – Da minha casa? Quando eu me mudei? Não era perto.
P/1 – Como foi parar numa casa de família?
R – Quando eu fui fazer o segundo grau em Fontoura, eu tive que morar numa casa de família em Fontoura daí, porque o transporte é longe. Daqui, se eu não me engano, dá 12 quilômetros.
P/1 – Tem memórias da escola? Alguma professora marcante?
R – Com certeza! Eu gostava de estudar. O meu professor do primeiro ano ... acho que uma professora que a gente nunca esquece é a Fabi. Por quê? Como eu estava numa outra comunidade, era um professor. E eu não sei como era na época, mas eu nunca passava de ano [risos]. Continuava sempre na mesma série. Aí, eu vim ali e a professora Fabi falou: ‘Ó’, tu passou pra tal série!. Então, foi uma coisa que me marcou bastante.
P/1 – Você tinha amigos na escola?
R – Sim, tinha amigos.
P/1 – Teve alguma experiência marcante no período da escola?
R – Não, não que eu lembre assim.
P/1 – Como foi morar numa casa de família?
R – Na casa onde parei eu tinha que fazer de tudo, né? Limpar a casa, lavar a roupa, fazer o almoço. Deixar tudo pronto pra daí de tarde eu ir pra escola. Quando eu chegava aí de tarde, eu tinha que ajeitar todas as coisas pra não ficar com muita coisa pra fazer na manhã do outro dia - pra eu conseguir ir de novo pra escola.
P/1 – E eles apoiavam o seu estudo?
R – É. Era um trato feito com meu pai. Eu trabalhava pra estudar na verdade. Era bem puxado na época.
P/1 – Os seus pais incentivaram?
R – Sim, sempre me incentivaram.
P/1 – E os seus irmãos?
R – Os meus irmãos também estudaram. A minha irmã tá fazendo faculdade, o meu irmão tem o segundo grau.
P/1 – O que mudou da infância à juventude?
R – Ah, bastante coisa mudou [risos]! Bastante! Na infância, as coisas eram
mais difíceis e agora é bem mais fácil. Teve uma mudança grande, sabe?
P/1 – O que gostava de fazer quando era mocinha?
R – Nos finais de semana, a gente vinha na igreja. Minha família é católica. Todos os finais de semana. A gente ficava no campo, que tinha ao lado da igreja, jogando bola e conversando. É isso que a gente fazia.
P/1 – Você é casada?
R – Sim.
P/1 – Como conheceu o esposo?
R – Conheci ele numa festa junina [risos], lá na comunidade Linha Silveira.
P/1 - Faz tempo?
R - 11 anos vai fazer no dia 30 de junho.
P/1 - Você tem filhos?
R - Sim, uma menina de dez anos.
P/1 - Como foi o dia do casamento?
R - Foi...como vou dizer? Foi bom! Acordei feliz [risos]. É uma coisa que a gente não sabe explicar, porque a emoção é tão grande que você não sabe descrever. Foi a realização de um sonho na verdade.
P/1 - O que vocês fizeram? Teve alguma coisa?
R - Assim… a gente casou. A gente só fez uma janta para os padrinhos. Eu me vesti de noiva, ele com todos os trajes normais, né? Mas… a gente optou por fazer só uma janta com as testemunhas e com a família mesmo. Foi pequena a festa, mas tava muito bonita.
P/1 - Qual foi o seu primeiro trabalho, sem contar a casa de família?
R - Eu comecei a dar aula e no início com os contratos nas comunidades. O que o nosso município tem emergencial, daí, contratam a gente no início do ano e vai até terminar as aulas. Eu fui trabalhando assim, até sair o concurso. daí, eu já sou concursada. Sou nomeada.
P/1 - Você fez faculdade? Como foi?
R - Terminei a faculdade, iniciei uma pós-graduação mas parei agora.
P/1 - Que faculdade fez?
R - Fiz pedagogia e a pós era em gestão escolar.
P/1 - O que a motivou por Pedagogia?
R - Assim, eu já tinha o magistério e a pedagogia foi pra ter mais suporte no trabalho em sala de aula, pra eu saber mais como lidar com as crianças. Depois que comecei a fazer eu me identifiquei bastante. Eu gostei e acho que é uma das coisas que todo o mundo deveria fazer. Ela é fundamental. Clareia bastante a gente.
P/1 - Na época da faculdade, teve algo que te marcou?
R - Sim, o meu trabalho de conclusão. Ele deixa a gente muito nervosa [risos]. Muito! Porque ele é tudo ou nada na verdade. É onde a gente vai mostrar se realmente conseguiu aprender. Mas eu - graças a Deus! - consegui. Deu tudo certo! Mas...me marcou muito. Eu lembro que quando eu tava fazendo, assim o nervosismo era tão grande que eu não sabia se fazia ou se chorava. É complicado.
P/1 - Ficou feliz como resultado?
R - Meu Deus! Fiquei muito feliz [risos].
P/1 - Voltando ao seu trabalho, como você começou a dar aula aqui?
R - Eu fiz o concurso do município.
P/1 - Como era a escola quando começou a trabalhar?
R - Era bem diferente [risos].
P/1 - Descreva o diferente?
R - Tudo! A escola, o espaço físico. Ela era… na verdade... assim...era uma coisa que você chegava e não se sentia muito bem, porque ela tava deixada de lado. No início eu até conversei com a diretora, pra gente tentar fazer alguma coisa mas, segundo ela, elas já tinham tentado e não adiantava. Continuava daquele jeito. Era bem feia, na verdade. São as palavras: bem feia [risos].
P/1 - Quais eram os problemas?
R - Um dos maiores problemas que tinha era o lixo. Por exemplo, a gente tinha que guardar o lixo no banheiro porque não tinha coleta. Era entulhos de lixo.
P/1 - Qual era o sentimento ao chegar na escola?
