Identificação. Fala sobre os avós de origem italiana. A família em Agudos, interior de São Paulo. A vinda para Bauru e as lembranças de infância. A Wilson Roupas Infantis. A primeira loja, a Cris Moda Feminina e a segunda, uma loja de moda praia. A Wilson Roupas, loja de rua e shopping. O pai, um grande exemplo. Namoro e casamento. As dificuldades trazidas pela pandemia do novo coronavírus.
O legado da Wilson Roupas
História de Cristiane Silvestre Costa Marcorin
Autor: Museu da Pessoa
Publicado em 08/03/2021 por Ana Eliza Barreiro
Projeto Memórias do Comércio 2020 - 2021
Entrevista de Cristiane Silvestre Costa Marcorin
Entrevistada por Luís Paulo Domingues e Daiane Terra
Entrevista MC_HV007
Transcrita por Selma Paiva
Conferida por Ana Eliza Barreiro
P/1- Cristiane, pra começar, a gente sempre começa com a pergunta padrão. Eu queria que você falasse pra ficar registrado por você, o seu nome completo, a data de nascimento e o local que você nasceu.
R/1- Meu nome completo é Cristiane Silvestre Costa Marcorin. Eu nasci no dia 04 de setembro de 1968, em Bauru.
P/1- Em Bauru. E qual é o nome do seu pai e da sua mãe?
R/1- Wilson Costa e Marilda Silvestre Costa.
P/1- Legal. Você teve contato com os seus avós? Lembra o nome deles, pra falar aqui?
R/1- Todos. Minha avó materna é Natália. E o meu avô, Atílio. E paterno: Joaquim e Helena. Um italiano, o outro português. Imagina que mistura boa que deu! (risos)
P/1- Que deu, né? E você tem irmãos?
R/1- Eu tenho um irmão que chama Ricardo. Eu sou a mais velha. Ele é o do meio. E tem o Fábio.
P/1- E quanto a sua família, você sabe a origem deles? Eles vieram de fora pra Bauru? Como é que foi a chegada deles em Bauru? Eles são descendentes de imigrantes? Como é?
R/1- A gente, os mais novos assim, até a minha mãe, é tudo bauruense. Mas meu vô Atílio veio da Itália, pequenininho, eu acho que com sete, oito anos. E vieram pra Agudos, porque eles faziam, eles iam trabalhar na roça, né, e nas fazendas aqui eles trabalharam. Daí o meu bisavô chamava Leonardo e a Giovana. E o meu vô Atílio e a Natália. Agora, da parte do meu pai eu conheci só a bisa e a minha vó e o meu vô. Eles eram... então, eu não sei direito. Eles são daqui mesmo, o vô e a vó. A bisa é que eu não sei, se ela veio de Portugal, se não. Ela morava em Cafelândia, aqui no interior também.
P/1-E vieram todos pra Bauru antes de você nascer?
R/1- Sim. Vierem pra Agudos, a primeira vez. Meu biso... meu avô veio com a mãe dele e o pai dele ficou na Itália, ele fazia comida na guerra, sabe? Ele era cozinheiro lá. Então, depois que ele veio. Daí eles moravam tudo junto, no mesmo quintal. Maior loucura. (risos) Bem família de italianada, mesmo.
P/1- E você lembra assim de traços da cultura italiana e portuguesa na família? Comida, música?
R/1- Sim. Bacalhau. Meu pai, quando era dia de Páscoa, assim, Sexta-Feira Santa, ele comia bacalhau na hora do almoço, daí ele ia até o outro dia. Ele ficava comendo de madrugada. Era maluco, gostava. E no outro, no lado da minha mãe, era italianada doida, fala tudo alto, aquelas coisas. E também...
P/1- Falavam com sotaque?
R/1- Ah, o meu vô falava. Os irmãos, tudo falavam italiano. Tudo italiano. Só que ele era lá do sul da Itália. Chamava, eu acho que é Visco, o lugar que ele morou, nasceu. Deve ter parente lá. Eu nunca fui. Tem uma turma que já foi. Mas eu não conheço.
P/1- Entendi. E na sua infância? O que você lembra da sua infância? Você nasceu em qual bairro, assim, de Bauru?
R/1- Nossa! Eu não sei. Porque Bauru era pequenininho. Eu acho que foi no alto da cidade que eu nasci. Daí morei em um monte de lugar.
P/1- O que você lembra do ambiente de infância? Como era na rua, os seus amigos, com quem você brincava?
