Um pequeno excerto sobre a vida de Tânia Vera
A Fundação Real Grandeza funcionava com empregados de FURNAS que eram cedidos para a fundação. E esse foi meu primeiro cargo de chefia, indicada por FURNAS, empregada de FURNAS, cedida para a Fundação para ser chefe da Divisão de Seguros, em 1986. Foi uma loucura também.
A minha mãe nos ensinou a ler, escrever, os números, as primeiras coisas, antes de ir para o colégio, em casa, desde pequenas. Quando fui para o primeiro ano do colégio, para aprender, para ser alfabetizada, eu já era. Eu cheguei no primeiro ano do Colégio Princesa Isabel e a professora falou: “Olha, não tem o que fazer com ela aqui no primeiro ano, ela vai para o segundo”. O problema é que meu aniversário é em junho, então eu fiquei muito adiantada, eu fui para o segundo ano porque não tinha como me manter no primeiro se eu já sabia ler e escrever. As crianças não sabiam nada disso, e eu ainda tinha noções de soma, subtração, tinha noções de matemática.
Eu fui para o segundo ano e assim sempre fiquei muito na frente, e eu era a menorzinha da sala. E depois, quando chegou o segundo grau, quando acabou o colégio, eu não podia fazer prova para faculdade porque eu não tinha idade, então eu fiz um ano inteiro de cursinho para somente depois poder fazer a prova para a faculdade.
Meu pai teve que bancar o cursinho, que era pago. E para qual carreira eu fui?
Meu pai tinha um restaurante, que tinha esses cursinhos em cima, no centro da cidade. E lá tinha também o Instituto Brasileiro de Geografia, o IBGE, e o pessoal almoçava com frequência no restaurante. Eu sempre fui muito boa na parte de matemática, exatas, e eu queria ser professora, até os 14 anos minha meta era ser professora. Queria ser professora, mas felizmente, e graças a Deus, não deu certo.
Eu fiz concurso para o Instituto de Educação, que era na Tijuca, que era o lugar aonde você ia para se formar em licenciatura, mas não passei em conhecimentos gerais. Passei em português, matemática, mas conhecimentos gerais eu não passei.
Eu fiquei tão desencantada, que não quis fazer de novo, e fui fazer o tal científico. Isso foi com 14 anos, mais ou menos. Só que aí no científico, o que eu ia fazer? Ia ser professora de matemática de faculdade? E nisso, meu pai conversando com uma das pessoas que frequentava o restaurante dele, do pessoal do IBGE... “Mas se a sua filha gosta tanto de matemática, por que ela não vai fazer estatística?” Imagina? Isso era em 1969, o pessoal nem sabia o que significava isso. Bom, eu falei: “Tudo bem, vou fazer estatística, me convenci”. Naquela época, já estava começando essa coisa de não ter tanto emprego disponível, já não era mais assim, acabar uma faculdade e já arrumar um emprego, já havia uma dificuldade para arrumar estágio, e no estágio nem todo mundo ficava depois dele.
Fato é que que eu comecei a achar que estatística era uma profissão muito específica e que eu só iria poder trabalhar no IBGE ou em alguma coisa do governo, então, eu resolvi fazer três vestibulares diferentes: fiz a prova de administração para Fundação Getúlio Vargas, que era em Botafogo, fiz a prova de economia para a UFRJ, a universidade federal, que era na Urca, e fiz a prova de estatística, para a Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE. Duas delas eram gratuitas, a federal e a ENC, e a Fundação Getúlio Vargas era paga.
Passei nas três, mas a FGV ficou pelo caminho porque eu não tinha dinheiro para pagá-la. Optei por fazer economia na UFRJ pela manhã numa época em que diziam que iriam mudar para o fundão. Até hoje está lá, não mudou, e eu já tenho mais de 40 anos de formada. E fiz a noite a ENC, que era no centro da cidade, no bairro de Fátima, que era na Rua André qualquer coisa, que agora não me lembro, ao lado do bairro de Fátima.
A minha meta era fazer o primeiro ano das duas e ver em qual curso que eu me adaptava melhor. Ver em qual deles eu sentiria mais vontade de fazer. Também não deu certo. Fiz os quatro anos e me formei nas duas.
Foram quatro anos duros. Sete horas da manhã eu já estava lá na Urca, meu pai me levava de carro, me deixava lá, e eu voltava de ônibus, chegava em casa, comia rapidinho. Fazia curso de inglês, duas vezes por semana de tarde, ia a pé para o curso de inglês, voltava, fazia o IBEU, Instituto Brasileiro dos Estados Unidos, também em Botafogo. E de noite, pegava um ônibus na Voluntários da Pátria, socada, porque era no horário que estava todo mundo saindo do trabalho, às vezes ia em pé, encostada na porta, para poder chegar; quando chegava no centro da cidade você tinha que passar a roleta rápido porque caso contrário depois não conseguia saltar no ponto. E ainda andava um pedação até chegar na faculdade!
No terceiro ano da faculdade, eu comecei a procurar estágio. Na faculdade de ciências e estatísticas, tinha um colega que me disse: “Ah, você está procurando estágio? Eu trabalho em FURNAS”. “Gente, FURNAS agora está do lado da minha casa, eu moro na São Clemente, FURNAS está na Real Grandeza, eu posso ir a pé”. “Você quer tentar fazer um estágio lá?” “Claro, estou botando currículo em tudo que é canto!”
Acabei sendo chamada para ir lá, fui entrevistada pelo Superintendente de Recursos Humanos da época e fui trabalhar como estagiária de estatística, mas ainda não em Botafogo. Havia um monte de pedaços soltos da empresa pelo centro da cidade, ainda não estava tudo mudado para Botafogo.
Esse foi meu primeiro contato com FURNAS.
Eu fui trabalhar na Avenida Rio Branco, 151, na área de recrutamento e seleção, como estagiária de estatística fazendo testes. Aplicavam-se muitos testes nas pessoas que estavam sendo recrutadas, e eu fazia parte de estatística para dizer se fulano era bom, se não era, se ia passar, aprovado, aprovado com restrição, não aprovado. Nos testes que eram feitos, eu que fazia toda a modelagem da parte estatística disso.
Trabalhei ali um ano e meio como estagiária. E estava naquele ritmo: era faculdade de economia de manhã, estágio no centro da cidade à tarde e à noite faculdade de estatística. Lembro que para sair da faculdade de estatística, a Rua Riachuelo descia a ladeira da faculdade, e eu tinha um pouco de medo, já não descia pela calçada porque ficavam uns carros parados e eu ficava com medo de alguém me pegar, como mulher. Eu descia pelo meio da rua, uma rua sem saída, e descia sempre com alguém. Mas depois eu ficava sozinha no ponto do ônibus, e lá tinha prostituição, também tinha carro parando, buzinando para mim... Eu com os livros, ficava meio com medo, mas ia para casa e mamãe estava lá me esperando com um pratinho pronto, em cima de uma panela com água fervendo, não tinha micro-ondas, que esquentava o prato pronto do jantar.
Era uma loucura e foi assim um ano e meio.
Tive muita ajuda do meu pai, que me levava para a faculdade de manhã e, quando eu saia do estágio, ele saia do trabalho no centro da cidade e me pegava ali na Rio Branco para me levar para a faculdade. Só depois à noite que eu vinha de ônibus. Foi uma luta boa, e perto do que ele enfrentou, para mim foi pouco.

Minha mãe, ela não pôde fazer tudo o que quis, por exemplo, ela queria ter trabalhado, então ela sempre colocou na cabeça de nós duas, eu e minha irmã, que nós tínhamos que ser independentes. “Vocês não podem depender de marido, vocês têm que estudar, vocês têm que ser independentes.”
Ela era muito dependente e não era fácil mudar. E na minha geração, eu acho que foi uma conjugação de fatores, primeiro, ter independência do seu corpo, com a pílula, porque a mulher era destinada a ser mãe e as tarefas da sociedade estavam muito bem divididas. O homem ia para a rua arrumar o dinheiro e a mulher ficava em casa, tomava conta dos filhos, e ia envelhecendo, e a que estava mais nova tomava conta dos mais velhos. O zelo sobre a casa e sua rotina ficava totalmente a cargo das mulheres.
Depois os homens também passaram a precisar de que as mulheres trabalhassem, porque os salários foram diminuindo e um homem assalariado já não conseguia mais levar para família tudo o que precisava. Acho que foi uma conjugação de fatores que permitiu minha geração ter mais liberdade, conquistas e independência.

Eu sempre trabalhei em suplementos e comecei em RH, como estagiária. Na minha área, eu era a única estagiária de estatística, mas já tinha várias psicólogas. Quando acabava o estágio, quando se formava, permaneciam um dentre cinco, e eu precisava trabalhar, meu pai e minha mãe já não tinham muito dinheiro, eu era a mais velha, então, o que aconteceu?
Quando eu comecei a chegar ao fim da linha da faculdade, eu não sabia se FURNAS ia ficar comigo. Na ocasião, a Faculdade de Economia promoveu um curso de informática, na verdade, era de programação dado pela IBM, dentro da faculdade. Tinha que prestar uma prova e eles iam preparar essas pessoas para trabalhar depois no Instituto Brasileiro de Informática do IBGE, claro, quem passasse. Era ao lado da Mangueira, agora já acabou, até derrubaram aquilo lá. E eu me meti nessa, para variar. O que eu fazia? Eu matava uma aula para estudar para outra, tinha estágio em FURNAS, matava aula de manhã para fazer o curso de manhã, era uma loucura, porque o curso era aula todo dia, e toda sexta-feira tinha prova. Era realmente uma doideira!
Resultado: eu passei no curso para trabalhar no IBI e FURNAS também me segurou para trabalhar, mas com uma ressalva: “Não tem o cargo de estatístico aqui, você vai entrar como uma assistente administrativa”.
Na época, eu estava namorando meu primeiro marido, que trabalhava numa multinacional, lá na PRICE, uma empresa de auditoria grande e que não tinha tempo para nada. Pensei: “Cara, se eu for me meter em informática, programação, sem horário para nada, a gente não vai mais se encontrar”. Então, eu só fiquei em FURNAS. E por quê? Pela comodidade. Pela maior tranquilidade, por ser um emprego com horário, por ser perto de casa, isso, enquanto eu não tinha casado. Porque eu entrei no estágio em julho de 1971 e fui efetivada em dezembro de 72. Passei um ano e meio como estagiária naquela loucura! E muitos colegas de estatística ficaram falando para ir para o IBI, que eu iria ganhar mais, que eu não estava nem em um cargo de nível superior... Mas eu não fui! E depois, anos mais tarde, outras colegas que foram para o IBI vieram trabalhar em informática em FURNAS.
Foi assim que eu fiquei em FURNAS.
Eu fiquei na área de recrutamento e seleção e fui efetivada em dezembro de 1972 num cargo administrativo que não era nem de nível superior. Só que lá, todas as vagas eu via, né? E um dia me apareceu uma vaga de estatístico. Falei: “Opa! “Quero me candidatar!”. Falei para o meu chefe, mas ele logo esmoreceu o entusiasmo: “Não, essa vaga aqui você não vai conseguir, esse homem aqui...” Era para o assistente do diretor, que era como se fosse... Naquela época, os diretores, eles trabalhavam para fora da empresa, para a parte mais política, e existia um assistente executivo em cada diretoria, e ele era o diretor para dentro, ele que tocava todos os trabalhos com os superintendentes, ele que dava as ordens.
Havia, então, uma necessidade de um estatístico para a Diretoria de Suprimentos. Eu vi a vaga, falei com meu chefe que eu queria, e o meu chefe só faltou dizer para mim: “Você é muito novinha, esse homem é uma fera, não vai nem olhar para você”. Mas eu fui! Fui entrevistada pelo Doutor Hélio Maurício, assistente executivo da Diretoria de Suprimentos, e voltei. E nada.
Não tinha um retorno de nada.
Meu chefe: “Não te avisei!” Bom, um belo dia, o homem ligou lá para baixo e falou assim: “Eu quero a Tânia a partir de amanhã”. Caraca! Foi uma loucura! E aí eu fui trabalhar numa assessoria da Diretoria de Suprimentos, substituindo um engenheiro que estava se aposentando, e que era responsável pelos relatórios que consolidavam todas as informações da diretoria! E também informações externas, caso a diretoria tivesse que mandar para consolidar junto à presidência e depois mandar para os órgãos externos.
Parte de todos esses dados dessa assessoria iria ficar comigo, e foi assim que eu fui parar lá como estatística. Em FURNAS tinham apenas dois estatísticos, eu e o Roberto Ricardo, que eu já conhecia do recrutamento e seleção.
Eu fiquei trabalhando lá com o estatístico, mas nós nunca tínhamos vez na hora de ter um aumento salarial, fazer um reajuste de tabela, porque só tinha duas pessoas e FURNAS chegou a ter 10 mil empregados. Hoje, está com 3.000, 2.600, 2.700, uma coisa assim. Até que uma hora eu falei: “Ah não”! E comecei a trabalhar com o orçamento nessa assessoria, consolidar orçamento, comecei com normas, todas as normas que qualquer órgão debaixo da diretoria fazia, comecei a trabalhar nessa área toda. Eu passei para economia. Passei para economista, troquei de cargo, aumentei as minhas atividades e fiquei por lá.
Eu fiquei nessa assessoria de diretoria por 15 anos. E tive a minha primeira chance como chefe, minha primeira chefia.
Meu marido foi meu chefe nesses 15 anos. Na época, ainda não era meu marido, claro, não trabalhava com meu marido, não existe isso. Mas ele saiu da chefia e foi para outra diretoria. O meu primeiro chefe depois dele foi o Luiz Fernando Bergamini de Sá, que também saiu para ser diretor da Fundação Real Grandeza. Na diretoria da Fundação existia uma divisão de seguros, e como ele me conhecia, já tinha trabalhado comigo e queria mudar o chefe de lá, ele me ofereceu para ser a chefe da Divisão de Seguros, que era dentro da Fundação Real Grandeza.
A Fundação Real Grandeza funcionava com empregados de FURNAS que eram cedidos para a fundação. E esse foi meu primeiro cargo de chefia, indicada por FURNAS, empregada de FURNAS, cedida para a Fundação para ser chefe da Divisão de Seguros, em 1986.
Foi uma loucura também.
Tenho passagens, assim, muito estranhas. Lembro que eu cheguei lá no primeiro dia e eles também tinham mudado de local. Todos os móveis estavam no centro da sala, os empregados todos de braços cruzados esperando e o meu diretor me apresentando: “Essa daqui é sua nova chefa”. Fechou a porta e tchau!
Eu não conhecia as pessoas, não sabia no que cada um trabalhava, e as pessoas, os empregados ficavam me perguntando: “Onde bota a mesa?” “Bota o que aonde?” Foi maluquice! Mas graças a Deus me saí muito bem. Falei: “Atendimento ao público? Quem é atendimento para trás, vamo bora”! “Seguro de vida para cá!”; “Seguro de veículo para lá!” “Seguro de não sei o que para cá”. E fomos indo.
Eu passei nesse cargo quase quatro anos, e foi um período muito difícil, porque as condições de trabalho eram ruins, não era naqueles prédios bonitos de FURNAS, era num sobrado lá, numa parte antiga. Uma inflação de 80% ao mês! Não tem ideia do que significa isso! Sem nada, nem um valor acoplado ao índice que pudesse ter uma correção automática disso. Era 80% de inflação, um seguro que as pessoas seguravam seus carros num valor. Imagina se o carro era roubado? No mês seguinte era menos 80% do valor do carro. As pessoas só faltavam me bater, tudo na mão, nada automatizado. E você tinha empréstimo para comprar carro, era uma loucura, foi realmente uma fase muito brava.
Minha filha nasceu em 86, um pouco depois. E foi muito difícil para mim, porque a gente tinha que ir... Mas foi um aprendizado, se eu passei por isso aqui eu passo por qualquer coisa. E realmente, eu passei quatro anos ali, eu implantei computador, o microcomputador, porque o de grande porte era uma loucura, você tinha que ficar na fila para fazer um sistema de grande porte. Eu lá, com a água no pescoço, morrendo! Então consegui um microcomputador que não estava sendo muito usado na divisão do lado, falei com esse meu diretor: “Não, não tem condição!” E consegui colocar pelo menos apólice de seguro de veículos, que tinha essa renovação de valores absurda, e eu consegui...
Teve várias passagens ali, passagens de greve e precisando virar... Depois passamos o sistema para o computador grande de FURNAS. E de greve, ter que ir lá para pegar os pedidos de seguro, que estavam sendo emitidos pelo computador, e conversar com o sindicato para poder entrar, para pegar os pedidos para levar para seguradora, para fazer não sei o quê, para rodar a apólice. Trabalhar até uma, duas horas da manhã, então, foi uma fase difícil, principalmente porque depois eu também estava com uma filha de dois anos. Quase perdi minha voz porque trabalhava em cima das oficinas de FURNAS. Teve várias passagens, mas valeu!