R - Tanto fazia se era de manhã ou de tarde. O sentimento que a gente tinha era de desânimo, na verdade. Desde o primeiro dia que eu cheguei, eu já sentia as pessoas meio desanimadas, sabe?.
P/1 - Você pensava que poderia…
R - Eu pensava que poderia mudar, mas daí como se passou uns anos e continuava daquele jeito...eu já tava acreditando que ia continuar assim. A diretora mesmo falava: Não adianta tentar fazer alguma coisa, a gente já tentou e é assim.
P/1 - O que você pensava em fazer?
R - Sei lá! Eu tinha sugerido na época de a gente fazer uma festa junina pra comprar alguma coisa pra escola, ou pra mudar a pintura. Essas coisas assim que uma escola pode fazer.
P/1 - Nunca conseguiram fazer?
R - Dali um tempo, a gente fez uma festa assim, mas já tinha iniciado o projeto Minha escola, meu futuro.
P/1 - Qual a primeira impressão que teve, com a vinda do Projeto?
R - A minha primeira impressão: eu fiquei muito apreensiva. A gente não sabia o que vinha. Tudo que é novo a gente fica preocupada. Tá aí a minha questão: a minha vontade de mudança. Mas...eu não sabia a que ponto ia ser. Um projeto novo; expectativa grande; ao mesmo tempo o pé atrás. Depois que foi apresentado, a gente viu que era maravilhoso.
Assim, sempre que a gente vai fazer um projeto na escola, a gente pensa primeiro na realidade do nosso aluno, pra depois partir pra globalização. E esse projeto veio bem ao encontro da nossa realidade, porque uma das questões era o lixo. Aí, quando o projeto chegou e a gente começou a trabalhar, logo em seguida a gente ficou mais feliz.
Ainda porque ele não ficou só na escola, ele estendeu pra comunidade. O caminhão do lixo que não passava, começou a passar de 15 em 15 dias. As famílias - se vocês derem uma voltinha aqui, vão perceber ao redor -, cada uma construiu a sua lixeira. Então, isso facilita a coleta de lixo.
Um dos problemas que tínhamos na escola terminou.
P/1 - Teve participação direta?
R - Sim. daí, o pessoal veio e conversou conosco. Eles conversaram na sala, com os alunos e tal. Depois nós colocamos em prática.
P/1 - E como você participou?
R - Conversando com os alunos. Conscientização. Explicando pra eles como é que ia ser desenvolvido. Depois, a gente viu que deu certo porque daí o Projeto se espalhou na comunidade inteira. Então, acho que a participação da gente deu certo.
P/1 - Como os alunos receberam essa ideia? Recorda?
R - Sim. Bem...uma das preocupações é: Como é que eles ‘iam’ receber?. Mas, não teve problema nenhum. Foi bem recebido.
P/1 - Vocês já tinham trabalhado com a reciclagem? Conheciam?
R - Não.
P/ 1 - Não conheciam?
R - Não.
P/1 - Como tomaram conhecimento da coleta seletiva?
R - dai, na verdade, o projeto teve uma parceria do BRF (Multinacional brasileira do ramo alimentício) e da Prefeitura (Fontoura Xavier). A gente foi conversar com o pessoal da Prefeitura e eles, daí se comprometeram a mandar o caminhão para coletar o lixo. A BRF deu as lixeiras pra nós - aquela que é separada - e foi quando as crianças, com a separação do lixo, aprenderam. Agora, estão habituadas a colocar o lixo separado.
P/1 - O que você sente quando uma criança separa o lixo?
R - Muito feliz! Vejo que o projeto tá dando certo.
P/1 - O que mais de positivo o trabalho trouxe à comunidade? Mora aqui?
R - Muita coisa! Assim, vocês não chegaram a conhecer a escola antes. Como eu falei, não tinha como explicar. Agora, ela se transformou. Ela é um lugar onde tu chega e se sente bem. Ela é um lugar aconchegante. A gente vê os alunos andando com os olhinhos brilhando. Eles tem os brinquedos bons pra brincar. Então, a gente se sente motivado. A comunidade inteira ficou muito feliz.
P/1 - Parece que teve a ação coleta de entulho. Você participou?
R - Isso. A gente passou nas casas. Como falei, a gente falou com os alunos e tudo o que aprenderam na escola passaram. A gente passou nas casas para ajudar na coleta, só que a maioria do pessoal - como já estavam por dentro do assunto - já tinham feito a separação. Já tava tudo ensacadinho e era só a gente trazer até o lugar destinado; onde tínhamos combinado. Todo mundo ajudou!
P/1 - No ponto de vista de uma pedagoga: o que pensa sobre a atitude da criança levar o que aprendeu na escola para a casa, ensinar a família?
R - Ótimo! Acho ótimo! É sinal que ela vem na escola e que prestou atenção naquilo que aprendeu. Ela não segurou pra ela, passou pra família. E, com certeza, quando ela conversar com os amigos, ou com alguém, vai passando. Tanto que o projeto já não tá só na nossa comunidade. Tem mais gente perguntando, gente do município inteiro. Até teve uma reunião de núcleo com a comunidade vizinha e que a nossa coordenadora pediu pra gente passar o Projeto. A criança é assim: uma sementinha, que passa as coisas. Tudo o que eles aprenderam eles vão passando. Então, acho muito importante isso.
P/1 - A sua filha estuda aqui?
R - Sim.
P/1 - Ela também participou? Como foi a aprendizagem?
R - Sim, ela participa na escola. Digamos, quando a gente tá indo pra casa - ou no transporte público, ou caminhando - e ela vai comendo alguma coisa, ela não joga o lixo no chão. Ela pega e me dá pra guardar, pra eu chegar em casa e jogar no lixo. Ela não joga nada no chão. Ela ficou bem.
P/1 - O que o seu marido pensa de você estar envolvida neste projeto?