R/1- Brincava na rua. O que mais? Patinava. Tinha um clube perto de casa que era patinação. A gente ia muito lá, a vizinhança inteira. Eu morei a minha vida inteira no mesmo lugar. Depois que eu casei, daí eu mudei de lugar. Mas moramos bastante tempo nessa casa que nasceu o meu irmão Fábio. E depois numa outra nasceu o Ricardo e eu, que fui a primeira. Mas sempre no mesmo lugar.
P/1- Certo. E o que você lembra da cidade, naquela época? Como você lembra de Bauru, no passado?
R/1- Não tinha calçadão, era a rua do comércio. O que mais? Tinha a escola, a igreja. E, assim, isso que eu lembro. De ir pra escola. De ficar na loja. No Natal eu ajudava o meu pai, a gente ia dobrar roupa, fazer pacote de presente. (risos) E daí a gente andava, a minha mãe adorava descer no Centro, a minha avó morava lá também. Eu ficava muito na minha avó, porque a minha mãe tinha uma lojinha de criança, chamava Wilson Roupas Infantil. Então, eu e o meu irmão Ricardo - o Fábio ainda não era nascido – ficávamos na minha vó. Porque a minha mãe alugou uma casa bem na frente, pra gente poder, ela cuidar de nós. E tinha empregada também. E ela trabalhava, ela sempre foi de trabalhar, nunca ficou em casa. Até hoje, ela pega o carrinho ó, anda pra rua. (riso) Então foi isso, a minha infância foi essa. As minhas primas eram mais velhas, um pouco, que eu. Mas assim, nas minhas férias, eu ia na casa da minha tia, elas brincavam, eram mocinhas, namoravam. Eu ficava o mês inteiro lá, a gente brincava. Elas faziam de tudo pra me agradar. Era o maior legal. Tinha uma prima também que morava na Bahia, a gente curtia quando ela chegava. É isso aí. A minha infância foi essa.
P/1- E a escola?
R/1- Ai, eu detestava ir na escola. (riso) Mas eu...
P/1- Onde que você estudou, em Bauru?
R/1- No São José, o colégio das freiras.
P/1- E aí, como era lá? O que você lembra de lá? Quais as matérias que você gostava mais, assim?
R/1- Ai... Matemática um pouco mais. Português, não. História eu gostava, Geografia, essa parte. Mas eu não fiz faculdade, porque eu fui ficando na loja, trabalhando lá. E daí... eu vou em outro lugar, peraí. Está barulho, não está?
P/1- Tá. Tá legal.
R/1- Vou sentar aqui. Pronto. Melhorou?
P/1- Melhorou.
R/1- Pronto. Assim, está bom?
P/1- Está bom.
P/2- Só um pouquinho mais pra sua esquerda, Cristiane. Isso. Perfeito.
P/1- Legal. E você não gostava do São José? Achava chato? As freiras eram muito...
R/1- Achava bom. Mas eu não gostava de estudar mesmo. (risos) Eu nunca fui chegada. (risos) Não vou mentir. Eu não fiz nem a faculdade. Eu não quis. Eu fui ter loja. A minha mãe já abriu uma loja pra mim. Com quinze anos eu já fui emancipada, eu já tive loja. E trabalhei muito.
P/1- E era loja do quê?
R/1- De mulher. Chamava Cris Moda Feminina. Depois eu tive uma na rua, na frente de casa, também. E o que mais? Aí eu tive uma franquia no shopping. Quando o shopping saiu, eu tive uma franquia da Salva Vidas, era maiô e biquíni, só. Mas aí não dei certo porque, no inverno, né, não vendia nada, não sei o quê. Daí eu peguei, o meu pai fechou. E nós abrimos a Wilson, no shopping. Foi quando eles foram pra lá. Porque era só no Centro, a princípio.
P/1- Entendi. E tudo isso, essas primeiras lojas aí que você teve junto com a ajuda da sua mãe e do seu pai, você era menor de idade ainda?
R/1- Era emancipada. Eu já sou aposentada. Por tempo de contribuição. Comecei cedo a trabalhar.
P/1- Com quinze anos. E como era a frequência, assim, o pessoal ia na sua loja?
R/1- Ia. Ia, sim.
P/1- Qual era o público, assim?
R/1- Como assim?
P/1- A moçada da época? Era o pessoal da Rua Batista?
R/1- Era. O pessoal mais ali da... porque não era na Rua Batista, era numa ruinha, na Rio Branco. Então era uma boutique pequenininha, assim. E a gente tem muito conhecido. O meu pai é muito conhecido aqui. Ele já faleceu, né, faz um ano e meio. Então, a gente vendia. Era tão fácil vender, né e ganhar dinheiro. (riso)
P/1- E naquela época, qual é a diferença que você vê do comércio naquela época pra hoje? Você falou que era fácil vender, assim. Tinha menos loja?