A cultura da empresa nos anos 70? Muita hierarquia.
Eu me lembro que eu fiquei um ano e meio no centro da cidade, era mais tranquilo, mas tinha todo um código a ser seguido, por exemplo, uma mulher não trabalhava de calça comprida, era sapatinho de salto, meinha fina, o comprimento da saia lá para baixo do joelho, no joelho, no máximo. Os homens que trabalhavam de calça comprida.
Depois houve a mudança do centro da cidade para Botafogo, mas não passei para os blocos, primeiro passei por uma estrutura que dava lá para a Rua São João Batista, uma estrutura pequena, onde era o recrutamento de seleção. Eu fui para os blocos quando eu virei estatística, quando fui para a assessoria. Fui parar no décimo andar.
Em cada andar de FURNAS tinha uma diretoria, e naquela diretoria tinha o diretor, as assessorias mais próximas ficavam com ele, e os outros ficavam nos outros blocos. Tinha o serviço de garçom, trazendo cafezinho. Dentro do bloco A havia um elevador só para diretores, assistentes e níveis de superintendente, que era abaixo do diretor. Abaixo do diretor você tinha um assistente executivo, que era quase que um diretor e tinha os superintendentes, eles podiam pegar aquele elevador.
No último andar também tinha um restaurante, só para esse mesmo grupo, diretores e para as pessoas que vinham para reuniões, que eram convidados para almoçar. Nós chamávamos esse restaurante de “chão de estrelas”, e a gente tinha o nosso bandejão no subsolo.
Com o tempo, isso foi mudando. O primeiro a perder foi o elevador, muito chefe começou a dizer “eu não vou nesse elevador, eu vou no normal”. E por último foi o restaurante, que demorou bastante para sair.
FURNAS tinha setor, depois, acima, era divisão, depois era departamento, depois superintendente e o diretor. Tinha essa escala de graduação. Depois foi tudo encolhendo.
E outra coisa: quando FURNAS tinha 10 mil pessoas, nós tínhamos só 1000 mulheres, hoje são 20%. Eu fiz essa pesquisa outro dia, mulheres no balanço de FURNAS. E assim, na época, os cargos eram na biblioteca, copa, cargo de chefia era praticamente nenhum. Chefia da biblioteca, chefia de documentação, mas não mais que isso.

Era um ambiente bem mais masculino, e a gente ouvia falar, hoje chamamos de assédio, mas na época não se chamava isso. Quando a pessoa era assediada, quando alguma mulher era assediada, simplesmente tentava mudar de lugar, saia fora! Mas existia! Esses casos sempre existiram, sempre existiram. Não comigo, graças a Deus eu não tive isso. Mas você via que na hora que vinha uma chefia, ninguém pensava numa mulher, era como se fosse privativo de homens. E eu até acho que eu quebrei um pouco esse paradigma porque fui ser chefe de divisão na Fundação Real Grandeza.
Quando veio o governo Collor, houve uma alteração de diretor em FURNAS - como toda vez que muda o governo - e um dos diretores era um colega da financeira, o Gilber, que eu tinha ajudado a fazer uma tese. Quando ele virou diretor, ele quis fazer uma composição da diretoria e me chamou, junto com outras pessoas. Nós o ajudamos na construção dessa nova diretoria e eu fiquei sendo chefe, sai da divisão da Fundação Real Grandeza, voltei para FURNAS e assumi uma chefia de uma assessoria de recursos humanos. Que também foi uma pedreira!
Quer dizer, saí de uma pedreira de um jeito e fui parar numa outra pedreira.
Eu fiquei um ano e meio na época do Collor, quando nós tivemos a meta de demitir mais de 2.000 pessoas. E era minha assessoria que ia lá em Brasília, eu que ia escutar aquelas barbaridades e voltar tendo que executar. Foram muitas noites sem dormir, tentando resistir a esse golpe o mais possível, mas dentro da obrigatoriedade de cumprir porque é uma empresa do governo, tem que cumprir as determinações, sabendo que aquilo não podia ser daquele jeito.
Foi uma fase duríssima também, que às vezes a gente pensava... Em todos os meus cargos de chefia, foi a primeira vez que eu tive oportunidade de fazer equipe, que eu consegui fazer a minha equipe, porque era uma assessoria nova. Uma assessoria que tudo que não era pessoal, não era treinamento, não era desenvolvimento, caía comigo. Foi uma assessoria que fez o primeiro plano de demissão incentivada de FURNAS, lá nos anos 91.
Eu consegui formar uma boa equipe, mas era uma loucura. Às vezes, chegava 17:00 horas da tarde, todo mundo pronto para ir embora, 17:30, 18:00, ligava o diretor e dizia assim: “Segura todo mundo aí que está chegando um fax de Brasília, vai trocar tudo, vai trocar não sei quantas informações para amanhã.” E a gente virava a noite lá.
Foi uma fase dura, depois disso, o próprio Gilber me tirou dessa assessoria e fez uma proposta para a diretoria de FURNAS, para eu ser uma das diretoras da Fundação. E eu fui. Acho que nos anos 90, comecinho de 90, fui Diretora de Benefício na Fundação Real Grandeza, indicada por FURNAS. A primeira mulher na diretoria da Fundação.
E aí eu pegava de tudo. Pegava plano de saúde, empréstimos, seguros, pegava também toda a parte de assistentes sociais de FURNAS pelo Brasil inteiro, professores de educação física que tinham nas Vilas, menos previdência.
As vilas, no início, elas eram muito afastadas da cidade, então, para as pessoas irem para lá trabalhar, você tinha que criar toda uma infraestrutura. Você dava casa, clube, tinha assistente social, médicos, tinha que ter tudo, porque a cidade era longe. Com o tempo tudo isso foi se desfazendo porque as cidades foram se aproximando das vilas, o governo foi cada vez mais saindo fora, as estatais foram sendo cobradas por baixar custos. Do tipo, não precisa mais da casa, não precisa ter clube, os associados que paguem. Mas lá atrás não era assim, do Collor para cá, foi desmobilizando tudo.
Na época do Collor foi feito um PDV, um Plano de Desligamento Voluntário, que atingiu os aposentados ou aposentáveis, não era para qualquer empregado, era para os aposentados e os aposentáveis. Quanto mais tempo você faltasse para cumprir os requisitos da fundação, você ganhava lá um dinheirinho. Se você estava pleno para poder se aposentar pela Fundação Real Grandeza, você não ia ganhar nada, um pouco, por ser demitido. Cumpria-se a regra.

A Fundação da Real Grandeza na verdade é um fundo de pensão. O que é isso? Ela foi criada por FURNAS lá nos anos 70, para ficar com parte da previdência de seus empregados, ou seja, para que os empregados não só recebessem o benefício do INSS, mas também uma complementação. Os funcionários contribuíam a vida inteira, e FURNAS também contribuía com uma parcela igual para esse fundo de pensão, para quando eles preenchessem todos os requisitos de aposentadoria, um deles é se aposentar pelo INSS, eles estariam aptos a pedir um benefício de complementação de aposentadoria da Fundação Real Grandeza.
Ela é uma entidade muito importante, ela tem 12 mil aposentados, 12 mil famílias, e ainda temos o pessoal que está na ativa em FURNAS, mais 3.000 pessoas ainda contribuindo. A Fundação paga aposentadoria para mais de 12 mil famílias e também administra um plano de saúde de autogestão próprio.
Isso foi feito em todas as grandes estatais, tem a Previ no Banco do Brasil, a Petros na Petrobrás, você tem a Funcef da Caixa Econômica Federal. Porque lá atrás, para você manter um profissional qualificado, quando FURNAS estava no crescimento, construindo usinas, não sei o quê, você tinha que conviver com a iniciativa privada roubando toda hora alguém. Ou você dava salários muito altos ou você tinha que dar benefício. Um modo de segurar os empregados era dar o benefício de previdência e de saúde, pois o sistema público já estava começando a não aguentar a fornecer um serviço de qualidade.

Quando eu estava em FURNAS, não havia uma política da empresa para incentivar a entrada e o crescimento das mulheres, não foi uma mudança de cultura. No meu caso, eu simplesmente conhecia o diretor que me indicou, um colega que já conhecia meu trabalho depois de anos.
Hoje, não, a gente vê as políticas, isso não existia. Hoje, você vê políticas para cota racial, políticas voltadas às mulheres, LGBT. Não foi uma decisão de FURNAS, nós vamos começar a colocar mulheres nos cargos gerenciais, não, não foi. Mas foi assim, concurso. As mulheres começaram a passar nos concursos, estágios, as mulheres começaram a chegar lá nos estágios. Por quê? Porque elas começaram a chegar nas universidades. É a mesma coisa do deficiente, por que que o deficiente não entra? Ele não entra porque não tem estrutura nenhuma para a educação. Como é que um deficiente que não tem transporte próprio vai chegar no lugar? Agora pode ser. O mundo está mudando, agora nós vamos mudar, a tecnologia, essa pandemia, deu uma sacudida. E deu uma sacudida para melhor, um mundo melhor.
A real grandeza
Autor:
Publicado em 15/11/2021 por Danilo Eiji Lopes
Entrevista de Tania Vera
Entrevistada por Torigoe/Daniela
21/04/2021
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número FURNAS_HV008
Transcrito por Aponte
0:00
P/1 - Qual que é o seu nome completo, local e data de nascimento, Tania?
R – Meu nome é Tania Vera da Silva Araújo Vicente, nasci no Rio de Janeiro, 23 de junho de 1950. Morava no Rio de Janeiro, no centro da cidade.
0:31
P/1 – Tania, você conhece a história do seu nascimento? Seus pais te contatam como foi o dia que você nasceu?
R - Não lembro, não lembro assim do meu nascimento. Eu tenho assim, só o seguinte: eu nasci na época, de uma coisa que hoje o pessoal nem fala mais, que é nascer de forseps. Sabe o que é forseps? Forseps é um instrumento médico, que na hora do parto normal, se a criança não está saindo, você puxa como se fosse umas colheres. É um instrumento médico, para ajudar o bebê a nascer. Então eu nasci de forseps. Não sei se é por isso que eu tenho cabeça grande (risos). Nada, não há um chapéu que entre. É sempre difícil.
1:32
P/1 – Tânia, fala o nome completo da sua mãe e como é a história dela?
R - Dalva da Silva Araújo Vicente, também brasileira, filha de portugueses, viveu também no centro do Rio de Janeiro, mas precisamente ali na Lapa, onde hoje vocês conhecem muito bem, que é na Rua dos Arcos. Meu avô por parte de mãe tinha uma casa, que se usava muito naquela época. Ele era português, tinha vindo para o Brasil. E aquela casa era como se fosse para alugar quartos para português que vinham para o Brasil. Então era uma casa bem grande. E hoje é no terreno que fica a Catedral do Rio de Janeiro, aquela Catedral que vai ali da Rua dos Arcos, até a Avenida Chile, onde tem a Catedral, é o terreno do meu avô, era na rua dos Arcos. Tem a Fundição Progresso, que vocês conhecem hoje como um lugar cultural, mas era uma fundição.
2:44
P/1 - Me conta um pouquinho mais dos seus avós por parte de mãe. Quem eles são, a origem?
R – Meu avô veio para o Brasil, ele começou a trabalhar com venda de... Com essa coisa do aluguel das casas e também tinha tipo... Estou falando do avô por parte de mãe, primeiro né. E ele casou aqui no Brasil, primeiro casou com uma também portuguesa, que era viúva e tinha dois filhos, morreu a portuguesa. E aí casou com a minha avó, que teve três filhos, minha mãe é mais nova. E no parto da minha mãe a minha avó faleceu. Então ele ficou com duas filhas mais velhas, bem mais velhas, do que do segundo casamento, e os três pequenos. Minha mãe recém-nascida e os outros com... Meu tio e minha tia, que era mais velha, com pouca diferença de idade. Aí não casou mais, chega né. Então eu fui criada, como a minha mãe foi criada, e acabei. A mamãe junto conosco, por uma vó preta. Eu chamava minha avó, ela ajudava na casa, mas aí ela assumiu os três filhos do meu avô. Criou a minha mãe, era a mãe preta.
4:30
P/1 - E como que era a figura dessa pessoa? Como era o nome dela? Como é que ela foi para sua infância?
R - A gente chamava de vó Bita, ela morou conosco... Nós moramos sempre ali no centro da cidade, depois fomos para Botafogo. Fomos morar em Botafogo, fui morar em Botafogo com 4 anos de idade, na Rua São Clemente. E ela foi conosco e faleceu na nossa casa, depois de muito tempo. Eu já devia ter uns oito anos, sete anos, quando ela faleceu.
5:01
P/1 - Então você se lembra bem dela?
R – Lembro bem! Agora meus avós por parte de pai eram espanhóis. Então eu sou uma mistura, de raiz português com espanhóis. Moravam na mesma Rua dos Arcos, foi onde minha mãe conheceu o meu pai. E aí tem uma história um pouquinho mais brava. Porque meu avô, Benito Araújo, casou com a minha avó, que chamava Dulcíssima Aurora Vicente. Dulcíssima, embora a gente chamava de vó Aurora. Que Dulcíssima é doce, muito doce. Mas a minha avó, desde acho que 12 anos de idade, ela não tinha uma perna. Porque quando ela morava lá na Espanha ainda, ela teve um acidente, e no interior, não tinha recurso, naquela época, e perdeu uma perna. Mas ela teve com meu avô, cinco filhos. Meu pai é o mais velho, que está hoje vivo com 100 anos, morando comigo. Dos cinco filhos, tem mais uma filha, que se chama Dulcinéia, a gente chama de tia Néia, que está com 92 anos, também está bem. E eu e papai acabamos de enfrentar covid, ele ficou um mês e uma semana no hospital e se recuperou e estamos aqui firmes, algum pouquinho de sequelas. Porque antes dessa pandemia, ele saia na rua sozinho, ele tomava táxi, tomava conta dos remédios, fazer piscina. E agora tá um pouquinho mais debilitado, na parte ainda motora. Mas tá bem toma sua cerveja, seu vinho, come de tudo, tá melhor do que eu.
7:10
P/1 - E o que ele faz? Q que ele fazia essa época?
R – Meu avô por parte de pai, ele era Alfaiate. E você vê, ele casou com a minha avó, teve cinco filhos, e ela não tinha uma perna, ela era costureira. E ele o que aconteceu? Ele teve um acidente, passando na rua, um carro desgovernado, no centro da cidade, bateu e ele perdeu uma perna também. E aí ficou muito desgostoso e morreu logo. Então minha avó, ficou com cinco filhos, e meu pai por ser o mais velho, assumiu de trabalhar com 14 anos. Para ajudar no sustento da família. Que as outras três filhas do meio eram mulheres e o outro filho era muito novinho, ainda não dava, se ele tinha 14 anos. Então minha avó sustentou essa família toda, de cinco filhos, com meu pai trabalhando desde cedo, e com ela trabalhando de costura em casa.
8:25
P/1 – Tânia, você ouviu a história de como seu pai e sua mãe se conheceram?
R – Se conheceram na mesma rua. Moravam perto. Moravam na mesma rua, na Rua dos Arcos, no centro da cidade.
8:40
P/1 - E não tinha nenhuma questão, de um ser de uma família portuguesa e outro de família espanhola? Não tinha uma rivalidade, alguma coisa assim?