R - Ótimo! Acha ótimo! Na verdade, este projeto tem a questão dos 5S's (Senso de utilização; senso de organização; senso de limpeza; senso de padronização; senso de disciplina) e que lá em casa também tem, porque a gente tá integrando a BRF lá também [risos].
P/1 - O seu marido também?! [risos]
R - Sim! Ele também passa por avaliação lá. [risos]
P/1 - E o quê realmente te motivou a participar?
R - Achei o projeto maravilhoso! Vi que nele estava a chance de nós mudarmos a escola; ficar melhor. Fiquei bem motivada e...como vou explicar? Resolvi pegar junto. O que precisassem de mim, eu tava disponível pra fazer.
P/1 - O que fez exatamente?
R - Ajudei no que foi necessário, né? No desenvolvimento do projeto, na conversa com os alunos, com a comunidade, enfim.
P/1 - A comunidade aceitou bem?
R - Sim. Um dia, nós passamos nas casas para comunicar a reunião de apresentação do projeto. Ela seria no salão da comunidade, né? E a gente pode perceber a aceitação deles. Assim, eles ficaram felizes.
P/1 - Vocês ensinaram outras coisas? Escovação dentária? Como foi?
R - Foi bom porque eles já pegaram o hábito. Eles comem a merenda e vão direto pro recreio porque às vezes eles trazem outra merendinha. Depois, eles vão escovar os dentes. daí a escola tá tendo, também, acompanhamento do dentista que agora vem uma vez por mês.
P/1 - E a horta? Você participou?
R - Sim.
P/1 - Conta um pouco.
R - Cada canteiro é uma turma que cuida. Eles que plantaram e eles que estão cuidando.
P/1 - E como as crianças…
R - Fazem a limpeza. Eles adoram ir lá. Adoram cuidar.
P/1 - Cada um vai e cuida do que plantou?
R - É. Digamos, assim, o quarto ano foi - a turminha deles, né? - e plantou aquele canteiro de alface. Eles são responsáveis por cuidar, limpar e regar. Quando deu a seca, eles que molhavam tudo. Tá tudo com eles. Eles eram os responsáveis por aquele canteiro.
P/1 - O que acontece com os produtos da horta?
R - A gente utiliza na merenda escolar.
P/1 - Eles sabem o que estão comendo?
R - ...o que eles ajudaram a plantar.
P/1 - O que demonstram quando percebem que comeram o alface que plantaram?
R - Eles gostam. Nem era muito aceito, essas coisas, na merenda escolar. Hoje, eles comem direitinho. Eles gostam. É bem aceito. É uma coisa que eles sabem que foram eles que plantaram e que tão ajudando a cuidar.
P/1 - Você acha que o projeto chamou a atenção para outros lugares?
R - Com certeza! A secretária falou que a próxima reunião de diretores vai ser aqui na escola, pra eles verem o que aconteceu. A gente vai mostrar a mudança que teve aqui na escola, pra eles saberem um pouco a respeito do projeto e pra levarem a ideia pra escola deles.
P/1 - Sente que estão servindo de exemplo?
R - Com certeza.
P/1 - As outras escolas da região procuram sempre informações?
R - Com certeza. Eu acredito que a reunião vai ser com os diretores, porque os diretores daí passam pros demais professores.
P/1 - Tem colegas professoras, de outras escolas, que perguntam?
R - Sim.
P/1 - O que elas querem saber? O que perguntam?
R - Elas querem saber: como é que foi a mudança?; de que forma aconteceu? e quem teve a iniciativa?.
P/1 - Elas querem trabalhar aqui?
R - Com certeza [risos].
P/1 - O que você responde? [risos]
R - Aconteceu, agora esse ano (2012), que tinha uma colega minha que queria vir trabalhar aqui. Perguntou como poderia fazer e eu falei que isso depende da secretária e se tem vaga. No caso, nós aqui, no momento, não teria. Depende.
P/1 - Dentro de todo o processo de reformulação, teve alguma história ou experiência que te marcou?
R - A experiência que me marcou foi o dia que veio o caminhão carregar o lixo e que na verdade, não tenho certeza, foram dois ou três caminhões de carga. Carga que levaram de lixo, do tanto que tinha [risos]. Uma coisa que pra mim foi bem marcante.
P/1 - Como se sente ao olhar pro entorno da escola e para a comunidade?
R - Não dá nem pra acreditar no que aconteceu. Se você viesse aqui antes? Pra ter uma noção, esse mato que tem aqui atrás da escola o lixo todo era jogado. Ali dentro. Agora, ele tá todo limpinho, todo cuidadinho.
P/1 - O que você aprendeu com tudo isto?
R - Muita coisa! Muita coisa, bah!
P/1 - Por exemplo?
R - Por exemplo, trabalhar com os meus alunos e trabalhar por mim. A questão da ordenação, da organização, que às vezes falta. A gente sendo organizada, em qualquer lugarzinho, a gente consegue colocar um monte de coisa. Aprendi bastante coisa.
P/1 - Já tinha experiência com trabalho voluntário?
R - Não.
P/1 - O que pode ser feito a mais? Tem algum projeto que queira continuar, ou aplicar aqui na escola? Em termos de melhoria?
R - Com certeza! A gente sempre pensa em melhoria. Uma coisa que a gente gostaria é que o projeto continue aqui na escola, porque é maravilhoso.
P/1 - Você acredita que já estão com o conhecimento suficiente para poder tocá-lo sozinhos? Até ensiná-lo às outras escolas?
R - Acredito que a gente tenha o conhecimento, mas a orientação nunca é demais. Principalmente, vindo de pessoas que tão acostumadas a lidar com situações assim.
P/1 - Tem algo que não perguntei e que gostaria de comentar?
R - Eu gostaria de dizer, assim, que o projeto é maravilhoso. Eu adorei trabalhar junto. No início, a gente ouvia falar que vinha o pessoal da BRF e eu ficava um pouco nervosa mas, aos poucos, a gente foi se tornando grandes amigos. O projeto foi bom, é bom e está continuando. Tomara que continue, porque é maravilhoso!
