Identificação e mudança para Campinas em busca de oportunidades de estudo. Descrição da infância. Trabalho no bar do pai quando criança. Mudanças ocorridas no comércio de Campinas com a descentralização das lojas. A esposa. Aquisição de uma tabacaria. A relação entre comerciante e cliente. Aquisição de um café. Mudanças no consumo: diminuição das vendas de charutos e de isqueiros e início das vendas de bolos e pastéis. Pagamento com cartões e diminuição de pedidos de fiado. Entrada no ramo de franquias. Crescimento do comércio, com a abertura de shoppings. O comércio hoje.
IDENTIFICAÇÃO
Sou Jorge Francisco Vaz. Eu nasci dia 2 de janeiro de 1956, em Rosário de Oliveira, Minas Gerais. Estou em Campinas desde 1974.
FAMÍLIA
Meus pais são Nelson Marcelino Vaz e Olívia da Cruz Vaz. A família é mineira.
MIGRAÇÃO
Na época, Rosário era cidade do interior de Minas, mas é uma cidade hoje já na faixa de 100, 120 mil habitantes. Na época poderia ter uns 40, 50 mil. E como todo pai e toda mãe quer o melhor para o filho, o que acontece? Vamos chegamos a certa idade, quer um estudo melhor, uma faculdade que lá, inclusive, na época, nem existia. Então viemos pra Campinas para os estudos, aprimorar e desenvolver, e acabamos ficando por aqui.
INFÂNCIA
Uma infância praticamente pobre, como no interior. A minha família era muito humilde, mas, graças a Deus, nos orgulhamos da honestidade que os pais nos passaram. E sofrida, inclusive. Eu tenho recordações meio tristes da minha infância. Nós somos oito, todos vivos. Éramos dez, perdemos um casal de irmãos. Um eu não conheci, também chamava Jorge. E quando eu nasci o meu irmão mais velho chorava e perguntava pelo irmãozinho. A minha mãe pegou e repetiu o nome e depois, antes de nascer a caçula, as duas meninas mais novas, a minha mãe teve um problema, o médico desenganou uma irmã. O meu pai tinha um bar e minha mãe tinha uma pensão, cuidava de seis filhos. Tiveram uma decepção muito grande em relação a isso. Os médicos falaram que estava praticamente desenganada, que ela iria morrer mesmo, era rezar e esperar. Ela poderia viver algum tempo mais, mas só mesmo um milagre poderia salvar. E a minha mãe era muito religiosa, ia à missa todo dia. Numa dessas, indo na missa, ela saiu batendo um papo com uma amiga que ficou sabendo do problema que a minha irmã tinha, que também eu não recordo o nome da doença na época. Ela disse que já estava tendo cura. Tinha um médico que tinha curado uma menina também no Rio de Janeiro. Minha mãe não deu dois tempos. Ela chegou em casa e falou: “Nós viajamos para o Rio de Janeiro depois de amanhã.” A gente pequeno, não sabia de nada. E ela: “Eu já comuniquei com o seu...” - o meu pai tinha um irmão no Rio de Janeiro - “com o seu irmão lá, meu cunhado, para arrumar um local.” Falava, naquela época: “Vamos arrumar as trouxas.” Pegou só as roupas e algum bem, alugou um caminhãozinho e fomos para o Rio, assim mesmo, em dois dias. Chegou lá, meu tio já tinha arrumado um cômodo que era a cozinha e um cômodo, e fomos todos juntos. A minha mãe ainda, na época, levou uma sobrinha. Eu lembro que nós passamos muita necessidade. Depois o meu pai vendeu o bar e foi pra lá. Arrumou um emprego em Gramacho, no subúrbio do Rio de Janeiro. Nesse tempo que a minha mãe estava procurando o médico para a cura da minha irmã. Eu recordo que a nossa alimentação era tipo um feijão moído e canjiquinha, aquele farelo que dava para pinto, que era socado na nossa boca pra sobreviver. E, graças a Deus, com essa luta da minha mãe, hoje a minha irmã está viva e é mãe de três filhos. Isso me emociona muito. Eu recordo que foi uma vida triste, mas que valeu a pena pela vida da minha irmã. A brincadeira da infância era o futebol, que era o que a meninada fazia. Mas quando tinha tempo. Depois que a minha irmã se restabeleceu, foi curada, nós voltamos para Muriaé, em Minas Gerais, que era uma cidade já pegada a Rosário de Limeira, cidade maior. Lá também o meu pai teve um bar e a minha mãe tinha aquelas casas antigas, grandes, um quintal de mil metros. Era tipo uma chácara dentro da cidade. Ela cultivava couve, cebolinha, taioba, que os paulistas acho que não conhecem muito. Mas ela fazia um varal grande em bambu, amarrava aqueles montes de couve, de coisas, e eu e meu irmão saíamos de manhãzinha pra vender. Então eu não tive uma infância como toda criança que tem o seu lazer, tem o seu estudo. Foi uma luta difícil, mas, graças a Deus, com empenho nós vencemos.
VOCAÇÃO PARA O COMÉRCIO
Eu assimilei essa questão do comércio mais porque, desde pequeno, uma ordem de mãe era cumprida rigorosamente, como a do pai, principalmente. Então: “Vai para o bar, vai fazer as suas horas lá.” A gente ia e atendia o povo. Com sete, oito anos, nove anos, ficava no bar e tomava conta. O comércio, pra mim, satisfaz muito, porque desenvolve. Você conversa com um, com outro. Ele é muito sadio. Eu adotei essa parte comercial. Os meus pais já tinham no sangue. Alguns outros irmãos tentaram, mas não deram sorte. Eu tive também uma tabacaria, passei para o meu irmão, mas também não foi para frente. E hoje a família é diferente. Eu tenho irmão hoje que trabalha na Unicamp, tem outro que é esteticista, a caçula e o mais velho estão em Boston, nos Estados Unidos. Mas o que está mesmo no comércio até hoje, e permanece, sou eu. E estou transmitindo isso para o segundo filho. Ele já toma conta de uma cantina e já está se virando, graças a Deus.
MIGRAÇÃO
Vim para Campinas com 18 anos, em 1974. Para mim foi um trauma. Você sair de uma cidade que tem os amigos, praticamente já saindo da adolescência, e vir já para trabalhar e tentar uma faculdade. Foi meio triste. Eu não tive escolha. Cheguei de uma praia do Espírito Santo, fiquei 15 dias na casa de um amigo. E quando cheguei, a minha mãe falou assim: “Olha, está aqui a sua mala, você está indo para Campinas.” Já tinha um irmão morando aqui, trabalhava aqui no Pires, uma casa muito tradicional, que inclusive também já fechou. E falou assim: “Você vai pra lá pra procurar um espaço. Eu sei lidar com essa pensão, o seu pai vai ficar aqui mais algum tempo vendendo isso aqui. E você tem um conhecimento maior, inclusive, que os outros irmãos mais velhos. Vai lá procurar estudos pra se matricular.” “Mas, mãe, de uma hora para outra?” “Já está aqui a passagem.” Não tinha como, então, eu vim. Na época, onde é o Bradesco, a maior agência aqui na Avenida Francisco Glicério, era uma pensão, e o meu irmão ficava lá. Eu fiquei com ele algum tempo, depois achamos uma outra casa. E a minha mãe já estava vindo. Ela concretizou o negócio, alugou, e também alugou para pensão, para pagar os aluguéis, e fomos crescendo. Depois o meu pai chegou também e estamos aí até hoje. Hoje, graças a Deus, o meu pai, a minha mãe, os meus irmãos vivem todos bem de saúde e trabalhando. Para nós, vivendo naquela cidade pequena, tudo era novidade, uma vida mais agitada. Mas mesmo assim, na época, era uma Campinas mais pacata. Tinha 380, 400 mil habitantes, hoje estamos com um milhão e cem. Eu praticamente cresci com Campinas e consegui vencer.
TRAJETÓRIA NO COMÉRCIO
Foi meio difícil. Passei por vendedor, corretor, trabalhei numa antiga gráfica, que também é a Papelaria Mousinho, depois trabalhei na Secretaria da Fazenda. Aí conheci a minha esposa. Ela me levou pra almoçar na casa do avô. E chegando lá, depois do almoço eles gostavam de jogar buraco. Faltou uma pessoa e me pegaram: “Sabe jogar?” Eu falei: “Sei.” E joguei com ele. Era brincadeira, mas ele sempre gostava de ganhar. É interessante esse fato porque fizemos uma parceria. A minha esposa, namorada na época, não jogava; jogava o genro dele e a filha dele. E nós ganhamos as duas partidas que foram jogadas. Então: “Você está convidado agora, todo domingo, pra vir almoçar aqui com a gente. Você vai ser o meu parceiro definitivo.” E ele tinha oito tabacarias em vários pontos da cidade, no Largo do Rosário, Wandot, Ponto Chic, Gaúcha, que eu recordo, Éden Bar, e tinha mais duas. Ele já estava ficando velho, cansando disso e falou que ia vender. E o genro dele falou: “Jorge, você tem pique para comércio. Você não quer comprar?” Eu falei: “Eu não tenho dinheiro. Eu estou trabalhando na Secretaria da Fazenda, comprei uma chacrinha, mas estou pagando em 50 vezes. Paguei, uma meia dúzia de parcelas.” “Pode deixar que eu arrumo o negócio pra você.” O tio dela falou. Eu sei que eu dei a chacrinha, continuei pagando e ele me deu todo o estoque. Comprei a tabacaria no Éden Bar, isso em 1978, quatro anos após chegar aqui. E o salário, na época, vamos supor que era 600 reais, em termos de hoje, o que eu ganhava na Secretaria da Fazenda. Eu passei a ganhar dois mil trabalhando por conta, mas entrava às sete horas da manhã e saía à uma da tarde. Aquilo pra mim era uma brincadeira porque eu saía contente, ia pra casa e voltava. Morava perto, na Avenida Júlio Mesquita com a Avenida Benjamin Constant. Eu ia e voltava a pé. Não via a hora de o dia amanhecer pra voltar a trabalhar. Ali eu consegui fazer um pé de meia. Paguei, no primeiro ano, a tabacaria. No segundo, comprei um apartamentinho no Jardim Pacaembu e aluguei por um ano. No terceiro ano, eu já mobiliei, mudei e casei em 1981.