R – Não! Tinha assim, uma certa coisa da situação financeira. Que meu avô, tinha propriedades, tinha mais dinheiro. E a família do meu pai não. Então naquela época todos os filhos casavam com separação de bens. Naquela época as pessoas... Os pais mandavam muito nos filhos. Então, “não, minha filha não vai casar”. Casaram tudo com separação de bens. Mas meu avô ajudou muito meu pai, porque meu pai trabalhou em vários lugares. Primeiro, ele foi até a quarta série primária e ele chegou a ser dono de restaurante, no centro da cidade, em frente à Academia Brasileira de Letras, restaurante café e bar Sul-Americano, com um sócio. E ele fazia tudo do restaurante, tudo, ele sempre aprendeu sozinho, foi autodidata em tudo. E meu avô ajudou ele comprar essa parte do restaurante, e ele depois pagou lá no meu avô. E ficou no restaurante, muitos anos. Então todo mundo, em cima do prédio onde funcionava o restaurante, acima tinha uns cursinhos de vestibular. Então todos, todas as pessoas que fizeram lá Vetor, AS, Miguel Couto, todo mundo era por ali. E ele atendia muito, era um restaurante, tinha restaurante, o forte era o almoço, porque pessoas trabalhavam no centro da cidade, não tinha como ir em casa almoçar. Vou levar uma marmita, quem ganhava pouco, ou tinha que comer no centro da cidade. Então era um restaurante, não sei, Daniela de repente conhece. Como se fosse aqui o Aurora. Perto aqui de Furnas, que muita gente conhece, ainda existe até hoje. Um restaurante tradicional, não muito chique, mas com comida boa, que o pessoal vinha de fora. Dia de segunda-feira, sei lá, tinha feijoada, outro dia tinha rabada, aqueles pratos. E por incrível que pareça, o meu marido, José Elton, que também foi de Furnas. Deu aula nesse cursinho, que ele foi chegou a ser sócio do diretor, e deu aula nesses cursinhos e frequentava o restaurante do meu pai. Você vê que maluquice. Só fomos saber anos e anos depois. Então meu pai se manteve com o restaurante até aposentar. E aí ficou bem difícil, porque só tinha aposentadoria do INSS. Minha mãe era dona de casa, porque as mulheres naquela época também não tinham a menor oportunidade. Meu avô dizia que só podia ser professora, e ela queria ser outra coisa, então não podia ser. Estudar datilografia na época imagina, hoje em dia nem existe mais. Então ela sempre foi de cuidar da gente, enquanto meu pai trabalhava no restaurante. Agora ele tem uma passagem muito, muito importante, que hoje é o orgulho dele, ele foi, ele é um ex-combatente da Segunda Guerra Mundial. E o Ministério da Defesa, no ano passado, ano passado não, que a gente perdeu um ano, 2019. Ele foi honrado com uma medalha, chamada medalha da Vitória, para aqueles que combateram na guerra. Ele não foi a Europa, mas ele foi convocado. Ele não seguiu o exército, ele só foi convocado, porque tinha feito serviço militar, todo mundo foi convocado. Então ele foi para o Rio Grande do Sul, dirigia carro de combate. Ele tem muitas histórias para contar, é uma pessoa que eu me orgulho muito, meu pai. Vou começar com o lencinho.
13:25
P/1 - Enquanto a gente ainda não entrevista ele, quem sabe. Mas você pode contar uma dessas histórias que ele contou para você? Ou histórias que você gosta de lembrar que ele te contou?
R – Claro! Ele conta muito que... Ele foi na verdade convocado e serviu no Rio Grande do Sul, porque na época havia uma possibilidade, de talvez a Argentina invadir o Brasil, alguma coisa louca dessas. Então eles foram para lá. E eles ficaram num lugar que era antes um matadouro, abandonado, e o exército então ficou lá. E disse que em uma daquelas noites que estavam lá, houve uma chuva, vento, em um dos lugares onde eles dormiam, que eram camas beliches. Tudo meio improvisado imagina né, época de guerra, e simplesmente o teto desmoronou. No meio da noite, no escuro, uma confusão danada. E que ele deu a ideia, para salvar as pessoas, de colocar os carros de combate, com a luz acesa, no local onde havia tido o desmoronamento, para poder ajudar o pessoal a salvar quem não tinha morrido. Porque uns morreram, outros ficaram... Então ele conta muito dessa história, conta muito de acordar às 5 horas da manhã e tomar banho no rio gelado. Conta muito de jogar basquete e querer ir para a guerra lá na Europa, e o comando dizer para ele, “não, você não, você fica, você fica aqui, não vai não. Quem vai é quem está dando trabalho aqui, que não quer obedecer, não quer fazer... aí vai para lá”.
15:23
P/1 - Ele te contava as histórias quando você era criança ou até hoje?
R - Era criança e até hoje. Conta para os netos e agora para o bisneto que nasceu. Agora no ano passado, bisneto ele ainda não conta, porque ele só tem 7 meses. Mas para família toda.
15:45
P/1 - Você tem irmãos?
R - Tenho uma irmã, Norma Célia da Silva Araújo Vicente, ela é mais nova, três anos do que eu. Ela também trabalhou uma parte da vida dela em Furnas, mas como contratada, ela não era efetiva. E saiu agora, quando Furnas, demitiu todos os contratados, por determinação judicial. Então ela saiu tem uns dois anos.
16:28
P/1 - Como é que era a sua infância? Você cresceu em que casa, em que rua?
R - Como eu te falei, eu sou uma pessoa muito conservadora, embora possa não parecer. E eu só morei em três casas na minha vida. A casa, até quatro anos, lá na Rua dos Arcos. Depois a casa na Rua São Clemente, 317, esquina da rua da Matriz, dos quatro aos 24, quando eu me casei. E dos 24 até hoje, eu moro aqui, nesse apartamento, na Gávea, no baixo Gávea. Então eu sou muito conservador. Então eu vivi na Rua São Clemente, numa época, que a rua São Clemente, tinha mão dupla e bonde. Sabe o que é brincar de bonde? Pois é, eu sei! Como é brincar de Bonde. Na esquina da São Clemente com a Matriz, a minha casa era na São Clemente, bem próximo, então na Rua da Matriz não passava ninguém, a gente andava de bicicleta, andava de... Fazia tudo na Rua da Matriz. Hoje em dia, não tem a menor chance, você imagina. Você conhece a Rua São Clemente? É a principal rua, é a principal que sai da praia de Botafogo e leva você até a Lagoa. Então era ali mesmo que eu morava, ou seja, bem próximo a Furnas. Quando Furnas resolveu construir a sua sede em Botafogo. Porque no começo, como era Furnas? Furnas nasceu lá em 57 e cada órgão ficava num canto. Cada órgão num canto no centro da cidade. Na minha infância, como é que funcionava? Tudo funcionava no centro da cidade, os bairros não tinham nada, se você quisesse comprar um sapato, você quisesse... Você tinha que ir para o centro da cidade, os bairros eram residenciais. Depois é que foi aumentando a população, os bairros foram ficando independentes. Mas tinha muito pouca coisa, nos bairros, você tinha que ir para o centro da cidade, para fazer as coisas. Então, Furnas depois que cresceu, aí escolheu ali, Rua Real Grandeza, 219, certo? Até agora, um ano e meio, um ano e pouco, que saiu daqueles três blocos, que são de propriedade da Real Grandeza, Fundação de Previdência e Assistência dos Empregados de Furnas e da Eletronuclear.
19:35
P/1 - Me conta como é que era ser criança na Rua São Clemente, na década de 50, 60? Brincar de bonde, como é que era isso?
R - Eu morava em casa, como eu te falei. Uma casa de dois andares, que tinha uma garagem, apertadinha, mas tinha e muro baixo, coisa que hoje em dia, se você passa lá os muros parece uma fortaleza, a casa ainda existe. Meu pai morou lá até 5 anos atrás, quando minha mãe faleceu, cinco não, vai fazer seis, foi em 2015. E aí ele veio morar comigo. Mas como é que funcionava isso? A gente andava de bicicleta, andava de patins, tudo lá na Rua da Matriz. Porque para passar um carro, era uma vez na vida, outra na morte. Agora brincar de bonde é muito engraçado, porque os bondes, os homens pulavam do bonde, tanto para pegar o bonde, como para saltar do bonde e não pagar, ficava na balaústre. O ponto do bonde, era na porta da minha casa. Então a gente via isso. O bonde vinha, vinha freando, parava ali, a gente via o pessoal subindo no bonde rápido, descer do bonde rápido para não pagar. Então o que nós usávamos, logo na entrada da minha casa, tinha uns arbustos, tipo fixos, que eram umas arvorezinhas, e nos pequenos, e tinha como se fosse uma calçadinha, onde tinha terra, que esses arbustos eram plantados. Então a gente pulava na calçadinha, segurava e ficava se balançando, pulando, como se fosse, é claro que mulher não fazia isso, só homem, ainda tem essa, nossa época. Homem que pulava, mulher não, esperava o bonde parar, subia com toda a calma, sentava. Mas a gente brincava de bonde, botava jornal no meio dos dedos, como se fosse a nota dobrada, que o cobrador usava, ia pagando e dando o troco e fazia tim, tim, tim, tim, cada vez que pagava alguém, tinha que registrar, ele tinha que prestar conta do dinheiro. Então tinha tipo um registro lá, como se fosse quase um reloginho, que cada vez que recebia, ele apertava, puxava a cordinha, e aí saía lá mais um numeruzinho, de mais uma cobrança feita. Então a gente brincava muito no quintalzinho na frente da casa, que era isso. E tinha a garagem, meu pai saia para trabalhar, a gente brincava na garagem. E muitas vezes na Rua da Matriz, hoje impraticável.
22:32
P/1 - Você brincava com a sua irmã?
R – Sim! Nós brincávamos normalmente dentro de casa, porque mamãe ficava supervisionando, não deixava muito na rua não. Agora tinha aquela brincadeira de rua, que minha avó por parte de pai, morava em Ramos com a família toda, com as três filhas. Meu pai morava em Botafogo e o meu tio morava em Copacabana. As três filhas morava com ela em ramos. No fim de semana, todo domingo a gente ia para lá, aí era brincar na rua, era festa junina na rua, era outro tipo de brincadeira.
23:16
P/1 – Lá em Botafogo, é perto da Voluntários da Pátria a São Clemente né?
R – A São Clemente é a que vem... Hoje o trânsito vem da praia de Botafogo, para Lagoa pela São Clemente e vai, o contrário, é pela Voluntários da Pátria. Morava bem pertinho do quartel. Na época da ditadura, a gente viu fechar a Rua São Clemente, e aquele nosso pedaço, onde nós morávamos, não passa ninguém, porque tinha um quartel ali, e quase em frente ao quartel, tem a prefeitura hoje. O quartel está reduzido a um pedacinho, porque era grande. E aí agora já teve um investimento imobiliário, fizeram um edifício, sobrou um pedacinho lá para o quartel.
24:05
P/1 - E vocês faziam amizade com os garotos, garotas da rua, do bairro?
R – Não! Era mais vizinhos, vizinhos de porta, morava na outra casa, não tinha assim... Embora a rua da Matriz, seja em frente a subida do Morro Dona Marta, que todo mundo conhece, que teve o clipe do Michael Jackson, Dona Marta, o mundo conhece aquele morro. E as lembranças que eu tenho assim do Morro, não tinha medo nenhum do Morro. Me lembro de carnaval, o bloco descendo do morro e a gente indo para porta e acompanhando um pouco o bloco, chamava Maria vai com as outras, porque ia passando e ia aumentando. Porque na minha infância, a gente não participava de blocos. Eu participei de ver escolas de samba e as sociedades que eram os clubes, clubes Democráticos, agora não estou lembrado dos outros, na Rio Branco, na avenida Rio Branco. Meu pai sempre foi muito de levar a gente para todos os lugares, meu pai e minha mãe. Minha mãe era danada de perturbar ele, “vamo para cá, vamo para lá”. Nós tínhamos carro, ele colocava o carro de manhã cedo, numa das transversais a avenida Rio Branco, para guardar o lugar lá, para de noite, bem perto , Araujo de Porto Alegre, que eu me lembro, bem próximo ao Municipal, Teatro Municipal. E aí a gente levava coisa para comer, levava refrigerante, botava um pano em cima do carro para não estragar. E ficávamos em cima do carro vendo passar as sociedades, as coisas que vinham tipo um desfile, na própria Avenida Rio Branco. Então essas coisas eu me lembro muito, que meus pais sempre foram muito de nos levar para passear, Jardim Botânico, viajar, sempre aqui para perto, porque também não tinha dinheiro para viajar. Só fui viajar para exterior, quando casei.
26:40
P/1 - E vocês ouviam rádio, viam TV nessa época.
R – Sim! Lembro do rádio, ouvíamos rádio na casa. Depois a primeira televisão, de chegar determinada hora, 8 horas, e todo mundo subir para dormir, acabou, no dia seguinte acordar cedo. E na parte de educação, nós fomos criados ali em Botafogo, então a princípio em colégio pago, privado, na Rua da Matriz, na Rua das Palmeiras, um colégio que até acho que ainda existe, Princesa Isabel, Brasil América, nessas duas ruas por ali. E depois quando a coisa foi apertando, da parte de situação financeira. Aí eu já tive como irmã mais velha, já fui para o colégio público. E aí a minha primeira experiência de colégio público, foi muito... Hoje também seria difícil fazer isso, mas naquela época os colégios públicos ainda eram bons, quando eu... Que foi no segundo grau, no segundo grau eu fui para o primeiro colégio público, fui eu com a minha prima, que era mais ou menos da minha idade, e meu primo, os três juntos. Pro colégio, Rivadávia Corrêa, ao lado da Central do Brasil, na Presidente Vargas, no turno da noitinha. Então, na hora que a gente saia de lá, entrava às 5 horas e saia às 9 horas, uma coisa assim. A gente ia para Floriano Peixoto, atrás, Marechal Floriano, a rua de trás, para esperar o ônibus. Minha prima ia para Santa Teresa, eu Botafogo, meu primo para Copacabana. Aí já era uma barra pesada, na parte noturna, você tinha muita prostituição por ali. Eu não me lembro assim de ver drogas, embora na São Clemente, a gente já conhecia pessoas que subiam o morro muito. E a gente dizia, “i aquele ali tá subindo muito louco, aquele ali tá indo pegar drogas”. Já ficava morrendo de medo! Mas lá a gente não via essa coisa de droga assim, muito forte, mas via prostituição, principalmente de mulheres e de travestis. Mas não assustava, não tinha medo de ser assaltada, dessas coisas não. E a gente pegava o ônibus, ia para casa, no dia seguinte estava lá de novo. Aí eu fiquei um ano lá, e aí abriu um outro colégio, novo, aqui na Gávea. 1º ano do Colégio André Movuá, nesse primeiro ano do Colégio André Movuá, nós nos inscrevemos e saímos do Rivadávia , lá no centro da cidade, lá na central e viemos para cá. Que tinha uma proposta, a diretora era a Henriette Amado, tinha uma proposta, enquanto lá no Rivadávia a gente não podia, uniforme era assim cobrado, não podia, menina tinha mini-saia na época, não podia enrolar a saia, não podia enrolar a meia, não podia puxar a blusa. E aqui podia tudo, porque ela dizia assim, liberdade era o lema dela, com responsabilidade. Então as portas das salas eram abertas, quem não quisesse assistir aula, não assistia, a cobrança era, “liberdade com responsabilidade’. E foi assim que eu fiz o meu segundo ano e terceiro ano do ensino de 2º grau, que na época chamava científico, ou clássico. Eu fui para o cientifico, o clássico era mais para humanas e o outro era mais para exatas, eu fiz científico. Fiz então o primário no Princesa Isabel, o ginásio no Brasil América, primeiro na Rua da Matriz, e o outro na Rua das Palmeiras, e depois fui para o primeiro ano lá no Rivadávia Corrêa e os outros dois anos aqui na Gávea. E era muito engraçado, que também era um fim de mundo, então a rua, a Avenida Bartolomeu Mitre, que quando a gente saía também era no turno da noite. Saia 9 e pouco da noite, ficava esperando o ônibus, sentávamos no meio-fio, com as pernas para o lado de fora, esperando o ônibus, hoje se você fizer isso, você fica sem as pernas, que tanta gente. Você não é do rio, mas o pessoal que é do Rio, o Jockey Club, é em frente. E o Jockey agora, ele tá cheio de restaurantes, então é muito movimento. E aqui a Gávea agora, depois que abriu o túnel para Barra, foi assim um crescimento avassalador. Porque tanto o Jardim Botânico, quanto o Jockey, quando eles foram criados, lá no Dom Pedro, era no fim do mundo do Rio de Janeiro. E hoje não é assim.
32:29
P/1 - Você viveu um Rio de Janeiro que mudou bastante né, quase que não existe mais.
R – Não, não existe! Você vê, por exemplo, aqui na Gávea mesmo... Bom, depois disso o que eu fiz... Você já quer que eu já chegue em Furnas ou continuo falando um pouquinho mais? Como é que está o tempo?
32:52
P/1 – Por mim a gente tem bastante tempo, se a gente puder continuar na infância, adolescência. Pode ser?