P/1 - O que você sente que mudou na vida dos alunos?
R - A atitude deles, como falei. O jeitinho e o cuidado que eles tem. Um fica corrigindo o outro. Por exemplo, na questão da correção. Se um deles tá comendo uma bala, esquece e larga o papelzinho no chão. O outro diz: ‘Ó’, faz favor! Vai juntar a ‘casca’ da tua bala!. Então, mudou bastante.
P/1 - Puxando na memória: a escola de antes, a escola de agora.
R - Uma transformação total [risos]. Não tem nem comparação.
P/1 - Muito obrigada pela entrevista.
R - Eu que agradeço [risos].
---FINAL DA ENTREVISTA---
Instituto BRF - Pequenas atitudes fazem a diferença (PAFD)
Pedagoga e educadora ambiental
História de Lediane Seguetto Fiorini
Autor: Museu da Pessoa
Publicado em 15/05/2020 por Jader Chahine
Projeto Pequenas Atitudes Fazem a Diferença - Instituto BRF
Realização Museu da Pessoa
Entrevistado por Stela Tredice
Depoimento de Lediane Seguetto Fiorini
Fontoura Xavier, 21 de Junho de 2012
Código: PAFD_HV04
Transcrito por Marcia Fernandes/MW Transcrições (Mariana Wolff)
Revisão por Esalba Silveira
P/1 – Então, eu queria que você começasse com seu nome completo, o local e a data do seu nascimento, que você nasceu?
R – Lediane Seguetto Fiorini, eu nasci no dia 13 de junho de 1979, em Putinga.
P/1 – Putinga fica aonde?
R – Putinga é um município – como é que eu vou dizer – faz divisa com Fontoura Xavier, mas desce – como vou explicar assim?
P/1 – É perto?
R – É perto, faz divisa com Fontoura Xavier. É mais pra baixo, pegando, descendo a estrada que passa aqui no Colégio vai ter um rio e tinha uma a calha onde faz divisa, o próximo município é Putinga.
P/1 – E você passou a sua infância aonde?
R – Na comunidade pequena que tem mais pra baixo que é a Santa Catarina.
P/1 – Tá. E como é que era esse lugar na sua infância?
R – Era um lugar pequeno, uma comunidade pequena; escola pequena também – na época era um professor que atendia todos os alunos, – Meu Primeiro Professor era o nome. E a comunidade era bem pequena, mas era bem unida. E eu gostava de morar lá, gostei muito da minha infância.
P/1 – E os seus pais, a origem da sua família você sabe, Lediane?
R – Sim, meu pai é de origem italiana; minha mãe é origem brasileira.
P/1 – Seu pai ele nasceu na Itália?
R – Não, não; eu não sei que relação o pai dele tinha, eu não sei essa relação assim; mas eu sei que ele é de origem italiana.
P/1 – E os seus avós, então, você sabe alguma coisa deles?
R – Eu, os meus nonos, na verdade, os pais do meu pai eu quase não tive convivência com eles porque eles, a minha nona faleceu antes de eu nascer e daí o meu nono depois continuou morando lá. E a gente se mudou, daí eu não tive muita convivência com ele.
P/1 – Você tem irmãos?
R – Tenho.
P/1 – Quê que eles fazem?
R – A minha irmã é professora, trabalha aqui na mesma escola que eu e o meu irmão é pedreiro.
P/1 – Então, você passou a sua infância nessa comunidade lá?
R – Uhum.
P/1 – E assim, que vocês faziam que você se lembra desse momento da sua infância nessa comunidade?
R – Eu me lembro que a gente morava perto dos meus avós, os pais da minha mãe, gostava muito deles. E eu ajudava o meu pai e a minha mãe a trabalhar na roça desde muito cedo porque era mais difícil, né? Antigamente as coisas eram mais difíceis e como eu era a filha mais velha eu tinha que ajudar. No final de semana a gente se reunia pra brincar com os amigos, que na verdade como a comunidade era pequena era todos os parentes. Então a gente se reunia pra brincar, pra fazer brincadeiras.
P/1 – Como você ajudava os seus pais?
R – Na época a gente plantava até trigo, né? Trigo, milho, feijão, essas coisas assim. Na verdade eu ajudava depois de um pouquinho maior. Mas antes, como a minha mãe não tinha com quem me deixar eu ia pra roça, e ficava lá na sombra com eles pra não ficar sozinha em casa.
P/1 – E sempre tinha assim costumes fortes da cultura italiana na sua casa, na sua família?
R – Quando se reunia a família do meu pai e que tinha alguma festinha, ou alguma outra coisa eles gostavam muito de cantar italiano, sabe?
P/1 – Que cantorias que vocês faziam lá na sua casa?
R – Ah, eu lembro só que eu não sei cantar, né? A Verdinela eu não sei cantar, mas eu lembro que eles cantavam.
P/1 – Eles cantavam em italiano?
R – Em italiano.
P/1 – E você lembra se você entendia assim?
R – Não, eu não entendo muito porque, assim como eles falavam em italiano, tinham os filhos deles que eram casados com as mulheres brasileiras; daí um pouco eles falavam meio misturado e eu não conseguia entender.
P/1 – Certo. Você falava que nos finais de semana você gostava de brincar com os seus primos, seus amigos?
R – Uhum.
P/1 – Quê que vocês brincavam?
R – Pular corda, de rodas cantadas.
P/1 – Que brincadeira é essa?
R – Rodas cantadas é que nem aquela musiquinha: “Roda cotia, de noite e de dia”, sabe?
P/1 – Uhum.
R – Ovo choco e pular corda, essas coisas.
P/1 – E tinha alguma coisa assim que você imaginava que quando crescesse você gostaria de ser, Lediane?