COMÉRCIO DE CAMPINAS
O movimento era muito diferente dos dias atuais porque as butiques se centralizavam na Rua General Osório, Avenida Tomás Alves , na Rua Treze de Maio, pontos super valorizados. Você queria entrar no comércio, você tinha que pagar uma fortuna pelo ponto. Pagava-se luva. A vida era mais bonita, mais saudável. Eu lembro que eu morava aqui, não tinha carro na época, na Avenida Benjamin Constant e a minha esposa, namorada na época, morava aqui na Avenida Andrade Neves, na esquina também. Eu saía a pé. Se você fizer esse trajeto hoje à meia-noite, uma hora, do jeito que eu fazia, não sei se eu vou chegar ou até onde eu chego. Naquela época, as pessoas tinham um relacionamento um pouco melhor do que o de hoje. A relação entre vendedor hoje e naquela época realmente é bem diferente. A gente que era do comércio, quando começava a comprar de uma certa empresa que vendia alguns produtos, digamos, chocolate, produtos da linha Adams, parte de tabacaria, você se afinava com ele, ficava amigo. Você acabava comprando sempre com o mesmo vendedor. Hoje em dia não. Você tem muito mais opções e também tem que procurar preço. Hoje, o preço é tudo. Naquela época também era. Mas se você faz uma compra muito boa, você tem boas condições de vender com preço acessível para quem compra. Mas era um tratamento diferenciado. Hoje um vendedor chega, às vezes, não sabemos nem o nome. Quando você pensa em falar com ele, já foi embora. Era diferente o relacionamento. A vida hoje é corrida pra todo mundo, mas eu acho que ainda tem que acalmar um pouco porque a vida não é só trabalho, lucro, dinheiro. Tem pessoas, às vezes, acabam esquecendo essa afinidade que eu acho que deve ter, principalmente quem compra e quem vende, e para quem consome o que você vende. Cheguei a ir várias vezes a São Paulo, pegava o metrô e tudo. Não sei andar muito em São Paulo, mas tinha uma senhora, mãe de um amigo meu, que gostava de ir. Então caminhava. Íamos ao bairro daqueles produtos orientais, na Liberdade. Comprava muitas coisinhas na parte de tabacaria, que isso vendia muito. Eram presentinhos, coisa importada que poucas pessoas tinham. No comércio, no meu caso, sabia o cliente que tinha. Então você batia o olho e sabia a mercadoria: “Essa vende, essa não.” Eu gostava muito de fazer essas compras quando era possível. Os estabelecimentos comerciais mais conhecidos em Campinas eram a Casa Mousinho, parte de gráfica, que eu trabalhei, que fechou, infelizmente. O proprietário Senhor Luizinho faleceu; a Casa Ezequiel, o Restaurante Rosário, o Éden Bar, o Giovanetti que só tinha um, o Bar Voga, City Bar ali no Centro de Convivência antigo, permanece até hoje. Tinha a Baby Calçados. A Líder era também uma loja de tradição de Campinas, que foi vendida para Rede Magazine Luiza. Depois entrou Casas Bahia, e tudo veio afunilando esses menores. Acaba vendendo. Acaba não tendo jeito de competir com eles. E tem muitos, assim que no momento eu recordo: Pizzaria Etna, a Torre de Pizza.
CAFÉ REGINA
Quando eu assumi o Café Regina tinha quatro funcionários. Cinco com o caixa. Depois trouxe um irmão mais novo pra trabalhar junto comigo e assumi o caixa. O movimento foi aumentando e hoje eu estou com dez funcionários. Tem algumas histórias realmente interessantes em relação ao Café, que são algumas reformas. Primeiro, quando comprei o Café Regina, até então eu tinha só uma tabacaria no Éden Bar. Acabava um pacote de cigarro, vamos supor na sexta à noite e isso aí ia ser entregue para ele na segunda-feira. Então o que acontecia? Eu vendia muito, além de tabacos, eu vendia cigarro no atacado. E nesse atacado era um, dois, três, 50 pacotes; se tivesse e a pessoa quisesse, eu venderia. Então um dia o gerente do Café Regina foi comprar três pacotes de cigarro e disse que o proprietário iria vender. Eram dois cunhados, um de Santos e um aqui de Campinas. E eu não sabia, na realidade, o que era o Café ainda, não tinha assim noção do tamanho que o nome do Café Regina representava. Então eu fui tomar um café lá, me apresentei e tivemos um início de conversa em relação à venda. E essa pessoa, que ficava aqui, o cunhado, não tenho nada contra, mas era uma pessoa instável. Ele chegou e pediu um preço “x”. Eu falei: “Mas como é o pagamento disso?” “É à vista.” “Então está bom, muito obrigado. Não está no meu alcance.” Passaram uns 15 dias depois, o Alfredo Chagas chegou: “Você vai perder o café, o café é um bom negócio. Você falou que queria relacionar a parte de tabacaria com café. Os dois dão um casamento perfeito.” Eu falei: “Mas eu já fiz uma oferta e ele não aceitou.” Aí ele falou: “Mas o cunhado dele está vindo de Santos, é uma pessoa mais ponderada, você pode conversar.” Aí eu conversei com o cunhado dele. Falei em preço novamente. Já era outro preço. Marcamos pra semana seguinte porque o cunhado tinha que ir embora pra Santos. Quando fomos conversar, outro preço. Em dois meses o preço alterou cinco vezes. Mas algo em mim falava: “Compra, compra, compra.” Marquei um encontro na contabilidade pra ver com o meu contador e os dois. Nisso eu já tinha feito uma pré-proposta em relação ao preço e o cunhado dele de Santos, tinha aceitado. Aí fomos pra contabilidade. Eu já tinha explicado tudo para o contador, falei: “Vamos evitar conversar com o fulano lá pelo seguinte, porque a pessoa de Santos é uma pessoa mais ponderada e é mais de palavra.” Eu apresentei o contador e fomos sentar. Nisso eu já tinha passado todo o preço, toda a forma como ia ser pago. Praticamente 50% ele ia dar em questão de uma semana e os demais ele ia dividir pra mim em 12 pagamentos. Eu consegui isso, sendo que ele queria praticamente à vista. Quando eu passei os números pra ele, o segundo levantou e falou: “Olha, não foi esse o preço.” Eu falei: “Eu combinei com você, com o Rubens de Santos.” Ele falou: “Não, se você quiser realmente comprar é cinco mil a mais dessa proposta que você está fazendo.” E o meu contador, meio nervoso, já queria brigar. Eu chutei o pé dele por baixo da mesa e falei: “Está certo, põe mais dois pagamentos então em cima.” Ele pegou, aceitou. E nisso saímos dali. Eu fui tomar posse cinco dias após o negócio realizado, porque eu estava concretizando o negócio. E quando eu estava no estabelecimento tinha muito mais coisas, quando eu fui tomar posse era outra... Mas não liguei para aquilo. Aí fui na companhia que fornecia café na época, era a empresa São Joaquim, Café São Joaquim, e expliquei que estava comprando. Ele pagava semanalmente e numa negociação com a São Joaquim passei a pagar após 30 dias. Ali capitalizei pra uma eventual parcela, e nisso eu fui negociando. Eu consegui pagar com os “pés nas costas” porque eu tenho até as reportagens antigas de 1984, até cita o gerente antigo, que era o Alfredo Chagas. Teve um aumento muito grande no café. Assim que eu peguei, subiu quase 200%. Então aquilo a gente tinha que repassar para o consumidor. Não era o nosso alvo, mas tinha que ser repassado. Então a prestação se tornou barata pra mim, tanto é que após 60 dias, quando eu estava pagando a segunda parcela, ele veio me propor pra desistir do negócio que ele me devolvia com lucro. Eu disse pra ele que estava agradecido, mas por enquanto dava pra eu manter a minha palavra e o pagamento e se um dia eu não conseguisse, eu venderia pra ele. Graças a Deus não foi necessário. Ao lado tinha a Kopenhagen, que era uma casa muito antiga também. A casa da Kopenhagen, depois de um determinado tempo, começou também a trabalhar com café, só que o café expresso, não batia de frente com o meu. Depois a Kopenhagen foi fechada. Aliás, o prédio foi vendido e a pessoa que comprou o prédio não conseguiu fazer locação para a Kopenhagen. A Kopenhagen saiu de onde estava situada e foi montada a Giovanetti. Depois veio o bingo. Pegou fogo naquela região ali, na época, que era o Restaurante Cenati e o Taco de Ouro, casas também antigas e tradicionais, que foram totalmente destruídas. Aí veio um grupo de São Paulo, alugaram o prédio e edificaram novamente. Nesta época, porém, o Café teve um desequilíbrio porque ficou fechada a rua por um determinado tempo, quase 60 dias, porque podia cair alguma parte. O prédio era tombado pelo órgão Condephaat [Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arquitetônico]. E depois que reabriu novamente. Estava sujeito até a atingir o Café, graças a Deus não atingiu. Essas foram as modificações que eu recordo. Agora, os demais prédios, a padaria ali em frente, a Padaria Orly se mantém, inclusive até hoje. Na esquina era a loteria, continua, que é inclusive do filho do proprietário do prédio, da família Faber.