R - Tá bom! Então pode ser. Na minha infância também teve uma coisa muito importante, que foi... A minha mãe, ela nos ensinou a ler, a escrever, os números, as primeiras coisas, antes de ir para o colégio, em casa, pequenas. Então, eu mais velha, quando eu fui para entrar no primeiro ano do colégio, para aprender, para ser alfabetizada, eu já era. Eu cheguei no primeiro ano do Colégio Princesa Isabel e a professora falou: olha, não tem o que fazer com ela aqui no primeiro ano, ela vai para o segundo. Só que meu aniversário é junho, então eu fiquei muito na frente, eu fui para o segundo ano, porque não tinha como me manter no primeiro, se eu já sabia ler e escrever. E as crianças não sabiam nada disso, ainda, e tinha noções de somar, diminuir, entendeu, tinha noções de matemática. Então eu fui para o segundo ano. Fiquei sempre muito na frente, e eu era a menorzinho da minha sala. Existia na época também, um negócio de você pegar o quinto ano e pular o quinto ano, aí eu já não pude fazer isso, porque eu já estava adiantada. E depois quando chegou lá no segundo grau, quando acabou o colégio, eu não podia fazer prova para faculdade. Porque eu não tinha idade, então eu fiz um ano inteiro de cursinho, para depois fazer prova para a faculdade. Aí meu pai teve que bancar o cursinho, porque cursinho era pago. E para que a carreira eu fui? Como eu te falei, meu pai tinha um restaurante, que tinha esses cursinhos em cima, no centro da cidade. E tinha também o Instituto Brasileiro de Geografia, o IBGE, e o pessoal almoçava no restaurante dele. E eu sempre fui muito boa na parte de matemática, essas coisas, mais em compensação, eu queria com aquela coisa toda, de ser professora, até os 14 anos, minha meta era ser professora. Queria ser professor, mas felizmente e graças a Deus, não deu certo. Porque eu fiz concurso para o Instituto de Educação, que era na Tijuca, que era o lugar aonde você ia se formar em professora. E eu não passei em conhecimentos gerais, passei português, matemática, conhecimentos gerais, não passei. Eu fiquei tão desencantada, que não quis fazer de novo, e fui fazer o tal científico, foi com 14 anos, mais ou menos, e foi minha sorte. Só que aí no científico, o que eu ia fazer? Ia ser professora de matemática de faculdade né. E meu pai conversando com uma das pessoas que frequentava o restaurante dele, que era o pessoal do IBGE, “mas se a sua filha gosta tanto de matemática, porque ela vai fazer estatística”. Imagina, isso era 1969, o pessoal nem sabia o que significava isso. Aí eu falei: bom, vou fazer estatística, me convenci de fazer estatística. Mas só que naquela época, já estava começando essa coisa do emprego, de não ter tanto emprego quando saia das faculdades. Eu estava iniciando, mas já não estava muito como era antigamente, quem conseguia entrar na faculdade, quando acabava, as empresas iam lá para pegar as pessoas. Na minha época, já não era mais assim, já tinha uma dificuldade para arrumar estágio, no estágio nem todo mundo ficava, entendeu. E eu comecei a achar que era uma profissão muito específica, que eu só ia poder trabalhar no IBGE e em alguma coisa assim de governo, então eu resolvi fazer três vestibulares diferentes. Eu fiz administração, fiz a prova de administração para Fundação Getúlio Vargas, que era em Botafogo. Fiz a prova de economia para a UFRJ, que é a Universidade Federal, que era na Urca. E fiz a prova de estatística, para escola nacional de ciências estatísticas do IBGE. Duas eram gratuitas, do Governo, a ENC que é a escola de estatística, e a UFRJ em economia, e a Fundação Getúlio Vargas era paga. Por óbvio, passei nas três, mas a Fundação Getúlio Vargas ficou, porque eu não tinha dinheiro. Então fui fazer economia pela parte da manhã, na Urca na UFRJ, numa época que dizia que ia mudar para o fundão, até hoje tá lá, não mudou, eu já tenho mais de 40 anos de formada. E fiz a noite, a Escola Nacional de Ciências Estatísticas, que era no centro da cidade, no bairro de Fátima, que era na Rua André qualquer coisa, que agora não me lembro, ao lado do bairro de Fátima. A minha meta era fazer o primeiro ano das duas, e ver qual que eu me adaptava mais. Que eu sentisse mais vontade de fazer. Também não deu certo, fiz os 4 anos e me formei nas 2. Foram 4 anos duros, de manhã cedo, 7 horas da manhã eu já estava lá na Urca, meu pai me levava de carro, me deixa lá, e voltava de ônibus, chegava em casa, comia rapidinho. Fazia curso de inglês, duas vezes por semana de tarde, ia a pé para o curso de inglês, voltava, fazia o IBEU, Instituto Brasileiro dos Estados Unidos, também em Botafogo. E de noite, pegava um ônibus, na Voluntários da Pátria, socada, porque era no horário que estava todo mundo saindo do trabalho, às vezes ia em pé, encostado na porta, pra poder chegar, quando chegava no centro da cidade tinha que passar lá roleta rápido, porque se não depois não conseguia saltar no ponto, e ainda andava um pedação até chegar na faculdade. E fiz os quatro anos da faculdade, quando no terceiro ano, eu comecei a procurar estágio. E na faculdade de ciências e estatísticas, tinha um colega meu lá, “a, você está procurando estágio? Eu trabalho em Furnas”. “Gente, mas Furnas, agora está do lado da minha casa, eu moro na São Clemente, Furnas está na Real Grandeza, vou a pé”. “Você quer tentar fazer um estágio lá?” “Claro, estou botando currículo em tudo que é canto, vamos lá”. Aí fui lá, fui entrevistada pelo superintendente de Recursos Humanos da época, e fui trabalhar como estagiário de estatística, mas não em Botafogo. Ainda tinha um monte de pedaços soltos no centro da cidade, e não estava ainda tudo mudado para Botafogo. Então meu primeiro contato com Furnas, embora eu conhecesse, porque eu morava perto da sede que estava iniciando. Eu fui trabalhar na Avenida Rio Branco, 151, na área de recrutamento e seleção, como estagiária de estatística, fazendo os testes, aplicavam-se muitos testes nas pessoas que estavam sendo recrutadas. Então eu fazia parte de estatística, para dizer: fulano tá bom, não, tá ruim, vai passar, aprovado, aprovado com restrição, não aprovado. Nos testes que eram feitos, eu que fazia toda a modelagem da parte estática disso. Eu trabalhei ali, um ano e meio como estagiária. Aí você imagina, era faculdade de economia de manhã, estágio no centro da cidade à tarde e à noite faculdade estatística. Que também para sair da faculdade de estatística, a Rua Riachuelo descia a ladeira da faculdade, aí eu já tinha um pouco de medo, já não descia pela calçada, que tinha carros parados, ficava com medo de alguém me pegar, como mulher. Então descia pelo meio da rua, que era uma rua sem saída, descia pelo meio da rua, descia sempre com alguém. Mas eu depois ficava sozinha no ponto do ônibus. E aí também tinha prostituição ali, também tinha carro parando, buzinando para mim, entendeu. Eu com os livros, ficava meio já com medo. Mas ia para casa, e mamães estava lá me esperando com um pratinho pronto, em cima de uma panela com água fervendo, não tinha micro-ondas, esquentava o prato pronto do jantar. E era uma loucura, foi assim um ano e meio. Tinha muita ajuda do meu pai, que ele me levava para faculdade de manhã, e quando eu saia do estágio, ele saia do trabalho no centro da cidade, ele me pegava ali na Rio Branco e me levava para faculdade, depois de noite eu vinha de ônibus. Então foi uma luta boa, mas é assim mesmo, a vida... Perto do que ele enfrentou, para mim foi pouco.
44:00
P/1 - Queria te perguntar sobre os seus pais. Como é que era o humor deles, como é que era o jeito deles em casa? Da onde que veio essa questão de você e sua irmã, vocês estudarem, num período que talvez, eu não sei, não era tão obvio assim mulheres fazerem isso?
R - Eu posso te falar, que isso aí, muito minha mãe, porque o meu pai... Minha mãe tinha uma personalidade muito mais forte, do que do meu pai. E como ela não teve mãe né, ela teve a mãe preta, que não tinha muita autoridade assim como meu avô. Naquela época os homens mandavam. Então quem mandava, era o meu avô, e o meu tio que era filho do meio. A mais velha, era atacada, brigava com ele o tempo todo, porque queria fazer as coisas também. E a minha mãe também. Então minha mãe sempre, para sobreviver eu acho, teve uma personalidade muito forte. E meu pai muito, até hoje, impressionante, é um exemplo de vida, eu tenho na minha vida, com 70 anos, eu conheci três pessoas que eu digo que são exemplos de vida. A minha sogra, do meu segundo casamento, do meu atual marido, que morreu com 85 anos e dizia: eu sou a mulher mais feliz do mundo. Você acredita num negócio desses? E passou também o pão que o diabo amassou. Sergipana, veio para cá numa época também que os maridos só que mandavam. E a outra, ela trabalhou em Furnas, também como contratada. E essas coisas da vida, ela é mãe, eu tenho enteados, meu marido tem o primeiro casamento. Meu primeiro casamento eu não tive filhos, fui casada 9 anos, e não tive filhos, e no segundo tem uma filha de 35 anos, que é a Fernanda. Mas meu marido tem três filhos do primeiro casamento, e o mais novo do primeiro casamento, a sogra dele era Analegica, a Daniela até conhece, trabalhou no jurídico de Furnas, também era uma pessoa zen, calmíssima, educadíssima. E meu pai assim, até hoje, com 100 anos, ele pergunta, “o que eu posso te ajudar, que eu posso fazer”. Até março do ano passado ele tomava conta dos remédios dele, saia sozinho, tá sempre pronto a ajudar qualquer pessoa, não é a mim, qualquer pessoa. E minha mãe muito nessa coisa de não poder fazer o que queria fazer, ela queria ter trabalhado. Então ela sempre colocou na cabeça de nós duas, que nós tínhamos que ser independentes. “Não, vocês não tem que depender de marido, vocês tem que estudar, vocês tem procurar ser independente.” Porque ela era muito dependente, e não tinha ninguém assim para mudar. Eu acho que eu também, foi uma conjugação de fatores, porque a mulher só foi trabalhar, quando ela começou... Primeiro, ter independência do seu corpo, com a pílula, porque antes ela era destinada, as tarefas da sociedade estavam muito bem divididas. Homem vai para rua arrumar o dinheiro e mulher fica em casa, toma conta de filhos, e vai ficando mais velha, a que está mais nova toma conta dos mais velhos. Toda função que hoje a gente tá vendo que está piorando, porque as pessoas estão vivendo mais. Ficava totalmente a cargo das mulheres. Os homens também passaram a ter necessidade que as mulheres trabalhassem, porque os salários foram diminuindo, e um homem assalariado não conseguia mais levar para família tudo que precisava, para os seus filhos. Foi uma conjugação de fatores eu acho, que foi fazendo com que isso fosse ocorrendo, a pílula muito, muito importante e todos esses fatores juntos. Então essa coisa, minha irmã é economista também, ela trabalhou no Banco Bradesco, ela trabalhou na Esso, e depois trabalhou em Furnas, na área sempre mais financeira. Eu trabalhei sempre em suplementos, trabalhei em RH, comecei em RH, como estagiaria. Também tem um ponto assim diferente, que foi o seguinte, quando eu estava fazendo o estágio, eu já te falei, que muitos estagiários já não ficavam. No local mesmo que eu estava, que eu era a única estagiaria de estatística, mas a parte de psicológica, que já tinha várias psicólogas. Quando acabava, se formava, ficava uma das cinco, sei lá. Então quando... Eu precisava trabalhar, meu pai e minha mãe já não tinham muito dinheiro. Eu era a mais velha, então o que aconteceu. Quando eu comecei a chegar no fim da linha da faculdade, eu não sabia se Furnas ia ficar comigo. Então na Faculdade de Economia houve um curso de informática, na verdade era de programação, dado pela IBM, dentro da faculdade, tinha que fazer uma prova, e eles iam preparar essas pessoas para trabalhar depois no Instituto Brasileiro de informática do IBGE, quem passasse. Tinha que fazer uma prova para fazer o curso, fazia o curso de 2 meses, e quem fosse aprovado, teria um emprego lá no Instituto Brasileiro de Informática. Era na Mangueira, ao lado da Mangueira, agora já acabou, até derrubaram aquilo lá. E eu meti, para variar, então eu fazia, eu matava uma aula para estudar para outra, tinha estágio em Furnas, matava aula de manhã para fazer o curso de manhã, era uma loucura, porque o curso era aula todo dia, e toda sexta tinha prova. Então era realmente uma doideira. E aí eu passei no curso, para trabalhar no IBI e Furnas me segurou também para trabalhar, mas só que disse, “olha, eu não tenho o cargo de estatístico aqui, você vai entrar como uma administrativa, uma assistente administrativa”. Na época eu estava namorando o meu primeiro marido, que trabalhava numa multinacional, lá na PRICE, que era uma empresa de auditoria grande, e que não tinha tempo para nada. Falei: cara, se eu for me meter em informática também, programação, sem horário para nada, a gente não vai nem se encontrar. Então eu só fiquei em Furnas mais, por que? Pela comodidade, pela maior tranquilidade, por ser um emprego com horário, por ser perto de casa, enquanto eu não tinha casado. Porque eu entrei no estágio, em julho de 1971 e fui depois efetivada, em dezembro de 72. Passei um ano e meio como estagiaria naquela loucura. E muitos colegas meus de estatística, “não, você vem pra cá pro IBI que você vai ganhar muito mais, o que você vai ficar fazendo aí? Não está nem em cargo de nível superior.” Mas eu não fui, e depois outras colegas que foram, depois mais tarde, vieram trabalhar em informática em Furnas, eu tenho colegas em Furnas, que foram e depois acabaram voltando para Furnas. Mas foi assim que eu fiquei em Furnas. Eu fiquei na área de recrutamento e seleção, fui efetivada em dezembro de 72, num cargo administrativo que não era nem de nível superior, e entrei. Só que lá, todas as vagas eu via né. Trabalhava lá, e me apareceu uma vaga de estatístico. Falei: opa! “Quero me candidatar”. Falei para o meu chefe, meu chefe, “não, mas essa vaga aqui você não vai conseguir, esse homem aqui...” Era o assistente do diretor, que era como se fosse... Naquela época, os diretores, eles trabalhavam para fora da empresa, para a parte mais política, e existia um assistente executivo em cada diretoria, e ele era o diretor para dentro, ele que tocava todos os trabalhos com superintendente, ele que dava as ordens. Então havia uma necessidade de um estatístico para diretoria de suprimentos, na época. Eu vi a vaga, falei com meu chefe que eu queria, o meu chefe só faltou dizer para mim, “você é muito novinha, esse homem é uma fera, não vai nem olhar para você”. Mas eu fui! Fui entrevistada pelo Doutor Hélio Maurício, assistente executivo da Diretoria de Suprimentos, e voltei, e nada, não tinha um retorno de nada. Aí o meu chefe, assim, “não te avisei!” Bom, um belo dia, o homem ligou lá para baixo, e falou assim: olha só, eu quero a Tânia a partir de amanhã. Caraca, foi uma loucura, entendeu. E aí eu fui trabalhar numa assessoria da Diretoria de suprimentos, substituindo um engenheiro que estava se aposentando e que era responsável pelos relatórios todos que consolidava todas as informações da diretoria. E por informações externas, que também a diretoria tivesse que mandar para consolidar junto na presidência e depois mandar para os órgãos externos. Então a parte toda de dados dessa Assessoria ia ficar comigo. E foi assim que e fui, e fui como estatística, fui para lá como estatística. Só que também estatísticos, tinham dois em Furnas, eu e o Roberto Ricardo, que era um que eu tinha visto quando eu trabalhava no recrutamento e seleção, o pessoal, “i tem um cara aqui ó, um ser estranho aqui, que vai ser estatística lá na presidência”, e eu conheci ele assim. Mas eu fiquei com o estatístico lá e os estatísticos nunca tinham vez na hora de ter um aumento salarial, fazer um reajuste de tabela, só tinha dois, Furnas chegou a ter 10 mil pessoas. Hoje está com 3.000, 2.600, 2.700, uma coisa assim. Mas então, aí eu falei: ah não! Aí eu comecei a trabalhar com o orçamento nessa assessoria, consolidar orçamento, comecei com normas, todas as normas que qualquer órgão debaixo da diretoria fazia, comecei a trabalhar nessa área toda. E aí eu passei para economia. Passei para economista, troquei de cargo, aumentei as minhas atividades lá, e fiquei lá. Eu fiquei nessa assessoria de diretoria por 15 anos. E tive a minha primeira chance, minha primeira chefia, como chefe. A, meu marido foi meu chefe, nesses 15 anos aí. E o que aconteceu? Eu me separei, ele se separou e depois nós fomos morar juntos. Morar juntos não, moras juntos foi só quando a nossa filha nasceu, muito depois, cada um na sua casa. Então o que aconteceu? Meu marido saiu da chefia, foi para outra diretoria, na época não era meu marido, claro, não trabalhava com o meu marido, não existe isso. Eu ainda era casada nessa época, e o meu primeiro chefe depois dele, foi o Luiz Fernando Bergamini de Sá, ele foi ser diretor da fundação Real Grandeza. Primeiro foi meu chefe, e depois ele saiu para ser diretor da fundação Real Grandeza. E na diretoria da Fundação Real Grandeza, existia uma divisão de seguros e ele come conhecia, tinha trabalhado comigo, queria mudar o chefe lá, e me ofereceu para ser a chefe da divisão de seguros, que era dentro da Fundação Real Grandeza. A Fundação Real Grandeza funcionava com todos os seus empregados, eles eram de Furnas, cedidos para a fundação. E foi aí o meu primeiro cargo de chefia, indicada por Furnas, empregada de Furnas, cedida para Fundação, para ser chefe da Divisão de Seguros da Fundação, isso foi em 86. Então, foi a minha primeira chefia, foi uma loucura também, tenho passagens assim, muito estranhas, porque eu cheguei lá, no primeiro dia e tinha mudado também de local, então estavam todos os móveis no centro da sala, os empregados todos de braços cruzados esperando, e o meu diretor me apresentando, “essa daqui é seu novo chefe”. Fechou a porta e tchau. Eu não conhecia as pessoas, não sabia no que cada um trabalhava. E as pessoas assim, os empregados me perguntando, “bota o quê aonde?” Foi maluquice! Mas graças a Deus me sai muito bem. Falei: atendimento ao publico, os que atendem mais na frente? Quem é atendimento para trás, vamo bora! Seguro de vida para cá, seguro de veiculo para lá, seguro de não sei o que para cá. E fomos indo. Eu passei lá quase 4 anos. E foi um período muito difícil, porque as condições de trabalho, não eram naqueles prédios bonitos de Furnas, era num sobrado lá, numa parte antiga. Então era uma loucura, porque uma inflação de 80% ao mês, vocês não tem ideia do que significa isso. Sem nada, nem um valor acoplado ao índice que pudesse ter uma correção automática disso. 80% de inflação, um seguro que as pessoas seguravam seus carros num valor. Imagina, se o carro era roubado, no mês seguinte era menos 80% do valor do carro. Então as pessoas só faltavam me bater, tudo na mão, nada automatizado. E você tinha empréstimo para comprar carro, era uma loucura, foi realmente uma fase muito brava. Essa fase já estava... Minha filha nasceu em 86, um pouco depois. E foi muito difícil para mim, porque a gente tinha que ir... Mas foi um aprendizado, que eu acho... Eu disse assim: se eu passei por isso aqui eu passo por qualquer coisa agora, entendeu. E realmente, eu passei quatro anos ali, eu implantei computador. Microcomputador, porque o grande porte era uma loucura, você tinha que ficar na fila para fazer um sistema de grande porte. Eu lá, com a água aqui né, morrendo! Então consegui um microcomputador que não estava sendo muito usado na divisão do lado, falei com esse meu diretor, falei: não, não tem condição. E consegui colocar pelo menos apólice de seguro de veículos, que tinha essa renovação de valores absurda e ali eu consegui... Têm várias passagens ali, passagens de greve e precisando virar... Depois quando passou do pequeno porte, para o grande porte, depois quando passamos o sistema para o computador grande de Furnas. E de greve, ter que ir lá para pegar os pedidos de seguro, que estavam sendo emitidos pelo computador, e conversar com o sindicato para poder entrar, para pegar os pedidos para levar para seguradora, para fazer não sei o quê, para rodar a apólice. Trabalhar até 1 hora da manhã, 2 horas da manhã, então foi uma fase difícil, principalmente porque depois eu também estava com uma filha de dois anos. Quase perdi minha voz, porque trabalhava em cima das oficinas de Furnas. Então tem várias passagens, mas valeu!