R – Na verdade, eu mesma não tinha muita imaginação do que eu gostaria de ser, mas a minha avó dizia desde pequena que eu ia ser professora, devido às minhas mãos que eu tinha os dedos um pouco grande [risos]. Ela sempre falava que eu ia ser professora, mas eu não pensava isso.
P/1 – [risos] Por que ela via, por que você acha que ela via?
R – Não sei, eu acho que ela notou que entre todos os netos dela, a que levava os estudos mais a sério era eu porque os outros pararam bem mais cedo. E eu continuava, continuei estudando.
P/1 – E você gostava?
R – Eu gostava de estudar.
P/1 – E como é que foi a sua ida na escola, você se lembra da escola?
R – Aí dali a um tempo a gente se mudou pra uma comunidade mais aqui perto – é a Linha Silveira – colégio maior, eu vim estudar ali, gostava muito de estudar ali. Ali vinha uma professora e eu continuei estudando. E quando terminei o primeiro grau naquela escola, tive que estudar em Fontoura Xavier; eu lembro que na época a gente não tinha transporte, eu parei numa casa de família pra continuar meus estudos. Aí quando normalizou tudo eu voltei pra casa e continuei estudando, sempre gostei de estudar. E meus pais me incentivavam muito.
P/1 – Como que foi então, vocês vieram pra Fontoura e aí?
R – Não, esse lugar onde eu morava não era Fontoura Xavier. A gente só se mudou pra uma comunidade mais perto da cidade que é a Linha Silveira, que é próximo da Comunidade São Roque, que é onde a gente está.
P/1 – Mas a escola ficava longe?
R – Da minha casa quando eu me mudei, não, era perto.
P/1 – E aí como é que você foi pra uma casa de família?
R – Não, quando eu fui fazer o segundo grau, em Fontoura Xavier, eu tive que morar numa casa de família lá em Fontoura.
P/1 – Tá.
R – Porque precisa de transporte, é longe; daqui dá 12 quilômetros, se eu não me engano.
P/1 – Mas ali na sua infância que experiências que você tem, que memórias que você tem sua escola, tem alguma professora que foi marcante pra você?
R – Com certeza, teve; eu gostava de estudar. O meu professor do primeiro ano, eu acho, que é uma professora que a gente nunca esquece, né? Que é a Fabi. Porque lá, como eu estava numa outra comunidade, era um professor; eu não sei como é que era na época, mas eu nunca passava de ano [risos], eu continuava sempre na mesma série. Quando eu troquei de escola, a professora, na época, falou: “Ó, tu passou pra tal série”. Aí então foi uma coisa que me marcou bastante.
P/1 – E você tinha amigos na escola, o que você fazia?
R – Sim, tinha amigos.
P/1 – Teve alguma experiência marcante no período da escola com você?
R – Não, não que eu lembre assim.
P/1 – Aí então, você resolveu que você queria continuar estudando e então pro segundo grau você teve que morar numa casa de família. O que você fez, como que foi essa mudança pra você?
R – Na casa onde eu parava eu tinha que fazer tudo, né? Limpar a casa, lavar roupa, fazer almoço, deixar tudo prontinho pra daí de tarde eu ir para escola. Quando eu retornava de tarde, que eu tinha que ajeitar todas as coisas, pra no outro dia de manhã não ficar muita coisa pra eu fazer pra eu conseguir ir de novo pra escola.
P/1 – E eles apoiavam o seu estudo?
R – Era tipo um trato que tinha sido feito com meu pai; eu trabalhava, mas era pra eu estudar, na verdade. Era bem puxado eu lembro, na época.
P/1 – E os seus pais te incentivavam a estudar?
R – Sim, sempre me incentivavam.
P/1 – E os seus irmãos?
R – Os meus irmãos também estudaram; a minha irmã tá fazendo faculdade e o meu irmão tem o segundo grau só.
P/1 – Tá. E daí assim, Lediane, o que você sente que mudou da sua infância assim pra sua juventude?
R – Ah, bastante coisa mudou [risos], bastante. Na infância as coisas eram tudo mais difíceis; agora é bem mais fácil. Teve uma mudança grande, sabe?
P/1 – E na sua juventude, quando você era mocinha assim, que você gostava de fazer, você passeava, você tinha amigos, o que você fazia?
R – A gente vinha na igreja; nos finais de semana a gente vinha na igreja, minha família é católica. Todos os finais de semana a gente vinha na igreja e ficava no campo que tinha ao lado da igreja jogando bola, conversando; é isso que a gente fazia.
P/1 – E você é casada?
R – Sim.
P/1 – E como é que você conheceu seu esposo?
R – Conheci ele numa festa junina [risos] lá na Comunidade da Linha Silveira.
P/1 – É? Faz tempo que você tá com ele?
R – Dez, 11 anos vai fazer dia 30 de maio. Fez… não, de junho agora, vai fazer 11 anos dia 30 de junho.
P/1 – Vocês têm filhos?
R – Sim, uma menina com dez anos.
P/1 – Tá. E como é que foi o dia do seu casamento?
R – Foi como vou dizer? Foi bom, acordei feliz [risos]. É uma coisa que a gente não sabe explicar porque a emoção é tão grande que você não sabe descrever como é que é. Mas foi a realização de um sonho, na verdade.
P/1 – O que vocês fizeram, teve alguma coisa?
R – Assim, a gente casou; a gente só fez uma janta pros padrinhos. E eu me vesti de noiva, ele, todos os trajes normais, né, mas a gente optou por fazer só uma janta com as testemunhas e com a família mesmo. Foi pequena a festa, mas estava muito bonita.
P/1 – Uhum. E Lediane, então seu primeiro trabalho foi?
R – Na casa daquela família.
P/1 – Na casa dessa família?
R – Isso.
P/1 – E depois que outros trabalhos que você teve?
R – Daí eu comecei a dar aula; no início com os contratos emergenciais nas comunidades, o nosso município tem esses contratos; contratam a gente no início do ano até terminar as aulas. E eu fui trabalhando assim até sair o concurso e eu fazer o concurso e passar. Eu já sou uma concursada, sou nomeada.