PRODUTOS
Quando eu iniciei em 1984, se vendia muito mais charutos. Vendia muitos tipos de charutos e cigarros importados. Hoje não tem essa facilidade. Como entrava eu não sei. Não tem mais esse tipo de cigarro importado, americano mesmo. Então havia algumas marcas famosas, que às vezes a pessoa conseguia pedir pra gente e nós conseguíamos. Esses produtos não tem mais. E quanto ao charuto também, algumas marcas foram saindo e entrando novas marcas no mercado, mas marcas mais caras. E ainda se vende um pouco de charuto cubano. Nós temos também um charuto muito bom feito na Bahia. Quando os americanos vem pra cá, eles gostam de fumar muito charuto, chegam a levar caixas. Mas outros produtos foram se adequando conforme a demanda, a procura. Isqueiros, artigos para charuto, para cachimbo, que vendia bastante também, caiu a venda. Então, dentro do café eu fui ampliando algum mix. Coloquei um doce português, alguns bolos, pastelzinho. Tem um pastel lá, qualidade fina, uma massa saborosa, o meu pai tem essa receita há mais de 50 anos, desde os tempos de Minas. Então sempre procuramos pôr alguma coisa a mais, que o cliente, às vezes, chega e quer. Esses jovens hoje querem um cigarro diferente, cigarro de palha. Até cigarro de palha essa moçada fuma. Então vamos colocando os produtos à medida que vamos sentindo a necessidade.
MOBILIÁRIO
A louça era toda, na época, branca. Depois, nessa última reforma, em 1999, ela levou a logomarca do café. E inclusive também, nessa reforma, eu quase apanhei no dia. Eu reformei o café totalmente porque o sistema lá de fazer o café, de coador, era feito na frente do café. Então eu notava que as moças estavam passando o café e ficavam olhando para rua, o carro descendo, e olhando, e perdia um tempo com aquilo. E nessa reforma eu falei: “Vamos modificar.” E levei o café para ser feito na parte do fundo. E na frente, onde se fazia aquilo lá, em parceria com o Café Canecão, depois eu mudei, foi colocada uma máquina de três grupos, muito bonita, com o desenho de uma águia. E nesse dia que foi reabrir ao público eu também dei café o dia todo, gratuitamente, e mini pão de queijo, porque o pessoal ficou ansioso pra ver a reforma. E quando chegaram aqueles clientes mais tradicionais e viram aquela máquina lá, falaram: “Mas o que vocês estão fazendo? O Café Regina não é seu, é patrimônio de Campinas. Eu vou quebrar aquela máquina.” Aí eu falei: “Calma, meu senhor, vem aqui.” Peguei na mão do senhor. Ele é cliente, inclusive, até hoje, levei ele pra lá e falei: “Não estamos mudando o sistema de fazer o café. Aquilo ali é mais uma peça decorativa para vender também café expresso, mas a nossa tradição continua.” “Ah, bom, agora você me deixou mais tranqüilo.” Então são clientes tradicionais que se sentem realmente também donos. Faz parte da história e não querem que mude o sistema, o modo de ser feito.
FORMAS DE PAGAMENTO
Às vezes chega alguém: “Ah, posso tomar? Eu pago depois.” Isso é meio dificultoso para o caixa. Quando eu estava no caixa era outra coisa, conhecia todo mundo, mas a menina tem que tirar a ficha. Então, às vezes, há um bloqueio nessa parte. Mas quando estou por perto e a pessoa pede, só faço sinal que tudo ok. Então os outros produtos se pagam com cartão de crédito, Visa e Mastercard. E os demais, as pessoas são obrigadas a tirar a ficha primeiro pra depois consumir. Então praticamente a minha venda total, 99% é à vista. E quando chega um cliente que está diariamente lá e quer tomar um café ou comer alguma coisa, acabo deixando marcar. Marca, depois a pessoa volta e paga. Mas praticamente 99% é à vista.
PROMOÇÕES
Eu comprei lá em 20 de setembro de 1984. Quando deu 20 de setembro do ano seguinte, 1985, eu senti que a clientela, através de uma pesquisa que foi feita... Porque uma pessoa queria lançar um produto pediu autorização pra fazer uma entrevista com os clientes. Eu falei: “Tudo bem.” Essa pessoa queria lançar esse produto no Café Regina, então eu disse que poderia fazer. E nessa pesquisa deduziu-se que 80% dos clientes que passavam ali, na época, em torno de 2 mil e 500 a 3 mil e 500 pessoas eram pessoas que estavam ali todos os dias. Eram os bancários, juízes, promotores, advogados e os comerciantes da região. Então não foi viável o lançamento desse produto. Eu não recordo qual, mas não era viável porque era a mesma clientela. Ele queria um tipo de clientela que fosse diferenciada diariamente. Por causa dessa pesquisa, inclusive, eu adotei o sistema. Aí em setembro, no primeiro aniversário da minha compra, não da fundação do Café. Quando abriu o Café, eu pus uma placa dizendo que o café, naquele dia, era gratuito em função do aniversário do café sob a minha direção. E desde lá até hoje, porque no dia 20 de setembro agora vai fazer 23 anos sob a minha administração, eu continuo fazendo essa oferta para os clientes.
TRADIÇÃO E MUDANÇAS
A decoração, agora vamos passar por uma nova reforma. Inclusive, agora, no mês retrasado fiz uma parceria. Vendi 1/3 do café pra uma pessoa pra tentar entrar no ramo de franquia. E a decoração realmente vai ser mexida novamente. Tem fotos do fundador, porque foi feita uma homenagem para ele. E a pessoa que pintou o quadro do fundador pintou a minha também, mas isso já vai para cinco, seis anos. Então vai ser tirado isso, vai colocar fotos da cidade. Eu já tenho algumas lá, a cidade antiga, acho que de 1930, 32, 38. E vai passar por uma modernização nas cores. Tem um arquiteto bolando. Alguns móveis vão ser mudados, mas a tradição, de certa forma, continua a mesma. E agregam outros. O Café é meu em termos, mas já faz parte realmente da história de Campinas, porque ali passam todos os políticos, pessoas que levaram o nome de ruas famosas no centro da cidade passaram por lá. Tem histórias que eu recordo, daqueles recortes, que tem um senhor que falou que tomou um café lá com Getúlio Vargas. Então o ex-prefeito, o Grama [José Roberto Magalhães Teixeira], ministro que vem em Campinas, passam por lá. Então o Café engrandece e engrandece muito por eu ser o proprietário. Às vezes, a gente sente que há pessoas que querem falar com você. E eu sou uma pessoa comum, normal. E um dia, tem um fato interessante. Antigamente eu ficava no caixa direto. Agora, eu não fico mais no caixa por causa do computador, esses números pequenos, eu não consigo mais. Mas eu passo lá minhas dez, 11 horas por dia. E tem a parte de cima, que tem o escritório. E um dia eu desci pra tomar um café, arejar um pouco. Aí chega uma pessoa, bate papo, chega outra, bate papo. E na hora que eu desci, senti que tinha um cliente na porta, na faixa de 72 anos mais ou menos, um senhor de cabelo branco e olhou para mim. E a gente tem sensibilidade, você vê que a pessoa parece que quer falar com você. Então naquilo saiu essa pessoa que estava conversando, e chegou um outro amigo. Conversamos mais uns dez minutos. Saiu esse, chegou o outro. E a pessoa ia se aproximar, parava e voltava. Nesse pouquinho que eu desci pra tomar um café, eu fiquei quase uma hora e 15 minutos conversando com um e com outro, e essa pessoa não saía. Eu falei: “Não é possível, essa pessoa vai fazer uma reclamação. Então eu tenho que atendê-lo.” E quando saiu essa última pessoa, também cliente, batendo papo, ele se aproximou e eu já fui de encontro a ele. Já dei a mão pra ele e falei: “Eu estou sentindo que o senhor queria falar comigo.” Ele falou: “Eu queria sim. Eu queria te conhecer pessoalmente. Eu vejo sua correria aí. É um prazer muito grande conversar com o dono do Café Regina. Eu vou chegar em casa e vou falar para os meus filhos.” Então isso engrandece a gente porque são pessoas que pensam que a gente é... Mas não é nada disso. Então eu sou uma pessoa comum, como os outros. Às vezes, nós temos a nossa privacidade e a pessoa nos vê de um lado e acha que é aquilo, mas não é nada disso. Eu sou uma pessoa de conversar com qualquer um, desde o mais rico até o indigente que eu dou um cafezinho. Somos pessoas comuns. Nós somos todos iguais.
COMÉRCIO DE CAMPINAS
Campinas, além de crescer muito e ter um número populacional diferente das outras cidades daqui da região metropolitana, ela ainda tem muito a crescer em termos de investimento cultural. Tem cidades menores que são mais ricas nessa parte, no esporte. Campinas, em certa época chegou a ser eleita a primeira no ranking em relação aos esportes. Hoje perde pra Paulínia, Americana, dependendo do tipo de esporte. Eu acho que os nossos dirigentes têm que voltar um pouco e focar essa geração, esses jovens. Nós vamos fazer um trabalho agora em cima disso. Eu tenho alguns colégios perto e vou distribuir vale-café pra criançada, esses jovens de 17, 18 anos, que estão entrando no Bentinho [Colégio Politécnico Bento Quirino], na Escola Carlos Gomes, na Microcamp, pra também saber o que é um café, saborear. Porque muitos jovens hoje não gostam. Eu tenho três filhos e apenas um toma café; e toma dois, três cafés. E o café é saudável, acima de tudo, para as pessoas. Então eu vejo ainda muito que Campinas precisa crescer em muitos aspectos, assim em relação à cidade, comparada com outras. Mas Campinas cresceu muito e realmente é um pólo muito rico. Você vê hoje aqui aeroporto e mais outras coisas. Rede hoteleira cresceu muito. Nós temos hotéis aí que compara com esses grandes resorts do país. Então Campinas cresceu e ainda tem a crescer muito, mas deixa a desejar em alguns aspectos voltados para a população, referente aos jovens principalmente. Você vê hoje que tem muitos jovens aqui que saem pra Indaiatuba e outras cidades, Itu, pra ir atrás de algumas boates que Campinas, às vezes, não tem, pondo em risco, inclusive, a vida desses jovens. Então eu acho que tem que fazer atrações que os mantenha na cidade, perto dos seus familiares. O comércio em si também cresceu muito. Esses shoppings, esses mega-shoppings que vieram pra cá, esses empreendimentos, isso aí traz, cada vez mais, renda em benefício para a cidade. Então, nessa parte aí, que é dos dirigentes e tudo, eu acho que está de parabéns. Mas, focando um pouco fora do comércio, ainda são necessários outros empreendimentos.