1:02:29
P/1 - Como era a cultura da empresa nos anos 70? Quando você entrou, como é que era a apresentação? O que as pessoas falavam sobre Furnas? Como é que era a relação, as hierarquias da empresa?
R- Muita hierarquia. Eu me lembro, como eu te falei, eu fiquei um ano e meio no centro da cidade, era mais tranquilo, mas tinha todo, por exemplo, uma mulher não trabalha de calça comprida. Era sapatinho de salto, meinha fina e comprimento da saia lá para baixo do joelho, no joelho no máximo. Não, homens que trabalhavam de calça comprida. Eu fiquei um ano e meio, um ano e meio não, no meio do estágio, houve a mudança do centro da cidade para Botafogo, de onde eu estava trabalhando. Mas não passei para os blocos, eu passei também por uma estrutura que dava lá para a Rua São João Batista, uma estrutura pequena, ali que era o recrutamento de seleção. Foi quando, depois eu fui para os blocos, quando eu virei estatística, que eu fui lá para a assessoria. E eu fui lá para o décimo andar. A hierárquica era assim, em cada andar de Furnas uma diretoria, e aquela diretoria tinha o diretor, as assessorias mais próximas ficavam com ele, e os outros ficavam nos outros blocos. Então o serviço de garçom, trazendo cafezinho. Dentro do bloco A, um elevador só para diretores, assistentes e níveis de superintendente, que era abaixo do diretor. Abaixo do diretor você tinha um assistente executivo, que era quase que um diretor e tinha os superintendentes, aí eles podiam pegar aquele elevador. No último andar também um restaurante, só para esse mesmo grupo, diretores, pessoas que vinham em reuniões, que queria convidar para almoçar, era no prédio de Furnas, lá no último andar. A gente chamava o restaurante lá, tinha o bandejão no subsolo e o restaurante, o chão de estrelas, que a gente chamava de chão de estrelas. E o elevador também privativo para diretores, assistentes, superintendente, só podia ir se alguém te chamasse. Depois com o tempo, isso foi... O primeiro a perder foi o elevador, muito chefe começou a dizer, “eu não vou nesse elevador, eu vou no normal”. E por último foi o restaurante, mas o restaurante ainda demorou bastante para sair. E outra coisa, as mulheres, quando Furnas tinha 10 mil pessoas, nós tínhamos só 1000 mulheres, hoje são 20%. Eu fiz essa pesquisa outro dia aí, mulheres no balanço de Furnas. Eu fui olhar que eu tive que fazer também uma fala lá para Real Grandeza, e aí eu pesquisei. Quer dizer, e mesmo assim, na época, os cargos eram assim, biblioteca, cargo de chefia, praticamente nenhum. Chefia da biblioteca, chefia de documentação, mas não mais que isso. Porque você tinha uma hierarquia muito grande. Furnas teve setor, depois acima era divisão, depois era departamento, depois superintendente, e o diretor. Essa escala de graduação, depois esse setor serviço saiu, e menos tempo já saíram as divisões, pouca gente tinha divisão, foi tudo muito encolhendo. Agora, eu não sei se você ainda quer que fale dos anos 80 ou dos anos 90?
1:07:28
P/1 - Você falou que quando você entrou tinham poucas mulheres e ainda tem poucas mulheres, é isso? Você sentia que era um ambiente mais masculino, como é que era lidar com isso no dia a dia?
R - Era um ambiente bem mais masculino, mas em alguns setores, a gente ouvia falar, hoje chama assédio, na época não se chamava isso. Então quando a pessoa era assediada, quando alguma mulher era assediada, simplesmente tentava mudar de lugar, saia fora! Mas existia! Esses casos sempre existiram, sempre existiram. Não comigo, graças a Deus não, eu não tive isso. Mas você via que na hora que vinha uma chefia, ninguém pensava numa mulher, era como se fosse privativo de homens. E eu acho até que eu quebrei um pouco esse paradigma. Porque eu fui ser chefe de divisão na Fundação Real Grandeza, aí quando veio o governo Collor, chegou o governo Collor e houve uma alteração de diretor em Furnas, como toda vez que muda o governo, é uma estatal Federal. E um dos diretores, era um colega da financeira, que é o Gilber e que eu tinha ajudado ele fazer uma tese, eu fiz a parte estática. E aí quando ele virou diretor, ele quis fazer uma composição da diretoria dele, e me chamou, junto com outras pessoas, na época já com o marido também, ajudamos na construção dessa nova diretoria. E eu fiquei sendo chefe, sai da divisão da Fundação Rela Grandeza, voltei para Furnas, e assumi uma chefia de uma assessoria de recursos humanos. Que também foi uma pedreira, quer dizer, saí de uma pedreira de um jeito, e fui para uma outra pedreira. Eu fiquei um ano e meio na época do Collor, quando nós tivemos meta de demitir mais de 2.000 pessoas. E era minha assessoria, que ia lá em Brasília, eu, escutar aquelas barbaridades e voltar tendo que fazer. Então foram muitas noites sem dormir, tentando resistir a esse golpe o mais possível, mas dentro da obrigatoriedade de cumprir, porque e uma empresa do governo, tem que cumprir as determinações, sabendo que aquilo não podia ser daquele jeito. Então foi uma fase, foi um ano e meio duríssimo também, que às vezes a gente pensava... Em todos os meus cargos de chefia, foi a primeira vez que eu tive oportunidade de fazer equipe, eu consegui fazer a minha equipe, porque era uma assessoria nova. Uma assessoria que tudo que não era pessoal, não era treinamento, não era desenvolvimento, caia comigo. Então foi uma assessoria que fez o primeiro plano de demissão incentivada de Furnas, lá nos anos 91. E depois, quer dizer, eu fiquei nessa assessoria, consegui formar uma boa equipe, mas era uma loucura. Porque às vezes chegavam 5 horas da tarde, todo mundo pronto para ir embora, 5 e meia, 6 horas, ligava lá o diretor, e dizia assim, “segura todo mundo aí que tá chegando aqui um fax de Brasília, vai trocar tudo, que não sei quantas informações para amanhã.” E a gente virava a noite lá, também foi uma fase dura, depois disso, o próprio Gilber me tirou dessa assessoria, e fez uma proposta para diretoria de Furnas, de eu ser uma das diretoras da fundação. Então eu fui, acho que nos anos 90, comecinho de 90, diretora de benefício na Fundação Real Grandeza, indicada por Furnas. Primeira mulher na diretoria da Fundação. Quando eu vim para ser chefe da assessoria, nessa assessoria em Furnas, já tinham começando as mulheres a ser chefia de outras divisões e departamentos, mas eu nem me lembro se já tinha muitas. Eu acredito que não, era mais divisão, assessoria já não tinha. E fui para a Fundação Real Grandeza, quer dizer, eu já tinha estado como chefe de divisão lá, saí, fiquei um ano em Furnas nessa assessoria de RH, voltei para Fundação Real Grandeza como diretora, fiquei quatro anos lá, indicada por Furnas. E aí eu pegava tudo, menos previdência, pegava plano de saúde, empréstimos, os seguros, e pegava também toda a parte de assistentes sociais de Furnas pelo Brasil inteiro, professores de educação física que tinham nas Vilas. As Vilas no início, elas eram muito afastadas da cidade, então para as pessoas irem para lá trabalhar, você tinha que fazer toda uma infraestrutura. Você dava casa, tinha um clube, você tinha assistente social lá, você tinha médicos, tinha que ter tudo, porque a cidade era longe. Depois isso tudo foi com o tempo se desfazendo, porque as cidades foram se aproximando das vilas, o governo foi cada vez mais saindo fora, as estatais foram sendo cobradas por muito menos custos. Do tipo, não tem mais casa, não precisa mais da casa, não precisa ter clube, cada um que tem clube, os associados que paguem. Mas lá atrás não era assim, do Collor para cá, foi desmobilizado tudo. E foram na época do Collor, mais de 2.000 pessoas... Foi feito um PDV, um plano de desligamento voluntário, que atingiu os aposentados ou aposentáveis, não era para qualquer empregado, era para os aposentados e os aposentáveis. Quanto mais tempo você faltasse para cumprir os requisitos da fundação, você ganhava lá um dinheirinho. Se você estava pleno para poder se aposentar pela Fundação Real Grandeza, você não ia ganhar era nada, vai, porque vai ser demitido. Cumprir a regra.
1:15:03
P/1 - Conta para mim, Vera, qual é a função da Fundação Real Grandeza?
R - A Fundação da Real Grandeza, ele é uma outra empresa, ela na verdade é um fundo de pensão. O que é isso? Ela foi criada por Furnas, lá nos anos 70, para ficar com a parte de previdência de seus empregados, ou seja, os empregados não serem, só quando forem aposentados, só receberem o benefício do INSS. Eles vão contribuir a vida inteira, e Furnas também contribuiria com uma parcela igual, para esse fundo de pensão, para quando eles preenchessem todos os requisitos de aposentadoria, um deles é se aposentar pelo INSS, eles estariam aptos a pedir um benefício de complementação de aposentadoria da Fundação Real Grandeza. Então ela é uma entidade muito importante, ela hoje tem 12 mil aposentados, 12 mil famílias e ainda temos aí o pessoal que tá na ativa, em Furnas, mais 3.000 pessoas ainda contribuindo. Então ela paga aposentadoria para mais de 12 mil famílias, e ela também administra um plano de saúde de autogestão próprio. Então a Fundação Real Grandeza, instituída por Furnas, lá atrás, é uma outra empresa, mas a Furnas é que foi quem criou esse fundo de pensão, para que os seus aposentados tivessem no final da vida, não só o benefício do INSS, mais uma complementação, porque era muita diferença. Inclusive na época, isso foi feito em todas as grandes estatais, se tem a Previ no Banco do Brasil, se tem a Petros na Petrobrás, você tem a Funcef da Caixa Econômica Federal. Porque lá atrás, para você manter um profissional qualificado também, quando Furnas estava no crescimento, construindo usinas, não sei o que. Ou você tinha que conviver com a iniciativa privada, roubando toda hora alguém, ou você dava salários muito altos, ou você tinha que dar benefício. Então um modo de segurar os empregados, era o benefício de previdência, quando se aposentasse e de saúde também, que já estava começando ao sistema público não aguentar a fornecer um serviço de qualidade. Porque quando eu era pequena, eu sempre fui... Falei da parte de Educação, de faculdades públicas, e eu era atendida, eu tinha um médico de família, um pediatra, quando era pequena e qualquer coisa mais grave, um tombo, quebrou, era o Hospital Miguel Couto aqui, hospital público. Então, depois de muito tempo a parte de saúde foi se deteriorando e foram surgindo os planos de saúde e todas essas grandes estatais, além da área de previdência, fizeram também seus planos de autogestão em saúde, algumas estão dentro da mesma instituição, outras, por exemplo, o Banco do Brasil não, ele tem a Cassi para saúde, e a Previ para previdência. Nosso caso, nos estamos com as duas na Fundação Real Grandeza.
1:18:54
P/1 – Tania, você consegue pensar em fases de Furnas, em transições, capítulos dessa história da empresa que você viveu? E se sim, qual foi o fator de mudança, quais seriam as diferenças?