P/1 – E você fez faculdade, você continuou estudando, como que foi?
R – Eu terminei a faculdade e eu iniciei uma pós-graduação, mas eu parei agora.
P/1 – Que faculdade você fez?
R – Eu fiz Pedagogia e a pós era Gestão Escolar.
P/1 – E o que te motivou a fazer Pedagogia?
R – Eu já tinha o Magistério e pra ter mais, para eu saber mais como lidar com as crianças, para ter mais suporte para trabalhar em sala de aula. Depois que eu comecei a fazer eu me identifiquei bastante, eu gostei de cursar Pedagogia. Acho que é uma das coisas que todo mundo deveria fazer, é a base a Pedagogia; ela é fundamental, ela clareia bastante a gente. Eu adorei fazer Pedagogia.
P/1 – Teve alguma coisa que te marcou nessa época da faculdade, alguma história, algum trabalho que você fez?
R – Sim, o meu trabalho de conclusão porque ele deixa a gente muito nervosa [risos], muito, porque ele é tudo ou nada, na verdade. É onde a gente vai mostrar se a gente realmente conseguiu aprender ou não. Mas eu graças a Deus consegui, deu tudo certo. Mas me marcou muito porque eu lembro que, quando eu estava fazendo, o nervosismo era tão grande que eu não sabia se eu fazia, se eu chorava, o que eu fazia porque é complicado. Mas no final eu consegui, deu tudo certo.
P/1 – E você ficou feliz com o resultado do seu trabalho?
R – Meu Deus [risos] fiquei muito feliz.
P/1 – E assim, voltando aqui ao seu trabalho da escola, como é que foi você fez o concurso, como que você veio dar aula aqui na escola?
R – Eu fiz o concurso, concurso do município.
P/1 – Tá. E aí você começou a trabalhar. Como que era a escola quando você começou a trabalhar?
R – Quando eu comecei a trabalhar aqui a escola era bem diferente, era bem diferente [risos].
P/1 – Como que era esse diferente assim?
R – Tudo; a escola, o espaço físico, tudo era diferente aqui, tudo era diferente.
P/1 – Como é que você descreveria assim a escola, como era antes?
R – Ela era, na verdade, era uma coisa que você chegava aqui e não se sentia muito bem porque estava meio que deixada de lado, na verdade. E aí quando eu cheguei aqui no início, até eu conversei com a Diretora pra gente tentar fazer alguma coisa pra mudar. Mas, segundo ela disse, já tinham tentado fazer e não adiantava e continuava daquele jeito. Era bem feia, na verdade; essas são as palavras, bem feinha [risos].
P/1 – É, assim que problemas ela apresentava nessa época?
R – Um dos maiores problemas que tinha aqui era lixo; por exemplo, a gente tinha que guardar o lixo no banheiro porque não tinha coleta, nada. Então, era entulhos de lixo.
P/1 – E assim, era difícil vir trabalhar de manhã e você chegar aqui, qual era o sentimento que você tinha quando você entrava na escola?
R – Tanto fazia se era de manhã ou de tarde; o sentimento que a gente tinha era de desânimo, na verdade, porque desde o primeiro dia que eu cheguei aqui eu já sentia as pessoas que trabalhavam aqui meio desanimadas, sabe?
P/1 – E você sempre pensava que poderia...
R – Eu pensava que poderia mudar. Mas como se passaram uns anos e continuava daquele jeito eu até já estava acreditando que ia continuar assim porque a diretora mesmo falava: “Não, não adianta tentar fazer alguma coisa porque a gente já tentou e é assim mesmo”.
P/1 – E a sua vontade era fazer o quê?
R – Sei lá, até eu tinha sugerido na época de a gente fazer festa junina pra comprar alguma coisa pra escola, pra mudar a pintura; essas coisas assim que a escola pode fazer.
P/1 – E aí nunca foi e não conseguia fazer?
R – Depois, dali a um tempo a gente fez uma festa assim. Mas já tinha iniciado o Projeto aqui, a Minha Escola, Meu Futuro.
P/1 – E como é que você, qual foi a sua primeira impressão desse Projeto?
R – A minha primeira impressão no início eu fiquei muito apreensiva, na verdade, porque a gente não sabia o que vinha. A gente tudo que é novo a gente fica preocupada. Porque aí está a minha questão, a minha vontade de mudança, mas eu não sabia a que ponto ia ser; um projeto novo ele dava uma expectativa grande e ao mesmo tempo com o pé atrás. Mas aí quando foi apresentado o Projeto a gente viu que o Projeto era maravilhoso porque sempre que a gente vai fazer um projeto na escola a gente pensa primeiro na realidade do nosso aluno pra depois partir pra globalização. E esse Projeto ele veio bem ao encontro da nossa realidade porque uma das questões era o lixo. E aí quando chegou o Projeto a gente começou a trabalhar. E logo em seguida a gente ficou mais feliz ainda porque o Projeto não ficou aqui só na nossa escola, já estava na comunidade. E aí o caminhão do lixo passava, começou a passar de 15 em 15 dias. E as famílias – se vocês derem uma voltinha aqui vocês vão perceber aqui ao redor – cada família construiu a sua lixeira; então isso facilita a coleta do lixo e um dos problemas que nós tínhamos aqui na escola terminou.
P/1 – Então, assim, é como é que você se envolveu você teve alguma participação diretamente?
R – Sim, o pessoal veio, conversou conosco. Até eles conversaram na sala, com os alunos e tal e depois nós colocamos em prática o Projeto.
P/1 – E esse primeiro passo, assim, o que você sente que você fez, que você tomou uma atitude, que você, como é que você participou ativamente nisso?
R – Conversando com os alunos, conscientização, explicando pra eles como seria desenvolvido o Projeto; e depois a gente viu que deu certo porque Projeto se espalhou na comunidade inteira. Então, eu acho que a participação da gente deu certo.