MEMÓRIAS DO COMÉRCIO DE CAMPINAS
Eu acho muito agradável. É uma honra estar aqui deixando esse depoimento. Isso só engrandece o nome do Sesc. Quero parabenizar vocês desde já, naturalmente é um feito que vai marcar para outras pessoas que não conhecem Campinas.
LIÇÕES DO COMÉRCIO
O comércio, às vezes, é visto por pessoas de outros focos como ingrato para pessoa. Mas para mim ele é muito gratificante porque eu acho que o comerciante tem que ser, acima de tudo, honesto. Honesto com as pessoas, com o produto que vende, com o carisma das pessoas. Então isso só tem a engrandecer quem está de um lado e do outro, quem compra e quem está vendendo. Agora, eu fico muito feliz porque eu aprendi isso na minha infância, com a minha simplicidade e dos meus pais, mas voltando pela honestidade acima de tudo. Então isso para mim é a base essencial, você comprar produtos e dar a garantia para pessoa. E como o meu produto é mais parte de consumo, você também tem que procurar fazer o melhor. Se tem uma reclamação: “Ah, o café está frio”, um descuido de uma moça. Ou: “O café está fraco”, a tradição aqui é forte. “Por favor, joga fora, joga todo o bule fora, faz um novo para o cliente.” “Não, mas é só um.” “É só um. Faz um bule inteiro, mas não tem problema. Se ele quiser tomar mais, toma.” Então eu vejo desse lado. A honestidade do nosso lado tem que ser primordial.
RELAÇÃO COM O COMÉRCIO DE SÃO PAULO
Se comparando com outros estados, o estado de São Paulo tem o que dizer em relação ao comércio porque praticamente, no populacional ele ganha em termos de tudo. Então todas as feiras, todos os focos giram em torno de São Paulo. Apesar de eu ser de Minas, mas praticamente a minha vida é aqui. Como diz o outro, hoje eu estou com 51, praticamente há 33 anos já estou em Campinas. Eu sou inclusive cidadão campineiro. Então a minha vida é Campinas. Tanto é que a minha família está toda aqui. Em Minas eu voltei apenas duas vezes. Então eu vejo, apesar de Minas também ter um comércio muito rico em outras áreas, manda praticamente quase que na moda, principalmente na moda feminina. O pessoal até do Rio, de São Paulo também compara lá. Mas o comércio de São Paulo eu acho que ainda é imbatível, em quase todos os setores.
FUTURO DE CAMPINAS
Eu acredito muito, os meus filhos estão aqui ainda, que Campinas vai crescer muito. Então é o que eu disse, agora vai dos governos, dos dirigentes, que tem que crescer em base adequada para população nova que vem, não apenas abrir novos bairros e deixar a Deus dará as pessoas com necessidade. Então tem que fazer uma coisa traçada, bem elaborada, porque daqui para frente sempre vai vir, como em todos os setores, vão vir pessoas de todas as cidades buscar, como eu vim para cá em 74, pessoas que vão querer ter confiança num futuro melhor pras suas famílias. Mas tem que saber escolher. Eu acho que as pessoas que se põem nessa posição de vir para uma cidade maior, eu acho que elas têm que também fazer uma pesquisa ou ter um certo conhecimento, algum familiar, uma base de suporte, porque a pessoa vem e depois chega aqui com cara e coragem. Depois acaba em um bairro onde depois os seus filhos crescem, não têm alimentação, cai no abandono, na criminalidade, nas drogas. Os dirigentes têm que estar atentos para essas pessoas e saber acolher, porque antigamente parece que tinha um sistema para as pessoas que chegavam aqui, até os próprios andarilhos. Não tinha tanto indigente como se vê hoje. Tinham alguns albergues. A pessoa pegava e encaminhava, ou depois até pagava. Tinha um governo aqui, não me recordo qual, na época, mas que pegava essas pessoas, até pagava passagem para eles de volta porque eles não tinham estrutura nenhuma para ficar. Campinas tem que crescer, e vai crescer muito, como as outras cidades, mas eu acho que tudo isso depende muito dos prefeitos e governadores, dos seus estados, para o melhor comum para todos.
AVALIAÇÃO DE VIDA
Se hoje você me fizesse uma pergunta, se você tem um ídolo na sua vida, eu acho que todo mundo tem, eu queria deixar isso aqui e dizer que realmente eu tenho esse ídolo. É a minha mãe. Por quê? Em relação à luta, à bravura que ela teve para salvar um filho, sabendo que os outros poderiam morrer. Então eu acho que isso é uma lição de vida muito grande. Jamais vou esquecer essa parte, essa luta de mamãe porque ela perde os demais, mas sobrevivem todos. Então, me baseando nisso, eu só tenho garra para lutar igualmente pelos meus filhos e deixar um recado, como eu disse, eu não sei onde vai chegar esse vídeo. Então se chegar até os jovens, que o futuro é deles, que eles tenham base na família, no pai, na mãe, e que esqueçam drogas e tudo mais. Isso não leva a nada, só leva à perdição e à morte. Então, que lute com insistência nos estudos e procurem se relacionar em família. Porque a família eu acho que é a base de tudo e pode levar eles sempre a crescerem. E trabalho, porque o futuro é deles que estão vindo aí e que têm uma vida toda pela frente. Eu não sei quanto tempo ainda vou viver, mas o tempo que eu vivi, graças a Deus eu considero bem vivido pelo meu trabalho e pela família que eu tenho.
Memórias do Comércio - Campinas (MCCAMP)
Café tradicional
História de Jorge Francisco Vaz
Autor: Museu da Pessoa
Publicado em 06/08/2008 por Museu da Pessoa
P/1 – Boa tarde, senhor Jorge Francisco Vaz, é com grande satisfação que nós o recebemos aqui...
R – Muito obrigado.
P/1 – Para o entrevistarmos a respeito da sua trajetória. Primeiramente nós gostaríamos que o senhor nos dissesse o seu nome completo.
R – Jorge Francisco Vaz.
P/1 – O local e a data de nascimento.
R – Eu nasci em 2 de janeiro de 1956 em Rosário de Oliveira, Minas Gerais. Em Campinas, estou aqui desde 1974.
P/1 – Qual o nome dos seus pais?
R – Nelson Marcelino Vaz e Olívia da Cruz Vaz.
P/1 – Então o senhor disse que o senhor veio de Minas. A sua família é mineira?
R – A família é mineira.
P/1 – E o senhor se lembra em que condições, porque a saída de Minas pra São Paulo?
R – Na época era cidade do interior de Minas, mas é uma cidade hoje já na faixa de 100, 120 mil habitantes, mas na época poderia ter uns 40, 50 mil. E como todo pai e toda mãe quer o melhor pro filho, o quê que acontece? Vamos chegamos em uma certa idade, quer um estudo melhor, uma faculdade que lá, inclusive, na época, nem existia. Então viemos para Campinas para os estudos, aprimorar e desenvolver, e acabamos ficando por aqui.
P/1 – Como era a sua vida nessa cidade em que o senhor nasceu? Como era a sua infância, o bairro onde o senhor morava?
R – Uma infância praticamente pobre, como no interior assim. A minha família era muito humilde mas, Graças a Deus, a gente se orgulha da honestidade que os pais passaram pra gente. E sofrida, inclusive. Então eu tenho recordações meio tristes assim da minha infância em relação ao caso que eu tive. Nós somos oito, todos vivos. Éramos em dez, perdeu um casal. Um eu não conheci, ele também chamava Jorge. E quando eu nasci o meu irmão mais velho chorava e perguntava pelo irmãozinho. A minha mãe pegou e repetiu o nome, né? E depois, antes de nascer a caçula, as duas meninas mais novas, a minha mãe teve um problema, o médico desenganou uma irmã. E naquele trabalho, que o meu pai tinha um bar, minha mãe tinha uma pensão, cuidava de seis filhos, teve uma decepção muito grande em relação a isso. E os médicos lá falaram que estava praticamente desenganada, que ela iria morrer mesmo, era rezar e esperar. Ela poderia viver algum tempo mais, mas só mesmo um milagre poderia salvar. E a minha mãe era muito religiosa, ela ia à missa todo dia. E numa dessas, indo na missa dela, ela saiu batendo um papo com uma amiga dela e a amiga dela ficou sabendo do problema que a minha irmã tinha, que também eu não recordo o nome da doença na época. Ela disse que já estava tendo cura. Tinha um médico que tinha curado uma menina também no Rio de Janeiro. Mas a minha mãe não deu dois tempos. Ela chegou em casa, falou: “Nós viajamos pro Rio de Janeiro depois de amanhã”, assim. E a gente pequeno, não sabia de nada, né? Aí o meu pai chegou, falou: “Eu já comuniquei com o seu...”, o meu pai tinha um irmão no Rio de Janeiro, “com o seu irmão lá, meu cunhado, pra arrumar lá um local”. Falava, naquela época: “Vamos arrumar as trouxas”. Pegou só as roupas e algum bem lá e colocou. Alugou um caminhãozinho e fomos pro Rio, assim mesmo, dois dias. E o meu tio, chegou lá, já tinha arrumado um cômodo praticamente, sei lá, duas vezes mais que esse, que era a cozinha e um cômodo, e fomos todos juntos. A minha mãe ainda, na época, levou uma sobrinha. E nessa época eu lembro que nós passamos muita necessidade. Depois o meu pai vendeu o bar e foi pra lá e arrumou um emprego _____, no subúrbio. E neste tempo a gente estava, a minha mãe procurando o médico pra cura da minha irmã. Eu recordo que a alimentação nossa era tipo assim um feijão moído e canjiquinha, aquele farelo que dava pra pinto, que era socado na nossa boca pra sobreviver. E, Graças a Deus, com essa luta da minha mãe hoje a minha irmã está viva, mãe de três filhos. Isso me emociona muito. Então eu recordo que foi uma vida triste mas que valeu a pena pela vida da minha irmã.