R - Um desses foi o governo Collor, que eu já te falei, que enquanto, até o governo Collor Furnas só crescia, depois do Governo Collor Furnas começou a encolher e foram sucessivos planos de desligamento voluntário, sempre com as pessoas mais velhas, que podiam aposentar, e agora até com os novos. Porque é encolher direto, você vê Furnas, está com 10.000... Está certo que a tecnologia comeu muitos postos de trabalho, e isso fez com que também encolhesse toda uma hierarquia que existia, a gente entende tudo isso. Mas foi, o marco foi o Plano Collor, depois houve um outro marco, que foi quando houve a primeira tentativa de privatizar Furnas, que também foi um marco muito forte. Eu na época era assistente do presidente, do Dr. Luiz Laércio, que vocês já fizeram uma entrevista com ele. E foi assim um período muito ruim, porque era como se... Você vê, eu trabalhei 30 anos em Furnas, eu fiquei 30 anos, me aposentei lá. Então tudo que eu tenho hoje, eu tenho uma casa, eu tenho uma previdência, tenho um plano de saúde, que tá caro, mas porque Furnas também não ajuda nada para aposentados no plano de saúde. Mas eu digo, mas eu tenho um plano de autogestão. Tudo isso eu devo ao meu trabalho em Furnas, meus 30 anos, devo muito a Furnas. Mas de um tempo para cá, você vê, por exemplo, plano de saúde é um negócio importantíssimo, para as pessoas mais idosas. Para os novos é, mas para os idosos é fundamental. O sistema Eletrobrás todo, enquanto as outras, os aposentados tinham os mesmos direitos dos ativos, na Previna, na Petros, na Previna não porque e Cassi. Mas eu digo assim, no Banco do Brasil eles se preocuparam e mantiveram. Nós já pegamos uma fase, que nenhuma de nós, nem pessoal da Chesf. Todo o sistema Eletrobrás, tirando Itaipu, porque ela é um órgão Nacional, então o cara quando se aposenta, ele tem o plano de saúde igualzinho aos ativos. Mas o resto todo ninguém tem, isso veio piorando muito. Então nós temos muitos aposentados hoje, poxa que ajudaram Furnas a crescer, e que não tem plano de saúde, porque não tem capacidade de pagamento, entendeu. Porque Furnas entra com zero no plano da saúde. Então isso mudou muito, a coisa de você ver o seu empregado. As empresas hoje, com essa coisa de competição, de menores custos, elas estão assim, acabando com as expectativas, os ganhos todos que nós tivemos com anos de luta. Entra governo, sai governo e mais ou menos a mesma coisa, você perde todas as suas conquistas. Então a época da privatização, foi uma época que a gente viu a associação de aposentados, a Após Furnas, é a única associação dos aposentados, entrou na justiça, dizendo que eles pretendiam cindir a empresa, para poder vender mais facilmente. Porque ela era uma empresa muito grande, então eles iam cindir em geração e transmissão. A Após Furnas, hoje eu sou também conselheira na ata, já fui presidente da Após Furnas, por dois mandatos. Ela entrou na justiça e consegui impedir essa privatização de Furnas, Dr. Luiz Laércio deve ter feito um depoimento, que ele era Presidente, ele renunciou, foi uma coisa muito importante, ele renunciou à presidência, quando simplesmente iam jogar a Fundação Real Grandeza com déficit para lá, sem pagar nada, e danem-se os aposentados. Porque na proposta de privatização, não ia ficar no governo nada que tivesse custo mais alto. Então aquele período foi muito ruim, foi muito ruim. E agora a gente está vendo de novo o governo, com todas, não é só com Furnas, com todas as estatais federais, emitindo medidas que simplesmente detonam com tudo aquilo. Quer dizer, eu como eu falei para você, eu quando fui para Furnas, se eu tivesse ido lá para o tal do IBI, eu ia ganhar quase o dobro de salário. Eu fui por uma questão de tempo, de ser mais perto, de ser mais calmo o trabalho que eu ia fazer. Mas fui também, seguinte, estou ganhando um salário baixo, mas eu tenho um indireto aqui de benefício muito alto. Esses indiretos de benefícios estão sendo cortados assim, todos os ganhos que os sindicatos conseguiram por anos e anos de acordo coletivo, aí vem uma comissão, uma CGPAR, inventa lá uma comissão, que vai tomar conta das estatais. Sai dando medidas e diz: olha, previdência sem risco, agora não pode ter plano de benefício definido, nem de contribuição variável, é tudo como se fosse uma poupança e pronto, não quero risco nenhum”. Então a gente está vendo o trabalho ser subavaliado, para os ativos e as consequências todos dos aposentados. Isso é um paradigma. Até Collor crescimento... Até porque mudou também o marco regulatório do setor elétrico. Antigamente você tinha uma estrutura, eu sou do tempo, que eu me lembro pequena de apagão na minha casa ali na São Clemente. Acabou a luz, de noite, todo dia, ficava sentada numa cadeira lá do lado de fora, um calor do cão, mosquito, não tem luz, light. Então quando entraram as estatais, elas entraram para realmente fazer um crescimento do país. E no caso da parte de energia elétrica, Eletrobrás não existia. Eles criaram as empresas fatiando por região geográfica do país. Eletrosul no sul, Furnas no sudeste, Eletronorte depois, que foi a mais nova, no norte e a Chesf no nordeste. Então elas não brigavam entre si, cada uma tinha seu fatia de mercado. Olha, ela vai fazer o planejamento para aquilo ali, ela vai fazer a geração, ela vai fazia transmissão, vai fazer tudo, só não vai fazer a distribuição, que aí não. Quando houve a mudança do marco regulatório, que nós seguimos um modelo inglês, embora a gente tenha bacias hidrográficas, coisas que eles não tem. Fingi que a gente não tem. Então, o que aconteceu, todo mundo compete com todo mundo. Isso é uma maluquice, é o braço direito, brigando com o esquerdo, entendeu. E as estatais impedidas de participar, “mas vai entrar o privado”, vai entrar o privado? Privado não bota um tostão, pega dinheiro do BNDS, entendeu. E aí faz junto com a estatal, porque ela tem o conhecimento. Você olhar... Eu não sou especialista nessa área, mas o Roberto Araújo é, uma pessoa importantíssima de vocês falarem, que também trabalhou muito tempo em Furnas, nessa área de energia mesmo. E hoje o preside o Ilumina, é uma pessoa que eu acho que vocês tem que chamar, que vai mostrar com detalhes essa loucura que está sendo setor elétrico no Brasil, e só piorando porque agora é vender Eletrobrás. Então eu me lembro de alguns fatos estranhos, que é bom para ficar na história, de quando mudava a diretoria, você tinha um evento, uma solenidade no auditório de Furnas. E houve uma época em que entrou um presidente de Furnas, foi exatamente depois do Luiz Laércio, veio anunciar... Que o Luiz Laércio era um presidente da casa, ele foi mesmo superintendente inclusive, quando eu era chefe dessa assessoria de RH, por isso que ele me chamou para ser assistente dele quando ele virou presidente, já conhecia o meu trabalho. Houve o Luiz Carlos Santos, que era uma pessoa que foi presidente de Furnas, indicado na época pelo Fernando Henrique, começava com ele, que era um deputado federal que não tinha sido reeleito. E houve toda uma solenidade no auditório. E eu não sei se alguém vai falar, mas eu acho importante falar, que na solenidade, houve pessoas que conseguiram entrar no auditório, visitantes, porque tinha muito político, tinha de tudo. E eles eram simplesmente do Greenpeace, então no meio da solenidade, eu acho que foram umas três ou quatro pessoas no auditório, elas estavam acorrentadas as cadeiras, para não serem retiradas do recinto e começou a ter um uma sirene, na hora que o presidente que estava sendo empossado, que era amigo do Fernando Henrique, falando. Porque nós tínhamos, se não me engano, tinha Angra, ainda estava conosco, antão a parte ambiental toda. Foi uma confusão danada, um evento para não esquecer. E eu acho que é isso, algumas coisas me deram força para depois que eu me aposentei também entrar numa luta, em defesa dos aposentados. Eu me aposentei em 2002, como assistente do presidente. Então você vê, eu fiquei 30 anos, fui de estagiária, chefe de divisão, chefe de área, estatística, não, primeiro administrativo, depois estatística, depois economista, depois assessor de suprimentos, os cargos. Mas eu trabalhei em muitas coisas, porque depois que eu sai da diretoria da Fundação e voltei para Furnas, eu voltei, fiquei como assistente do diretor, que eu tinha saído, que era na época, já era diretor de administração. Que suprimentos já não existia mais, não tinha mais uma diretoria só de suprimentos, juntou com administração. E aí eu fiquei ali um tempo, que vocês sai, era chefe, vai para outro lugar, quando volta seu lugar tá ocupado, certo? Você fica ali um tempo esperando uma nova oportunidade, foi quando o Luiz Laércio virou presidente e me chamou para trabalhar com ele. Depois o Luiz Laércio renunciou, entrou um político para presidência de Furnas, e eu fui mandada de volta para minha área, porque eu não tinha padrinho político. Eu era de carreira, então essas coisas... Que antes não tinha muito, passou a ter, depois de um tempo isso foi assim, eu acho que foi muito ruim para Furnas. Mas não é uma coisa que só aconteceu em Furnas, foi uma coisa que aconteceu em todas as estatais. A parte política foi... Os governos precisaram negociar com o congresso e esse toma-lá-dá-cá foi terrível. Algumas coisas a gente conseguiu barrar, outras não, no momento estamos na mesma luta por aí. Eu voltei da fundação, então fui ser assistente do Luiz Laércio, depois disso, quando ele renunciou, voltei para a já chamada de DG, diretoria de administração, mas a sigla era DG. Eu fui trabalhar com patrocínio, lei Rouanet, lei audiovisual, era assistente do diretor, preparava toda a documentação para poder a diretoria como um todo decidir quais projetos que vai participar, quais não vai. Fiquei um tempo assim, depois no final da minha carreira, nos últimos seis meses, eu fui chamada para ser assistente de novo do presidente, um presidente que ficou nos últimos seis meses, o Dimas Fabiano Toledo. Para controlar os limites dessa parte de comunicação, de marketing, eu fui para lá especificamente, eu falei: poxa, eu não quero ir mais para lugar nenhum, porque eu estou indo embora daqui a seis meses. Mas fui para lá, fiquei mais seis meses nessa área de controle de limites dos projetos e do apoio de Furnas para essa parte de patrocínio, basicamente. Tanto lei Rouanet, quando fora de lei Rouanet.
1:35:04
P/1 – Ao longo do seu tempo em Furnas Tânia, você conheceu funcionários, a cultura de outras áreas da empresa, tipo geração, transmissão, como é que era essa relação com outras áreas?
R - Como eu te falei, eu trabalhei muito na parte de suprimentos e administração, e me envolvi muito com a Real Grandeza, que não deixa de ser uma continuidade de RH, do assunto RH. Mas quando eu fui para ser chefe de divisão de seguros, eu dava palestra por Furnas inteira, então eu conhecia as áreas. O meu trabalho direto, não trabalhava diretamente, vamos dizer assim, com a operação, ou com a engenharia. Mas com a financeira, direto, com administração e suprimentos, direto, e com a Real Grandeza, direto, e com essa parte de patrocínio, também, que acabou no final também trabalhando nessa área. E aí eu me aposentei 2002, falei: bom, agora vou ficar quieta, tranquila, vou só da uma ajudazinha lá na Associação dos Aposentados de Furnas, trabalho voluntário, vou poder fazer tudo que eu não consegui fazer, durou três meses isso. Porque eu fui para Associação dos Aposentados e objetivo da associação, além de congraçamento é defender os direitos lá na Real Grandeza, no INSS né. E aí eu entrei, primeiro eleita no conselho fiscal, falei: não, quero só conselho fiscal, que eu vou aí uma vez de três, em três meses olhar as contas, associação pequenininha, não vai me dar trabalho. Aí como eu tinha acabado de sair, as pessoas lá eram já mais velhas, já estava... Sai em 2002 e tinha muita gente que saiu nos anos 90, logo nos primeiros PDVs mesmo, no plano de demissão incentivada. Eu estava assim bem fresquinha como estava funcionando as coisas, então eu comecei a dar ideias para associações. Dei tantas ideias, que eles propuseram o seguinte: daqui a dois anos, você que vai ser presidente. Aí fui eleita presidente da associação, 2 anos e foi reeleita mais de 2 anos, e nessa época eu me surpreendi com a minha pessoa. Porque eu sempre participei de associação de empregados como indivíduo, nunca participando como dirigente. Sempre participava de reunião de Sindicato, aí ia eu, como individuo, nunca participando da gestão. E na Após Furnas eu estava entrando como presidente. E nesse período que eu estive lá, a gente teve essa ameaça, foi uma ameaça, do... Agora tá preso, felizmente. Eduardo Cunha tentando... Conseguiu colocar o presidente de Furnas, que foi prefeito do Rio, já até morreu, e quando Furnas mudou, queria mudar os dirigentes que Furnas indicou na Fundação, e eles tem mandato. Então eu fui parte importante na luta, junto com os sindicatos, de enfrentar isso tudo, foi difícil, foi perigoso. Havia perigo, porque essas pessoas, a gente pensa assim, não tem limite. Mas a gente enfrentou isso com muito... E conseguimos manter os diretores lá até o fim dos mandatos deles. E aí depois já tinha mudado um pouco a gestão, e já conseguimos que não fosse indicadas pessoas. Porque nós temos, no nosso fundo, hoje mesmo eu estava de manhã numa reunião, tem fundos que pode vir pessoas de fora, fundos de pensão, que podem vir pessoas de fora para gerir, o nosso não, o nosso estatuto não permite. Mas mesmo assim, infelizmente nós temos colegas, que ainda na ativa, estão submetidos ao governo. E a gente fica muito preocupado, porque o dinheiro, o nosso entendimento é que o dinheiro, quando chegou no fundo de pensão, não é mais da patrocinadora, agora aquilo é para aposentadoria das pessoas. Então nos temos que estar de olho. Então foi uma fase na Após Furnas muito importante, nós fizemos, nós conseguimos matéria em jornal, matéria no Jornal Nacional, foi uma fase muito difícil, fizemos manifestações com mais de 400 pessoas pelas ruas de Botafogo. Mas nós fomos vencedores, esse episódio foi muito importante, e lá na privatização de Furnas também. Porque no dia que haveria uma assembleia, esse fato é importante. Assembleia lá no chão das estrelas, lá em cima. Uma assembleia de acionistas para dividir a empresa em GET, para depois ser mais fácil de vender. A associação dos aposentados conseguiu uma liminar para impedir. A Após Furnas conseguiu, então foi uma loucura, porque tinha polícia dentro, eu me lembro, que eu tentei, eu não era acionista de Furnas, tinha uma amiga que era. Ninguém podia subir nos elevadores, só tinha um elevador funcionando para ir para tal da Assembleia, com Polícia Armada dentro do elevador, choque na porta de Furnas, os empregados todos no pátio, todo mundo se abraçando, se dando a mão, uns tentando subir. Eu fui tentar subir por um outro caminho, que não era lá, quando cheguei pela escada lá pelo outro lugar, para tentar ir para minha sala, eu era assistente do Presidente na época, o Dr. Laércio tinha renunciado. Quando eu estou chegando lá num andar, que dava para passar para outro bloco. Polícia! Então foram alguns enfrentamentos. Mas que nós passamos por isso, e isso só fortalece e nos dá mais coragem de saber, que mesmo aposentados agora, isso aí é para todos, não é só para os aposentados de Furnas. Nós estamos vivos, cada dia mais durando e tendo consciência, se tiver com a consciência, com a cabeça boa, que ninguém sabe se vai ficar. Mas se a cabeça tiver funcionando boa, a gente tem que participar de tudo. Eu tinha uma ideia, de me aposentar e dizer, assim: agora... Isso eu acho que é importante dizer. Só vou fazer o que eu quero fazer, não quero saber disso, não quero saber daquilo. Isso não existe, principalmente em relação à tecnologia. “Ah eu não quero usar celular”. Não existe, quem hoje não tem celular, tá fora de tudo. “eu não quero isso, assim, assim”, não dá. Você tem que participar, você está vivo. E você é um contingente muito grande, as pessoas mais velhas, vão ser daqui a mais um tempo, um contingente, uma parcela importante da população. Assim, agora como as mulheres, que estão crescendo, seu poder de participação, e é isso mesmo, porque o Brasil não pode não contar com mais da metade da população que é mulher. Para trabalhar e para botar esse país para a frente. Não pode, não pode ficar só a cargo dos homens, e hoje mais que comprovado, que não é só mulher e homem, que a diversidade é que traz as inovações. Então nos temos que ter todos os tipos de pessoas, todos os tipos, brancos, negros, índios, LGBT, todas. Na Fundação Real Grandeza, nós já temos, a maioria mulheres, inclusive em cargo de chefia. Hoje, por exemplo, nós temos na Fundação, uma diretora, eu estou como conselheira eleita, na Real Grandeza agora, eleita pelos aposentados. Depois que eu sai da Após Furnas, não contei. Depois que eu sai dos dois mandatos de Presidente da Após Furnas, me candidatei a diretora, ouvidoria da Real Grandeza, e fui eleita pelos aposentados. Passei quatro anos lá. Eu ainda estava com os meus pais ainda vivos, a carga muito pesada, eu sou uma pessoa que eu sou workaholic, entendeu. Eu não consigo participar mais ou menos, eu participo mesmo, e eu estava vendo que eu ia precisar dar apoio aos meus pais. Então falei: não dá para eu ter 24 horas por dia de Real Grandeza. Então quando acabou meu mandato de quatro anos, eu não fui para reeleição, e fui para o conselho, me elegi para o conselho, que a princípio seria uma reunião por mês, embora você trabalhe todo dia para se atualizar. Mas hoje em dia com a carga tem sido 3 reuniões por mês, e você tem que manter certificação, você tem que estar sempre com cursos, porque senão você não pode exercer a profissão de conselheiro. Meu mandato termina esse ano, em novembro, como conselheira deliberativa da Fundação Real Grandeza, eleita pelos aposentados. E eu vou ficar só no pós Furnas, que eu estou com 70 anos, ainda tem muita contribuição. Mas eu estou com meu pai ainda aqui, com 100 anos, para ajudar aqui, para curtir ele um pouco também né.