R/1- Era. Tinha menos também. Meu pai... tinha a Casa Carvalho, que é mais velha. E o meu pai, a Wilson. Só tinha os dois. Só que o meu pai era antenado na moda. Então, ele tinha bom gosto. Ele comprava as coisas mais lindas que tinha. As marcas melhores era tudo lá. Ele vendia Lacoste, vendia Ona, Jocatenis (11:20), um monte de coisa. Só as top da época.
P/1- Então, você acabou o terceiro colegial e você já estava nesse ramo...
R/1- Eu fiz o Magistério.
P/1- Ah, fez o Magistério?
R/1- Fiz. Daí eu continuei com loja. Daí, quando eu casei, eu fiquei grávida e tal. Daí eu não fui, eu fechei a loja, porque o meu marido, nessa época, tinha aberto uma padaria. E daí eu parei de trabalhar, grávida, fiquei em casa um tempo. Daí depois veio o shopping, já tinha o shopping, o meu irmão que ficava, na minha ausência. Daí, depois que o Gabriel nasceu e cresceu um pouquinho, daí o Marcelo ficava com ele e eu ia pra loja, trabalhava das dez às dez da noite, no shopping. Fiquei um tempo assim. Depois, a condição vai melhorando e tal, a vida financeira, porque até então eu era empregada do meu pai, depois de um tempo que eu assumi a loja. Daí ficou só eu com a loja. A minha mãe sempre ajudou, mas também não pegava dinheiro de lá, sabe? Era mais eu, mesmo. E daí foi isso.
P/1- Entendi. Todas essas lojas que você falou que você teve, depois abriu outra, sua mãe também tinha, tudo veio da primeira, que foi Wilson Roupas, né?
R/1- Sim.
P/1- Você sabe a data que o seu pai começou com essa loja? E por quê?
R/1- 1968. Quando eu nasci.
P/1- Ele era o que, antes de fazer a loja? Como ele teve a ideia? Então, o seu pai fazia o que, antes de ter a loja?
R/1- Ele era gerente da Renner, naquela época. Daí, depois disso, ele teve uma sociedade com uma pessoa, que eu não conheci, que era um advogado, uma coisa assim. E ele tinha uma loja de esporte e chamou o meu pai pra ser sócio. Ele entrava com o trabalho e o homem com o dinheiro. Só que daí os filhos do cara mexiam no caixa, sabe aquelas coisas? E o meu pai era chato e daí ele não quis mais. Daí, nessa época tinha, eu acho que a Real Modas. Era uma loja daqui e era assim que nem Renner hoje: tem masculino, feminino, magazine. Daí o me pai entrou. Daí vendeu essa loja. E repartiu as lojas pra vender: a masculina, a feminina, a infantil. E ele ficou com a masculina, com a parte. E daí lá, a princípio era tudo horrível, as roupas. E ele foi comprar no dia vinte e cinco de janeiro em São Paulo (risos) e era feriado. E ele com o meu tio, que o meu tio foi ajudar, não compraram nada, tiveram que vir embora. (risos) Foi engraçada essa coisa. E daí o meu pai liquidou tudo o que ele tinha, a roupa feia lá da loja. E ele foi comprar de novo. E daí ele começou a vender. O primeiro Natal ele ganhou muito dinheiro e era tudo em grana. Eu não me lembro disso, mas a minha mãe lembra que ele jogava os dinheiros e nadava, assim, no dinheiro (risos): “Eu não acredito que eu estou ganhando tanto dinheiro! Maria, olha quanto dinheiro que tem aqui”. Não sei o quê. E foi isso aí. A vida inteira ele trabalhou muito. Muito mesmo. A minha mãe está chegando aqui.
P/2- Eu posso perguntar?
P/1- Pode.
R/1- Pode.
P/2- Eu ia perguntar, oh Cristiana (15:30), qual foi o ano que o seu pai decidiu terminar, né, largar essa gerência, na verdade, essa sociedade? E decidiu investir num negócio próprio, já que ele tinha essa intenção e essa força de trabalho? Quando foi? Qual ano isso aconteceu?
R/1- Eu não lembro. A minha mãe vai lembrar, mas eu não lembro.
R/2- O quê?
R/1- Mãe, é uma entrevista. Vem cá. Lembra que a moça ligou? Ela está aqui.
R/2- Boa tarde!
R/1- Essa é a mulher dele. Pergunta pra ela.
R/2- O quê? O ano, o quê?