P/1 – Do quê que o senhor gostava de brincar quando criança?
R – Era futebol, né, que era o que a meninada fazia. Mas quando tinha tempo porque quando a gente morava ainda nessa cidade, fomos pro Rio. Aí depois que a minha irmã restabeleceu, tudo, foi curada, nós voltamos pra Muriaé, que era uma cidade já pegado a Rosário de Limeira, né, cidade maior. Então lá também o meu pai teve um bar e tudo, e a minha mãe tinha, aquelas casas antigas, grandes, então um quintal de mil metros. Era tipo uma chácara dentro da cidade. Então ela cultivava couve, cebolinha, taioba, que os paulistas acho que não conhecem muito. Mas ela fazia um varal grande assim, em bambu, amarrava aqueles (montes ?) de couve, de coisas, e eu e meu irmão saíamos vendendo, de manhãzinha saíamos pra vender. Então eu não tive uma infância assim que nem toda criança que tem o seu lazer, tem o seu estudo. Foi uma luta difícil mas, Graças a Deus, com empenho nós vencemos.
P/1 – O senhor disse que o senhor seu pai e a senhora sua mãe, a sua mãe tinha uma pensão, ou trabalhava em uma pensão, e o seu pai em um bar. Então eles já viviam do comércio, né?
R – Sim.
P/1 – E como é que o senhor vê isso? Os seus irmãos também têm atividade comercial? Como o senhor vê essa herança do gosto pelo trabalho no comércio?
R – É, eu assimilei mais porque, desde pequeno, uma ordem de uma mãe era cumprida rigorosamente, como a do pai, principalmente. Então: “Vai pro bar, vai fazer as suas horas lá”. Então a gente ia e atendia o povo. Com sete, oito anos, nove anos, ficava em bar, tomava conta. Então o comércio pra mim satisfaz muito, que desenvolve, né? Você conversa com um, com outro. Então ele, pra mim, é muito sadio. Então eu, praticamente, adotei mais essa parte comercial, do comércio. Os meus pais já tinham no sangue. Agora, alguns outros irmãos tentaram mas não deram sorte. Eu tive também uma tabacaria, passei para o meu irmão, mas também não foi pra frente. E hoje a família é diferente. Eu tenho irmão hoje que trabalha na Unicamp, tem outro que é esteticista, outra está em Boston com o outro, a caçula e o mais velho. Mas o que está mesmo no comércio até hoje, e permanece, sou eu, e estou transmitindo isso pro segundo filho. Então ele já toma conta de uma cantina e já está se virando, Graças a Deus.
P/1 – O senhor disse que o senhor veio pra Campinas, o senhor já não era pequenininho, o senhor já era mocinho quando veio pra Campinas.
R – Sim, já era. Estava com 18 anos, 1974.
P/1 – E quais as impressões que o senhor teve ao chegar na cidade?
R – Ah, pra mim foi um trauma. Você sair de uma cidade que você tem o conhecimento, tem os amigos, e vem praticamente já saindo da adolescência, e já pra trabalhar e tentar uma faculdade. Foi meio triste. Eu não tive escolha. Eu cheguei de uma praia do Espírito Santo, fiquei 15 dias na casa de um amigo. E quando eu cheguei a minha mãe pegou e falou assim: “Olha, está aqui a sua mala, você está indo pra Campinas”. Já tinha um irmão morando aqui, trabalhava antigamente aqui no Pires, uma casa muito tradicional, que inclusive também já fechou. E falou assim: “Você vai pra lá pra procurar um espaço. Eu sei lidar com essa pensão, o seu pai vai ficar aqui mais algum tempo vendendo isso aqui. E você tem um conhecimento maior, inclusive, que os outros irmãos mais velhos. Vai procurar lá estudos pra matricular” “Mas, mãe, de uma hora pra outra?” “Já está aqui a passagem”. Não tinha como, então eu vim. E cheguei aqui, acabou... Na época também, onde é o Bradesco, a maior agência aqui na Francisco do Glicério, era uma pensão, e o meu irmão ficava lá. Então eu fiquei com ele algum tempo, depois achamos uma outra casa. Isso a minha mãe já estava vindo. Ela concretizou o negócio, alugou, e também alugou pra pensão, pra defender, pra pagar os aluguéis e tudo, e crescendo. Depois o meu pai chegou também e estamos aí até hoje. Hoje, Graças a Deus, o meu pai, a minha mãe vivem, os meus irmãos, tudo bem de saúde e trabalhando aí, né?
P/1 – Como que era Campinas na época que o senhor chegou? Como o senhor... O senhor chegou em condições não muito alegres, favoráveis para o senhor. Como é que o senhor viu Campinas? Como lhe apareceu a cidade?
R – A gente, vivendo naquela cidade pequena, era tudo novidade, uma vida mais agitada. Mas mesmo assim era, na época também, uma Campinas mais pacata. Na época tinha 380, 400 mil habitantes, hoje estamos aí com um milhão e cem. E Campinas, eu praticamente, quer dizer, de 400 a 1100, eu praticamente também cresci com Campinas, né? E consegui vencer. Foi meio difícil. Passei por alguns, por vendedor, corretor, trabalhei numa antiga gráfica, que também é papelaria (Mãozinho ?), depois trabalhei na Secretaria da Fazenda. Aí conheci a minha esposa, naquela época. Ela me levou pra almoçar na casa do avô. E chegando lá, depois do almoço eles gostavam de jogar buraco. Aí faltou um e me pegaram: “Sabe jogar?” Eu falei: “Sei”. E joguei com o senhor. Era brincadeira mas ele sempre gostava de ganhar. É interessante esse fato porque caiu eu e ele. A minha esposa, namorada na época, não jogava, e jogava o genro dele e a filha dele. E nós ganhamos as duas partidas que foram jogadas. Então: “Você está convidado agora, todo domingo, pra vir almoçar aqui com a gente aqui. Você vai ser o meu parceiro definitivo”. E nesse conhecimento, ele tinha oito tabacarias em vários pontos da cidade, no Rosário, (Vanpote ?), Ponto Chique, Gaúcha, que eu recordo, Éden Bar, e tinha mais duas. Então ele já estava também ficando velho e cansando e falou que ele ia vender. E o genro dele falou: “Oh, Jorge, você tem pique pra comércio e tudo. Você não quer comprar?” Eu falei: “Eu não tenho dinheiro. Eu estou trabalhando lá na Secretaria da Fazenda, comprei uma chacrinha aí mas estou pagando em 50 vezes. Paguei, sei lá, meia dúzia” “Pode deixar que eu arrumo o negócio pra você”, o tio dela falou. Eu sei que eu dei a chacrinha, continuei pagando e ele me deu todo o estoque, eu comprei a tabacaria no Éden Bar, isso em 1978, quatro anos após chegar aqui. E o salário que eu tinha, na época, vamos supor que seja 600 reais em termos de hoje o que ganhava na Secretaria da Fazenda. Eu passei a ganhar dois mil trabalhando por conta, mas entrava às sete horas da manhã e saía à uma. Mas aquilo pra mim era uma brincadeira porque eu saía contente, ia pra casa e voltava. Morava perto, na Júlio Mesquita com a Benjamin Constant. Então eu ia a pé, voltava e não via a hora do dia amanhecer pra voltar a trabalhar. Então, ali eu consegui já fazer um pé de meia. Paguei, no primeiro ano, a tabacaria. No segundo comprei um apartamentinho no Pacaembu e aluguei por um ano. No terceiro ano eu já mobiliei, mudei e casei, 1981.
P/1 – Que beleza. Senhor Jorge, o senhor tem lembrança de como eram as lojas, como era o comércio naquele período? Assim, as lojas, a feição, como era o movimento assim das lojas.
R – O movimento era muito diferente dos dias atuais porque as butiques centralizavam, né, na General Osório, Tomás Alves, a Treze de Maio, como hoje, os pontos super valorizados. Você queria entrar no comércio, você tinha que pagar uma fortuna pelo ponto. Pagava-se luva, né? E a vida era mais bonita, mais saudável porque você saía. Eu lembro que eu morava aqui, não tinha carro na época, na Benjamin com a Júlio Mesquita. E a minha esposa morava, na época, aqui na Andrade Neves, ali na esquina também. Então eu saía a pé. Se você fizer esse trajeto hoje meia noite, uma hora, do jeito que eu fazia, eu não sei onde eu vou chegar, até onde eu chego. Então o comércio antigamente, naquela época a vida, as pessoas, era um relacionamento um pouco melhor do que o de hoje.
P/2 – Você sentia essa diferença na relação com o vendedor, com o comprador? Que hoje os produtos se vendem mais por si mesmos, pela aparência, pela propaganda. E você sentia uma diferença anteriormente, na relação do vendedor, por __________________ pessoas, por exemplo?
R – É, a relação entre vendedor hoje e naquela época realmente é bem diferente porque a gente que era do comércio já naquela época, quando começava a comprar de uma certa empresa que vendia alguns produtos pra você, digamos, chocolate, produto, linha Adams, parte de tabacaria, você se afinava com ele, ficava amigo. Então você acabava comprando sempre com o mesmo, né? Hoje em dia não. Você tem muito, realmente tem muito mais opções e você também tem que procurar preço. Então o preço hoje é tudo, como naquela época também era. Você faz uma compra muito boa, você tem condições de vender também boa e com preço acessível pra quem compra. Então era um tratamento assim diferenciado. Hoje um vendedor chega, você às vezes não sabe nem o nome. Quando você pensa em falar ele já foi embora. Então era realmente diferente o relacionamento com pessoas. A vida hoje é corrida pra todo mundo, mas eu acho que eu ainda tenho que acalmar um pouco porque a vida não é tudo só trabalho, lucro, dinheiro. Também tem as pessoas que às vezes acabam esquecendo essa afinidade assim que eu acho que deve ter, principalmente quem compra e quem vende, e pra quem consome o que você vende.