1:46:09
P/1 – Tânia me conta uma coisa que eu estou muito curiosa, a Dani começou a me contar sobre isso. Vamos imaginar assim, você saindo da sua casa indo para o prédio da Real Grandeza, como era esse caminho, como era entrar no prédio, como é que era..
R – Você está falando de Furnas, prédio de Furnas, aquele complexo, que embora seja da Real Grandeza, ele é um imóvel do Plano dos Aposentados de Previdência, é uma aplicação ali. É um negócio complicado, entendeu. Eu acho, quer dizer, eu vi aquilo nascer. Eu trabalhei no centro da cidade quando Furnas começou a ocupar o primeiro bloco A e o bloco B. Depois quando eu trabalhava em Furnas, foi construído o bloco C, eu vi a construção do bloco C. Trabalhava no bloco A, mas eu vi a construção do bloco C, esses blocos eram todos de Furnas. Mas houve uma época também de dificuldade financeira de Furnas, que não estava pagando os seus compromissos lá com a Real Grandeza, acumulou uma dívida substancial. E aí pagou a dívida, passando os blocos para o plano de previdência da Fundação, para o nosso plano BV, que era o único plano da época. Hoje a gente administra mais um plano de previdência. Quer dizer, aquele complexo todo não foi uma decisão de investimentos da fundação, aquilo foi uma necessidade de Furnas, que estava crescendo, foi precisando ocupar mais espaço. Teve uma dificuldade financeira, uma época, a gente dizia que teve uma época, que quem mandava era a diretoria financeira, que era para saber, a quem eu vou pagar. O dinheiro estava curto, eu só não pagava a distribuidoras, não pagava as geradoras. E aí... Que a distribuidora recebe direto da pessoa, então a gente paga, se não pagar corta a luz. Mas teve uma época que era calote generalizado no sistema, então a geradoras gerava energia, e os outros não pagavam ela. Então foi uma fase também difícil de Furnas, onde vamos dizer assim, o cargo mais importante era o diretor financeiro. Vou pagar quem, entendeu. Quer dizer, a gente viu o crescimento, a necessidade daqueles blocos, a ocupação total daqueles blocos e depois dos anos 90, começar a encolher, encolher, até a retirada geral. É muito triste, é muito triste, você ver uma empresa encolher. É muito triste, você ver a patrocinadora Furnas, que é a patrocinadora da Fundação Real Grandeza, sair da ocupação, de um prédio, que agora é dos aposentados que estão no plano PV, e que obviamente está vazio no momento, não está rendendo o que a gente imaginava, e que precisava render para pagar as aposentadorias, e ocupar um prédio menor no centro da cidade, melhor não tenho dúvida, que é menor, que é melhor. Porque está todo bonitinho, foi feito acho que um retrofit. Um prédio do Fundo de Pensão da Valia, isso há anos atrás, era inimaginável pensar um negócio deste. Eu não ia botar azeitona na empada do outro, eu ia botar na minha. Os tempos mudaram. Então tristeza, é muito triste, para nós aposentados, que vimos. Os novos já pegaram, os ativos de hoje, a maioria já pegou uma fase de encolher, não viu a fase do crescimento. Nós aposentados que vimos a fase do crescimento, que vimos a fase da preocupação de Furnas lutar pelos seus empregados, por melhorias de condições de trabalho, por melhorias de pensar na aposentadoria. Porque se Furnas não tivesse pensado na aposentadoria, hoje estava ferrada. Não tinha a menor condição de viver, nem de pagar, o que eu ganho do INSS, paga o meu plano de saúde. Então, não tem condição. Eu trabalhei lá os 30 anos lá. Então não dá, a gente vê uma coisa crescer, depois uma coisa começar a definhar, é terrível, sei que os tempos mudaram. Que nós temos que nós adaptar, falo inclusive isso, acabei de falar, que eu não queria dizer, “não quero mais isso, não quero saber disso”, não tem isso, a mudança é inexorável. Mas eu digo, o pensamento seria diferente, entendeu. O pensamento seria, “poxa, como vai ficar, o plano lá de pensão”. O pensamento hoje é puro e exclusivo de administração de custos e de dinheiro, as pessoas estão sendo relegadas, não é só Furnas, volto a dizer, estão sendo relegadas, infelizmente. Então a tecnologia está passando igual a um trator por aí, nos postos de trabalho, nós estamos num país sem educação, que é fundamental para tentar dar um pulo, e pegar um pouco mais na frente uma tecnologia. Se a gente for querer cumprir todos os passos, nós não vamos conseguir, nós temos que dar um pulo nessa educação. E para completar ainda vem ai essa pandemia maluca, sem falar nos nossos governantes, em relação a pandemia. Porque aí eu não quero entrar nessa seara.
1:53:00
P/1 – Como é que era as pessoas dentro da empresa, nessa pujança, nesse auge? Como que era conviver ali dentro desses blocos? O que tinha, o que os funcionários acessavam, nesse período?
R – Era tudo muito hierarquizado. Então, acesso a informação você só tinha acesso, aquilo que você trabalhava. Como eu trabalhei numa assessoria de diretor, eu tinha uma visão mais ampla, mas vamos dizer, como tinha uma estrutura muito grande, certamente quem trabalhava mais para baixo, não tinha ideia, entendeu, do todo. Quando você vai para uma instituição menor, porque Furnas era muito grande. Quando você vai para uma instituição menor, como eu fui, por exemplo, a Após Furnas, que eu fiquei ali, eu tinha um poder, eu consegui ver tudo, e tinha um poder de agir e fazer aquilo andar. Quando a instituição cresce muito, você tem que ter uma hierarquia, para poder ir, porque se você deixar também, cada um puxa para um lado, você não sai do lugar. Então existia uma hierarquia, o pessoal falava muito, por exemplo, da diretoria de operação, a gente dizia: não, a diretoria de operação, aquele pessoal que trabalha lá. Mas é igual o pessoal do exército, tem que ser, entendeu. No meio de uma guerra você não pode dizer para o soldado, vai lá... Agora não é mais soldado, porque agora é tudo de outro jeito. A guerra é guerra de informação, na verdade a guerra hoje tá na informação. Mas antigamente, você não podia chegar para o soldado, e soldado lá, resolver que, “eu não vou não, porque isso não vai dar certo”. Não tinhas isso, não tem como. Então o que eu vejo é o seguinte, ela foi crescendo, foi estruturando, e era uma hierarquia rígida. Era uma hierarquia rígida, bom dia, boa tarde, tudo muito formal. A carta que saia do departamento tal, se era carta do departamento tal, tinha que ir cópia para cá, não sei o que para lá, tudo hierarquizado, e a informação fluía, dentro daqueles canais, que eram permitidos. Você não tinha essa transparência que a gente tem hoje, nada disso. Não tinha!
1:55:57
P/1 - Digo também acesso no sentido, por exemplo, as pessoas nessa época se quisesse fazer uma formação fora da empresa ou dentro da empresa podiam fazer? Tinha alguma estrutura para os funcionários nesses blocos, como é que era essa questão?
R – Você está falando em relação a treinamento?
1:56:29
P/1 – Sim e também com relação à estrutura do edifício mesmo? Queria saber como era o dia a dia naqueles blocos, você falou que tinha 10.000 pessoas...
R – 10.000 pessoas não era no bloco, 10.000 pessoas era na empresa toda, inclusive nas áreas regionais. Mas ali tinha 5.000, a sede ali, tinha metade, em torno de 4, 5 mil pessoas estavam ali. Então você movimenta muito, você tinha um restaurante que servia 2.000 refeições dia, mais de 2.000 refeições por dia, no subsolo. Você não tinha esses outros benefícios, você não tinha tíquete-refeição, nada disso, no começo. Você tinha um salário e o seu salário tinha que da para tudo. Só que como os impostos aqui são muito altos, as empresas, cada vez que dá salário, você tem um monte de encargos e quando você dá o benefício, além de você não pagar sobre aquele benefício, você ainda consegue abater do seu imposto lá a pagar que é uma coisa. Isso também não é em Furnas, isso ai é o que aconteceu com todas as empresas, “não, muito caro dar salário, vamos dar benefício”. Só que agora tá tirando benefício, e não está dando salário. Por quê? Porque hoje tem muito desempregado, hoje você precisa de menos empregados. Como é que eu via aquilo ali? Eu via esse funcionamento, cada setor bem estanque. Eu como tive a sorte de trabalhar numa assessoria de uma diretoria, conseguia ver mais para baixo, mas é muito hierarquizado, mulheres mais para secretaria, secretárias todas, muito poucas mulheres, quando tinha, como eu te falei, cargo de gerência então, tinha duas, sei lá. E olha que tinha cargo de gerência naquela época, que eu te falei estrutura, superintendência, departamento, divisão e setores, sessão, teve uma época que tinha sessão. Depois foi encolhendo ao contrário, sumiu a sessão, aí já começou a sumir as divisões, nem todo mundo tem divisão, agora tá bem mais enxuto. Mas ali, aquele ambiente ali, era esse ambiente, ele movimentou o bairro de Botafogo por todos esses anos. Movimentou restaurante, comércio, dentista, tudo, manicure, tudo. E agora foi um bom baque, para todo o bairro, a saída de Furnas, foi um bom baque. Nós estamos lá na Fundação, avaliando, não no momento, porque o momento não tá muito bom para vender nada. Mas fazendo os estudos de como nós vamos fazer com os três blocos. Três blocos, mais uma subestação de energia, tem muita coisa ali.
2:00:11
P/1 – Tania, você ter sido a primeira diretora mulher em Furnas, na Real Grandeza?
R – Não, em Furnas não. Em Furnas eu não fui diretora. Indicado por Furnas para a Real Grandeza. Primeira diretora da Real Grandeza.
2:00:37
P/1 - Você viu isso com uma forma de incentivar outras mulheres dentro da empresa, mulheres mais novas?
R – Não, não foi uma politica de empresa, não foi uma mudança de cultura. Eu simplesmente, como eu conhecia o diretor que indicava. Ele não era diretor, era um colega de trabalho, trabalhava na financeira e a gente tinha muito contato, sabia que eu era estatística, fazíamos alguns trabalhos juntos. A assessoria que eu trabalhava com ele. E aí de repente ele virou diretor de Furnas, porque ele simplesmente, ele foi companheiro, colega do Collor em Brasília, muito tempo antes. Então ele foi indicado para ser diretor de Furnas, e ele me conhecia, queria botar alguém da confiança dele na Fundação Real Grandeza. Então não foi como hoje a gente vê hoje a gente vê políticas, isso também não existia. Hoje você vê políticas para cota racial, para poder inserir o preto na universidade, você vê políticas de mulheres, para poder colocar a questão dos gêneros, sejam mulheres, LGBT, o que, qualquer camada de gênero. Naquela época não tinha isso, então isso foi meio por acaso, eu acredito que foi por acaso. Não foi uma decisão de Furnas, nós vamos começar a colocar mulheres nos cargos gerenciais, não, não, foi. Mas foi assim, concurso, as mulheres começaram a passar nos concursos, estágios, as mulheres começaram a chegar lá nos estágios. Por quê? Porque elas começaram a chegar nas universidades. Para elas poderem chegar lá... É a mesma coisa do deficiente, porque que o deficiente não entra? Ele não entra porque não tem estrutura nenhuma para a educação. Como é que um deficiente que não tem transporte próprio, o transporte não facilita, não tem mobilização nenhuma, como é que ele vai chegar no lugar? Agora pode ser. Agora nós vamos mudar, porque a tecnologia, com essa pandemia, deu uma sacudida. Antigamente a gente falava assim, “curso que não é presencial, isso ai é curso pago, o cara não tá fazendo curso nenhum. E não serve”. Gente, agora a gente esta fazendo tudo no presencial, se não vale nos estamos perdidos. A gente está vendo que vale né. E para aquele que não vale, que não fizer, o problema vai ser dele, vai ser igual a Anriete Amado falava, lá no meu colégio André Movuá, liberdade com responsabilidade. Se você finge que está fazendo o curso, e não aprende, meu filho, você que vai arcar com essa consequência. Mas eu digo assim, a pandemia é terrível, mas ela fez com que, por exemplo, a gente vê lá, na própria Associação de Aposentados, a gente ficava assim, “não, mas para botar alguém assim, a gente tem que ter alguém que more aqui perto, porque é tudo com pouco dinheiro, é tudo trabalho voluntário, então não dá para gente pegar um cara que está em São Paulo”. Agora a gente tem como fazer as reuniões com os representantes regionais, entendeu. Claro que a gente precisa botar uma tecnologia na mão dele, e ele também tem que ter possibilidade de aprender alguma coisa, mas a gente não abria a nossa cabeça para isso, a gente achava que tinha que ser o presencial. Então eu não vejo assim, eu vejo isso, a mulher foi ocupando o seu lugar, depois de pílula e da necessidade de trabalhar, porque o marido já não conseguia arcar com todas as despesas. Ela foi conseguindo se qualificar, e com isso ela conseguiu se inserir no mercado trabalho. Na hora que você começa a ser um grupo maior, você começa ser visto. Mas naquela época não havia essas políticas que hoje há. “Não, nós vamos fazer uma política ativa para colocar mais pessoas”. Se eu tiver aqui, eu quero contratar duas pessoas, sei lá, negras, eu quero contratar mulheres, eu quero contratar isso, porque eu entendo que isso é o melhor para organização, pensamento de pessoas diferentes, entendeu. Então no meu caso, não foi assim, no meu caso foi pura sorte. Eu estava lá, e uma pessoa forçada, eu tinha feito um trabalho de tese, ajudado na tese, “não, mas ela já conhece a Fundação, já esteve lá, já esteve lá como chefe de divisão, então pode ser diretora”. Então não foi uma posição, então é claro, que lá, tudo em Furnas não é um diretor que decide. Ele leva a proposta para diretoria colegiada, que na época eram 7 diretores, e que foi aprovada a minha indicação. Mas depois a gente começou a ver, mais engenheiras, mais economistas e mais pessoas, mais engenheira nuclear, entendeu. E hoje a gente vê a mulher, se você pegar, a gente vê, por exemplo, eu tenho um enteado que é defensor público. Quando eu fui a posse dele, o que tinha de mulher defensora pública, era mais do que homem. E ele já é defensor, já tem o que, ele deve ter uns 15 anos ou 20 anos de defensor. Naquela época eu me assustei, quando eu entrei para solenidade, eu vi muitas mulheres, falei: nossa, mas quantas mulheres defensoras. Isso é o fim de uma batalha que começou lá atrás. Que para estar ali teve um primeiro passo lá atrás, de mães, como a minha, que falava: você tem que ser independente, você tem que ser independente, porque eu não consegui, mas você vai, você vai. Minhas filhas vão. E ela teve êxito.
2:07:53
P/1 – Eu queria que você me contasse Tânia, se tem pessoas que foram marcantes dentro da empresa ou apenas figuras que te marcaram, colegas? Tem essas pessoas também que você gostaria de registrar?
R – Sim, acho que tem. Eu tenho a pessoa do Henrique Gomes Barcelos, que foi quem me levou para Furnas, que era o meu colega da faculdade de estatística, me levou como estagiária, foi muito importante, sem ele, eu vivo dizendo isso para ele, ele fala: que nada! “Mas sem você eu não estaria aqui!” Então ele foi muito marcante. Eu tenho a pessoa do Luiz Fernando Bergamini de Sá, que foi meu primeiro chefe, que me deu minha primeira chefia, essa da chefia de divisão de seguros na Real Grandeza, primeiro foi meu chefe, e depois quando ele foi diretor da Fundação, ele me colocou em baixo dele, numa divisão, chefia. Eu tenho o Gilber, que me indicou, foi diretor de Furnas e me indicou para ser diretora da Fundação, primeiro para ser chefe de uma assessoria de RH e depois para diretora da Fundação. Eu tenho o Dr. Luiz Laércio, que me chamou para ser assistente dele. E eu tenho uma pessoa, que acho que foi muito importante, que eu conheci em Furnas, e que foi importante em toda minha vida, que é o meu marido, José Elton Tavares de Oliveira. Que eu conheci em Furnas, e que foi o meu mestre. Eu costumo dizer para ele, quando eu me livrei dele, eu comecei a ganhar as chefias, porque ele não me deixava ganhar chefias, então eu me livrei dele, eu fui subindo, quando não estava mais perto dele. Mas não, ele é uma pessoa muito importante na minha vida, foi uma guinada pessoal muito grande. Porque eu era casada, me separei, e fui ficar com ele. Tenho uma filha com ele, estamos juntos a 40 anos. Mas ele foi meu mestre. Mestre é um negócio diferente, muito duro comigo, quando nós não tínhamos nada, e ele foi meu chefe, muito duro comigo, eu não fiz o mestrado da Coop, porque ele não me deixou ir, meu chefe. Você acredita? Eu passei no concurso para fazer o mestrado para a Coop, precisava que ele me liberasse do trabalho para ir lá para o Fundão, sei lá, na parte da manhã. Ele falou: não, eu não preciso dessa qualificação aqui, e se você vai querer, o outro vai querer, o outro vai querer, como é que eu vou fazer? Que tinha um outro também... E até hoje eu não fiz mestrado, meu mestrado e na vida. E ele é um mestre, não só para mim, ele preparou muita gente que estava em Furnas, porque como ele foi sócio do vetor, e era professor de desenho geométrico e geometria descritiva, preparava pessoal para IME e ITA. Então ele tem o dom de realmente ensinar, e eu acho que eu aprendi muito com ele, e a coragem daquilo que eu venho fazendo na minha vida, eu aprendi na Após Furnas, na Associação dos Aposentados, que a união das pessoas pode fazer muito, e é um trabalho voluntário, ninguém ali é pago. Nós temos os empregados, mas tanto os diretores, como os conselheiros, é todo mundo no suor do trabalho voluntário. E é isso que eu vou fazer depois de novembro.