R/1- Que eu acho que ele saiu, que ele foi sócio da loja. Ele saiu...
R/2- Foi quando você tinha um ano. Ela tinha um ano. Você tem cinquenta e...
R/1- Dois.
R/2- Faz cinquenta e um anos, isso, que aí ele abriu a própria loja.
P/1- Está certo. Cristiane, aí você acha que o seu pai deu certo? Que você falou do assunto de até nadou o dinheiro, tal?
R/1- Ficava jogando, né, mãe? Não ficava jogando dinheiro pra cima, naquele dia?
R/2- É. No Natal. É no primeiro Natal, que ele ganhou bastante.
R/1- No primeiro Natal da loja.
R/2- É.
P/1- Essa loja já era na Batista? Onde era?
R/1- Na Batista. Em frente a Americana. Era boa.
P/1- Você acha que deu certo por causa do nível de roupas, que era pra uma população que tinha mais dinheiro, tal?
R/1- Sim.
P/1- Era uma concorrente da Casa Carvalho, né, de roupas mais finas?
R/1- Sim. Mas o meu pai eram mais bonitas as roupas. Sempre. Era, mãe.
R/2- Nessa época, era os Carvalho antigo.
R/1- Eram os mais velhos, entendeu?
R/2- Não era o Cássio Carvalho.
R/1- Está ouvindo?
R/2- Era o pai dele. Então, era uma loja bem antiga. Eram roupas antigas.
R/1- O meu pai inovou.
R/2- E o Wilson começou a inovar.
R/1- Trazia...
R/2- Trazia... ia toda a semana em São Paulo, comprar e trazia...
R/1- Um monte. Vendia muito.
R/2-... novidades, né?
R/1- Ele tinha um monte, uns dez funcionários, né?
R/2- Sim. Aí começou a melhorar, ele pôs mais gente, né?
R/1- Daí era o dia inteiro. Sabe assim um dia de Natal, uma semana do Natal de compra que a gente vê hoje, nós? Era todo dia.
P/2- Cristiane, então você acha que um dos sucessos da loja foi a diversidade, no caso? Você comentou que havia, que vocês inovaram trazendo diversas marcas. Como era isso?
R/1- O meu pai vendia muito bem, meu pai. Ele era vendedor nato. Então, assim, ele punha a fitinha aqui, métrica e trabalhava o dia inteiro. Ele atendia cliente. Ele ia fora de Bauru, levar roupa, aqui perto, em Lençóis, voltava.
R/2- Tinha cliente que ele levava na casa do cliente.
R/1- Na casa. Marcava tudo as roupas, barra, tudo. Daí ele trazia, a costureira arrumava. Tinha uma oficina em cima da loja nossa, de roupa. Tinha a Maria que era costureira e ela ficava o dia inteiro lá costurando. Ó, não vencia. E daí ele levava de volta na casa do cliente. Ele era diferenciado, assim. Ele atendia muito.
R/2- E um das coisas boas que tinha na Batista, que tinha a Noroeste do Brasil, que tinha muitos funcionários. E eles compravam na Batista, nas lojas.
R/1- Na loja. Na nossa, bastante.
R/2- É. A gente tinha a clientela que comprava.
R/1- Tinha. Todas as marcas boas estavam com ele.
P/2- E como ele fazia essa pesquisa, Cristiane? Sei lá, de inovar nas marcas? Ele analisava o público?
R/1- O representante vinha. O representante vinha e oferecia. Daí você vai pegando.
P/2- Ele achava que era legal e colocava?
R/1- Oi?
P/2- Aí ele achava que seria uma boa e investia e dava certo? Ele tinha esse feeling.
R/1- Sim. Daí o pessoal vinha atrás dele também, né, pra ele comprar. Daí lançavam as marcas, vinham pôr na loja, ver se ele queria comprar. Ele comprava. Tudo ele comprava.
R/2- Coisas boas.
R/1- Coisa boas, né? E daí foi isso. A diferença era essa.
P/1- E a propaganda? Como é que...
R/1- Fazia bastante. Ele fazia também.
P/1- Era na rádio, TV?
R/1- Rádio e jornal.
P/1- Rádio e jornal?
R/1- É. A propaganda era ele, eu acho. Porque a loja era lotada. Só tinha ele e a Casa Carvalho. E a dele era mais legal, as roupas eram lindas. E ele atendia, fazia aquele auê, sabe? Os clientes gostavam dele. Tinha cliente que ficava esperando, não queria nem funcionário, era só ele que atendia. E vendia um monte. Era outra época. Não tem nem o que comparar.