P/1 – Como é que os alunos receberam isso, você lembra?
R – Sim, bem; uma das preocupações é como é que eles iam receber; mas não teve problema nenhum, foi bem recebido.
P/1 – Você já tinha ou a escola já tinha trabalhado com essa ideia de reciclagem, vocês já conheciam isso?
R – Não.
P/1 – Vocês não conheciam?
R – Não.
P/1 – E aí como é que vocês tomaram conhecimento dessa ideia de coleta seletiva ou como foi pra vocês aprenderem isso?
R – Daí, na verdade, como o Projeto teve uma parceria do BRF e da Prefeitura a gente foi conversar com o pessoal da Prefeitura e eles se comprometeram a mandar o caminhão da coletar do lixo. E a BRF deu as lixeiras pra nós, que é separada, então foi aonde a questão que as crianças – o lixo é separado – que as crianças aprenderam e agora estão habituadas a colocar o lixo separado.
P/1 – E hoje quando você vê uma criança colocando o lixo na lixeira certa, assim, o que você sente?
R – Muito feliz; eu vejo que o Projeto está dando certo.
P/1 – E que mais coisas positivas você acha que esse Projeto trouxe pra comunidade, Lediane, você que mora aqui?
R – Muita coisa, principal; assim. A escola vocês não chegaram a conhecer antes, como eu falei, não tinha como explicar. Agora, ela se transformou, ela é um lugar onde tu chega tu e se sente bem; ela é um lugar aconchegante. A gente vê os alunos andando na escola com os olhinhos brilhando. Eles têm os brinquedos bons pra brincar. Então a gente se sente motivado. E a comunidade inteira ficou muito feliz com esse Projeto.
P/1 – Parece que teve uma ação de coleta, de entulho; você participou disso?
R – Isso. Até a gente passou nas casas, a gente falou com os alunos e tudo o que aprendem na escola eles passam. E a gente passou nas casas pra ajudar a fazer a coleta. Só que a maioria do pessoal, como já estavam por dentro do assunto, eles já tinham feito a coleta, estava ensacadinho e era só a gente trazer até o lugar destinado onde tínhamos combinado. Todo mundo ajudou.
P/1 – E o que você acha – você que é Pedagoga – que você acha dessa experiência da criança levar o que ela aprendeu na escola levar pra casa e ensinar os pais?
R – Ótimo, eu acho ótimo, porque é sinal que ele vem na escola, ele prestou atenção naquilo que ele aprendeu e ele não segurou pra ele, ele passou pra família dele; e a família dele, com certeza, quando conversar com os amigos, com alguém vai passando. Tanto que o Projeto já não tá só na nossa comunidade, tem mais gente perguntando no nosso município inteiro, sabe? A gente já teve uma reunião de núcleo na comunidade vizinha, aonde a gente, a Coordenadora quer que a gente passe o Projeto pra eles. E a criança, a criança é assim uma sementinha, ela que passa as coisas. Tudo o que eles aprenderem, eles vão passando. Então eu acho muito importante isso.
P/1 – E a sua filha, ela estuda aqui?
R – Estuda.
P/1 – E como é que é, a sua filha também participou, vem participando dessa aprendizagem?
R – Sim, ela participa na escola também. Ela quando a gente está indo pra casa – às vezes eu vou no transporte, às vezes eu vou à pé, caminhando – se ela vai comendo uma bala ou um salgadinho ela não joga no chão; ela pega e me dá pra eu guardar, pra eu chegar em casa e jogar no lixo, ela não joga nada no chão, ela ficou bem.
P/1 – Ela entendeu?
R – Ela entendeu.
P/1 – E o seu marido, seu esposo, sua família, o que eles acham de você estar envolvida nesse Projeto?
R – Ótimo, eles acham ótimo porque até, na verdade, esse Projeto, essa questão dos cinco “s” lá em casa também tem porque a gente está integrado da BRF e aí lá também tem o Projeto [risos].
P/1 – [risos] E o seu marido também?
R – Sim, ele também passa por avaliação.
P/1 – Tá. E o que você sente que te motivou exatamente a participar disso, o que foi que realmente te motivou?
R – Eu achei o Projeto maravilhoso; e como eu vi que nesse Projeto era a chance de nós mudarmos aqui na Escola, ficar melhor, com certeza, então eu fiquei bem motivada. E – como é que eu vou explicar – eu resolvi pegar junto, o que precisasse de mim eu estava disponível pra fazer.
P/1 – E o que você fez assim exatamente?
R – Ajudei no que foi necessário para o desenvolvimento do Projeto, na conversa com os alunos, com a comunidade, enfim.
P/1 – E a comunidade aceitava bem?
R – Sim, sim, porque até nós passamos nas casas um dia que ia ter a reunião pra mostrar o Projeto no salão da comunidade. E a gente passou nas casas convidando e podemos perceber a aceitação deles, eles ficaram bem felizes.
P/1 – Nesse caso das crianças, elas tiveram contato com algumas novas práticas de higiene, como escovação de dentes; como é que foi isso, como é que foi a introdução desses novos conceitos pra eles?
R – Foi bom porque, como vocês perceberam, eles já pegaram o hábito. Eles comem a merenda, eles vão pro recreio – porque às vezes eles trazem uma outra merendinha – depois eles vão escovar os dentes. As crianças também tem o acompanhamento do dentista, agora, aqui na Escola, vem uma vez por mês.
P/1 – E essa ideia da horta, você participou?
R – Sim.
P/1 – Conta um pouquinho essa…
R – A horta cada canteiro é de uma turma que cuida; eles que plantaram e eles que estão cuidando.
P/1 – E como é que as crianças?
R – Fazer a limpeza. Eles adoram ir lá, adoram cuidar.
P/1 – Eles cuidam, cada um vai lá e vê aquilo que plantou?