2:12:44
P/1 – Tânia, tem alguma outra passagem que você acha marcante em Furnas, que você consegue se lembrar? Seja o que você ache para dar risada, ou você lembre, isso aqui foi um grande desafio?
R – Falei do desafio da privatização, que aquele dia foi um dia memorável, aquele foi um dia memorável, da resistência dos desempregados. Porque os gestores não tinham como resistir. E da resistência da Após Furnas com ação judicial, me lembro da gente, todo mundo, desde de manhã lá, a assembleia indo começar, para poder cindir a empresa, é claro que o acionista majoritário era a Eletrobrás, tem 99% das ações, ia votar a favor, o resto ia ficar brigando lá, reclamando sem chance. E eu me lembro daquela escadaria, subindo as escadas, o advogado da Após Furnas, Dr. Leonel, que já faleceu, chegando com um oficial de justiça, com a liminar. E o pessoal não queria deixar entrar, tinha polícia na porta, e a gente conseguiu fazer eles entrarem. Aí depois para subir no tal do elevador, só tinha um elevador com a tal da polícia para subir, então a gente forçando a barra, os empregada todos juntos. E eles conseguiram subir, chegou lá na Assembleia e entregou para o presidente da Assembleia a liminar, que impedia a privatização. Foi uma confusão danada, mas quando acabou, estava todo mundo chorando, aos prantos, abraçados, foi muito lindo. E lembro também de uma passagem mais recente, que eu não falei agora, que foi quando os blocos estavam sendo para ser desocupados, também a Após Furnas, com a Asef, Associação dos Empregados, deu um abraço naquele quarteirão, também foi uma passagem emocionante, chovendo e todo mundo lá.
2:15:20
P/1 - Como é que você me descreveria o restaurante do seu pai, Tania? Como é que era?
R – O restaurante do meu pai. Não sei se vocês sabem? Você não sabe, você não é daqui do Rio. O centro da cidade, os prédios mais antigos, eles eram construídos assim, ao redor do quarteirão. Um quarteirão, todo de prédios e no centro, tinha umas passagens de carro, para você parar, você estava lá no centro, você parava os carros, o centro do quarteirão. Então no rio tem muito prédio assim, você pegava construía os edifícios em volta, tinha algumas passagens que você parava no meio daquele bloco de edifícios, era o estacionamento. Então o restaurante do meu pai da frente para Presidente Wilson, e os fundos era nesse final, nesse buraco aí, nesse centro dos prédios, que ficava todo mundo lá. Na entrada, ele era restaurante, café e bar. Então na entrada você tinha uma caixa, o balcão a direita, onde você vendia cafezinho, lanche em pé. Uma caixa para poder vender essas coisas, e no lado esquerdo tinha uma coisa que chamava charutaria, sabe o que é isso? Era um balcãozinho assim como se fosse um, parece uma estante, uma bancada e uma estante por trás, onde vendia cigarro, vendia piteira, charutaria, vendia essas coisas de fumo. Então tinha a charutaria, umas 2 ou 3 mesinhas, daquelas de pé de ferro e tampo de mármore, pequenininhas e o balcão onde todo mundo tomava cafezinho, lanches, sentava um pouquinho ali. Depois um pouquinho mais para frente, é que vinha restaurante. Então tinham duas portas, daquelas portas que faziam assim, do lado de cá e do lado de lá tinham aquelas portas, aí você entrava para o salão do restaurante. Todo de espelhos, em volta as mesas e uma caixa, ficava o balcão também, onde ficava com a máquina, caixa registradora para pagar, os clientes. E lá no fundo, à esquerda cozinha e a direita os banheiros. Era um restaurante muito tradicional. Mas o prédio era do INSS, então havia um contrato com o INSS. E também chegou uma época, que o governo resolveu retirar todo mundo. E aí meu pai foi obrigado a se aposentar e se desfazer de tudo que estava lá dentro daquele restaurante. Foi um baque para ele, mas ele ganhou um neto, entendeu. E aí ficou tomando conta do neto, foi isso que fez ele ficar até hoje.
2:18:52
P/1 – Você se lembra de frequentar esse restaurante?
R – Sim! Durante a semana não dava, porque a gente tinha aula e morava em Botafogo, lá era o centro da cidade. Mas aos sábados, aquilo era muito mais tranquilo, porque não tinha, as pessoas não trabalhavam no sábado, no domingo. O restaurante abria no sábado, mas não tinha praticamente, era mais para limpeza, fazer uma limpeza. E tinha os cursos que às vezes ainda tinha aula aos sábados. Eu me lembro eu pequena, sentada no colo da moça da caixa, da caixa que ficava logo na entrada. Por que você vendia, fazia o troco, e você dava ficha para a pessoa. A ficha do cafezinho, vamos dizer, era vermelha, a ficha do suco era azul, a ficha do pãozinho com manteiga, era não sei o que. Então tinha uma caixinha de madeira com aquelas fichinhas todas e uma caixinha registradora, onde tinha o dinheiro. Adorava ficar lá, fingindo que estava vendendo aquelas coisas. Então eu ia muito lá, assim, pequena. Depois mais velha não, porque não dava mais tempo. Você viu a loucura que era né.
2:20:08
P/1 – O seu pai, sua mãe tinham amigos, clientes que iam sempre no restaurante.
R – Não, amigos não! Os clientes eram clientes, os amigos e a família, era família.
2:20:26
P/1 - E como é que você conheceu seu primeiro marido? Qual o nome dele?
R – Meu primeiro marido é Paulo César Esteves Nossa, eu conheci na faculdade de economia. Era meu colega de faculdade, fomos casados 9 anos, sem filhos, nos separamos e não temos assim convívio, porque não tivemos filhos.
2:20:53
P/1 - E como é que foi com seu segundo esposa, então? Você conhecia ele, era seu chefe, e aí?
R – Ele foi meu chefe, ele foi ao meu casamento, meu filho. Você acredita? Naquela época se convidava chefe para o casamento. Eu casei em 74, 2 anos depois de formada. Então ele foi no meu casamento, ele era uma pessoa muito fechada no trabalho, muita gente não gostava inclusive dele, porque era muito fechado. Gente, tem um beija-flor aqui na minha janela, está chovendo à beça aqui. Bom, ele era uma pessoa muito, muito, fechada, muito encrenqueiro, tudo muito certinho, entendeu. Era triste, mas com isso me fez no trabalho aprender muito com ele. Porque não servia trabalho mais ou menos, o trabalho tinha que estar impecável. E ele não tinha mesmo papas na língua não, com qualquer um, não era comigo, com qualquer um, sempre foi assim. Então, você me perguntou... No meu segundo marido, na verdade a gente estava juntos e eu fiquei grávida sem querer. Aí continuamos juntos, porém, cada um na sua casa, só quando a Fernanda... Só que ele vivia mais na minha casa, do que na dele, porque eu estava grávida né, e aí e foi indo assim. Mas Fernanda nasceu, ele mantinha um apartamento, na casa dele e eu aqui e ele só veio para cá, quando a Fernando tinha nove meses. Aí nós passamos a morar juntos, estamos até hoje. Agora no momento afastado pela pandemia, porque eu estou com 70, ele está com 80 anos, ele está lá no sítio, aqui em Guaratiba, trancado e eu estou aqui, segurando as pontas do papai e de vez em quando vou lá. Esse final de semana mesmo devo ir lá.
2:23:10
P/1 - Imagino que então você foi conhecendo outras faces dele, não só como chefe.
R – Sim! Eu fui conhecendo ele, primeiro como colega de trabalho, que ele não era chefe, depois como chefe, era muito chato, mas valeu, ele era triste de chefia. Mas isso que me deu, entendeu. Vamos dizer assim, a gente chama estofo, né? Sabe o que é estofo? Sei que me deu estofo para poder, porque você na vida, você vai ter partes boas, partes ruins. Algumas você consegue controlar, outras você tem que ter estofo para aguentar. Então, eu, por exemplo, tive um chefe depois dele, não vou dizer o nome, é obvio. Falei do Luiz Fernando Bergamini, mas o outro eu não vou dizer. Que eu tinha contato com esse chefe, porque como eu trabalhava na assessoria, e a gente pegava dados de toda diretoria, eu tinha contato com esse chefe. Mas eu sabia, aquele negocio, sabia que ele tratava mal todo mundo, que era para baixo, ele nunca me tratava mal, porque eu ficava lá na assessoria do diretor, fazendo trabalho lá pro meu marido, que era o cão chupando manga. Então, tanto eu, quanto os outros colegas quando iam lá, não tinha problema. Só que ele vai virar o meu chefe, falei: cara, isso não vai dar certo. Ele é grosso, grosso de falta de respeito, que uma coisa é você cobrar um trabalho, como meu marido fazia, “não, não tá bom, você pode melhorar, isso aqui eu não quero aqui, quero lá”. Mas o outro era, hoje em dia ele estava ferrado, porque as coisas mudaram né, Pessoal ia dizer, “isso é assedio, isso é não sei o que”, entendeu. Mas eu saiba do histórico dele, nunca tinha... E quando ele virou chefe, eu vi ele fazer alguma coisa nesse sentido com alguma pessoa colega, não esperei duas vezes, arrumei um jeito, “muito obrigada”, vou me mudar de lugar. Foi quando veio a oportunidade da minha primeira chefia, e ai lá fui eu. Não, não tem condição, hoje em dia isso não é admissível, mas naquela época era muito complicado, dependendo da personalidade do chefe, você comia o pão que o diabo amassou. Era muito complicado.
2:26:13
P/1 – E como é que foi o nascimento da sua filha e porque vocês escolheram Fernanda?
R – Ela ia ser Ursula, mas no ultimo minuto, virou Fernanda. Ela ia ser Ursula por causa dos “100 anos de solidão”, mas quando eu olhei a carinha, não tinha cara de Úrsula não, tinha cara de Fernanda. E na verdade, na época, as pessoas já faziam a tal da ultrassonografia, para verificar se era menina ou menino, mas eu não quis ver. Então foi surpresa mesmo. E hoje ela está com 35 anos, está bem. E eu também me dou muito bem com os primeiros filhos dele, os três filhos dele, do primeiro casamento, formamos uma família, me dou bem com a ex-mulher dele. Então estamos em paz.
2:27:15
P/1 – E Tania, como é ser mãe para você, mudou muita coisa?
2:27:25
P/1 – Queria te perguntar o que você pensa para o seu futuro? Você tem algum projeto, alguma coisa para conquistar? O que você pensa?
R - Eu penso isso, vou sair da Fundação, não vou me candidatar a eleição nenhuma mais na Fundação, eu acho que eu já cumpri bastante tempo, eu já estou 18 anos aposentada. Mas eu vou manter esse tipo de trabalho junto a Após Furnas, como trabalho voluntário, como conselheira. Sou conselheira nata lá, não vou ser presidente, nem nada disso. E eu também estou em outros grupos, todos vinculados a essa área de previdência. Hoje mesmo tive uma reunião, estou num grupo, da Unidas Prev, que é uma associação, das associações de aposentados. E também estou num grupo de eleitos os fundos de pensão, que é o Fundep, continuarei trabalhando nesta área, para isso. Mas eu sempre fui também chegadinha a querer ajudar na parte de Assistente Social, de ajudar alguma coisa, em alguma ONG, que aí dependendo do tempo que eu vou ter, dependendo do que vai acontecer com essa pandemia, se eu ainda estiver inteira. Eu vou trabalhar nesse outra fase também. Também trabalho voluntário.
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P/1 – Como é que você vê o futuro de Furnas? Daqui 20, 30 anos?
R - Essa é difícil hein! Eu vejo o seguinte, com a privatização da Eletrobrás, se isso realmente acontecer, eu vejo não só o futuro de Furnas, como das outras subsidiárias da Eletrobrás, que vai ter uma reviravolta. Porque essa estrutura toda foi montada como eu te falei, a menos que o sistema elétrico mude novamente, que nós estamos fazendo força para isso, a continuar desse jeito, eu vejo que essas empresas não fazem mais tanto sentido tanto de emprego, entendeu. Porque elas foram colocadas aí, porque elas foram divididas por região geográfica, e o modelo hoje não é região geográfica. Então depende muito do que vai acontecer, com a Eletrobrás e com modelo do setor elétrico, entendeu. Então pode ser de tudo, pode encampar as outras, pode perder a sua identidade e virar só Eletrobrás todas. Que mais ou menos já foi isso, quando eles fizeram com a marca, quando Eletrobrás colocou aquela marca daquelas gotinhas ali, Eletrobrás. Aí o pessoal não estava lá nos blocos, quase enforcou a Eletrobrás. Porque Furnas tem uma marca que eu acho que é muito importante, que é a torre, a torre de transmissão é a marca de Furnas. Então botaram, foram obrigados a botar lá a marca da Eletrobrás, mas botaram um Furnas na frente, deixaram o torre. Agora com essa mudança de sede, isso vai se esvaindo, você vai esvaindo com a marca, onde está a torre? Muito diferente de você ver uma torre. Você ter um quarteirão de empresa. Então a gente tem que ver os próximos passos, são muito importantes, esses próximos anos. Vai depender... O governo vive dizendo aí, que agora passou para 2022, a gente vai resistir, para que não seja nem 2022, nem 2023. Mas eu digo, mesmo que não seja a própria reestruturação da Eletrobrás, mesmo que não venda, a gente vê que é isso que eles estão fazendo, entendeu. Quando você começa a tirar a marca, quando você começa a comer o boi aos bifes. É uma pena, fico triste com isso.
P/1 - Como é que foi contar um pouquinho da sua história para gente hoje, Tania?
R - Foi bom! Eu tenho orgulho da minha história e ela não acabou, esse é o principal. Eu te falei que eu conheci uma Tania diferente quando eu fui para Após Furnas, e foi uma pessoa, que eu nem me lembro mais agora, o nome, só sei que quando eu era Presidente da Após Furnas, eu fazia no dia dos aposentados, a gente sempre trazia... Pedia o auditório de Furnas, que Após Furnas era ali dentro de Furnas, pedia o auditório de Furnas emprestado, fazíamos uma comemoração para os aposentados, dia do aposentado, um bolinho, trazíamos alguém para fazer um show, alguma coisa, mas sempre trazíamos também alguma coisa séria. Eu trazia ou um dirigente antigo da Após Furnas, mais velho, para dar palavra para ele no auditório. E eu me lembro que eu trouxe um senhor que foi Conselheiro Fiscal da Após Furnas, muito velhinho e ele fez um discurso lindo sobre coragem, e coragem é o que movimenta o mundo, entendeu. Você tem que conhecer, ter os seus sonhos ou ter as suas lutas, conhecer essas lutas e se preparar, ter conhecimento para lutar ou para alcançar os sonhos, para fazer acontecer. E ter coragem, coragem, para ir em frente, seja lá o que vier na vida. Então esse senhor, que eu vou tentar recuperar o nome, se eu conseguir, depois eu te digo, que já não deve estar entre nós mais. Mas coragem. E eu vejo assim, números, pessoas, que vocês deveriam chamar e que ainda estão vivas, Alzira Silva e Souza a Iona Moreira, são pessoas que fizeram muito em Furnas, fizeram muito na Após Furnas, a Alzira também fez, fundou a cooperativa dos empregados de Furnas. Já estão na casa dos 80, mas ainda estão lucidas, estão bem, que seria importante, Furnas reconhecer o trabalho delas, entendeu. Estou falando de mulheres, mas alguns homens que eu falaria, já faleceram, e dos mais novos você vão achar. Os mais velhos e que vocês talvez tenham esquecido. Espero que não esqueçam.