P/1 – O senhor percebe que houve uma mudança na sua forma mesmo de compras? Então antigamente o senhor tinha que ir a São Paulo pra fazer as compras?
R – Cheguei a ir várias vezes a São Paulo, pegava o metrô e tudo. Não sei andar muito em São Paulo, mas tinha uma senhora, mãe de um amigo meu, que gostava de ir. Então caminhava. A gente ia no Bixiga. O Bixiga não, o Bixiga é mais parte de restaurante. Naqueles produtos orientais.
P/1 – Liberdade.
R – Na liberdade. Então se comprava muitas coisinhas na parte de tabacaria, que isso vendia muito. Então era presentinhos, que era coisa importada mas que poucas pessoas tinham. Então você, no comércio, no meu caso, quando eu estava, a gente sabia o cliente que você tinha. Então você batia o olho e sabia a mercadoria: “Essa vende, essa não”. Então eu gostava muito de fazer essas compras quando era possível.
P/1 – Quando o senhor estava já como proprietário do seu estabelecimento, quais os estabelecimentos comerciais que o senhor citaria como os mais conhecidos em Campinas?
R – Era a Casa (Mãozinha ?), parte de gráfica, que eu trabalhei, que fechou, infelizmente fechou. O Senhor Luizinho, o proprietário, falecido. A Casa Ezequiel, o Restaurante Rosário, o Éden Bar, o (Jovanete I ?), que só tinha o um, o (Voda ?), Citibar ali no Centro de Convivência antigo, permanece até hoje. Tinha a Baby Calçados, a Líder. A _____ também é uma loja de tradição de Campinas, que foi vendida pra Rede Magazine Luiza. Depois entrou Casas Bahia, tudo, veio afunilando esses menores. Então ou acaba vendendo ou acaba não tendo jeito de competir com eles. E tem muitos, assim, que no momento eu recordo. A Pizzaria Etna, a Torre de Pizza.
P/1 – Quando o senhor assumiu o Café Regina, quantos funcionários o senhor...
R – Tinha, na época, quatro.
P/1 – Quatro.
R – Era cinco com o caixa, né? E então eu assumi e passei, tirei já o caixa, porque ficava eu, depois trouxe um irmão mais novo pra trabalhar junto comigo. Depois o movimento foi aumentando e hoje eu estou com dez funcionários.
P/1 – O que seriam assim os maiores problemas que o senhor, ou desafios que o senhor enfrentou no Café Regina?
R – Em relação a mão de obra?
P/1 – Em relação à permanência do Café Regina como uma referência não só em Campinas, mas em todo o estado. Muitas pessoas conhecem o seu Café Regina.
R – É, tem algumas histórias realmente interessantes em relação ao café, e algumas reformas. Eu, primeiro, quando comprei, até também é uma história, e eu tinha só uma tabacaria no Éden Bar. O gerente do Café Regina chegou um dia. E acabava um pacote de cigarro, quer dizer, vamos supor, na sexta à noite. Então isso aí ia ser entregue pra ele na segunda-feira. Então o quê que acontecia? Eu vendia muito, além de tabacos, eu vendia cigarro em atacado. E nesse atacado era assim, um, dois, três, 50 pacotes, se tivesse e a pessoa quisesse eu venderia pra ele. Então um dia ele chegou, foi comprar três pacotes de cigarro e disse que o proprietário do café iria vender. Eram dois cunhados, um de Santos e um aqui de Campinas. E eu não sabia, na realidade, o que era o café ainda, não tinha assim noção do tamanho que o nome do Café Regina já apresentava, inclusive naquela época. Então eu fui tomar um café lá, me apresentei e tivemos um início de conversa em relação à venda. E essa pessoa, o que ficava aqui, o cunhado, não tenho assim nada contra a pessoa, mas uma pessoa instável. Então ele chegou e pediu um preço “x”. Eu falei: “Mas como é o pagamento disso?” “Não, é à vista” “Então está bom, muito obrigado. Não está no meu alcance”. Passou uns 15 dias depois, o Alfredo chegou: “Você vai perder o café, o café é um bom negócio. Você falou que queria relacionar a parte de tabacaria com café. Os dois dão um casamento perfeito”. Aí eu falei assim: “Mas eu já fiz uma oferta lá e ele não aceitou”. Aí ele falou assim: “Não, mas o cunhado dele está vindo de Santos, é uma pessoa mais ponderada, você pode conversar”. Aí eu conversei com o cunhado dele. Aí fui falar em preço novamente, já era outro preço. Marcamos pra semana seguinte porque o cunhado tinha que ir embora pra Santos. Quando fomos conversar, outro preço. Em dois meses o preço alterou cinco vezes. Mas algo estava em mim, que falou: “Compra, compra, compra”. E marquei um encontro na contabilidade pra ver com o meu contador e os dois. Mas nisso eu já tinha feito uma pré-proposta em relação ao preço e o cunhado dele, de Santos, tinha aceitado. Aí fomos pra contabilidade. Chegou lá, já tinha explicado tudo pro contador, falei: “Oh, vamos evitar conversar com o fulano lá”, não vou citar o nome, mas não estou falando mal também, né, mas vamos falar o fulano, “pelo seguinte, porque a pessoa de Santos é uma pessoa mais ponderada e ela é mais de palavra”. Aí o contador, eu apresentei e tal. Fomos sentar. E nisso eu já tinha passado todo o preço, toda a forma como ia ser pago. Praticamente 50% ele ia dar em questão de uma semana e os demais ele ia dividir pra mim em 12 pagamentos. Eu consegui isso, sendo que ele queria praticamente a vista. Aí, quando eu passei os números pra ele, o segundo levantou e falou assim: “Olha, não foi esse o preço”. Eu falei: “Eu combinei com você, com _____ de Santos”. Ele falou assim: “Não, se você quiser realmente comprar é cinco mil a mais dessa proposta que você está fazendo”. E o meu contador, meio nervoso, já queria brigar. Eu chutei o pé dele por baixo da mesa e falei: “Ta certo, põe mais dois pagamentos então em cima”. Ele pegou, aceitou. E nisso saímos dali. Eu fui tomar posse só cinco dias após o negócio realizado porque eu estava concretizando o negócio. E quando eu estava no estabelecimento tinha muito mais coisas, quando eu fui tomar posse era outro. Mas também não liguei pra aquilo. Aí fui na companhia que fornecia café na época, era a São Joaquim, e expliquei que estava comprando. Ele pagava praticamente semanal, e numa negociação com o São Joaquim eu passei a pagar 30 dias. E ali também capitalizei pra uma eventual parcela, e nisso eu fui negociando. Eu consegui pagar com os pés nas costas porque eu tenho até as reportagens de tinta lá em 1984, até cita o gerente, dizem que é o Alfredo. Teve aumento muito grande no café. E assim que eu peguei também ainda subiu mais quase 200%. Então aquilo também a gente tinha que repassar pro consumidor. Não era o nosso alvo mas tinha que ser repassado. Então a prestação se tornou barata pra mim, tanto é que 60 dias após, quando eu estava pagando a segunda parcela pra ele, ele veio me propor pra desistir do negócio que ele me devolvia com lucro. Eu disse pra ele que estava agradecido mas enquanto dava pra mim manter a minha palavra e o pagamento, se um dia eu não conseguisse que eu venderia pra ele. Graças a Deus não foi necessário.
P/1 – O senhor nos relatou que o Café Regina já estava instalado nesse mesmo local, só que eu queria que o senhor comentasse como era o entorno do Café Regina no momento em que o senhor assumiu o café e hoje, essa transformação, se é que houve transformações na região, no bairro, na região em que o Café Regina está situado.
R – Não. O prédio em si não, que já estava edificado. Ao lado tinha a Kopenhagen, que era uma casa muito antiga também. E a casa da Kopenhagen, depois de um determinado tempo, começou também até a trabalhar com café, só que o café expresso, não batia de frente com o meu. E depois a Kopenhagen foi fechada. Aliás, o prédio foi vendido e a pessoa que comprou o prédio não conseguiu fazer locação pra Kopenhagen. A Kopenhagen então saiu de onde estava situada e foi montada a (Jovanete II ?). E aí veio o bingo. Pegou fogo naquela região ali, na época, que era o (Senati ?) e o Taco de Ouro, casas também antigas e tradicionais, e destruiu totalmente. Aí veio um grupo de São Paulo e alugaram o prédio e edificaram novamente. E nesta época, porém, o café deu um desequilíbrio ali porque ficou fechada a rua por um determinado tempo, quase 60 dias, porque podia cair alguma parte. O prédio era tombado pelo órgão (CONDEFAP ?). E depois que reabriu novamente, porque estava sujeito até a atingir o café, Graças a Deus não atingiu. Essas que foram as modificações que eu recordo. Agora, os demais prédios, a padaria ali em frente se mantém, inclusive está até hoje. Na esquina era a loteria, continua, que é inclusive do filho do proprietário do prédio, da família Faber.
P/1 – E nas demandas dos consumidores, os artigos que o senhor comercializava, quais foram as modificações, as transformações que ocorreram?
R – Se vendia muito mais, em 84, quando eu iniciei ali, charutos. Vendia muitos tipos de charutos. E cigarros importados. Hoje não tem essa facilidade. Como entrava eu não sei. Não tem mais esse tipo de cigarro importado, americano mesmo. Então algumas marcas famosas, que às vezes a pessoa conseguia pedir pra gente. Então a gente conseguia. Esses produtos não tem mais. E o charuto também, algumas marcas foram saindo e entrando novas marcas no mercado, mas marcas mais caras. E ainda se vende um pouco de charuto cubano. Nós temos também um produto muito bom, feito na Bahia. Quando vem americanos pra cá, eles gostam de fumar muito charuto, chegam a levar assim de caixas. Mas outros produtos foi adequando conforme a demanda, a procura. Isqueiros, artigos assim pra charuto, pra cachimbo, que vendia bastante também, também caiu bastante a venda. Então eu também fui, dentro do café eu fui ampliando algum mix assim. Coloquei um doce português, alguns bolos, pastelzinho. Pastel, que tem um pastel lá, qualidade fina, uma massa saborosa, que na época do meu pai, ele tem essa receita a mais de 50 anos, desde os tempos de Minas. Então sempre a gente procura por alguma coisa a mais, que o cliente às vezes chega e quer. Esses jovens hoje também, quer um cigarro diferente, cigarro de palha. Até cigarro de palha essa moçada fuma. Então a gente vai pondo à medida em que vai sentindo a necessidade.