P/1- E aí, ele abriu a loja pra você. Você só foi trabalhar na Wilson Roupas quando?
R/1- Quando eu peguei a Salva Vidas, franquia, no shopping. Meu pai comprou a loja do shopping. E daí eu fui trabalhar com essa marca, não deu certo, eu parei. Ele falou: “É melhor a gente parar por aqui, antes que isso piora”.
R/2- A franquia, né?
R/1- É. Daí eu peguei e fui trabalhar na Wilson do shopping. Ele abriu a do shopping lá, com a Wilson Roupas. E eu fui pra lá. O meu irmão ficava de manhã e eu ficava à tarde, até a noite. E era assim. A minha mãe também.
P/1- E deu certo essa subida pra zona sul, aí, pro shopping?
R/1- Ah, no começo...
P/2- Como era a loja do shopping?
R/1- O shopping era fraco ainda. Porque é um shopping de donos. Não é de um dono só. Cada um tem a sua parte.
R/2- Naquela época.
R/1- E daí... eu esqueci a pergunta. Volta.
P/2- Como era essa loja do shopping? Como foi ir pra zona sul, no shopping?
R/1- Deu certo. Foi super bem. Porque só tinha nós. A Casa Carvalho não tinha lá, né, mãe? Ela ficou um tempo sem ir, só nós.
R/2- É.
R/1- Então vendia super bem. Todo dia a minha mãe fechava a loja era onze, onze e meia, né, mãe?
R/2- É.
R/1- Arrumação, a gente trazia assim de calça vendida, pra fazer barra, camisa.
R/2- O Natal era ótimo!
R/1- O tempo inteiro vendia. Marcava a roupa. Terno, né, mãe?
R/2- É.
R/1- Gravata. Vendia de tudo.
P/2- Você falou da costureira. Então, era um serviço que vocês ofereciam também? Como era essa relação?
R/1- Era. Era funcionária.
P/2- Vocês tinham uma costureira na loja?
R/1- Tinham duas: a Maria e a Teté. E costuravam lá em cima da loja, no mezanino, tinha a oficina que tinha overloque, máquina reta, um monte, tudo as máquinas de fazer barra. Tudo. O meu pai comprava. Ele gostava, sabe? Ele costurava também, quando não tinha, estava lotado, ele fazia barra, né, mãe?
R/2- Fazia.
R/1- Isso aí ele fazia. E era assim.
R/2- O cliente ia dar uma volta. E voltava e já pegava com a barra feita.
R/1- Voltava e já estava pronta. E ele teve também...
P/1- E a clientela do shopping, era diferente da clientela mais tradicional do calçadão?
R/1- Mas era o pessoal da Batista que ia no shopping. Não tinha tanta gente em Bauru, assim, pra... né, mãe?
R/2- É. Aí deu uma mudada também.
R/1- Aí deu. O shopping começou a melhorar. A clientela começou... os filhos dos clientes, entendeu? Foi inovando. Daí, quando eu peguei a loja, daí eu comprava mais assim, mais pra jovem. Não jovenzinho, jovenzinho. Mas pro quarentão, trinta e poucos anos. Daí mudou um pouco o público, né, mãe?
R/2- É.
R/1- Daí já não era aquela velharada que comparava lá. Já ficaram velhos, esse povo. E nós continuamos com a loja. E era assim.
P/1- E a loja da Batista continuou forte? Continuou com os clientes?
R/1- A loja da Batista, meu pai pôs uma loja de gordo, GG. Chamava Wilson GG.
R/2- Perto da loja.
R/1- Perto da loja Wilson Roupas, da normal. E daí meu pai, depois pediram o prédio onde ele estava. E era muito caro o aluguel, não dava mais. E daí foram abrindo outras lojas, franquias, assim. Mas a gente foi assim, no mesmo nível, sempre. Daí é isso aí.
P/1- Aí depois mudou, né? Pra onde foi a Wilson, depois disso?
R/1- Ó. Depois foi na rua do lado ali, na Virgílio.
R/2- Onde era a loja do gordo.
R/1- Onde era a loja do gordo. O meu irmão que toca, agora.
P/1- Está lá ainda?
R/1- Está lá o ponto.
P/1- E vocês passaram durante tanto tempo assim tendo a loja Wilson Roupas, como, assim, pelos períodos de crise? Teve época de muita inflação, teve época que congelou o preço. Como é que vocês enfrentaram esses desafios?
R/1- Difícil. Não foi fácil. Foi enfrentar mesmo, né, mãe?
R/2- Teu pai vendeu o terreno pra pagar conta.