R – É, digamos assim, o quarto ano foi com a turminha deles e plantou aquele canteiro de alface; eles são responsáveis por cuidar, pra limpar, pra regar – quando deu a seca eles que molhavam tudo – está tudo com eles. Eles eram responsáveis por aquele canteiro.
P/1 – E os produtos dessa horta, o que acontece?
R – A gente utiliza na merenda escolar.
P/1 – E eles sabem que tão comendo?
R – O que eles ajudaram a plantar.
P/1 – E como é que as crianças demonstram o que elas demonstram quando elas percebem que elas tão comendo a alface que elas plantaram?
R – Eles gostam porque antes não era muito bem aceito a salada, essas coisas, na merenda escolar. Hoje eles comem direitinho, eles gostam, é bem aceito. É uma coisa que eles sabem que foram eles que ajudaram a plantar e tão ajudando a cuidar.
P/1 – Tá. Você acha que essa ideia, esse Projeto, então você já falou que de alguma forma outros municípios tão se interessando. Mas você acha que o Projeto aqui acabou atraindo a atenção de outras escolas, postos de saúde, outras, outros lugares começaram a se interessar?
R – Com certeza. Até a secretária falou que a próxima reunião de diretores vai ser aqui nessa Escola pra eles verem o que aconteceu, a mudança que teve aqui na Escola e para saberem um pouco a respeito do Projeto para levarem para outras escolas.
P/1 – Então vocês sentem que vocês estão servindo de exemplo?
R – Com certeza.
P/1 – E as escolas aqui da região, elas procuram ter informações, saber o que tá acontecendo?
R – Com certeza. E é por isso que eu acredito que a reunião vai ser com os diretores porque os diretores aí passam pros demais professores.
P/1 – E você tem colegas suas de outras escolas que te perguntam coisas?
R – Sim.
P/1 – Quê que elas querem saber, que que elas perguntam?
R – Elas querem saber como é que foi essa mudança, de que forma que aconteceu quem teve a iniciativa.
P/1 – Uhum. E têm colegas tuas que querem trabalhar aqui, como que, tem isso ou não?
R – Com certeza [risos], com certeza.
P/1 – [risos] E o que você fala pra elas?
R – Não, até aconteceu agora esse ano que tinha uma colega minha que queria vir trabalhar aqui, perguntou como é que ela poderia fazer. Eu falei que isso depende da secretária ou de ter vaga; no caso, nós aqui, no momento não teria. Mas isso depende.
P/1 – Uhum. E Lediane, nesse processo todo, dessa reformulação, dessa reconstrução, teve alguma história assim que tenha sido marcante, assim, uma experiência?
R – É, a experiência que me marcou foi o dia que veio o caminhão carregar o lixo e que, na verdade, eu não tenho certeza, mas eu acho que foram dois ou três caminhões de carga que levaram de lixo do tanto que tinha [risos]. Uma coisa que pra mim foi bem marcante.
P/1 – E hoje quando você olha aqui para o entorno, pra comunidade, como que você se sente?
R – Não dá nem pra acreditar o que aconteceu porque se viesse aqui antes. Pra ter uma noção aqui esse mato que tinha atrás da Escola aqui era jogado o lixo ali pra dentro e tal e agora ele é todo limpinho, todo cuidadinho, né?
P/1 – Tá. E assim nesse processo todo assim o que você sente que você aprendeu?
R – Muito, muito, muita coisa, bah.
P/1 – Por exemplo?
R – Por exemplo, aprendi a trabalhar com os meus alunos e até pra mim mesmo, a questão da ordenação, da organização, que às vezes falta muito. A gente sendo bem organizada em qualquer lugarzinho se consegue colocar um monte de coisa. Então aprendi bastante.
P/1 – Tá. Você já tinha feito algum trabalho voluntário?
R – Não.
P/1 – E você acha que, assim o que você imagina que vocês podem fazer mais, tem algum projeto que vocês queiram continuar fazendo aqui dentro da escola, em termos de melhorias?
R – Com certeza, a gente sempre pensa em melhorias. Mas uma coisa que a gente gostaria é que o Projeto continue aqui na Escola porque ele é maravilhoso.
P/1 – E vocês acham que vocês já tão com conhecimento suficiente pra, de repente, tocar sozinha esse Projeto e até ensinar outras escolas mesmo?
R – Eu acredito que a gente tenha o conhecimento, mas a orientação nunca é demais, ainda mais por pessoas que tão acostumadas a lidar com essa situação assim.
P/1 – Tá. Bom, eu acho que basicamente é isso. Tem alguma coisa a mais que eu não te perguntei que você gostaria de falar a respeito da sua participação no Projeto?
R – Bom, eu gostaria de dizer que o Projeto é maravilhoso, adorei trabalhar junto. Que no início a gente ouvia falar que vinha o pessoal lá da BRF a gente ficava um pouco nervosa, porque na verdade a gente não sabia o que é que vinha. Mas aos poucos, a gente foi se tornando grandes amigos. O Projeto foi bom, é bom e está continuando, tomara que continue porque ele é maravilhoso.
P/1 – Tá.
R – É isso.
P/1 – E os seus alunos, o que eles dizem, que você sente, o que mudou pros seus alunos assim?
R – Como eu falei, até a atitude deles, o jeitinho deles, o cuidado que eles têm, eles têm bastante cuidado; um fica corrigindo o outro. Por exemplo, se algum está comendo uma bala, às vezes esquece, larga; o outro diz: “Ó, fulano, faz favor, vai juntar a casca da sua bala”. Então, mudou bastante.
P/1 – E puxando um pouquinho da memória assim, da escola como era antes pra escola o que é hoje, assim, como é que você sente?
R – É uma transformação total [risos], não tem nem comparação.
P/1 – Tá ótimo, eu gostaria de; então tá bom, então é isso. Muito obrigada pela sua entrevista, tá?
R – Eu que agradeço [risos].