P/1 – E o mobiliário, assim, os equipamentos, a disposição dos artigos, as embalagens, no seu caso especificamente a louça?
R – A louça era toda, na época, branca. Depois, nessa última reforma, em 99, que foi feita, ela levou a logomarca do café. E inclusive também, nessa reforma, eu quase apanhei no dia. Eu reformei o café totalmente porque o sistema lá de fazer o café, de coador, era feito na frente do café. Então eu notava que as moças estavam passando o café e ficavam olhando pra rua, o carro descendo, e olhando, e perdia um tempo com aquilo. E nessa reforma eu falei: “Vamos modificar”, e levei o café pra ser feito na parte do fundo do café. E na frente, onde se fazia aquilo lá, em parceria com o Café Canecão, depois eu mudei, foi colocada uma máquina de três grupos, muito bonita, com o desenho de uma águia. E nesse dia que foi reabrir ao público eu também dei café o dia todo, gratuitamente, e mini pão de queijo, porque o pessoal ficou ansioso pra ver a reforma. E quando chegou aqueles mais tradicionais, viu aquela máquina lá, o cara falou: “Mas o quê que vocês estão fazendo? O Café Regina não é seu, é um patrimônio de Campinas. Eu vou quebrar aquela máquina”. Aí eu falei: “Calma, meu senhor, vem aqui”. Peguei na mão do senhor. Ele é cliente, inclusive, até hoje, levei ele pra lá e falei: “Não estamos mudando o sistema de fazer o café. Aquilo ali é mais uma peça decorativa pra vender também café expresso, mas a nossa tradição continua” “Ah, bom, agora você me deixou mais tranqüilo”. Então são clientes tradicionais que se sentem realmente também donos, e faz parte da história, e não querem que mude o sistema e o modo de ser feito.
P/1 – Esses clientes que o senhor citou...
(PAUSA)
P/1 – Então, senhor Jorge, o senhor estava falando dessa fidelidade ao estabelecimento que muitos clientes têm em relação ao Café Regina. Nós gostaríamos que o senhor falasse um pouco das formas de pagamento. O quê que poderia se dizer de formas de pagamento? Assim, as pessoas pedem pra pagar depois? Existe formas de parcelamento? Existe ainda o fio do bigode? Eu queria que o senhor falasse um pouco sobre isso conosco aqui.
R – A forma de pagamento, Graças a Deus, realmente pra mim, sempre chega alguém: “Ah, posso tomar? Eu pago depois”. Então é meio dificultoso pro caixa. Quando estava a gente mesmo no caixa era outra coisa, conhece todo mundo e tudo. Mas a menina tem que tirar a ficha. Então às vezes há um bloqueio nessa parte. Mas quando a gente está perto e a pessoa pede, eu só faço sinal que tudo ok. Então os outros produtos se paga com cartão de crédito, Visa e Mastercard. E os demais a pessoa é obrigada a tirar a ficha primeiro pra depois consumir. Então praticamente a minha venda total, 99% é à vista. E, assim, quando chega um cliente desse porte assim, que está diariamente lá e quer tomar um café ou comer alguma coisa, acaba deixando. Marca assim, depois a pessoa volta e paga. Mas praticamente 99% é à vista.
P/1 – O senhor faz promoções nos dias, nas datas ou no período em que o Café Regina comemora os seus aniversários. Fala um pouquinho sobre essas promoções que o senhor criou. Foi o senhor que pensou isso no Café Regina.
R – Sim, eu comprei lá em 20 de setembro de 1984. Quando deu 20 de setembro do ano seguinte, 85, eu senti que a clientela, através de uma pesquisa depois que foi feita, uma pessoa queria lançar um produto e pediu primeiro pra fazer uma entrevista com os clientes, se era autorizado. Eu falei: “Tudo bem”. Então ela queria lançar esse produto no café, então eu disse que poderia fazer. E nessas entrevistas, e nessa pesquisa que foi feita ali, deduziu-se que 80% dos clientes que passavam ali, na época, em torno de 2500, três, 3500 pessoas, eram pessoas que estavam ali diariamente, estava todo dia. Eram os bancários, juízes, promotores, a casa do Fórum ali, advogados, e os comerciantes da região. Então não foi viável o lançamento desse produto. Eu não recordo qual, na época, mas não era viável porque era a mesma clientela. Ele queria um tipo de uma clientela que fosse diferenciada diariamente, com esse número de pessoas. E por causa disso, dessa pesquisa inclusive, eu adotei o sistema. Aí foi feito em setembro o primeiro aniversário da minha compra, não da fundação do café. Vou deixar bem claro isso. E então eu resolvi. Quando abriu, naquele dia, eu pus lá uma placa dizendo que o café, naquele dia, era gratuitamente em relação ao aniversário do café sob a minha direção. E desde lá até hoje, que dia 20 de setembro agora vai fazer 23 anos sob a minha administração, eu continuo fazendo essa oferta pros clientes.
P/2 – Você disse que o tradicional do Café Regina é o café coado no pano.
R – Exato.
P/2 – E existe mais alguma coisa que você também não muda pra manter essa tradição? Alguma coisa da decoração, do tratamento?
R – Não. A decoração, agora vamos passar por uma nova reforma. Inclusive eu, agora, o mês retrasado eu fiz uma parceria, vendi 1/3 do café pra uma pessoa pra gente tentar entrar no ramo de franquia. E a decoração realmente vai ser mexida novamente. Tem fotos do fundador, que foi feita uma homenagem pra ele. E a pessoa que pintou o quadro do fundador pintou a minha também, mas já vai pra cinco, seis anos aí. Então vai ser tirado isso, vai colocar fotos da cidade. Eu já tenho algumas lá, a cidade antiga, acho que de 1930, 32, 38. E vai passar por uma modernização nas cores, tem um arquiteto bolando. Alguns móveis vão ser mudados, mas a forma ainda, a tradição, de uma certa forma, continua a mesma. E outros produtos que se agregam _____, desde o tempo que eu estou lá nós temos, mas é mais na época do frio, é o chocolate quente nosso. Ele é mais encorpado, mais forte, e que também tem uma tiragem boa. Mas isso assim, mais na época do frio. E as outras, tem mais coisas no dia-a-dia, né?
P/1 – Senhor Jorge, como é que o senhor percebe o seu estabelecimento na história do comércio de Campinas? Como o senhor vê o papel do Café Regina na história do comércio de Campinas?
R – O que eu vejo ali é que realmente é aquilo que o senhor disse quando quis quebrar a máquina lá, né? O café, realmente, a gente assim, é meu em termos, mas já faz parte realmente da história de Campinas, porque ali passam todos os políticos, pessoas que levaram o nome de ruas famosas no centro da cidade passaram por lá. Tem histórias que eu recordo, daqueles recortes, que tem um senhor que falou que tomou um café lá com Getúlio Vargas. Então o prefeito, ____, ministro que vem em Campinas, passam por lá, os atuais. Então realmente o café engrandece, e engrandece muito por eu ser o proprietário, em relação a isso, né? A gente sente assim, sensibilidade, às vezes, de pessoas querer falar com você, pensar que você é coisa. Não, eu sou uma pessoa comum, normal. Mas um dia, também, tem um fato interessante, que eu estava, a gente desce. Porque antigamente eu ficava no caixa direto. Então agora eu não fico mais no caixa. Por causa do computador, esses números pequenos, eu não consigo mais. Mas eu passo lá minhas dez, 11 horas por dia, diariamente. Então tem a parte de cima, que tem o escritório. Aí eu desci. Desce pra tomar um café, arejar um pouco. Aí chega um, bate papo, chega outro, bate papo. E na hora que eu desci eu senti que tinha um cliente na porta, na faixa de 72 anos mais ou menos, um senhor de cabelo branco e tal, olhou pra mim. E a gente tem sensibilidade, você vê que a pessoa parece que quer falar com você. Então naquilo ele saiu, essa pessoa que estava conversando, e chegou um outro amigo. Conversamos mais uns dez minutos. Saiu esse, chegou o outro. E a pessoa ia se aproximar, aí parava, voltava. E nisso demorou. Nesse pouquinho que eu desci pra tomar um café eu fiquei quase uma hora e 15 conversando com um e com outro, e essa pessoa não saía. Eu falei: “Não é possível, essa pessoa vai fazer uma reclamação. Então eu tenho que atendê-lo, né?” E quando saiu essa última pessoa, também cliente, batendo papo, ele se aproximou e eu já fui de encontro a ele. Já dei a mão pra ele e falei: “Eu estou sentindo que o senhor queria falar comigo”. Ele falou: “Eu queria sim. Eu queria te conhecer pessoalmente, que eu não conheço. Eu vejo sua correria aí. É um prazer muito grande conversar com o dono do Café Regina. Eu vou chegar em casa e vou falar pros meus filhos”. Então isso engrandece a gente porque são pessoas que pensam que a gente é, mas não é nada disso. Então eu sou uma pessoa comum, que nem outros, que às vezes nós temos a nossa privacidade. E a pessoa vê a gente de um lado e acha que é aquilo, mas não é nada disso. Eu sou uma pessoa de conversar com qualquer um, desde o mais rico até o indigente que eu vou, dou um cafezinho. Outros já pedem, né? Pessoas comuns. Nós somos todos iguais.
P/1 – Como é que o senhor percebe a cidade de Campinas hoje, e a região da Grande Campinas? Como que o senhor percebe isso hoje?