R/1- É. Meu pai vendeu as coisas pra pagar conta. Porque daí começa, né? O estoque era imenso. Ele não gostava de dar desconto. Foi juntando coisa. Daí chegou uma época que ele tinha um apartamento ali perto da loja, que ele alugou só pra pôr roupa que era fora de moda. Tinha um apartamento de roupa. Daí o meu pai nunca deixava as coisas: “Não. Deixa aí que eu vou vender”, né, mãe?
R/2- É.
R/1- E aquele estoque... daí a minha mãe, como é encardida, pegou o negócio, foi lá nesse apartamento, catou a empregada dela, né, mãe?
R/2- É. Fui...
R/1- Arrumou tudo aquelas roupas. E daí, ele já estava...
R/2- Aí ele já estava meio doente, já.
R/1- Meio doente já, com Alzheimer. Que daí a minha mãe montou uma loja na Duque, numa avenida, chamava Outlet Wilson Roupas. E ela vendeu tudo as roupas lá. Todas, né mãe, não sobrou quase nada.
R/2- É.
R/1- E ficou lá um ano, né?
R/2- Dois anos e meio. Por aí.
R/1- Uns dois anos, é. Vendeu tudo aquela roupa. E fechou, né, porque não tinha mais roupa pra fazer isso. E a gente não ia comprar roupa pra fazer liquidação. E daí foi isso, né?
R/2- É.
R/1- O que mais?
P/1- A família inteira, então, tem o tino de comércio. De onde vem isso? A sua mãe também (27:45)?
R/1- Ah, é turca a minha mãe.
P/1- Vem daí?
R/1- A minha mãe também é vendedora. Ela é boa vendedora. (risos) Sei lá. Meu pai era bom nisso. Daí ela casou com ele e só fazia isso. E daí eu só fazia isso. O meu irmão só...
R/2- Você vai acostumando, vai vendo, vai conhecendo.
R/1- É.
R/2- Aí nasce dentro da gente isso aí.
R/1- (risos) É o que tem pra hoje. Nós temos que fazer isso.
P/1- É verdade. E o ano passado, na pandemia, como vocês fizeram pra passar por esse outro desafio? Foi, deve ter sido um desafio.
R/1- Está difícil. Foi difícil. Fechou o shopping. Ficou quase três meses fechado. Daí já diminuiu funcionário. Daí já começa a ficar... não está bom, não.
P/1- Eu acredito que pra vocês já tinha um desafio anterior, que foi quando a Batista começou a... todas as lojas e todo mundo começou a migrar pra zona sul.
R/1- Sim.
P/1- A Batista ficou um pouquinho ... Mas mesmo assim, vocês resolveram manter a loja lá?
R/1- No shopping?
R/2- Não. A Loja da Batista, que ficou na Virgílio Malta.
R/1- Da Batista? É. Ficou na Virgílio, que era onde era a do gordo.
R/2- Ficava na mão de duas funcionárias.
R/1- Ficava na mão de duas funcionárias. E o meu pai ia lá, tadinho, mas só com o corpo dele, porque ele não entendia mais nada.
R/2- Ele só ia lá, porque era costume, já.
R/1- Porque era costume dele. E ele falava que lá ele não ia parar de ir. E ele ia, um pouquinho.
R/2- Lá era a casa dele, ele falava.
R/1- Mas depois no fim, já não foi mais. Daí fechou a loja. Fechou, não. Mudou. O meu irmão assumiu.
R/2- Aí nós reformamos a loja.
R/1- É. Reformou tudo a loja. Meu irmão era representante de vendas. E a minha mãe ficava lá, a mulher dele. E é assim. Tem duas funcionárias também. É isso aí.
P/1- Legal. E no futuro? Vocês continuam com o negócio, apesar do falecimento do senhor Wilson?
R/1- Então, na verdade eu vou fechar a loja. Porque eu estou precisando de cuidado. Eu tenho uma doença, que eu preciso fazer uma cirurgia. E, assim, como estão muito difíceis as coisas, a loja estava, assim, difícil, nessa pandemia aí. Degringolou a coisa. E para não ficar pior, a gente resolveu fechar.
R/2- Alugar a loja.
R/1- É. Já aluguei a loja. Vai ser uma loja de mulher. E terça-feira, quinta-feira passada foi o último dia da loja do shopping. O meu irmão também. Ele repassou a loja pra uma funcionária, que vai cuidar. E ele vai ficar com os aluguéis dele. E ele vai trabalhar como representante de novo. Então, a gente fechou. Com tristeza, mas tem que agir com a razão. Não só com o coração. Mas foi isso aí.
P/1- E você tem alguma coisa que você pudesse falar, pra definir o seu pai? O seu pai foi quem criou tudo isso, né? Você falou que ele era um grande vendedor, né?
R/1- Sim.
P/1- Pra gente deixar uma mensagem.
R/1- Ele era determinado. Ele conta... eu acho que mais determinação e a vontade dele, né, mãe?
R/2- É. Ele fazia porque ele...
R/1- Gostava.
R/2-... tinha determinação. Ela não pedia a opinião de ninguém.
R/1- Não. Ele que fazia tudo e desfazia. E bola pra frente. Não aceitava palpite nenhum. Eu, ainda, ele aceitava.
R/2- É.
R/1- Porque eu era mulher dos filhos, né? E ele, inclusive, assim, falava que eu era a melhor vendedora do mundo, (risos) que eu era a must, né, mãe?
R/2- É.
R/1- Coitado.
R/2- Puxava o teu saco.
R/1- Puxava o meu saco. Então, eu acho que é determinação. Ele falava, quando ele era criança, ele era engraxate. E daí ele fez um curso, eu acho que foi na Pró Vida, aqui em Bauru. E o que o curso mais falava era da determinação, de você ficar pensando no que você queria ser, que você queria ter, que você ia conseguir, que o que você pensa, vira realidade, não sei o quê. E ele vinha andando na rua, ele falava que ele batia a cabeça até no poste, porque ele estava tão viajando naquilo, que ele ia ter loja de homem, que ele gostava disso. E ele era engraxate. Ele era criança ainda. Daí ele saiu de casa, né, mãe, cedo.
R/2- É. Foi trabalhar.
R/1- Foi trabalhar como vendedor. E daí foi isso. Ele era muito trabalhador. Ele não tinha preguiça.
R/2- Sempre no comércio.
R/1- Sempre no comércio. Todo mundo conhecia ele. Ontem mesmo, o meu marido foi ver um lugar que ele vai alugar pra montar uma outra coisa e o cara, o senhor falou assim: “Você é daqui de Bauru? Não sei o quê”, pra saber dele. Daí ele falou: “Eu sou. Mas o senhor deve conhecer o meu sogro” “Quem é o seu sogro?” “O Wilson Roupas” “Nossa! Nem precisa falar mais nada. Pode alugar aí”, sabe assim? Todo mundo conhece a gente. Aonde a gente vai, um pelo menos conhece a Wilson Roupas. Todo mundo conhece.
P/1- Ele chegou a participar dos sindicatos de Bauru?
R/1- Não. Ele nunca gostou dessas coisas. Ele era do shopping, sim, conselheiro das contas, tudo. Mas CDL, essas coiseiras, não, nunca gostou. Ele ia de casa pra loja. Passava no bar do português pra tomar uma cerveja. E ia embora.
R/2- Teve uma época que ele era do Clube dos Lojistas.
R/1- Ele teve, mãe?
R/2- É.
R/1- Ó lá, eu não sabia.
R/2- [incompreensível] (34:23) Era do Clube do Lojista.
R/1- Clube do Lojista.
R/2- Ele ia.
P/1- Ele chegou a pegar a época das cadernetas, assim? Uma pessoa, sempre, muito conhecida em Bauru, tinha crediário na caderneta?
R/1- Isso. Crediário. Tinha. Eu vendia um monte. Eu tenho o fichário ainda. Tem muita.
P/1- Hoje não existe?
R/1- Não. Não existe. Existe assim, o condicional, vamos dizer. Você vai lá e pega o condicional, prova e traz de volta. Se você ficou, você acerta. Tem assim, amigo, parente que você marca num papelzinho, elas vão pagar depois. Só tem isso também. Mas não tem mais crediário. Nem usa mais. Mas era só crediário. Vendia um monte.
P/2- Eu queria perguntar, Cristiane, retomar um pouco a história. Você é casada. O seu esposo se apresentou, te ajudou a entrar aí na plataforma zoom.
R/1- Eu sou casada.
P/2- Eu queria saber um pouco da história de vocês dois. Como vocês se conheceram? Como foi? Conta um pouco pra gente como foi.