R – A cidade hoje?
P/1 – Hoje, e a região metropolitana, né, da Grande Campinas. Como que o senhor percebe essa região e a cidade? Como o senhor vê economicamente o comércio dessa região? Como o senhor vê, não só de Campinas mas da Grande Campinas?
R – É, Campinas, além de crescer muito e ser um número populacional diferente das outras cidades daqui da região metropolitana, ela ainda tem muito ainda a crescer em termos, ás vezes, de investimento cultural. Tem cidades menores que são mais ricas nessa parte, no esporte. Então, Campinas em certa época chegou a ser eleita a primeira aqui no ranking em relação aos esportes. Hoje perde pra Paulínia, Americana, dependendo do tipo de esporte. Então eu acho que o nossos dirigentes têm que voltar um pouco também e focar essa geração, esses jovens que também... A gente vai fazer um trabalho agora em cima disso. Eu tenho alguns colégios perto e vou distribuir vale-café pra criançada, esses jovens de 17, 18 anos, que estão entrando no (Dentinho ?), ali na Escola Carlos Gomes, na Microcamp ali pregado, pra também saber o que é um café, saborear. Porque muitos jovens hoje não gostam. Eu tenho três filhos e apenas um toma café, e toma dois, três cafés. E o café é saudável, acima de tudo, pras pessoas. Então eu vejo ainda muito que Campinas precisa crescer em muitos aspectos, assim em relação à cidade, comparada com outras. Mas Campinas cresceu muito e realmente é um pólo muito rico. Você vê hoje aqui, aeroporto e mais outras coisas. Rede hoteleira cresceu muito. Nós temos hotéis aí que compara com esses grandes resorts aí do país. Então Campinas cresceu e ainda tem a crescer muito, e deixa a desejar em alguns aspectos assim voltados pra população, referente aos jovens principalmente. Que você vê hoje que tem muitos jovens aqui que saem pra Indaiatuba e outras cidades aqui, Itu, pra ir atrás de algumas boates que Campinas, às vezes, não tem, pondo em risco, inclusive, a vida desses jovens. Então eu acho que tem que, às vezes, fazer atrações também, que os mantém na cidade, perto dos seus familiares.
P/1 – E o comércio, como o senhor vê o comércio, o crescimento do comércio, as formas que ele foi criando?
R – Olha, o comércio em si também cresceu muito. Esses shoppings, esses mega-shoppings que vieram pra cá, esses empreendimentos, isso aí trás, cada vez mais, renda em benefício pra cidade. Então, nessa parte aí, que é dos dirigentes e tudo, eu acho que está de parabéns. Mas, como eu disse, tem ainda, focando um pouco fora do comércio, ainda é necessário outros empreendimentos.
P/1 – Como o senhor vê a iniciativa do SESC Campinas em colocar histórias de vida que contam a história da cidade de Campinas?
R – Olha, eu vejo, eu acho muito agradável isso aí. Pra mim é até uma honra estar aqui falando com vocês e deixando esse depoimento, que eu sei que vai chegar a pessoas. Que não sei a forma que vai ser divulgado isso, se é em escolas ou não, mas isso aí só engrandece o nome do SESC. E eu sei que esse trabalho, parabenizar vocês desde já, que naturalmente é um feito que vai marcar pra outras pessoas que não conhecem um pouco de Campinas, e aqui a gente deixa um pouco do depoimento pro bem da cidade.
P/1 – O senhor trabalha no comércio desde menino. O senhor trabalhou no comércio com o seu pai e depois o senhor trabalhou no comércio e teve o seu próprio comércio. Quais as lições de vida que o senhor, vamos dizer assim, tirou dessa experiência no comércio e o que o senhor gostaria de dizer que para o senhor, efetivamente, foi importante, foi um enriquecimento pra sua vida?
R – Olha, o comércio às vezes é visto por pessoas de outros focos, às vezes ingrato pra pessoa. Mas pra mim ele é muito gratificante porque eu acho que o comerciante tem que ser, acima de tudo, honesto. Honesto com as pessoas, com o produto que se vende, com o carisma das pessoas. Então isso só tem a engrandecer quem está de um lado e do outro, quem compra e quem está vendendo. Agora, eu fico muito feliz porque eu aprendi isso na minha infância, com a minha simplicidade e dos meus pais, mas voltando pela honestidade acima de tudo. Então isso pra mim é a base essencial, você comprar produtos e dar a garantia pra pessoa. E como o meu produto é muito, ele é mais parte de consumo, você também tem que procurar fazer o melhor. Se tem uma reclamação, apesar de às vezes ainda tem: “Ah, o café está frio”, um descuido de uma moça. Ou: “O café está fraco”, a tradição aqui é forte. “Por favor, joga fora, joga todo o bule fora, faz um novo pro cliente” “Não, mas é só um” “É só um. Faz um bule inteiro, mas não tem problema. Se ele quiser tomar mais, toma. Então eu vejo desse lado. A honestidade do nosso lado tem que ser primordial.
P/1 – E o senhor acha que o comércio do estado de São Paulo como um todo, o senhor acredita que esse comércio esteja em que condições hoje?
R – Do estado de São Paulo?
P/1 – É, do estado de São Paulo, como o senhor vê? Não só da capital ou só de Campinas. O senhor teria uma avaliação pra fazer do comércio do estado? Assim, pelas suas relações.
R – Se comparando com outros estados, o estado de São Paulo tem o que dizer em relação ao comércio porque praticamente, no populacional ele ganha em termos de tudo. Então todas as feiras, todos os focos giram em torno de São Paulo. Apesar de eu ser de Minas, mas praticamente a minha vida é aqui agora. Como diz o outro, hoje eu estou com 51, praticamente há 33 anos eu já estou em Campinas. Eu sou inclusive cidadão campineiro. Então a minha vida é Campinas. Tanto é que a minha família está toda aqui. Em Minas eu voltei apenas duas vezes. Então eu vejo, apesar de Minas também ter um comércio muito rico em outras áreas, manda praticamente quase que na moda, principalmente na moda feminina, ______. O pessoal até do Rio, de São Paulo também compra lá. Mas o comércio de São Paulo eu acho que ainda é imbatível, em todos quase que setores.
P/1 – O senhor faria uma avaliação do futuro de Campinas e da região metropolitana? O senhor poderia fazer uma avaliação, uma projeção pro futuro de Campinas e região?
R – Olha, eu acredito muito, os meus filhos estão aqui ainda, e Campinas vai crescer muito. Então é o que eu disse, agora vai dos governos, dos dirigentes, que tem que crescer em base adequada pra população nova que vem, não apenas abrir novos bairros e deixar a Deus dará, né, pessoas com necessidade. Então tem que fazer uma coisa traçada, bem elaborada, porque daqui pra frente sempre vai vir, como em todos os setores, vão vir pessoas de todas as cidades buscarem, como eu venho pra cá em 74, pessoas que vão querer ter confiança num futuro melhor pras suas famílias. Mas tem que saber escolher. Eu acho que as pessoas que se põem nessa posição de vir pra uma cidade maior, eu acho que elas têm que também fazer uma pesquisa ou ter um certo conhecimento, algum familiar, uma base de suporte, porque a pessoa vem e depois chega aqui com cara e coragem. Depois acaba num bairro onde depois os seus filhos crescem, não tem alimentação, cai no abandono, cai na criminalidade, cai nas drogas. Então os dirigentes eu acho que têm que estar atentos pra essas pessoas e saber acolher, porque antigamente parece que tinha um sistema de pessoas que chegavam aqui, até os próprios andarilhos, ele era (professor ?), ia de frente pra ele e buscava. Não tinha tanto indigente como se vê hoje. Então tinha alguns albergues. A pessoa pegava e encaminhava, ou depois até pagava. Tinha um governo aqui, não me recordo qual, na época, mas que pegava essas pessoas, até pagava passagem pra eles de volta porque eles não tinham estrutura nenhuma pra vim e ficar aqui. Então Campinas tem que crescer, e vai crescer muito, como as outras cidades, mas eu acho que tudo isso depende muito dos prefeitos e governadores, dos seus estados, pra o melhor comum, pra todos.
P/1 – Senhor Jorge, nós temos muito a agradecer a sua presença, a sua disposição, e nós gostaríamos muito que o senhor fizesse algumas considerações finais, alguns comentários sobre essa sua participação, que o senhor já mencionou, mas que o senhor fizesse alguns comentários sobre o tema que o senhor gostaria de falar agora.
R – O tema... Se hoje você me fizesse uma pergunta, se você tem um ídolo na sua vida, eu acho que todo mundo tem, eu queria deixar isso aqui e dizer que realmente eu tenho e esse ídolo é a minha mãe. Porque? Em relação à luta, à bravura que ela teve pra salvar um filho, sabendo que os outros demais poderiam morrer. Então eu acho que isso é uma lição de vida muito grande. Então eu tenho isso, jamais vou esquecer essa parte, essa luta de mamãe porque ela perde os demais mas sobrevivem todos. Então, me baseando nisso, eu só tenho garra pra lutar igualmente pelos meus filhos e deixar um recado pra... Como eu disse, eu não sei onde vai chegar esse vídeo.
P/1 – Vai ser uma exposição aqui em Campinas, um site e um livro.
R – Certo. Então isso, se chegar até os jovens, que o futuro é deles, então que eles tenham base na família, no pai, na mãe, e que esqueçam drogas e tudo mais, que isso não leva a nada, só leva à perdição e à morte. Então, que lute. Lute com insistência nos estudos e procurem se relacionar em família porque a família eu acho que é a base de tudo e pode levar eles sempre a crescerem. E trabalho, porque o futuro é deles que estão vindo aí e que têm uma vida toda pela frente. Eu não sei quanto tempo ainda vou viver, mas o tempo que eu vivi, Graças a Deus eu considero bem vivido pelo meu trabalho e pela família que eu tenho.
P/1 – Muito obrigada, senhor Jorge.
R – Obrigado a vocês.