R/1- Como a gente se conheceu? Na praia. No Guarujá, a gente foi se conhecer. Porque ele foi num carnaval na Ilha Porchat lá, sei lá, o que era isso. E eu fui no Guarujá com umas amigas minhas. Eu tinha um namorado antigo. Antigo... de bastante tempo e eu terminei. Daí eu fui viajar com elas. Daí nós fomos andar a pé e tinha os namorados delas também. E começou a maior chuva lá no Guarujá. E nós a pé, na rua. Daí a gente começou a pedir carona. Daí parou dois caras numa Pampa, Seven, Pampa, sei lá: “Vem aqui. A gente dá carona pra vocês. Não vai tomar chuva. Não sei o quê”. E nós pulamos tudo lá no carro lá. E eu o vi, conheci. Daí eu cheguei de viagem, em Bauru, ele morava lá também: “Onde você trabalha?”. Ele disse: “Eu trabalho num lugar que é uma construtora. E eu sou digitador”. Eu falei: “Ah é? Você lembra de mim, da praia, não sei o quê?”. Ele falou: “Ah, eu lembro”. Eu falei: “Então, vamos comer um lanche, não sei o quê?”. Daí começamos a namorar. Namoramos dois anos e meio e casamos. Foi uma paixão, assim. Depois, ficamos até hoje juntos. Briga, né, mãe? Um enche o saco do outro, mas estamos juntos. (risos)
P/2- E quanto tempo você já está casada, Cristiane?
R/1- Vinte e sete anos.
P/1- E o nome dele, pra ficar registrado?
R/1- Chama Edson Marcelo Marcorin.
P/1- Tem filhos?
R/1- Tenho. O Gabriel. O Gabriel tem vinte e seis anos. Hoje ele está fazendo aniversário. Ele é arquiteto. Só tenho ele.
P/1- E tem mais alguma coisa que você queria deixar de mensagem pras Memórias do Comércio? A história da loja do seu pai é muito importante pra cidade. Alguma coisa que a gente não perguntou, que você queria deixar registrado?
R/1- É importante, sim. Foi importante. Assim, um lema que o meu pai tinha: “Eu quero trabalhar. E trabalhar. E trabalhar.”
P/1- Muito bom.
R/1- Foi a vida inteira assim.
P/1- Tem mais alguma pergunta?
P/2- Eu não. Era mais sobre o casamento mesmo, que eu achei interessante. Você comentou, falou que ele ia te ajudar. Eu falei: “Eu vou perguntar sobre eles”.
P/1- Fora trabalhar, vocês gostam de fazer o quê? Qual é a diversão de vocês? A gente sempre pergunta isso também.
R/1- Ir pra praia. A gente tem apartamento no Guarujá, a gente vai pra lá. O que mais? Eu saí bastante com o meu marido à noite. Diversão é essa. Tem piscina aqui em casa. Agora a minha mãe mudou aqui perto. A gente mora num condomínio fechado. Eles vêm pra cá, a minha sogra, o meu sogro estão sempre junto também, né, mãe?
R/2- É. Mas vocês têm muitos amigos.
R/1- A gente tem bastante amigo. A minha casa sempre teve gente, churrasco e música e som. Até hoje. Essa pandemia que deu uma parada na coisa. Está todo mundo desanimado e triste, assim. O povo não está querendo festa. Nem pode. O Natal foi chocho também. Foi um Natal, foi uma parte aqui, uma parte na minha mãe, na minha sogra. E estamos assim. Estamos aqui. Estamos indo. Agora a gente fechou a loja. Tem que fazer o acerto de tudo. E daí vamos ver, vamos esperar mais pra frente. Se eu ficar boa e passar tudo, eu volto a ter outra loja, se for o que eu quero. Se não, também, não vou fazer nada, vou ficar sossegada, (risos) passear e curtir a vida. Eu trabalhei bastante também.
P/2- No caso, Cris, você, então, se futuramente continuar, a loja do Wilson Roupas continuar, vai ser com você? Tipo, igual. Você mencionou que você tem um filho arquiteto.
R/1- O meu irmão, ele...
P/2- Então, tipo assim, não vai passar por mais nenhuma geração? Vai parar em você e no seu irmão, mesmo?
R/1- É. Porque o meu irmão, o filho dele também já vai se formar em outra coisa. E ele tem duas crianças, uma de doze e agora uma de um ano, uma menininha. E daí, assim, ele também não vai ficar com a loja. Ele vai viajar, ele é representante, ele pegou, tem marcas que ele vende. E isso aí.
P/2- Muito obrigada, abraços!
R/1- Obrigada, tudo de bom.
P/1- Então, tá bom. Muito obrigada pela entrevista!
R/1- Obrigada você.
P/1- E a gente se vê por aí. Um abraço.
R/1- Obrigada. Tchau.
P/2- Obrigada. Até logo. Boa tarde.
R/1- Obrigada. Tchau. Tudo de bom pra vocês.
P/2- Obrigada. Igualmente. Até logo.
R/1- Tchau.
P/2- Boa tarde.
P/1- Boa tarde.